Comecei um novo post pois parei o anterior curiosamente com
o número de palavras que é o meu número da sorte. Quando calhei de olhar para o
número de palavras, coisa que quase nunca faço, estava lá o número. Tive aquilo
por um sinal e mudei para cá. Não que eu seja de acreditar em sinais. Mas achei
bonitinho ficar com aquele número e vou revisar e publicar em algum blog
capilar.
20h18. Publiquei.
20h26. Fui botar Coca e fumar um indevido cigarro. Espero só
fumar agora quando for dormir. Sabe qual foi a maquinação que me passou pela
cabeça? Mandar do e-mail de mamãe, como se fora ela, um e-mail para Raimundo
Carrero dizendo que seu filho só faz falar na resposta dele, que ele responda
algo. Hahaha. Será que seria pressão? Mas não vou fazer isso. É baixo demais e
minha mãe não iria permitir. Hahaha. Estou é ficando biruta.
20h33. Puxei papo com a menina que só vi uma vez na vida. E
achei interessante. Não sei se ela vai me responder. Aposto que não. Mas dei
uma cutucada na existência. Sabe-se lá.
20h38. Dei outra e ficarei nessa, se ela responder
respondeu. Senão dane-se. Estou cansado de bajular e não receber nada em troca.
Só há uma pessoa que mereça isso de mim hoje. Mais ninguém. A Garota da Noite merecerá
uma carta de despedida. E só. É mais do que suficiente. Melhor pensar sobre
garotas que queimar a cuca com o livro. Vamos deixar isso para lá por enquanto.
Mas o que falar de garotas? São seres que não dão muita bola para mim, talvez
porque tenha o formato de uma. Hahaha. Sei que em dez anos duas garotas me
deram bola. Uma queria me comer, a outra queria me amar. A queria me comer bem
que tentou e quase conseguimos, mas só cheguei ao quase porque broxei. A que
quis me amar a essa ainda tenho muito o que escrever. E acho melhor não
falarmos de garotas. Meu conhecimento sobre esse misterioso universo é bastante
restrito, mas encantador, mágico. Guardo das minhas relações apenas as coisas
boas, as ruins não vejo necessidade delas. Então, na minha cabeça torta, todos
os meus relacionamentos valeram a pena. E em todos se não saímos ganhando,
saímos no zero a zero. Nunca achei que saí perdendo, sempre achei a experiência
válida, por mais doloroso que o final tenha sido. O final é o que menos conta,
o que conta é o recheio, é o que dá substância à relação. Não sei direito do
que falo, pois estou na cabeça com o vídeo de um pintor cego que me
impressionou. Pintor e cego, parece bem contraditória a escolha da profissão
com a deficiência, mas ele conseguiu conciliar a limitação com o ofício de
pintar. O ser humano supera limites inimagináveis realmente. Como me sinto
pequeno perto dele e de exemplos como o dele. Mas eles são exceções, não são a
regra, a regra, reitero é a mediocridade, estar na média, não ser excelente nem
péssimo, ser razoável. Eu sou medíocre, tudo ao meu redor aponta para isso. Mas
não quero entrar nesse mérito ou demérito pessoal. Eu sou o cara que tinha tudo
para dar certo e dei tremendamente errado. Nossa, completamente errado. Me
lembra aquela música de Caetano e Jorge Mautner, “Todo Errado”. Hahaha. A
garota me respondeu de forma simpática. Mas não acho que vá levar a conversa
muito adiante. Joguei outra pergunta. Vamos ver no que é que vai dar. Aposto
que em nada, para variar, mas variando, dessa vez isso não me importa muito.
Não estou ansioso aguardando uma resposta. Se vier veio, se não vier também não
tem problema. É uma posição confortável a minha em relação a essa garota. A meu
modo, estou me divertindo às custas dela. Posto assim parece até um desacato,
mas estou me propondo a auxiliá-la a traçar um plano para o seu futuro
profissional. Então não estou sendo chulo ou vazio, talvez, se ela me der a
devida atenção, eu possa ser de alguma utilidade em sua vida. E me divertir
enquanto faço isso. Mas vamos deixar a garota para lá. Estou pensando que a
minha geração pegou muita carona profissional na geração anterior. Não sei por
que tenho essa percepção. Na verdade, isso é mais exceção que regra. Estou
equivocado. Retiro o que disse. Mas a emancipação dos pais vem cada vez mais
tarde a meu ver. Não que isso seja um defeito, é uma tendência cultural apenas.
Dessa estou mais convicto. Até porque se casa cada vez mais tarde. E geralmente
se sai de casa quando se casa. Eu não sei porque não estou mais inserido no
mercado de trabalho e quando estava, uma das primeiras coisas que quis foi sair
da minha casa, tinha uma relação muito tumultuada com a minha mãe, achava que
ela me reprimia muito e reclamava demais, era um saco, cheia de atritos, então,
na primeira oportunidade, fui viver com um amigo do trabalho, depois sozinho,
que foi quando tive o meu primeiro burnout
ou que nome queiram dar. Pirei o cabeção e tentei me matar. Depois voltei a
sair de casa para ir morar com a Gatinha. Três, eu creio, maravilhosos anos,
até que a cola destruiu nosso lar e eu voltei a morar sozinho, quando então se
deu meu quarto e último burnout e
decidi que iria parar. Desde então vivo com os meus pais, primeiro com meu pai,
até a sua morte, e agora com a minha mãe até quando a vida permitir. Estou mais
tranquilo comigo mesmo que no post “Lixo”, que publiquei num dos meus
blogs capilares. A garota saiu do Facebook e não olhou a minha última
colocação. É a vida e segue. Sem nenhuma grande frustração a esse respeito. Frustrado
– e muito – eu estou com Raimundo Carrero. Mas não vou voltar a isso. Pelo
menos não por ora. Nossa, já são 21h28. O tempo passou voando agora. É bom
quando me perco na escrita. Adoro. Meu passatempo predileto, meu ofício de fé e
quando estou entretido com ele a vida faz todo o sentido para mim. Não estava
chegando nesse grau de envolvimento com o texto anterior, estava tomado não sei
por que tédio, mas um imenso que me roubava as palavras e quase a vontade de
ser e estar. Não desistirei de mim ainda, não agora que mais me aproximo da
realização do meu maior sonho profissional e pessoal. Talvez. Se não conseguir
será a maior frustração da minha vida. Nem sei como vai ser. Vai ser barra se
der errado. Espero que meu tio não falhe comigo.
21h35. Fui pegar Coca para ver se não entro no assunto livro
novamente. A música que está tocando é “Book Of Your Heart”. Irônico, para dizer
o mínimo. Vou falar só mais uma coisa sobre o livro, caso publicado, vou ter
que arrumar um meio de botar o endereço do meu blog em letras garrafais no
final, de repente a marca. Quero converter novos leitores para isso aqui. Seria
o máximo se vendesse bem e as pessoas se interessassem pelo meu presente e
acessassem o Profeta. Tudo pode acontecer. Inclusive, eu sei, superego, nada
disso. Vou falar sobre o quê? Sobre bonecos? Não. Sobre a vida. A vida hoje começou
pesada como narrada no texto “Lixo” e agora se apresenta bem mais amena,
mais agradável, gostosa de ser vivida, não sei o que mudou de um post para o
outro. Mas algo mudou. Ainda bem, não aguentava mais todo aquele tédio, marasmo
completo da alma. Há medíocres que conseguem se destacar, não sei por que eu
não poderia. Mas isso vai terminar no livro de novo. Acho que Sideshow perdeu
em qualidade na linha Marvel e deu um salto de qualidade na linha DC. As
esculturas de cabeça da Marvel estão muito HQs e genéricas, enquanto as da DC
estão realistas e cheias de personalidade. Interessante como pode a mesma
empresa lançar produtos tão díspares. Mas parei de colecionar com a Red Sonja
que, pelo que prevejo, virá com um bocado de peças separadas para encaixar, o
que acho um saco. Tira o encanto da figura para mim. Mas ela é encantadora
demais para eu deixar passar. Melhor escultura feminina que eu já vi. E última
compra para fechar a minha coleção com chave de ouro. Nossa, como era mais
fácil e principalmente mais barato comprar esses bonecos do Brasil no passado.
Hoje está de lascar. Mando tudo para a casa do meu irmão e fico na expectativa
de alguém vir e trazer (no caso ele mesmo, pois mais ninguém faz isso por mim).
Liguei para meu irmão agora, bateu a saudade. Mas ele estava tirando as compras
do carro. E eu não tinha nada efetivamente para dizer. Então a conversa durou
cinco minutos.
22h08. Estou ficando sem assunto. A viagem vem me afligir,
mas não de forma tão pungente quanto ontem, quando senti quase que uma fobia em
relação ao assunto, hoje estou apreensivo, mas bem melhor. Minha alma oscila
muito. Não como a de um borderline, mas dá seus altos e baixos consideráveis.
Graças aos céus estou mais tranquilo agora, com um astral melhor. O que me
incomodou foi a minha falta de comunicação com o meu irmão, como se deu difícil
e travada do meu lado.
22h21. Fui pegar Coca e mamãe me pegou para tomar os
remédios. Estou com o astral levemente mais baixo por achar que estou perdendo
a fluência com o meu irmão. Espero que não, que tenha por causa das compras.
Meu sobrinho tem dificuldade de entender o que eu falo. Está com sotaque
americanizado. É natural. Cada um com a sua vida. A minha pode ser resumida em
uma palavra, palavras. Não vai muito além disso e sempre volta para isso. Por
isso ser valorizado com escritor, ser publicado é tão fundamental para a minha
realização como pessoa. Não dá para ter a dimensão, só vivendo a vida que eu
vivo, que ninguém vive. O mundo outorga isso praticamente só a mim. Acredito
que outorgue igual quantidade de tempo livre a outras pessoas, mas duvido que
alguma delas escreva tanto quanto eu escrevo, nisso acho que sou único. Não é
lá grande coisa para se gabar porque o que escrevo nem sucesso faz. São textos
caudalosos e cansativos para os padrões cibernéticos.
22h42. Dei uma passada pela internet e minha tia-vizinha
estava tirando uma com a minha cara no WhatsApp. Que onda. Hahaha.
22h48. Achei mais uma editora, Papeis Selvagens. Mas essa
acho com distribuição muito fraca. Entretanto, quando tiver o livro concluído
sairei atirando para todos os lados. Vai que acerto algum alvo. Hahaha. Depois
de me frustrar com o meu tio, o que espero muito que não aconteça. Nossa, se se
der, vai ser uma decepção muito grande, a imagem dele nunca mais será a mesma
para mim. Mas, pensamento positivo. Nem de Carrero desisti ainda. Minhas
esperanças são resistentes. Estou levemente ansioso, com o que não sei. Acho
que com essas possibilidades todas darem errado. O cara que titia achou
parecido comigo me deu uma medida exata da imagem que transpareço para o mundo
que não é lá das mais agradáveis.
Eis aí com o que sou comparado. Minha autoimagem desceu dois
degraus. Mas tudo bem, já estava num recando obscuro da minha alma, a escuridão
é a mesma dois degraus acima ou abaixo. Hahaha. O amor ainda há de prevalecer
na minha vida. Vou comer o sanduíche que sobrou do almoço.
23h10. Sem saco de escrever mais hoje. Bucho cheio me dá
isso. E nem está muito cheio, comeria outro sanduíche se tivesse. Talvez tenham
sobrado almôndegas de ontem. Mas com o meu padrasto na sala, não me arrisco a
comer, só quando ele for dormir, se almôndegas houver. Senão, só me restará o
Sucrilhos. Acho que vou continuar isso amanhã. Não, me deixarei um pouco mais
aqui. Estou meio sonolento por causa da medicação e do sanduíche na barriga.
Acho que vou fumar o meu último cigarro e ir dormir. Acho que vou encarar mais
um rango.
-x-x-x-x-
12h20. Acabei de acordar. Ainda não tenho opinião formada
sobre o dia, estou a despertar. Tenho café e a fantástica faxineira está aqui,
duas grandes notícias. A primeira vontade que me bateu no dia: enviar um e-mail
para Seu Raimundo dizendo do para ler os dois últimos posts. Veja só quem e o
quê aparecem primeiro à minha mente quando acordo. Será que é uma coisa a que
dou (indevida?) importância? Sei lá, sigamos adiante, embora nada tenha me
surgido. Fumei dois cigarros e tomei duas xícaras do negro líquido. Tico e Teco
ainda se digladiam. Botei o Spotify no volume 10, U2 “Songs Of Experience” passando.
Meus posts não tiveram a visualização dos anteriores, acho que porque os publiquei
muito próximos, num intervalo de tempo muito curto. Ou porque sejam chatos e
longos mesmo. E a maioria já saiba disso. A outra coisa que me vem à mente é
que meu amigo, que tem um estilo muito próprio, será publicado. Sinto uma
inveja boa. Não sou um cara que lapida o texto, que garimpa palavras ou
expressões, por isso não me considero escritor, dentre tantos outros “poréns”.
Ele é ao que me aparenta alguém que tem o mais absoluto cuidado na escolha das
palavras e que divulga toda e qualquer publicação que faça. Tem o ofício da
escrita talvez em tão alta conta quanto eu. Mas escrevo como forma de
sobrevivência, é algo mais urgente e vital. Escrevo para que minha vida não
saia dos eixos, para manter a sanidade e não ir buscar em searas nada salutares
o prazer de existir. O meu prazer em resistir advém em primeira e última
instância da escrita. Se com ela eu já não sou ninguém, sem ela sou menos que
isso. Não conseguiria tecer os contos fantásticos, no sentido de fantasia, do
meu amigo autor, não me interessa e me pareceria um exercício fútil da minha
parte, uma imitação pobre do que ele faz com maestria. Acredito que ele talvez
tivesse mais facilidade em emular a minha escrita. Visto que não trago nada de
novo, nenhum floreio, raramente uma novidade, mas acho que teria dificuldade de
extrair tanto de tão pouco como faço. Não é tarefa tão simples, tendo uma
rotina tão estéril quanto a minha, onde pouco ou nada acontece a não ser a
escrita e uma olhada ou outra na internet.
13h00. O tempo passa, o tempo voa. Embora tenha começado um
novo dia, ele veio encangado no anterior, então tenho poucas páginas para
escrever, o que não sei se é bom ou ruim. Sempre posso abrir outro arquivo. E
outro e mais outro, quantos eu quiser, é a vantagem do virtual, é virtualmente
infinito. Enquanto o hardware funcionar, eu posso ter infindos novos arquivos
para dizer bobagens. Salvei um meme
que achei curioso a um tempo atrás e que o Facebook calhou de me relembrar
hoje.
Não o reparti na minha página da rede social para ser uma
exclusividade daqui. Ato mais besta, né, mas é um dos mimos que faço pelos meus
leitores. Queria ter a profundidade psicológica de um Dostoievsky, mas
infelizmente não possuo. Vivo me debatendo por dentro, mas nem por isso alcanço
os dilemas que os personagens do autor apresentam. Não vou matar uma velhinha
para ter assuntos mais profundos para tratar. Ou meu próprio pai, que por sinal
já faleceu. Tenho medo de tratar do meu pai aqui e ser mal interpretado por
alguém da família que porventura leia este post.
13h29. Hoje é aparentemente o Dia Mundial Sem Tabaco e mamãe
me mostrou uma reportagem sobre os diversos malefícios do cigarro. Me deu
vontade de fumar um. Hahaha. Bom, agora estou um pouco mais bem informado sobre
os malefícios do fumo e as benesses de parar de fumar. O problema é que não
quero parar de fumar e minha existência aqui só me interessa por causa do
bendito livro. Nada mais tem muito interesse. Nem acho que deveria dar tanta importância
ao livro se nem à revisora agradou. Eu acho. Ela nada me disse. Mas não parecia
muito empolgada quando veio falar comigo. O Hulk é realmente tudo o que pode
ser com a luz do dia o iluminado através da película das janelas do meu quarto.
Queria que a mesma diferença entre o Hulk agora sob essa luz e a versão pálida
e sem contraste da noite fosse a diferença do texto revisado para a versão crua
que mandei a ela. Seria o comparativo perfeito, se isso for possível.
13h46. Fui fumar um cigarro e mamãe ficou a me indagar se a
leitura não tinha aberto a minha mente em relação ao cigarro. Não havia muita
coisa que não soubesse e disse-lhe que não tinha muito apego à vida, esqueci de
comunicar-lhe minha fé cega em relação aos avanços da medicina. Foi melhor
calar. Ela se disse triste e eu vim para o meu quarto. Ah, ela perguntou ainda
se eu não pensava em diminuir e eu lhe disse que já havia diminuído o
suficiente, que antes fumava duas carteiras e meia por dia. Hoje passo dois
dias com uma carteira. Acho uma diminuição substancial e a que estou disposto a
ceder. Está de bom tamanho. Sei que para o fumo o único bom tamanho é parar
completamente, mas como não estou disposto a abandonar o tabagismo, já abdiquei
de vícios outros, muito mais danosos, não vou ficar sem o meu cigarrinho. Ela
me pintou cenários terríveis como o de constante sensação de sufocamento por enfisema
pulmonar. Prefiro não pensar nisso e ir levando a vida. Disse-lhe ainda – e olha
que foi um papo curto – que afora o livro não há mais nada que me gere
motivação de viver. Ela enumerou os familiares, os sobrinhos, mas nada disso me
gera empatia. Eu sou um cara cada vez mais antipático, no sentido de não sentir
empatia pelos demais. É triste isso e se fosse escolher por abandonar alguma
condição seria essa. Entretanto, não sei como nem sinto disposição de fazê-lo.
Já fui considerado uma pessoa especial, mas isso a um tempo há muito ido, sou
uma pálida sombra do que fui. Não sei onde aquele que fui foi parar, me
constrange esse que sou, mas não sei mais ser de outra forma. A causa da
transformação desconheço, sei que quando me apercebi ela já havia se dado e só a
percebo se intensificar. Não sei parar sua marcha. Tento sair, mas vou sem
vontade de ir, como um artista que volta aos palcos para cantar os mesmos
velhos sucessos. Anacrônico, deslocado, ensimesmado, sem conteúdo, calado,
alienado. Isso tudo é muito triste e me dói, mas não consigo fingir ser o que
era se de fato não encontro tal pessoa dentro de mim. Eu mesmo aos poucos vou
me excluindo do meio social e me encastelando cada vez mais no meu quarto-ilha.
Acredito, como medida última, que um grande amor venha me resgatar e me pôr de
volta o gosto pela vida entre as pessoas, mas sei que isso não passa de uma
grande e contraditória ilusão. Como arrumar alguém se não saio do meu
quarto-ilha? Sim, há uma possibilidade, mas essa não há de se concretizar. É
tão impossível quanto Raimundo Carrero me responder. Ainda mais. Mas não quero
tratar disso. Fato é que me afasto das pessoas pois me causa cada vez mais
estranhamento estar entre elas. Me sinto cada vez menos parte do mundão. Talvez
tenha sido confinado tempo demais, vezes demais, não sei se esta seria a causa,
é uma suposição apenas. Fato é que me sinto mais livre mais eu e mais meu aqui
longe das pessoas e perto das palavras. Não queria sair para a fantástica
faxineira arrumar o meu quarto. Espero que ela demore a chegar aqui. Migrarei
para a varanda, mas não estou com vontade fazer isso agora, sendo acarinhado
pela brisa geladinha do ar condicionado. “Landlady” me lembra a liberdade que é
estar aqui fazendo o que eu gosto, de ser do jeito que eu gosto. Não gosto de
me tornar um alienígena entre os meus semelhantes, mas não sei ou encontro
forças para reverter isso. Não sei se já contei isso aqui, mas meu amigo da piscina
ou o meu amigo redator, não me recordo, disse que havia um vídeo no YouTube
ensinando as mulheres a extorquirem os seus maridos ao máximo antes da
separação. Feito obviamente por uma mulher. Num mundo assim, acho que o meu
livro é até menos imoral do que poderia supor. O passo-a-passo de como
dilapidar financeiramente aquele que se jurou amar na saúde e na doença. São
tempos curiosos esses em que vivo, onde a democratização da comunicação e o
acesso irrestrito a ela produz coisas assim e todo o tipo de coisas outras que
eu deveria explorar e conhecer, mas não tenho disposição, entretido que estou
com a minha escrita. Sinto um interesse de revirar o lixo da internet, ver os
seus extremos, mas, para isso, conto com o meu amigo da piscina, quando há algo
de realmente relevante que se destaque do resto do lixo, ele me mostra. Relevante
para ele, digo. Ele é meu filtro e minha fonte de informação. Meu informante.
Hahaha. Espero que não perca o hábito de me repassar tão preciosas pérolas de
como pode ser tenebrosa e humilhante a condição humana. Ele tem uma atração
pelo que se destaca por estar abaixo da média, eu tenho o mesmo interesse, por
mais que tenha me espantado com o pintor cego, que é algo muito acima da média,
me chama mais atenção quão baixo alguém pode descer em busca de atenção. Não
sei por que se dá assim comigo, só sei que é. Bate até uma vontade de buscar algo
no YouTube para ver, mas acho que para isso é preciso um certo know-how, saber
fazer as perguntas certas. Não adianta eu colocar piores vídeos do YouTube,
acho que o resultado será decepcionante, não sei e não vou testar. Abri o
YouTube só para ver o que ele me sugeria de cara, e só deu pegadinhas de João
Kleber, e um vídeo de Björk e outro sobre alienígenas. Tirando Björk acho que
não deva ser muito diferente da página inicial do meu amigo da piscina, visto
que vejo mais YouTube por sua causa. É um grande serviço que não tenho
paciência para explorar, imagino que deva haver o mundo lá, mas prefiro ficar
escrevendo. Se me viciar em YouTube estou ferrado. É um poço sem fundo ainda maior
que o Facebook, eu creio. Não sei por que me lembrei novamente de Raimundo
Carrero. Não vou deixar ele tomar o meu pensamento uma vez mais. Não agora.
Estou meio desarranjado hoje. Será que desarranjado é uma terminologia
conhecida em todo território nacional ou é um regionalismo? Não sei e pouco se
me dá. Tenho que ouvir a discografia do The Clash. Mas também não agora.
Prevejo, pelos barulhos dos baldes se aproximando que terei que deixar o meu
quarto-ilha dentro em breve. Irei para a diminuta mesa da varanda que não tem
apoio para os meus braços, pois além de pequena é redonda. O maior paradoxo que
eu posso imaginar é um espelho de frente para o outro. Quem está refletindo
quem e o que está sendo refletido? Acho isso o que há de mais curioso. É um
pensamento que me faz viajar. Eu, nos meus períodos de mania achava que isso
seria a resposta para alguma coisa, só não me lembro para quê. Hahaha. Não
importa era tudo viagem da minha cabeça mesmo. A maior parte da minha vida
passo dentro da minha cabeça. Não reparto com as cabeças alheias, só reparto
quando divido no meu blog, mesmo assim não há troca, é tudo muito unilateral.
Como uma companheira faz falta nessas horas. Essa troca tão salutar e saudável.
Sinto que a Gatinha à medida que vai construindo a sua história, vai se distanciando
de mim. Isso me entristece mas respeito e admiro o movimento dela. É uma pessoa
que precisa estar em constante movimento, isso a impulsiona para a frente e
cresce na vida. Eu sou o extremo oposto, a personalização da imobilidade e
estagnação. Cada um na sua vibe.
Quero ver quem vai ser a pessoa que meu amigo cineasta vai criar de mim. Parece
que está empolgado com o projeto, que está trabalhando nele. Não poderia ficar
mais lisonjeado. A pessoa que eu fui no último ano em muito se assemelha a quem
sou hoje. Não mudei muito de lá para cá. Mas certamente não sou mais o herói da
infância do meu amigo, quando demonstrava certa verve para macho-alfa. Hoje sou
macho-ômega. Hahaha. Sem liderança, lidero a mim mesmo e nem tanto assim, nos
confins do meu quarto-ilha. Me isolo do mundo porque não acho nada de
interessante nele. O que tinha para achar eu já achei. Só é impossível. Mas não
estou à procura de possibilidades. Embora se alternativa se apresentar será
muito bem-vinda. Minha grande incursão/intervenção no mundão indubitavelmente é
o meu livro. Vou pegar um copo de Coca.
15h12. Minha mãe está numa situação tão pior que a minha,
aparentemente comprou duas passagens no nome dela em dois cartões diferentes.
Disse-me que meu padrasto está preocupadíssimo com a cabeça dela. Eu vou ter
que enfrentar o que vier. Ela pensa em cortar o remédio contra o câncer durante
a viagem, eu endosso. Se isso realmente melhorar a sua cognição e o seu joelho.
Senão o que estará levando para a minha irmã não é uma companhia, mas um
problema. Minha irmã e mamãe são grandes confidentes uma da outra. Minha irmã
já estava pensando em contratar uma cuidadora para mamãe.
15h24. Falei com o meu amigo corretor que disse estar “tudo
massa” com ele lá em Portugal. Disse-lhe que provavelmente viajo dia 24 para
lá. O barulho dos baldes se aproxima ainda mais. Acho que chegou ao meu
banheiro, dentro em breve serei temporariamente extraditado do quarto-ilha, o
meu reino, o meu país, por questões de higiene.
15h29. Já estou devidamente instalado na varanda e ouço o
barulho da obra algumas dezenas de metros abaixo. É massa o som aberto da
varanda, as aves gorjeiam, os peões martelam e conversam, as ruas estão calmas
pela falta de combustível, não vou nem botar a música do computador para tocar.
Ouço minha mãe conversando com o meu padrasto na cozinha. Estão almoçando. Fui
convidado, mas não tenho fome a essa hora. Algo me gera desconforto. Não sei o
que é.
15h34. Sigamos em frente a despeito de qualquer desconforto
do ser. Estava pensando na minha amiga do ateliê de pintura na China. Me
perguntou do selfie que mandei para
ela se eu tinha óculos fundo de garrafa no que respondi que não, que era bochechudo
e tinha olhos pequenos mesmo. Hahaha. Estou disperso, fora do meu quarto-ilha
há muitos estímulos e eles me distraem.
15h39. A cidade conversa ao meu redor. Emitindo os seus sons
particulares. A cidade é um macro-organismo. Como um formigueiro. É maior que a
soma de suas partes e possui (quase) todas as características de um ser vivo,
se alimenta, produz excrementos, se regenera, cresce, tem seus órgãos com
funções específicas e tem uma vida muito mais longa que aquela dos seres que a
compõem. Só não se reproduz. É a única característica dos seres vivos que não
lhe é peculiar. Uma leve brisa adentra a varanda, sopro da tarde que está numa
temperatura agradável, com uma luz amena, sem a claridade causticante do verão.
Também já vão dar quatro da tarde. Prefiro a vida passando rápida do que o
tédio das horas a se arrastar sem função definida. Eita, já estou na sétima
página, terei que interromper esse arquivo dentro em breve para começar outro,
antes disso, revisarei e postarei esse, depois celebrarei com um cigarro e um
copo de Coca. Queria que a fantástica faxineira acabasse com o meu quarto antes
de mamãe e meu padrasto virem ver a passagem em duplicata aqui na sala atrás de
mim. Não quero assimilar por tabela todo o estresse da situação.
15h50. Não sei por quê, mas a varanda me lembra o meu amigo
cineasta, lembrança boa e bem-vinda. É uma pessoa muito querida que espero que
subsista como amigo após o lançamento do livro. Tenho grandes esperanças que
isso ocorra, caso o livro pule do mundo das ideias para a realidade. A paisagem
da varanda me dispersa. Fico a observar a muralha de prédios e o verde que
ainda resiste à conquista inevitável do cimento. A marcha do progresso nem
sempre é apreciável e nem saberia dizer se é progresso se feito de forma
irresponsável e desgovernada. O dinheiro move o mundo, não a Declaração
Universal dos Direitos Humanos. Um vento mais forte e ainda mais agradável,
pela sensação táctil diferenciada que proporciona, adentra a varanda. Uma
revoada de pássaros passa cantarolando. Um bebê chora. A existência é realmente
um espetáculo grandioso e multifacetado. Enquanto um martela, outro arrasta a
pá no cimento, outro acalenta um outro que acaba de aportar no mundo, enquanto
eu narro todos esses eventos, é rica, a existência é uma experiência
extremamente rica, gosto de apreciá-la assim, sozinho e à distância, protegido
pela altura e pela segurança do meu apartamento. A varanda é grande. Meu
apartamento é grande, antigo. Mas não muito. Nem uma coisa nem a outra. É do
tamanho perfeito para eu viver muito bem. Tirando algumas crises interiores que
me afligem e nada tem a ver com o lugar em que me encontro. O vento, há quanto
tempo não o sentia tão integralmente assim. Ele assobia grave e incerto na
imensa flauta que é a porta da varanda. Eita, entrei na oitava página e nem me
dei conta tão absorto estava com o texto. Vou pelo menos acabá-la para revisar
e postar. Acho que é o tempo de a fantástica faxineira acabar com o meu quarto.
Se não já acabou. Vou averiguar, fumar o cigarro e tomar a Coca-Cola. Não,
revisarei primeiro. Fico por aqui.
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