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terça-feira, 30 de outubro de 2018

ELES NÃO



14h14. Acabada a publicação de um, volto aqui para despejar mais palavras pois elas são o centro da minha existência. Penso palavras, sinto (muitas vezes em palavras) e escrevo, faço uma confissão, um desabafo onde pouco resta de mim não revelado. É o que faço, é o que sei fazer de melhor e, sei, não é muito bom. Dane-se, me preenche. Não tenho mais a gana de ser reconhecido como escritor, não faz mais diferença e nunca fez, em verdade, era fruto de uma vaidade que não mais possuo porque pesa carregá-la, é impossível de concretizar e não levarei tal título para lugar nenhum. Minha mãe veio me perguntar se eu achava certo ter bebido no dia da eleição, respondi prontamente que sim. E se não beberei mais é porque eu não quero e não por causa das ameaças dela. Foi um dia singular e queria extravasar, pronto, passou. A vida segue. Não me arrependo e nem ressaca tive. Foi ótimo, um momento em que transbordei amor quando tudo era ódio e revolta. Foi um bom antídoto para a situação. Especialmente para a situação dentro de mim. E aprendi bastante sobre mim com essa embriaguez. Ela facilita a socialização, mas numa medida menor do que eu supunha. Também a fissura do crack não me veio, não deu nem sinal. Mas não arriscarei. Não preciso. Eu não preciso de álcool, essa foi a minha percepção. Ele dá alegria, ele deixa me deixa mais sentimental e expansivo, mas não é necessário para o meu bem-estar. Não me fará falta. Valeu a pena me conceder esse momento, acho que precisava. Até para fazer essas descobertas. Bom experimento. Desde já tenho vontade de voltar à Vila Edna. Sem álcool. Mas acho que esse assunto já deu. Se não tiver dado, voltará. Não tenho restrições em relação a isso.

14h37. Me sinto sensivelmente mais maduro do que da última vez que tomei um porre, isso me agrada. Aprendi alguma coisa ou algumas coisas ao longo desses seis, sete anos que estava sem beber. Pus minha mãe em modo paranoico porque ela descobriu the hard way que tem menos controle sobre mim do que supunha. Que eu sou mais independente do que ela gostaria. Bom é nesses choques de realidade que as relações se redimensionam, tomam novas formas e direções. Não sei se ela terá mente aberta para isso, creio que não, mas nada posso fazer a não ser seguir o meu caminho da melhor forma que encontro. Que sei e aprendi. Mais com a vida até que com eles, meus pais. A fase de influência formadora deles se esvaiu há algumas décadas. O resto foram experiências, escolhas, consequências e toda a gama de lições que a vida me proporcionou, muitas vezes de formas bem duras. Dei muitas cabeçadas, mas acho que aprendi algo. Tirei lições, me dou mais ao respeito, me respeito mais, me gosto mais também. Eu amo a vida, nunca pensei, depois da infância, que gostaria de ser eu novamente, mas me encontro satisfeito com quem sou. Tenho até um tiquinho de orgulho desse eu que se transmuta e do que já foi transmutado. Vou fumar com café. Me deu um branco agora pensando que darei o meu Nintendo Switch para os meus sobrinhos.

15h04. Mamãe me mostrou charges da oposição a Bolsonaro e as taxou de “ridículas” e fomentadoras da “separação social”. Bom, praticamente metade do Brasil é oposta ao presidente, o que ela queria? Que porque o cara foi eleito, todo mundo iria abaixar a cabeça e aceitar? Todo mundo se abraçar em delirante e desvairada alegria? Muita ingenuidade. Bom, me botou um áudio sobre a situação da Venezuela, onde o estado tomou conta de tudo. Não acho que seja esse o caminho. Não sou comunista nem radical. O que acho é que não podem ser maculados os direitos humanos e a democracia. A oposição e o povo em geral acompanhará mais de perto esse governo do que qualquer outro que tenha havido antes. Ou não, esse movimento pode ser como um carnaval que se dá de quatro em quatro anos. Não sei bem o que falo pois estou em verdade pensando na minha coleção de bonecos no momento. No Batman branco. Em como trazê-lo para cá. Acho que ele vai ser maior do que imagino. Como espero que Bolsonaro seja menor, menos perigoso do que imagino. Tenho minhas dúvidas a respeito do Batman e do presidente. Não aguento mais café por enquanto. Vou tomar uma Coca com gelo. E fumar mais um cigarro.

15h32. Minha mãe aparentemente foi dormir... de novo. Realmente está de saco cheio de lecionar. Não sei por que não desiste logo. Já deu, já fez demais, está de bom tamanho. Bem, a vida é dela, tem mais chão que eu, sabe o que é melhor para ela. Embora sejamos sempre aprendizes porque a vida nunca para de ensinar, é uma eterna e ininterrupta aula. Isso me dá esperanças de ser alguém melhor para mim com o passar dos anos.

15h37. Estou entediado, isso é um saco. Olhar para o Hulk me acalenta. Vi um rumor de que uma das pessoas cotadas para o ministério da educação tem como um dos planos ensinar criacionismo no colégio. Espero que seja fake news, afinal é inconstitucional, visto que o Brasil é um país laico. Não se pode dar predileção a uma religião em detrimento das demais. Estou com vontade de começar a escrever no “Eu Não Sou Cristão”. Se bem que posso dizer o que penso aqui mesmo, não faz muita diferença o endereço e sim o conteúdo. Não tenho muito deste último, é verdade, mas o pouco que eu tenho acha um acinte tal possibilidade. Ainda mais não sendo cristão.

15h55. Minha mãe me ligou, chamou no quarto e me cortou o Chartreuse. Descobri que o meu lar não é uma democracia. Não para mim. Eu sou tido como alguém de uma hierarquia inferior, um subordinado, alguém a quem é negado o direito de decidir acerca de diversos aspectos da minha vida. É certo que consolidei alguns direitos, mas outros me são vetados. Melhor ficar no meu quarto-ilha e reinar absoluto aqui, dono das minhas palavras. A relação que tenho com a minha mãe aos 41 anos de idade é adoecida e o pior disso é que é assim em grande parte porque o permito. Não sei como consertar isso. Não sei se tem conserto. Ou eu não tenho coragem de consertar, tenho medo como um garotinho tem medo da mãe. Eu acho que ainda sou o garotinho em relação à minha mãe e acho que ela me vê da mesma forma, foi uma relação que não amadureceu, que estancou e isso parece ser cômodo para os dois, por mais que agora me incomode. Ela consegue incutir culpa onde não há razão para tal. Tomei um porre e daí? Não fiz nada de errado, não destratei ninguém, não busquei outras drogas, vim para casa escrever. Passou. Ah, quer saber? Foda-se. Não vou me encher de energia negativa por conta da reação da minha mãe a esse episódio. Vou seguir, mas agora não me sinto bem. Depois do novo ataque dela ao meu ego com essa história do Chartreuse. Se ela vai esperar por arrependimento da minha parte, é melhor jogar o Chartreuse fora. Não me arrependo. Meditei muito sobre o assunto antes de tomar a decisão de beber. Achei que estava seguro e pedi a um amigo que me apontasse se estivesse sendo excessivo em algum momento. Não me excedi. Sepultar esse assunto nesse parágrafo. Já deu. Vou fumar.

16h24. Meu astral está baixo, o convívio com a minha mãe está pesado. Saco isso. Não queria voltar ao tema, mas até me culpar pela sua improdutividade no trabalho colocou em minha conta. É muito drama, chantagem emocional para cima de mim. O pior é que sucumbo. E sucumbido sigo escrevendo sem muito gosto. Meu irmão vem para Recife no final do ano e nem isso me anima, a reforma do meu quarto me apetece mais. Me peguei pensando enquanto fumava que, no meu leito de morte – que espero muito que seja o meu quarto-ilha –, definhando e sentindo as dores do câncer que me carcomerá por dentro, chamarei o filho da fantástica faxineira para escolher as três figuras que quiser da minha coleção, com exceção do Hulk. O Hulk com todos os seus defeitos e humanidade, pois foi esculpido à mão, é a peça mais impressionante que eu já vi e que tenho o orgulho de possuir. Quero que me faça companhia até o meu último suspiro. Pode ser que o meu leito de morte seja num mórbido e impessoal hospital, isso seria deveras triste. Creio na evolução da medicina, entretanto e essa crença me anima, pois me lembra da evolução tecnológica como o todo, da qual sou fiel, e que transcenderá Bolsonaro, eu transcenderei Bolsonaro. A não ser que ele engrosse e cace e mate a oposição, mas acho que não se dará. Falou tanto em democracia. Embora não saiba o que democracia signifique para mente tão estreita. Quero fumar outro cigarro, mas não vivo numa democracia e certamente sofrerei uma retaliação desnecessária se for. Não estou a fim. Prefiro segurar mais meia hora para fumar tranquilo. Estou intranquilo no momento. A constatação de que sou da classe oprimida aqui em casa me causa desgosto, mas não me rebelo, não me sinto preparado para uma revolução. Nem sei se jamais estarei. Porque doerá na minha mãe, ela iria sofrer com a mudança. Não gosto de fazê-la sofrer pois isso me dói. Sou tão codependente desta situação patética quanto ela. Mereço ser oprimido. Tenho quase toda a liberdade que anseio, está de bom tamanho. Aceitar as coisas como são. Ou seja, só vou fumar às 17h. Faltam 15 minutos. Não gosto do estado de espírito em que me encontro. Como mudá-lo? Dando uma olhada no Tinder.

16h55. Nada no Tinder. Li algumas matérias sobre Bolsonaro. Não me agradaram. Tampouco me surpreenderam. 16h59. Estou de baixo astral. Hoje não está sendo um dia bom, preciso de sono, de um novo despertar e um novo amanhecer para me sentir tranquilo. O sono tem essa vocação de amansar os meus demônios interiores. Vou fumar.

17h12. A luz escapa, a noite se anuncia. Estou ouvindo Valsa Brasileira de Zizi Possi e estou ouvindo há tempo demais. Vou botar a lista 6 em modo aleatório. Pronto. Começou bem com Ella e Louis cantando Can’t We Be Friends?, um retrato da maioria das minhas paixões. Não sei porque essa vocação, provavelmente por ser feio. Ou mais especificamente por me achar e me portar como feio. Tenho que largar mão disso. Dar um foda-se para isso também. A vida é muito curta para me privar por me achar feio, mas o Tinder e o Badoo comprovam, nesse tempo que estou disponível nos aplicativos só me curtiram barangas velhas. Sou só opção para isso. As gatas me descartam como eu descarto todas as mulheres feias. A sina da solidão vem se somar ao desgosto da vida que agora me toma. Vai passar, é só um momento em que me desequilibrei emocionalmente. Não se pode estar bem todos os dias.

17h29. Mandei um foda-se para o anjo do Tinder. Não ia dar em nada mesmo. Nem sei se era real. Foda-se. Uma fedelha e eu me desmanchando por ela, tendo ansiedade e sofrendo por sua atenção cibernética. Mereço mais que isso. Mereço ter mais respeito comigo. Não me aguento vou escrever mais coisa para ela. Preciso desabafar.

17h38. Desabafei, me sinto melhor. Adoro passar lição de moral para o anjo do Tinder. Acho que essa foi a última, pois duvido que ela vá puxar papo comigo de novo. Preciso acender a luz, não enxergo mais as letras e não decorei suas localizações nesse teclado USB que uso em substituição ao do notebook, que quebrou. Acho que vou fumar. Que dia mais chato, vixe.

18h03. Fui lá e beijei minha mãe. Ela me beijou de volta. O Badoo estava programado para cobrar automaticamente que ozzy. Só descobri quando recebi o recibo por e-mail. Já desprogramei isso.

18h12. Me perdi na internet, nada de interessante. Eu estou usando do meu subterfúgio para melhorar meu dia. Aumentei o volume de 10 para 12. Agora está legal. Não aumento mais porque minha mãe reclamaria. E acho que o 12 está perfeito, potente, com clareza, mas não incomoda. Ouvindo Virus, de Björk. O momento pede Björk. Gosto do universo musical para o qual ela me transporta. Acho que preciso fumar. Vou fumar. Não. Esperar dar 18h30. Estou sem inspiração, com mais vontade de pensar do que de escrever. São pensamentos bestas sobre minha mãe achar que eu estou fumando muito. A vida, a existência é fantástica como a enxergo nesse momento, parece mágica, incrivelmente complexa, o universo em que estou inserido do quarto-ilha com seus bonecos é um fantástico cenário. Meu quarto vai ser um fantástico cenário que muito me agradará admirar e ocupar. Sabe o que eu queria? Estar perfeitamente aclimatado com este teclado, pois as letras já estão apagando e eu ainda não as decorei com perfeição. Mas gosto do teclado, pois é bom de dar porrada, teclo com força e certa violência, é mais prazeroso assim. 18h27. Como foram longos esses minutos. Às vezes o tempo se dilata inesperadamente. A percepção do tempo, digo. A espera do momento de fumar, dada a vontade que tenho, faz com que se alooonguem... 18h29. Falta pouco para saciar tal vontade. Deu.

18h36. Enquanto fumava na escada, lembrei da atleta da escada, uma vizinha a quem convidei para um papo, sugerindo interesses afetivos, e me respondeu não convir porque tinha noivo. E, pensando nela, pensei numa ficção. FICÇÃO: estava agora fumando na escada e a atleta da escada apareceu praticando o seu treinamento vespertino de descer e subir degraus. Ao passar por mim parou para me cumprimentar. Eu não tive dúvida e sugeri: “e se a gente se beijasse agora inesperadamente, sem pensar? Seria o nosso segredo e sua oportunidade de experimentar outra boca. Vem cá”. E nos beijamos apaixonada e vorazmente. Ao nos descolarmos eu digo: “filmei tudinho no celular e vou mandar para o seu noivo”. Ela empalidece. Eu digo: mentira, mulher, nem celular tenho aqui”. FIM. Já estou com vontade de fumar outro cigarro, mas só de 19h. Nossa que vontade de fumar. Olhei que alguém me deu like no Badoo, mas, para ver esse like ou eu dou like para aquela pessoa, que não dá para saber quem é, seria obra do acaso-destino, ou assino o Badoo premium. Me contentarei se alguma para quem eu dei crush der chat para mim. É o que me interessa em verdade. Toquei numa parte do meu corpo que me deu desconforto mental, que onda. Não aguento, vou fumar. 18h53. Passou. Vou quando a música acabar. Fantástica, por sinal, New World, de Björk, do filme Dançando no Escuro, de Lars Von Trier pelo qual a cantora islandesa, protagonista, ganhou a palma de ouro de Cannes. O filme mais triste que eu já vi, de longe. Em uma linha o filme trata da incompreensão, pela sociedade, de uma pessoa com caráter perfeito. Vou fumar, enquanto entra Army Of Me, que foi trilha de um filme que de que gosto muito, Sucker Punch. Acho que até o assistiria agora.

19h07. Mudei de ideia, escrever é mais interessante e não sei onde o filme está salvo. Tenho o Dancer In The Dark em Blu-ray. Achei na Alemanha com legendas em alemão. Mas comprei, tenho que o assistir também em algum momento. Agora quero agradecer à existência por me permitir fumar e extrair o prazer que extraio disso. Acho “existência” uma palavra tão bela e tão carregada de complexidade. A miraculosa dança dos átomos que origina coisas como eu, como Björk, como a porra do anjo do Tinder, como esse evento incomensurável que é o agora no universo. É realmente uma das palavras mais preciosas do meu vocabulário e uma fartamente utilizada porque a amo. Ela me possibilita, me permite, me cede parte de si para que eu seja. Não há palavra outra que não gratidão. E amor profundo. Meu humor mudou completamente, volto a estar encantado com a vida, o beijo fez diferença. Nossa, quero fumar outro tomando uma Coca-Cola. Acho que um dia ainda crio coragem para experimentar o meu esperma. Tenho essa curiosidade sobre o seu sabor. Quem o sabia bem era a minha segunda namorada.

19h23. Puxa, deve ser uma sensação estranha, se é que Bolsonaro teve essa consciência, que todos os brasileiros passaram quinze dias pensando nele, mesmos os que votavam em Haddad. Parte com devoção cega e parte com medo ou raiva, mas todos pensando em uma só pessoa. Milhões e milhões de pessoas com você na cabeça. É muito doido. Foi um momento muito doido da democracia e pode continuar sendo. Ou não. É uma incógnita. O grande mistério nacional. As expectativas são quase irreais de ambos os lados, gente esperando um golpe militar, uns com anseio, uns com medo. É muito doido. Eu espero tudo com muita curiosidade, estou praticamente blindado da sociedade encastelado no meu quarto-ilha. Mas quando sair com o meu primo-irmão na noite não acho improvável ver, ao menos uma vez, um bêbado puxando a arma para outro. Mas isso por ora é ficção. O Brasil vai ter o que merece, o que pediu, o que demandou com o voto. A vontade do povo se fez. Estupradores serão castrados quimicamente. Entendo a ideia “preventiva”, mas acho desumano demais. O ato do estupro é desumano também (para os dias de hoje, afinal na época da escravidão era praxe brancos estuprarem negrxs e índixs, ou assim tenho para mim, pois até a tortura era permitida e o assassinato). Acho um passo atrás no nosso padrão civilizatório, mas talvez faça o estuprador pensar duas vezes antes de fazer uma vítima. Não sei. Penso nos possíveis inocentes que poderiam ser punidos injustamente. As feministas devem defender tal medida. FICÇÃO: casal briga e se separa. Mulher vingativa, lacera a vagina e o ânus com algo e se agride. Diz que estava sendo estuprada pelo ex-marido, por isso se separou. O cara é condenado, preso, violado e agredido e torturado por todos os outros presos e pela polícia, pois estuprador é repudiado até por marginais, depois é castrado quimicamente. E tudo o que pode fazer é chorar e gritar sua inocência, sem efeito. FIM. Vou fumar. Estou fumando muito hoje. Espero que traga boas ideias.

19h57. Vi parte de uma entrevista de Bolsonaro para o Jornal Nacional, meu padrasto torce para que Moro vá para o STF. Fumando só me veio a garota do último vídeo pornô que eu vi, linda, mignon, namoraria com ela, não parecia vulgar como uma atriz pornô geralmente me parece e, no entanto, foi a forma que escolheu de levar a vida. Ou de levar na vida. Desculpe a piada infame. Estou meio sem ideias. Acho que vou navegar um pouco. Li um texto que parecia sobre alguém com aversão à penetração. Perguntei se podia publicar aqui dando a autoria. Nossa, agora que percebi, estou na quinta página! Me descontrolei. Vou seguir, o blog é meu. Ela permitiu. Vou postar.

“Eles não.

Para tudo se tem uma primeira vez, e nem sempre são boas. Talvez nem as segundas, ou terceiras vezes são. Talvez nunca passem a ser. A culpa não foi sua. Foi minha por não saber dizer não. Se despiu, me invadiu. Fiquei sem reação. Não, eu não disse não. Ninguém viu, nem ouviu. Me senti nada, fiquei sem nada. Para ele não foi nada. E por que ninguém disse nada? Não foi a primeira, nem a segunda, nem vai ser a última. Não foi bom, nem vai ser. Me senti pó. E por isso, hoje, prefiro ficar só. Eles não, dessa vez não.”

Texto: Júlia Comelato, 30.10.18.

Já que tenho o texto, vou encerrar por aqui, revisar e postar porque a autora quer o link. Foi um post repleto de sexo. Curioso. Imagino que reação ela vai ter a respeito da minha colocação. O nome do post será “ELES NÃO” em homenagem a escritora iniciante. E usarei a imagem que ela usou para ilustrar. Curioso. A existência, a existência... cheia de inesperados.

domingo, 28 de outubro de 2018

BEBEDEIRA?

18h49. Nada me é mais aprazível que uma folha de Word em branco. Penso que ela guarda todas as possibilidades do universo, mas sei que em verdade, quando a tomo, ela se limita somente ao que há em mim e ao que estou disposto a oferecer. Mesmo assim, constrita dessa forma, me agrada muito. Estou ouvindo In Utero, do Nirvana. É um disco que gosto bastante, é meio desgovernado, desesperado, sombrio. Estava dando uma navegada na internet. Vou fumar e pegar Coca.

19h16. Mamãe me comunicou que vai deixar a fantástica faxineira em casa e que irei acompanhá-la. Saíram duas pesquisas, uma indicando empate entre os presidenciáveis e outra com larga vantagem para Bolsonaro. Acredito mais na segunda, não acho que tenha jeito.

21h16. Finalmente, depois de pegar os filhos e deixar a fantástica faxineira em casa, passar no Bompreço para comprar Cocas e uns poucos outros pertences e minha mãe botar alguns vídeos de Sandy para eu ver, sento aqui culpado. Ela queria que eu a fizesse mais companhia. Mas faz tanto tempo que não escrevo, escrevi pouco hoje por causa da faxina. Estou ouvindo Sandy e pensando no Azure Dragon. Foi só falar e o anjo do Tinder me surgiu na cabeça porque lembrei das eleições e que lhe disse que voltaria a me comunicar após tal evento, ou seja, amanhã. Penso em beber bebidas alcoólicas amanhã. Tomar um porre. Extravasar toda a tensão desse período conturbado da história nacional. Não sei se faça isso mesmo, mas é uma ideia que vem ganhando força ao longo dos dias. Não terei dinheiro, nem sei onde vende crack por aqui, não acredito que buscaria a droga, que é a razão pela qual parei de beber. Se me bater fissura, é realmente um sinal de que não devo beber.  

21h32. Não sei o que fui fazer além de fumar outro cigarro, mas a ideia de beber amanhã pulsa em mim. Veremos. Como já chegarei em casa bêbado, mamãe não poderá fazer nada a não ser encarar os fatos. Talvez vá querer me proibir de ir à Vila Edna, alguma maneira de me punir há de inventar. Mas um porre na vida não vai me matar. Porra, é a minha vida e só vou passar por ela uma vez! Nada vai acontecer comigo além da possível e provável ressaca. E da retaliação da minha mãe. Vale a pena. Eu acho. Nem lembro mais como é estar embriagado. Mas não quero mais falar disso. Talvez nem o faça. Comentei com o meu primo-irmão e ele questionou se eu estou podendo beber. Escrevi mais ou menos o que disse aqui.

22h24. Fiz uma coisa que não fazia há semanas: fechei o Chrome. Confesso que me sinto meio órfão. Vamos ver quanto tempo resistirei. É um hábito já bastante consolidado, alternar entre as palavras e a internet. Ainda mais com o Tinder acessível pelo navegador. Peguei o tique de olhar de tempos em tempos se surge alguém. Ainda estou decepcionado com o fato de não ter conseguido a atenção da balconista. Não há nada que eu possa fazer. É seguir dando os meus superlikes e confesso que estou cada vez menos exigente em relação às garotas que o merecem, mesmo assim os que dei não resultaram em nenhum match. Peguei no mouse para olhar o Tinder motivado pela frase anterior, mas me lembrei que havia fechado o Chrome. Não sei porque me privo. Acho que vou fazer uma limpeza do HD. Momento.

22h55. Em vez de abrir o aplicativo de limpeza de disco eu, sem pensar, reabri o Chrome e, uma vez aberto, não resisti e fui navegar. Tem jeito não. Botei para baixar o filme que mamãe queria ver, sugestão da fantástica faxineira, e Ant-Man and Wasp.

23h05. Fui fumar um cigarro. Estou ansioso por amanhã. Acho que mais pela possibilidade de beber. É bom trelar, quebrar barreiras, embora não esteja certo de que realmente farei isso. Escrevendo a frase anterior me desanimei. Não sei, não sei. Não quero ir muito tarde para lá, mas também ignoro que horas vou acordar. Ter fechado o Chrome, mesmo que o tenha reaberto, parece que deixou o computador mais rápido, curioso. Vou pedir ao pai da Vila Edna que guarde o conteúdo do livro só para si. E, se preferir, nem leia. Não sei. Estou cheio de dúvidas hoje. Coloquei o novo disco do U2 para ouvir, ele tem um significado especial na minha vida. Significa liberdade, em particular da cola e do manicômio. Indo além, a liberdade que experimento na minha vida, limitada como é. Minha liberdade é de um tipo diferente, pouco correlato com a liberdade de ir e vir, que é identificada, creio, como a liberdade mais primordial. Eu raramente saio do meu quarto e, quando saio, não tardo a sentir falta de estar nele. O meu isolamento eu julgo já ser algo meio patológico. Tal isolamento acho que é reflexo da condição – e decorrente condicionamento – experimentada no período que passei praticamente em prisão domiciliar quando morava com meu pai. Foi a medida encontrada por ele para me impedir de usar cola. Não guardo ressentimentos de sua decisão, morando em Boa Viagem, longe da minha turma, não havia muitos lugares para onde quisesse ir. Sofro também privação financeira, por mais que receba pensão, só posso utilizar dinheiro quando outorgado pela minha mãe. Isso também não me incomoda (muito), não fora pelas bonecas e pelos cigarros. Nossa, queria muito que mamãe passasse a me dar uma carteira por dia. Acho que vou pedir isso de Natal a ela. Por falar nisso, preciso ir ao banco desbloquear o meu celular para poder efetuar saques da poupança. Não agora no final do mês, mas no começo do mês que vem. Vou fumar. Não sei. Talvez acabe tentando ir na terça, visto que segunda tenho Ju.

0h18. Já é dia da eleição. Daqui a 7h41 minutos, começará. Tomei os meus remédios, me despedi de mamãe e agora tenho a noite só para mim. Meu amigo cineasta me mandou uma música de Caetano para ouvir: Amanhã. Ouvirei agora. Momento.

0h48. Era uma música linda e positiva de Guilherme Arantes, interpretada por Caê. Resolvi botar o disco todo para ouvir. Saudade danada me bateu do meu amigo cineasta. Amo-o muito. Me dei conta do imenso após ouvir a música. Dei um crush para uma garota muito interessante do Badoo. Pois, é estou apelando para dois aplicativos de paquera. Tentando o que não me invade. Já dei superlikes e crushes para várias garotas e nada. Aliás, houve o anjo do Tinder e a garota do Instagram, mas não sei se são/eram perfis reais. Estou com saudade do meu anjo, apesar da insegurança em relação à sua identidade. Findada a apuração ou confirmada a vitória, mandarei mensagem para ela. Talvez ébrio, talvez não. A vontade que tenho tenho que calar dentro de mim. O tempo virá, é só ter paciência. Acho que vou comer.

1h36. Devidamente alimentado. Foi um jantar digno, gostei. Primeira coisa que me veio? O anjo. Não que haja esperança em algo que não sei nem da veracidade. Gostaria que a garota que curti no Badoo me desse bola, é bastante interessante e possui um piercing argola no nariz como o anjo e é loira como o anjo e é apetitosa como o anjo. E fuma, o que, para mim, é um plus. Bom, dei várias curtidas, pode ser que alguma vingue apesar da minha idade e do meu bucho.

1h48. Acho que vou me retirar dentro em breve...

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13h28. Acordei há algum tempo. Recebi um match no Badoo, mas estou sem coragem de começar uma interação, acho que porque não é alguém que me encante de verdade. Dentro em breve me arrumarei para ir à Vila Edna, mas confesso que não estou muito disposto para birita hoje, agora. Botei meu celular para carregar mesmo não tendo descarregado, pois quero ter bateria para mandar a mensagem para o anjo do Tinder quando o resultado da eleição se der. Sei que é contraditório querer falar com alguém que talvez seja fake e que não me dá a mínima e não querer falar com uma garota que revelou um interesse sincero pela minha pessoa. Façamos o seguinte: quando o meu celular carregar, eu vou me aprontar para ir à Vila Edna. Uma vez lá, inicio o papo com a garota que me deu o match no Badoo.

14h22. Acho que vou para a Vila Edna às 16h. Um bom horário eu creio. Nem muito cedo, nem muito tarde, bem, talvez só um pouquinho tarde. Em verdade, acho adequado. Sobre beber lá, confesso que não me decidi. Acho que só chegando lá. A antecipação já me causa desconforto, as vésperas sempre me dão vontade de desistir, sei bem como sou. Coloquei uma Coca para gelar no congelador para levar para a Vila. Estou com mil pensamentos na cabeça como formigas de asa em volta da luz em dia de chuva. Vontade de fumar tomando uma Coca bem gelada. Resistirei um pouco mais. Confesso que estou puto com um amigo de infância meu que mora no Canadá e defende Bolsonaro. Mas não deixarei o antagonismo político macular a nossa relação. Essa raiva passará. Vou fumar, não há por que esperar. A vida é muito curta para ser desperdiçada com esperas sem sentido. Isso deveria se aplicar ao anjo, mas em relação a ela guardo uma terna esperança.

14h53. Não estou muito inspirado para a escrita. Estou curioso para escrever embriagado, se isso se der. Minha mãe vai pirar na batatinha. Vai dar um escândalo. Ameaçar, internação inclusive, sei tudo o que me espera. Não acho que seja um ato irresponsável. Estou plenamente consciente. Não quero me prejudicar. Não acho que vá me bater fissura de crack embora não tenha certeza disso. Descobrirei. Ou não. Não decidi sobre a bebedeira, mas como é um pensamento dominante, acho que levarei o meu projeto a cabo. Não sei também se haverá resistência por parte dos habitantes da Vila Edna à minha ideia. Creio que não, mas nunca se sabe.

15h07. Creio que ébrio eu não conseguirei resistir ao impulso, visto que o id vai estar sem rédeas, e não encomendar uma das duas últimas estátuas que quero. A Harley Quinn. Espero que me controle. Pretendo beber seis long necks. Mas sei que quando começo é difícil parar. Esse é um dia sui generis em muitos aspectos. Confesso que estou com um pouco de medo de beber e ser inapropriado. Pedirei que me sinalizem se eu agir dessa forma. E que me coajam a manter as estribeiras. Vixe, que fixação chata. Ainda bem que já estou na terceira página e que daqui a pouco em vez de projetar o futuro, estarei efetivamente vivendo esse futuro que projeto. O Brasil, meu amado Brasil, fazendo uma escolha odiosa. E eu entendo, o povo cansou do PT, o povo é conservador e violento. Se vão haver casualidades na guerra contra o tráfico, isso não incomoda o eleitor porque eles creem que não será com eles. Ansiosos por “segurança”, anseiam por armas. Sei bem que tipos vão querer ter armas em casa. São os piores tipos. Vou fumar.


15h26. Está quase na hora de me aprontar. Está quase no final da terceira página. Quando ela acabar, vou me preparar. Colocarei o meu melhor perfume, colarei o adesivo de Haddad e vou para o ninho de resistência e de amor que é a Vila Edna. Me dói um pouco deixar a minha mãe sozinha, mas ela concordou. Ademais tem que preparar aula e prova. Não teria tempo para companhia, companhia essa que poderia estar oferendo agora, em vez de estar aqui a escrever e não ofereço. Então é hipocrisia da minha parte o que acabo de falar. Ainda acho que Bolsonaro, na coletiva que dará após a apuração dos votos dirá algo como “petralhada, agora vocês vão ter que me engolir!”. Bom, acabou a terceira página. Vou revisar, postar, tomar banho e ir.

quinta-feira, 25 de outubro de 2018

MAIS TINDER

22h00. Acho que hoje vou dormir cedo. Achei uma supergata, nível modelo mesmo, no Tinder. Tudo de bom. Dei o superlike, mas cometi o equívoco de não copiar o seu Instagram, por onde eu poderia puxar conversa com ela. Estou aqui profundamente arrependido. Se bem que quando a esmola é boa, o santo desconfia, de toda sorte, tenho que tentar. E a coincidência: ela tem o mesmo nome do anjo do Tinder.

23h08. Santo Tinder plus! Apareceu uma nova garota e eu pude apertar o botão de rewind e voltar ao perfil dela. Já a adicionei no Instagram e joguei aberto com ela, vamos ver se ela vai ver ou responder. Não acho que tenha tanta sorte, mas ela está lançada. Já tinha me esquecido da paranoia de ficar olhando o Instagram para ver se a figura visualizou a minha mensagem. Estou nessa no momento, mas vou desencucar. Só há seis por cento de bateria, então mesmo que ela quisesse não poderia bater um papo hoje.

0h06. O evento cibernético Spooktacular da Sideshow Collectibles me roubou um tempo agora, tentando faturar uma figura do Flash bem legal num sorteio. Era um que não me incomodaria ganhar. Entro em todos da Sideshow, mas nunca levei nada, não vai ser dessa vez. A bateria do celular vai acabar a qualquer momento. Acho que hoje realmente vou me retirar dentro em breve, se bem que sempre me proponho a isso e me embrenho madrugada adentro.

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13h15. Cá estou, acordei há mais ou menos uma hora com política na cabeça. Estou cansado disso e aliviado que o pleito se dará nesse domingo.

13h22. Já fiz a minha imagem de perfil para depois da eleição.




13h23. Não acredito que Haddad vá ganhar. Se ganhar, até eu vou duvidar da lisura do processo eleitoral. Não será um alívio, pelo contrário, será a confirmação de que o sistema político é mais podre e corrupto do que eu poderia supor. E nem posso imaginar qual será a reação da população frente a um resultado contrário a Bolsonaro. A nova garota do Tinder não viu as minhas mensagens e não creio que as verá. A outra que adicionei da mesma forma, pelo Instagram, nunca me respondeu nem olhou minhas mensagens. Vou pegar Coca e fumar um cigarro.

13h45. Li uma matéria sobre o show de Sandy que acontecerá hoje à noite e uma pontada leve de arrependimento me bateu por não ter comprado o ingresso quando ainda havia relativamente perto do palco. É a vida e segue. Mergulhei um pouco na internet, tudo gira em torno da política. Botei Björk alto para ouvir. Five Years ao vivo. Era uma música que não me apetecia muito, mas, ao prestar atenção na letra, me conquistou, é uma das minhas várias prediletas hoje em dia e a versão ao vivo é bem massa. Sobre assuntos do coração, confesso que o Tinder não tem me trazido grande sucesso. Sucesso nenhum para ser honesto.

14h16. Botei café na cafeteira elétrica que ganhei da minha tia jornalista para fazer. Quero economizar Coca e, especialmente, gelo. A verdade é que não estou encontrando muita disposição para as palavras esses dias, não é desmotivação, é falta do que dizer. Seria muito mais conveniente a Bolsonaro fechar o congresso e legislar a seu bel prazer. Não imagino como terá maioria no congresso. É claro que, como ele, eu sonhe com congressistas que votem de acordo com suas convicções, consciência e vontade de seu eleitorado, sem ser necessária nenhuma barganha ou transação política. Mas acho difícil que isso se dê. Se ele conseguir, só por isso já valerá o seu papel como presidente. Acredito que seria algo realmente novo na política mundial. Seria um exemplo, mas me parece conto de fadas. Estou desconcentrado, não sei direito o que escrevo. Queria ser presidente. Tenho medo, porém, de me corromper com o poder, como mencionei em post anterior. Vou ver o café e fumar.

14h36. Estava pronto e está bom. Tenho uma xícara ao meu lado. Não sou o único que escreve na minha família, tampouco o melhor, menos ainda o mais esforçado, mas sou o que mais se dedica à palavra por ter construído tempo para isso. Não acredito que nesse caso a prática leve à perfeição, o que me aproximaria dela seria ler uma boa gramática, mas sou um escritor preguiçoso e, agora, despretensioso. Nunca serei grande, aceitei isso. Não sei como, nem tenho talento para tanto. Sei me narrar e isso me contenta, então faço. É algo como uma conversa que travo comigo mesmo, um estudo das minhas percepções e experiências. O marido de uma amiga minha, artista de verdade e completamente, disse-me artista, fiquei lisonjeado com isso, mas não mereço ser alçado a tão grande altura. Pintei um punhado de quadros e deito palavras, nada mais. Pintar, não pinto mais. Foi paixão passageira, abortada pela necessidade de minha mãe de que eu me aprimorasse e dominasse a técnica, de que não ficasse “parado”, o que roubou da pintura a sua liberdade e seu aspecto lúdico para mim. Não a culpo, entendo tudo o que se passava na sua cabeça, sei que queria o meu melhor e que se sentia angustiada em me ver sem fazer nada, pois para ela era inadmissível tal posição na vida àquele tempo. Não gosto de apontar culpados. Se fosse culpar, culparia a mim mesmo que nunca gostei de fazer nada por obrigação e sempre odiei estudar (ódio que depois se voltou ao trabalho, quando esse parou de me recompensar à altura do meu sofrimento e empenho). Por não ter que me submeter a nada disso mais, me sinto abençoado e acredito que encontrei o meu lugar no mundo. Sou um covarde preguiçoso que ama se exibir através das palavras. Talvez seja um pouco mais que isso, mas esse pouco mais me escapa agora. Mais café e cigarro. Vou à Vila Edna no domingo, acabei de confirmar, minha alma precisa disso, será bom.

15h06. O café me faz bem, me deixa mais alerta, mais esperto, com mais energia, criativa inclusive. Não que eu crie algo quando escrevo, pois em verdade não escrevo, descrevo o que me vem à cabeça. É uma coisa menor, mas, como disse reiteradas vezes, é o que me cabe e agrada fazer, é a liberdade que exerço, é a minha forma de expressão, minha satisfação egoísta e ególatra. Não tenho vergonha de ser assim, aceito, me faz bem e me ajuda a tocar o barco do que, de outra forma, seria uma existência sem sentido. Não há utilidade outra no que produzo que não a satisfação pessoal. Acho que é o que todo mundo busca, eu encontrei nessa forma de expressão que, se tem algum diferencial, é ser muito minha, muito própria visto que absolutamente subjetiva. Não pesquiso, não analiso fatos, exceto pela campanha eleitoral. Isso passará e eu permanecerei. Com minhas paixões impossíveis e meus bonecos. E as palavras, sempre as palavras, em doses bem servidas, meu eu pede por elas como alguém que sufoca precisa de ar. Respiro palavras, as vomito irresponsavelmente, despretensiosamente pois abandonei a pretensão. Ela não me cabe e não me serve. Me resignei de que os meus planos de ser publicado falharam todos. Meu texto não merece a tinta e o papel. Que seja, isso não me impedirá ou me constrangerá de produzi-lo. Não sei porque me meto às vezes a essa “metalinguagem” e não importa saber, obedeço o que vem de mim, cada impulso, cada intenção. Claro, há o superego e ele é cada vez mais o meu superego que o do meu pai ou do meu irmão. Isso me agrada sobremaneira e alivia, dá leveza, à minha vida. Tenho certamente mais defeitos que as duas figuras supramencionadas, ou pelo menos os tenho de natureza mais repudiada pelo senso comum. Danem-se todos e me atirem a primeira pedra aqueles que não possuem defeitos. Sou um sujeito incomum, isso cria uma ruptura social que me desagrada e, ao mesmo tempo, me permite me exercer de forma mais plena e minha. Eu tenho exatamente o que busquei. Nem a mais, nem a menos. Bem, talvez um pouco a mais. Mas não me culparei por esse excedente de benesses. É o que a existência me oferta e colho o que me interessa. E pouco me interessa. Tento plantar, mas não tenho mão boa para o plantio. Que seja, se é solidão o que me cabe, acatarei e subsistirei, tenho minhas palavras por companheiras, fiéis e submissas. Por falar nisso dei um like em uma garota de 26 anos BDSM, uma categoria de perversão curiosa que envolve submissão, sadomasoquismo e dominação. Ela seria a parte dominada. Tentei adicionar ao meu WhatsApp, mas não tive êxito, seu telefone está no meu celular, mas não sei se teria coragem de machucar alguém, mesmo que ela pedisse por isso. Há um lado sádico e comodista meu que adoraria ter uma “escrava voluntária”, mas não consigo ver como uma relação que fosse me trazer satisfação. Por mais que, não vou mentir, uma mulher submissa me pareça uma ideia curiosa e atraente. Tenho pensamentos e sentimentos contraditórios sobre o tema. Não gosto de dor e não entendo como alguém pode desejá-la, mas sei que há pessoas assim. Eu acho que tentaria “curar” a pessoa dessa posição, pelo menos tentar compreender o que a levou a tal condição, a desejar ser subjugada, humilhada e sofrer pequenas torturas. É um universo que desconheço inteiramente e que por estar no limiar da marginalidade, por ser tabu, me atrai. O proibido, o que foge ao padrão sempre me causou profundo interesse. Não sei por que isso se dá, coisas do id, eu acho.

15h55. O meu texto é tão simplório e pobre, meu repertório vocabular tão limitado que chego a cansar de algumas palavras que uso, uso-as apenas por falta de alternativa. E tome repetição. Também – e isso sou eu passando a mão na minha própria cabeça – escrevo muito, não há como escapar das repetições. Vivo para escrita, mesmo que redundante. É o meu bem mais precioso, minha paixão maior, espero nunca desencantar dela. Aí sim, tudo se tornará extremamente redundante. O som está alto. Acho que vou, depois do café com cigarro, botar Björk de novo e aumentá-lo ainda mais, só estou eu aqui em casa. E o máximo que posso me dar nessa condição é ouvir a música na altura que eu quiser. Não sei se é pouco isso, mas me apraz. Vou lá fumar.

16h13. Voltei e soltei um Alice In Chains no volume 30. Massa. Só falta a minha mãe chegar agora, estou me sentido amplamente livre. O bróder que recolhe o lixo aqui do prédio apareceu enquanto fumava e chamou Bolsonaro de uma coisa que não tinha ouvido ainda: “psicopata”. Achei que lhe cabia de certo modo, por mais que esteja de posse de todas as faculdades mentais. Me divertiu tal colocação. Eita, estou sem nada na cabeça para dizer. O ar está ligado, a tarde cai, penso no anjo e mandei uma mensagem para a sua homônima, pedindo que lesse as minhas mensagens. Não sei se o fará, sei que é o máximo que posso fazer.


16h24. Minha mãe chegou e me intimou a ir ao shopping com ela hoje. Um cara me alertou que a homônima do anjo é um perfil fake. O que me faz suspeitar do anjo também. Sei lá. Sou muito ingênuo em termos de internet. Voltarei a falar com o meu anjo no domingo, assim que souber quem será o novo presidente, como prometido. Ela tem curtido as minhas fotos. Todas as que publico. Não sei. Sigo acreditando por falta de crença mais sólida. Essa eu sei ser demasiado vaporosa, mas é a que tenho. Por ora. Acabei de olhar o Tinder e parei numa moça de 20 anos até jeitosa que se diz “apaixonada por Homens Mais velhos”. Vou esperar até ter superlikes de novo para mandar-lhe um. É balconista e isso não me incomoda. Quem sabe a sorte não me sorri aí? Quem sabe não é ela que vai acabar com a minha solidão? Estou criando expectativas muito altas. Melhor baixar o facho. Mas ela não é de se jogar fora. Não sei quanto tempo o Tinder vai demorar para me conceder os superlikes, mas não tirarei de seu perfil até que aconteça. Ansiedade. Sou um cara ansioso e imediatista vivendo em tempos ansiosos e imediatistas. É a era do agora ou nunca. Acho que exagero, mas também acho que a internet e a informática de forma geral trouxe esse senso de urgência e velocidade que antes não existia. Eita, já entrei na quarta página. É revisar e postar. Acompanhe o que vai se dar em relação à garota no próximo post. Como se isso lhe interessasse. Hahaha.   

terça-feira, 23 de outubro de 2018

BRANCO, PRETO E CINZAS



21h16. Falei com o meu amado irmão, sempre me faz um bem enorme. Aparentemente iremos a Areias quando ele vier no final do ano, possivelmente com Maria e poderemos, enfim, levar as cinzas de papai para jogar na maré de Macau. Estou sem saber o que dizer e sem vontade de dizer. Vou bisbilhotar a internet.

21h32. Nada de interessante. Aliás, só uma garota de cabelos azuis que é de Recife e está no Adote um Cara, mas que não apareceu no aplicativo quando o reinstalei. Deixa para lá. Estava começando a me bater um tédio, então voltei para cá, meu porto seguro, minha salvação, meu ofício que amo. Não tenho nada a dizer, por que será? Sinto uma conexão maior com o maravilhoso mundo dos bonecos. Há tempos não sentia.

22h03. Estive mergulhado no maravilhoso mundo dos bonecos até que enchi o saco. A paz do post anterior me abandonou. Sinto que cada vez significo menos. Não só para mim, mas especialmente para os demais. Eu me esvazio de conteúdo, de coisas novas, de vivências. Meu irmão ficou feliz que estou entrando em apps de relacionamento, confessei-lhe que não tenho dado muita sorte. Para que escrever? Para que dizer da minha miséria afetiva? Em que isso vai me ajudar, em que vai mudar alguma coisa? É só pela catarse do desabafo? Acredito que sim. Só penso no anjo e na impossibilidade do anjo. Me dói não ser ideal como o anjo é para mim. Não desistirei. Ainda. Mas, como em relação à campanha eleitoral, as coisas já estão virtualmente decididas e são contrárias ao meu desejo. Não me espantaria nada, Bolsonaro dar um golpe de estado. Bom, o que será, será.

-x-x-x-x-

14h06. Sem a mínima disposição de ir para Ju, mas irei. O país está doente. Ou já era doente e agora os sintomas irromperam. Estamos longe de ser uma nação civilizada. Apostamos numa “moralização” do Estado. Os custos dessa suposta “moralização” cabe ao futuro revelar. Às vezes me parece uma moralização com gosto de sangue, sedenta de sangue, portanto uma moralização que fere, inclusive a democracia.

14h25. Pouco mais de meia-hora até entrar no banho. Preciso ver o programa de ontem de Bolsonaro.

14h41. Não achei e perdi o meu tempo na internet, li que ele declarou que vai caçar petistas e vermelhos, ou seja, a oposição. Isso não me soa lá muito democrático ou constitucional. Bom, espero que sejam palavras vazias, como ele diz que todos os seus depoimentos passados foram.

14h53. A hora de tomar banho se aproxima, galopante. Não estou com saco para nada hoje, essa é uma sensação que se apresenta repetidamente nos últimos dias. Não me desagrada, porém não convém hoje. Queria ficar aqui escrevendo, tomando café e Coca, ouvindo música, que ainda não coloquei. Não terei tempo para isso agora. Quando voltar de Ju. Não sei o que dizer a ela. Vou olhar o Tinder.

15h03. Nada que tenha feito os meus olhos brilharem, mas dei um superlike em uma. Preciso tomar banho. Antes, preciso tomar coragem. Estou satisfeito com a vida por me apresentar poucas, mas grandes contrariedades. Estou com medo da censura de Bolsonaro e de ser uma de suas vítimas.

17h32. O que ficou de mais marcante da minha consulta com Ju foi justamente a declaração final dela: “tenho muito carinho por tu”. Me calou bem e profundamente. Me fez muito bem, o que demonstra a enorme carência afetiva a que me submeto. Eu poderia amar Ju, acho que seria fácil e bom. Mas não vou misturar as coisas pois não devem ser misturadas. Nem sei bem o que digo, estou com uma dor chata nas costas que me impede de me concentrar propriamente.

17h49. Estou sem saco de escrever.

19h43. Estava vendo um programa que meu irmão JP, aniversariando hoje, me mandou. Sem comentários porque não estou com paciência para eles. A dor nas minhas costas me incomoda, tenho que caminhar muito lentamente para minimizá-la e só com algum tempo em pé a coisa melhora um pouco. Estou ficando velho, isso jamais aconteceria aos meus 18 anos. Ficar velho me assusta, a velhice sempre me foi assustadora e torna-se ainda mais quando vejo como se apodera da minha mãe, debilitando-a. Tomei um Dorflex dado pela fantástica faxineira, mas acho que ainda não fez efeito, ou se fez, não foi muito grande. Queria muito mandar uma mensagem para o anjo do Tinder.

21h04. Minha mãe chegou, disse que vai botar uma compressa de água morna para eu deitar em cima. Minhas costas estão demais. Se for como da primeira vez que ocorreu, vou passar uma semana sentindo essa dor. Coisas da vida, é aceitar e suportar. Mandei o discurso de Bolsonaro para a minha mãe ler. Não sei se o fará. Tanto faz, em verdade. Eu pelo menos dormirei com dor nas costas e a consciência limpa de não ter apoiado o ser. Queria tanto falar com o anjo, mas esperarei. Tenho todo tempo que a existência me concede. A frase de Ju ainda ecoa dentro de mim e ter vindo quando falo do meu lado afetivo é estranho e errado. Pensei em mandar um WhatsApp dizendo que o carinho é recíproco, mas não o farei, não sei que interpretação ela teria e não quero abrir margens. É algo desnecessário em nossa relação. Não estou com vontade de escrever, acho que vou comer e me deitar. Não quero isso também. Não ainda.

21h39. Interessante como a dor atrapalha o raciocínio, o constante desconforto, meu corpo gritando que não é mais o que costumava ser.

22h37. A Gatinha me ligou. Foi bom, é bom ouvi-la, sabê-la, sempre. Estou mais despretensioso em relação a vida, já não me importa mais ser escritor, importa apenas escrever. Se é válido ou lixo não cabe a mim julgar, nem me importa mais o julgamento alheio. Tenho em minha cabeça que nunca serei publicado e tal constatação já não me afeta ou frustra como antigamente. Em verdade tenho vergonha de como me apresento no Diário do Manicômio. Talvez hoje seja um pouco mais do que fui, devo ser, errar e reconhecer os erros é crescer. Acho que consegui rever alguns e não mais os cometo. Não sou uma pessoa exemplar, longe disso, nunca o serei, mas estou contente com a minha humilde pequenez. Queria muito, muito, muito ter uma namorada jovem, gata e legal, mas eu não sou jovem gato e não sei se sou legal, logo a probabilidade de isso acontecer é mínima. Nas redes sociais quase tudo é política e toda a luta da esquerda é em vão. Pelo menos teremos a consciência limpa de que tentamos e alertamos, restar-nos-á sofrer as consequências. O que mais me dói não é o que fará à democracia e aos brasileiros, mas o que objetiva fazer contra a Mãe Natureza, um dano que será irreparável, irresponsável e burro. Nossa, que desastre.

23h20. Cansei de política por hoje, já tive a minha avalanche de notícias e contranotícias. Aceitação, acho que estou nessa fase agora. Aceitando a vida como ela é. E sendo extremamente grato por ser assim comigo. Acho que o meu lugar no mundo, que é muito peculiar e muito meu, valeu todo o sofrimento pregresso pelo qual passei e me submeti. Estar livre da depressão, da escravidão do trabalho, podendo me dedicar ao meu ofício que tanto amo e que não me remunera economicamente, mas me recompensa das demais formas, é sem dúvida uma existência abençoada. Apesar da dor nas costas, apesar de Bolsonaro, apesar de não ter uma namorada e de abdicar da vida social (não alcanço e cada vez mais distante fica), apesar desses pesares, gosto de quem vou me tornando, gosto de ser e de estar no mundo. Não tenho lá muitas convicções ou opiniões formadas acerca das coisas dos homens e elas não me interessam e se interessam, interessam cada vez menos. Me fecho em mim, me tranco na minha gaiola – o quarto-ilha – onde posso ser completamente livre através do meu texto.

23h46. Vi as top do Tinder e havia um par de mulheres deformadas de tanta malhação, negócio horrível, não me atrai nem um pouco. Eu não vou mentir, o anjo não me sai da cabeça. Pode ser que outra surja, mas eu já desenvolvi afeto por ela. Acho ela especial. Em verdade, acho que é uma patricinha de Boa Viagem sem muita coisa na cabeça, mas é absolutamente linda e parece ser alegre, ter a alma leve e fresca, do frescor que só a juventude proporciona. Ela me encanta. Eu que também sou um desmiolado sem muito na cabeça. Outra coisa que não me sai da cabeça é a liberação do desmatamento da Amazônia pelo odioso. É de uma estupidez tão desmensurada que me faltam palavras, é inconcebível. E pode se tornar um fato.

-x-x-x-x-

12h11. Depois de devidamente acordado pela minha dose matinal de café e nicotina, venho me pôr à disposição das palavras. A dor nas costas melhorou sensivelmente, mas está longe da normalidade. Acordei pensando em garotas. A declaração de Ju ainda encontra eco em meu peito, acho que pela imensidão da minha carência. Mas não posso nem vou confundir as coisas. Mal começo e já me encontro sem assunto.

13h22. Postei um monte agora no Facebook para protestar sobre Bolsonaro. É uma situação calamitosa a que vivemos.

14h27. Fiz um elogio sincero à Portuguesinha, gosto de fazer elogios sinceros às pessoas, por outro lado, tenho imensa dificuldade em fazer críticas, não me sinto autorizado ou com envergadura moral para criticar ninguém. Acompanhar ciberneticamente o dia-a-dia da Portuguesinha é algo que me traz enorme satisfação, me dá a falsa sensação de proximidade e me deixo iludir por isso.


16h08. Embebido na política novamente. É a campanha de mais baixo nível que já presenciei, o que demonstra o nosso nível de civilidade. Estou com vergonha do Brasil, não o reconheço como a pátria que eu amo, a mim me parece um monstro desfigurado moralmente. Mas sou um ser ignorante politicamente, não entendo de política e acho uma profissão ingrata no país. Sigo acreditando que é preciso ter uma alma muito nobre para não se corromper com o poder. Eu não sei se eu teria essa lisura de caráter, creio que não, tendo em vista todos os malfeitos que já cometi em minha vida. Sou uma pessoa um pouco diferente hoje, é verdade, e seguirei me lapidando no que for capaz, mas não afasto de mim o risco de ser corruptível. Minha reputação não é nada ilibada e cometi diversas atrocidades morais das quais me arrependo e que não pretendo repetir, mas cuja própria existência deixa margens para novos erros. Não quero poder para além do que é meu e de mim. Até gostaria de ter o poder de seduzir uma garota que me interesse (e penso logo no anjo do Tinder), mas aí paira a minha incompetência social com o sexo oposto. E como sou incompetente nesse aspecto e como me é custosa tal incompetência. O preço é a solidão. Pago reclamando o mínimo que posso e não tenho outro a quem cobrar senão a mim mesmo pelo meu absoluto fracasso. Me conforto está em já ter amado muito e profundamente e de ter experimentado todos os ônus e os bônus do amor. Amei. Posso dizer com absoluta convicção. Absorvi e compreendi o amor, sei o que é, do que se trata, o que traz e o que deixa. E acabou-se a terceira página. 

domingo, 21 de outubro de 2018

COMO QUE ILUMINADO



15h58. Recebi duas notificações do Tinder, de duas garotas diferentes. Vou investigar. No mais acordei tarde hoje e recebi uma carrada de protestos e ameaças da minha mãe, as que mais me assustaram foi a de trocar de psicóloga e psiquiatra. Não vou trocar de psicóloga, o que minha mãe não parece entender é que não há psicóloga que vá me transformar na pessoa que ela deseja que eu seja, simplesmente porque eu não sou nem quero ser essa pessoa. Ela acha que eu estou obcecado por aplicativos de paquera, eu os tenho usado como último recurso para conhecer alguém que me agrade levando a vida de ostracismo que voluntariamente levo. Se tenho fixação é por uma garota específica, o que outras pessoas chamariam de paixão (bastante platônica até o momento). A medida que o tempo foi passando, minha mãe foi se acalmando e agora repousa antes de encarar a aula que vai ter que preparar. Vou ver o que o Tinder me trouxe.

16h16. É uma supergata, do tipo que me intimida mais do que me atrai e ela mandou a mensagem “Vielas”, não sei se isso é bom dia ou olá em outra língua, sei que respondi “ruas estreitas”. Hahaha. Não acho que isso vá para canto nenhum. Até porque demorei a responder.

16h34. Fui atender ao chamado da natureza, que não me deixa esquecer que sou um bicho, colocar Coca e fumar um cigarro. Nenhuma resposta da supergata. Perguntei o que ela achou de interessante em mim.

16h40. Apareceram novas garotas no Tinder, dei um superlike em uma. Não acho que vai rolar. Não acho que o Tinder é o caminho e infelizmente ainda só tenho olhos para o anjo. Vou colocar a lista 6 do começo.

16h44. Estou sem muita inspiração, mas seguirei a perseguir palavras porque não há mais nada que me apeteça. Estou cansado de política, as redes sociais são dominadas pelo assunto, cansa. Já se sabe o resultado do pleito, já se sabe muito bem quem o novo presidente é como pessoa, medíocre, preconceituoso e autoritário. Vai ser bom para o amadurecimento político da nação. Para o meu amadurecimento político. Eu que sou um néscio politicamente falando. E em outros muitos aspectos também. Não tenho vergonha da minha ignorância. Tenho vergonha do meu bucho e do meu pau pequeno, o que mostra a exata dimensão da minha ignorância. Vou mergulhar um pouco nos Instagram. Em verdade vou ver se o anjo postou uma nova foto. Ou a Portuguesinha alguma de suas histórias.

16h58. Nada, só minha ex-madrasta postando incansavelmente posts em defesa de Bolsonaro e pouco mais que isso. Acho que vou fumar outro cigarro.

17h09. Não estou com vontade de nada, basta-me existir apenas. Parece pouco e é. Mas estou começando a me acostumar a ter só isso. O tédio não me acomete e isso para mim é o suficiente. Em verdade, não entendo como não me acomete, mas prefiro não entender e não o sentir. Não estou nem com saco de pensar no anjo. Quero apenas estar, me basta ser e estar. É quase um estado meditativo. Essas coisas esotéricas me lembraram o cara da massagem. Confesso que não tenho o menor interesse em me submeter àquilo de novo. Se há uma coisa que deseje? Ver o Batman branco que encomendei. Afora isso, nada. Qualquer mudança na minha atual condição me gera desconforto. Estou extremamente bem existindo por existir nesse momento, tomando minha Coca Zero e fumando os meus cigarros com minha mãe dormindo. Tudo na mais perfeita paz e harmonia, todas as minhas necessidades satisfeitas. Até estranho que não sinta tédio. Talvez a medicação tenha começado a surtir efeito. Ou eu realmente estou em paz com a existência no momento. Quando penso na existência, a imagem que me vem é a de uma nébula. Engraçado, nunca tinha parado para reparar nessa visão platônica minha. Grandiosa, para dizer o mínimo, e mesmo assim uma fração insignificante do universo, por mais que ache que nada no universo seja insignificante, tudo tem seu sentido de ser, seu papel. Vou pegar mais Coca e fumar.

17h35. Não sinto necessidade de nada e isso me traz uma bem-estar singular. Não preciso, não anseio, não há vazio, estou e me sinto pleno. Não há aperreios, estresses, angústias, incômodos. Só o contentamento de ser eu comigo mesmo nesse momento, acho um estado muito raro de alcançar e me surpreendo com ele. Não sei como cheguei até aqui nem quanto tempo vai durar. Björk no som me completa e repito, não preciso de mais nada. Como investigar esse estado? Quais as causas? Não sei e sinceramente não importa, nada mais importa além de estar aqui e agora. Pensar no futuro gera desconforto, quero sorver o presente, o agora, o que virá, virá, o que tiver de ser será, não há nada que eu possa fazer, o fluxo da existência é mais poderoso que eu, o controle é uma ilusão. Sou apenas um conjunto de átomos que se dá demasiada importância. Um ser que finge ser especial, que se acredita especial, sou poeira cósmica complexamente estruturada pelo acaso-destino tentando fazer o melhor dessa condição sui generis e efêmera. Assim como Bolsonaro e Haddad. Postei tal constatação no Facebook. Achei que deveria, segui o impulso que me veio. Minha mãe acordou e continuo em paz. Que paz gigantesca e absoluta experimento. Se for por causa da medicação minha profunda gratidão a ela e pelo acesso a ela. Mas acho que há um algo mais hoje, como houve ontem. Só que hoje o contentamento é maior, a paz é maior. É um prazer existir assim, sem expectativas ou desejos, momento a momento.

18h14. Me perdi no Facebook. Não deveria, mas já foi, passou. Tenho que compartilhar com a minha mãe da minha paz grandiosa e bela e inexplicável.

18h23. Ela estava ao telefone com o meu padrasto o que me deu uma luz sobre o que experimento nesse momento, é como se tivesse me desligado da minha humanidade, como se, através dela, eu aceitasse o que sou e o que não sou, que sou um fluxo do universo, me sinto em completa sintonia e harmonia com o universo, com a existência. As questões humanas, as neuroses humanas perdem o sentido nessa visão ampliada, elas me parecem como que ilusões, delírios, abstrações (que deveras são) e que não me importam ou me incomodam nesse momento. Parecem coisas pequenas e insignificantes, a paz e o desapego são mais importantes que qualquer outra coisa, a aceitação das coisas como são é o mais importante, a gratidão por esse momento é mais importante e a gratidão que sinto é imensa. Até o amor me parece algo menor, a paz é maior que o amor, é realmente uma sensação curiosa, de desligamento, de liberdade, de grandeza na minha imensa pequenez. Minha pequenez é bela, como é bela uma pequena pérola. Não sei quanto tempo esse estado vai durar, não sei quando aterrissarei desse estado, mas queria continuar planando indefinidamente. Sei que isso não durará para sempre, que pode ser um rompante de mania (é sempre o que penso e desconfio quando estou bem). Só tenho um desejo: comprar mais Coca porque a que tenho está no fim. Afora isso não desejo mais nada. Minto, desejo continuar carregando essa sensação de paz comigo e com tudo o que há enquanto me for permitido. Me lembra muito o sentimento de “nirvana” que experimentei em um delírio de cola, só que agora completamente lúcido. Só preciso de mim e do que me cerca, não preciso que nada venha e que nada parta. Permanecer assim é o que me interessa. Acho que já redundo, mas que redunde, esse momento é completamente meu, a existência me deu esse presente e agradeço. Obrigado universo por permitir minha existência com a consciência dessa forma.

18h56. Aceitação. “Não tem jeito, Bolsonaro vai ser presidente. É necessário para o amadurecimento político e democrático do país. As lições mais duras são as mais difíceis de serem esquecidas”. Postei no Facebook e saí. Entrei no meu Facebook de bonecos, preciso de um pouco de fantasia.

19h11. Minha mãe veio falar para eu deixar o Diário do Manicômio de lado, esquecer do assunto. O livro, nesse agora que experimento, me parece uma ilusão. O meu próprio eu me parece uma ilusão que permite ao animal Mário existir na sua condição de homem. Tudo parece distante e irrelevante. Só o momento importa. O momento e a paz do momento. Falei da paz que estou sentindo para a minha mãe e ela não pensou duas vezes em dizer que era por causa do remédio. Que seja, me importa a transcendência do momento, não suas causas. Pensei novamente no massagista e quero desistir dele. Não faz sentido para mim. Não me agrada, não quero. Voltando ao livro, acho que só iria me ferir com a sua publicação. Nada mais vou fazer em relação a ele. Os estragos já estão feitos e não sei se conseguirei desfazê-los. Isso abala a minha paz, o futuro abala a minha paz. E o livro está entregue ao meu tio que tenho convicção que não tomará atitude para publicá-lo, então fico mais tranquilo. É algo que teve seu momento e que passou. Não sinto necessidade de me reconhecer escritor. Isso é outra ilusão, fruto do egoísmo e da egolatria. A Coca acabou e minha mãe consentiu em me financiar mais uma. Vou de café enquanto isso não acontece, mas não agora. A garantia do café roubou a urgência que me tomava. Não devo quase nada a quase ninguém. Devo respeito à minha mãe desde que ela me respeite em retorno. O retorno independe de mim. Não estou preocupado com retorno. O momento é maior que qualquer desejo. O momento é de não-desejar. De viver e apreciar essa extraordinária condição. Esmiuçá-la em palavras ouvindo Björk no meu quarto-ilha é tudo o que preciso. Penso no anjo do Tinder, na sua beleza extasiante para mim. Beleza que nunca se entregará a mim. E, se a solidão tivesse sempre o aspecto que agora possui, não me faria falta nenhuma. Seria indescritivelmente bom e belo tê-la deitada na minha cama, mas a possibilidade inexiste, não é o que a existência quer para mim. Só me resta ter a humildade de aceitar. Se eu não faço nada para mudar, não há como as coisas mudarem. Simples assim. Tenho medo que mudem. Simples assim. Dono dessa paz, para que mudar? Hoje é um dia especial. O celebro fazendo o que usualmente faço. O que parece sugerir que faço a coisa certa. Se me agrada e não fere a mais ninguém, não há erro. Vou no café e cigarro.


19h55. Meu amigo jurista não gostou da colocação sobre Bolsonaro que eu postei no Facebook. Disse-lhe que continuasse a lutar, eu joguei a toalha, pois acho inevitável. E porque tal assunto não me importa agora. Arcarei com as consequências das escolhas do meu país. Não estou com o espírito de combate, só quero paz e tenho paz no momento, estou num momento muito meu, não estou pensando em mais ninguém, só na maravilha que é a existência, é tão raro esse alumbramento, não quero que a disputa presidencial o atrapalhe. Vou comprar a Coca, mamãe já me deu o dinheiro. Não, não agora. Dentro em breve. Não quero sair do quarto-ilha, não quero abandonar as palavras. Se bem que estou sem ter o que dizer. Já me repeti demais. 

quinta-feira, 18 de outubro de 2018

BANHEIRA

Me agredindo-deleitando


0h07. Ouvindo Adriana Calcanhotto e pensando e como poderia amar de novo. Não vejo como passando o dia enfurnado no meu quarto-ilha.

0h21. Uma banheira. Provavelmente terei uma, é quase certo. Nunca pensei que uma banheira seria mais possível na minha vida que uma namorada e eis que a vida assim se dá. Pensei que passarei, durante as reformas do quarto e banheiro, um tempo na casa da minha tia-mãe, o que muito me agrada, pois agora que minha prima foi tentar a sorte em Sampa, deve estar repleta de solidão. Talvez eu venha emprestar um pouco de vida e variedade à rotina dos meus tios. Não sei. Ficarei tão recluso quanto aqui, então não é lá grande acréscimo. Mas acho que alguma diferença faz. Não queria ir a Ju nesse período. Não que eu não goste dos nossos encontros, eles são um sopro de vida para mim. Nem acredito que já seja madrugada da quinta; essa semana passou num piscar de olhos. Mais do que normalmente se dá. Acho que vou fumar. Aliás, eu sei que vou. Penso que estou com câncer de boca. Isso me apavora, pois ficaria deformado pela retirada do tumor. E a aparência que hoje me desagrada, se tornaria um distante e precioso sonho. Se for o caso, fiz por merecer e arco com as consequências. Mas sinceramente não queria que fosse assim. Seria o adeus a qualquer gatinha, seria a condenação definitiva ao meu quarto-ilha. Seria melhor a morte. Vou fumar.

0h46. Algo em mim entristece quando a luz automática do hall se apaga me relegando à escuridão esquecida do lugar, me sinto um tanto mais só, um tanto mais desprezível. Diabos, ainda não me acostumei com o novo teclado. É muito contraproducente. Gosto de me vomitar com mais facilidade. O pai da Vila Edna disse que todos os grandes escritores começaram vomitando suas ideias, mas sei que disso não passarei, pois é exatamente isso que me apraz. Não quero enredo ou personagens fictícios, o enredo é a vida e os personagens aqueles que cruzam comigo e me impactam de alguma forma. Eu percebo que à medida que o tempo passa eu me torno menos o cara do “por quê?” e passo a ser o cara do “por que não?”, talvez seja isso que esteja incomodando o meu primo urbano em relação a mim. Não sei. Sei que inventei uma adivinhação que só eu sei a resposta: o que é o que é; que quando tenho sinto falta e quando não tenho falta nenhuma me faz? Que coisa mais pueril. Deixa ser. Não estou aqui para agradar ninguém a não ser a mim mesmo. Preencher o vazio das minhas horas com algo minimamente digno, microscopicamente digno. Sou apenas um nó insignificante na imensa rede cibernética, todo o sumo da minha existência é essa irrelevância. Não nasci para ser um exemplo a ser seguido, um transformador de vidas. Sou um ser neurótico e insignificante para o nosso belo quadro social como a maioria de nós, o chato é que não me abandona certa mania de grandeza, grandeza essa que nunca alcançarei, tenho os pés bem firmes no chão. Não tenho talento nem conteúdo para ser escritor. Sei disso. Li alguns grandes livros na vida e sei o que é talento e conteúdo e difere bastante dos meus desabafos e neuroses. Mas é o que me agrada fazer, o que me é mais fácil, o que espanta o tédio então sigo fazendo. Vou fumar.

1h23. Virus remix, estava precisando. Sinto que esse post traz um tom mais sombrio e melancólico que os demais. Que seja, não sou uma pessoa constante, ninguém o é. Tenho uma penca de medicamentos para equilibrar as minhas emoções e elas realmente não oscilam muito. Também como oscilar estando quase que integralmente diante do computador? Bom, foi a paz que construí para mim depois de uma carrada de sofrimento profundo. Agradeço à existência por tudo o que tenho. Inclusive a vindoura banheira, quiçá o Batman no final do ano que vem. Sei que o anjo não se conecta ao Instagram há mais de 15 horas. Isso me deixa menos ansioso do que se estivesse conectada e não me respondesse, que é precisamente o que vai acontecer uma vez que acesse o aplicativo. Não tenho nada a acrescentar ao que já foi dito. E disse em inglês, pois em tese ela está em outro país e sabe inglês. Me peguei pensando na Portuguesinha enquanto fumava, ela está muito mais presente na minha vida desde que nos seguimos pelo Instagram. Ela é uma publicadora bastante ativa lá, tem lá o seu quinhão de exibicionismo como eu. Adoro. Daria direitinho comigo, não tivesse dono e um oceano nos separando. É, apenas isso.

2h47. Comi, o sono bateu. Vou fumar um cigarro e ir dormir.

2h58. Voltei. É difícil me desatrelar das palavras quando estou sem sono. Nossa, li uma atrocidade de Bolsonaro que calou fundo em mim, ele pretende liberar o desmatamento indiscriminado da Floresta Amazônica para criação de gado e plantio de soja, disse que vai perseguir ativistas ambientais “xiitas” e encena até sair da ONU.

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11h33. Café e cigarro. Preciso.

11h42. Acordei, mas meu despertar é gradual obedece a ritmo e leis misteriosos. As primeiras coisas que me vêm é Bolsonaro e o anjo, para variar. Sobre o primeiro serei amplamente informado se assim me aprouver, já a segunda é uma incógnita que não quer ou não pode se manifestar. O café me desce meio quadrado, será que é uma agressão começar o dia tomando o negro líquido com cigarros? Deve ser, mas já causei numerosos danos muitos piores ao organismo, o que não exime a conduta que tomo hoje de seus danos. Mais cigarro e café.

12h03. Não estou com muita cabeça ainda para escrever. As palavras não me vêm e ainda há esse teclado novo me atrapalhando. Vou aumentar o som, passa Guns n’ Roses, não é particularmente do meu gosto, mas marcou uma época da minha vida, por mais que não tenha jamais adquirido um CD da banda. Spotify me permite. É a lista 6 que deixei rolando durante a madrugada. O meu cérebro ainda reluta em se sentir completamente alerta, há uma letargia chata me dominando. Acho que vou revisar e postar o texto de ontem, é menos demandante.

12h13. Estou sem saco de revisar o texto no momento. Estou sem saco de nada. Fumar agora não vou, preciso ter o mínimo de controle, só às 12h30. Não sei ao certo o que pensar sobre o pai da Vila Edna ler o meu livro. Ele pediu por isso. Eu cedi pelo mais completo exibicionismo e porque ele seria uma das três pessoas para quem eu enviaria o texto para apreciação, por julgar uma pessoa de mente aberta e que eu amo e respeito bastante, além de intelectual. O pedido dele coincidiu com um desejo meu, mas o temor do preconceito me aflige. Está feito e não pode ser mais desfeito. Não sei como a vida me cobrará por isso. Maldito teclado. Infected Mushroom tocando. Tenho dois discos deles. Ainda bem que não vai haver saída nesse final de semana. Agora encasquetei com a ideia do livro. Não me levará a lugar algum, a não ser elucubrações catastróficas. Deixemos isso de lado. Eu acho que enfastiei de sexo. Tanto tempo sem praticar atrofiaram a minha libido e a importância do sexo em minha vida. É uma coisa que não me faz mais falta, algo que não preciso praticar para me sentir homem e inteiro. Sei que vou contra a opressão midiática do sexo, mas tal opressão não me afeta, apenas me intriga, pois não tenho disposição para gastar tanta energia com o tema nem cultivo a obsessão de trocar fluidos indiscriminadamente como se houvesse uma meta ou placar a ser alcançado e suplantado. Não é a minha. Vários anos de celibato me trouxeram a esse lugar e não me animo a sair dele. Me animo, sim, a fumar mais um cigarro com café.

13h00. Conversei um pouco com a fantástica faxineira sobre a reforma do meu quarto, isso me trouxe para pensamentos mais amenos e bons, a sonhos mais possíveis. Incrível, ter meu quarto remodelado para receber as minhas bonecas sempre me pareceu inalcançável. Esperei isso por mais de década e parece que em janeiro a transmutação terá início. Entretanto levará mais tempo para que todos os bonecos estejam aqui para exposição. Há vários na casa do meu irmão. Talvez só os tenha de fato todos e todas no final do ano que vem. Talvez além. O Batman sei que não vem esse ano, ficará um enorme espaço vazio à sua espera.

13h22. Por não saber exatamente o tamanho desse espaço, mandei uma carta para o fabricante pedindo as dimensões. Espero que me atendam. Vou fumar.

14h41. A fantástica faxineira estava arrumando o quarto-ilha, fiquei no celular vendo propaganda política contra Bolsonaro. É bom que muitos não esmaeçam, mas eu joguei a toalha, admiti a derrota. Tempos sombrios, talvez com consequências irreversíveis ao ecossistema global, estão à frente. A democracia está em perigo, mas juro que o que me preocupa mais que os direitos humanos, que podem ser reestabelecidos, é a riqueza e a biodiversidade natural do Brasil que não pode ser recomposta. Um homem que pretende vender a interesses escusos o nosso patrimônio natural em vez de explorá-lo sustentavelmente, nem sei que nome dar a essa monstruosidade. Preciso postar isso no Facebook.

15h18. Fui e me perdi na enxurrada de posts. Alguns nojentos, que só podem ser fake, um cara dizendo que vai mandar uns quatro “pra cova”, dizendo que pobre e bandido é tudo igual, matar pobre é um bolsa família a menos nas costas. Não creio que a bestialidade tenha chegado a esse ponto. Se bem que em se tratando do estado mencionado, não duvido tampouco.

15h32. Eu tenho que buscar conforto na incompetência do gestor em articular as suas políticas de governo. É o que para mim salva o Brasil de uma calamidade. Se bem que ele foi inteligente o suficiente para escolher um militar como vice, pois, se alguém o tirar do jogo quem assume é o general e ninguém quer isso. Já sei até o que ele vai falar quando da posse, vai citar Zagallo e dizer que os petistas vão ter que o engolir. Sei lá, aí já é ficção demais. O Brasil pede por isso, é aberrante, grotesco e todos pagaremos.

15h57. Sem querer, dei um superlike numa prostituta e perdi de usá-lo numa supergatinha que veio depois dela, me embananei, caralho! Era uma gatinha quase no top do anjo. Era do jeitinho que eu gosto. Nossa, se desse um superlike na certa...

16h29. Minha mãe vai ficar indignada comigo, mas assinei o Tinder plus por um mês na tentativa de dar o rewind e, depois de assinado, descobri que na modalidade peba eu só tenho possibilidade de dar um rewind e não foi o suficiente, que merda. Superinteressante a garota. Vi as sugestões top às quais o Tinder me deu acesso e dei um superlike numa gostosuda de rosto bonitinho que certamente não vai querer nada comigo. Mamãe vai dar a porra. Agora já foi. O interessante é que ter feito uma vez me motiva a fazer mais, não farei isso, me controlarei, mas é curioso o rush de adrenalina que pode levar à compulsão.

17h02. Minha mãe chegou. Tomaremos Chartreuse verde na varanda agora, quando contarei do meu gasto.

19h28. Tomamos o licor, ela aceitou bem a assinatura que eu fiz do Tinder, dei match numa garota que tinha dado like em mim através do aplicativo e ela se revelou uma “acompanhante”. Batemos um bom papo. Ela não acredita no amor e eu sou um fiel convicto do sentimento, então houve um sadio embate de ideias, mas um lado não conseguiu convencer o outro. Até que ela se cansou da conversa e educadamente se despediu. E acabou-se a terceira folha. Dois posts para publicar. Dois posts para revisar.



terça-feira, 16 de outubro de 2018

LÍNGUA ARDENDO



17h41. Estou cada vez mais descarado em um certo aspecto e isso me agrada, me empodera e desmistifica. Para mim, principalmente.

18h01. Estava publicando o outro post, resolvi divulgar dessa vez no Instagram. Não me passou pela cabeça que muitos amigos iam ler. No Instagram, vi ainda que Bolsonaro quer para ministro da educação alguém que “toque fogo em tudo o que Paulo Freire escreveu”. Gostaria de saber a opinião da minha mãe a respeito. Afinal é educadora e vota no candidato. Não sei se é fake news.

18h14. Ela disse que achou horrível a colocação de Bolsonaro. Se Bolsonaro der carta branca aos PMs para matar, será que não haverá aquele(s) que fiquem viciados em matar? Eu sei que matar vicia, pois conheci um viciado, era de um grupo de extermínio.

18h15. Memórias afluíram dessa internação. O celular apitou, obviamente pensei que poderia ser ela, o anjo do Tinder, e, mais obviamente ainda, não era. Quando acabar It’s In Our Hands, de Björk, eu vou fumar. E se o policial viciado começasse a matar por motivos esdrúxulos, sem necessidade de punição tão severa? Um mendigo, por exemplo.

18h43. Eu não entendo porque os miseráveis não se rebelam, acho que por falta de educação, se fossem bem educados se rebelariam. A situação do miserável é inaceitável por mais que o homem seja um ser adaptável. O pensamento voltou pro anjo, mas quando passei para fumar vi minha mãe e meu padrasto discutindo preços de refeições em Munique e lembrei do restaurante de mais de quinhentos anos onde comemos um magnífico joelho de porco, que local tão europeu, tão germânico e agradável e belo. É, enquanto isso um miserável tenta enganar a sua fome com o sono num chão duro, à deriva de tudo, à margem da sociedade sem ser marginal. Me indago como a vida os levou àquilo. É desumano. É muita crueldade que não deveria ser tolerada. É a excrecência do sistema capitalista. A falha da sociedade. A falha do Estado que deveria pelo menos garantir os direitos das cláusulas pétreas a todos os cidadãos. Vamos ver se Bolsonaro que disse que vai honrar a constituição vai conseguir tal feito.

19h01. O meu amigo da piscina ligou me chamando para descer, fumar e conversar, mas houve alguma coisa com a mãe que o fez mudar de ideia. Disse que se fosse descer me dava o toque. Nossa, quero fumar e mamãe fica empatando. Que saco, está dizendo que eu estou fumando demais.

19h10. Minha tia pediu para postar a imagem abaixo às 20h00 no Instagram e no Facebook e repassar para dez pessoas. Repassei para um bocado.




19h16. Acho que vou fumar outro cigarro.

19h25. Já escolhi a imagem de abertura do meu post. Que você, se chegou até aqui, já viu. É uma imagem que transparece um autoritarismo violento. Serão tempos muito peculiares.

20h21. A Gatinha me ligou, está vivendo uma parte complicada da sua vida. Disse que ligava depois. Vou ligar para ela. Parei de falar com ela para poder fazer as postagens pedidas pela minha tia, mas, pelo que vi, o único que aderiu fui eu. Bom, fiz a minha parte. Meu amigo da piscina disse que a conversa com a mãe foi “de boa”. Não mencionou nada sobre descer para fumar e conversar. É uma pena, hoje estou particularmente disposto a isso. Bom, é a vida. E segue. Já entro na segunda página de texto. O anjo não viu minhas mensagens. Eu estou com vontade de escrachar novamente. Ah, tentei ligar para a Gatinha e deu desligado. Preciso ficar aqui mais quinze minutos antes de fumar. Saco. Senão mamãe vai reclamar. Perguntei ao meu amigo da piscina se ainda iria descer. Veremos o que vai acontecer.

20h49. Ele disse que vai descer daqui a pouco. Ótimo! É uma variada boa na minha vida. Nossa, vamos viver o bolsonarismo. Espero que não vire guerra civil. É o pior cenário que posso imaginar. Golpe militar com resistência popular. Queria que meu amigo se manifestasse logo. Acho que vou fumar outro cigarro.

21h11. Meu amigo chamou, vou descer.

21h55. Ficção. Acho que o país deveria ser liderado por um economista, visto que se a economia melhorar, tudo vai melhorar. O governo será mais rico, podendo prestar os serviços necessários com mais qualidade e eficiência, em se falando de um país sem corrupção, onde, no futuro, uma AI será o executivo e os homens serão o legislativo e o judiciário. A cidade será patrulhada por drones capazes de disparar dardos que levariam instantaneamente à inconsciência um agressor. Será que se Bolsonaro sancionasse a pena de morte para estuprador, as feministas aplaudiriam?

22h18. Botar um sozinho para escutar. Botei New Order, um álbum específico, o que tem Crystal. Me veio um rosto ficcional, posto que nunca a vi, da backing vocal do New Order. E não gosto de New Order com backing vocals. 22h25. O debate já começou há 15 minutos.

22h44. Não era um debate como eu esperava eram comentaristas falando sobre o resultado da pesquisa. O que eu faço da vida? Eu só sei fazer isso, só consigo me concentrar nisso e no anjo do Tinder. E um pouco em política agora, por vivermos um momento histórico na política brasileira, talvez tão histórico quanto Lula no poder. Só que o extremo oposto. Espero que não tão extremo assim. Quanto parece ser. Vou comer.

23h44. A linguiça ardeu na minha língua. Eu perdi a garota do Instagram numa sucessão de eventos e suspeitas quase como se não fosse para ser ela. E estou suspeitando agora do anjo do Tinder, ter viajado e não postar nenhuma foto? É estranho. Mas só me resta esperar. Dentro em breve vou bodear.

0h07. Sento aqui para terminar o último copo de Coca. Vai ser uma guinada radical nos rumos da nação. Não sei se ela está preparada para isso. Eu não estou. Eu confesso que tenho medo da barbárie. De “vigilantes” civis com armas. Do povo fazendo o que acham ser justiça com as próprias mãos. Ou gatilhos. Ou facas, pedras...

0h18. O copo acabou até amanhã.

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13h54. O anjo mandou um “Oiee”. Deve ter mandado para todos os seus contatos. Não me alimenta a alma, pois sei que disso não decorrerá nenhum diálogo. Estava debatendo política com a fantástica faxineira, eleitora de Bolsonaro, sem sucesso. Há café e cigarros, já tomei três xícaras com três cigarros e acho que estou pronta para a quarta. Vou mandar uma mensagem para o anjo pedindo que poste fotos da viagem. Fi-lo. Vou ao café com cigarro.

15h01. A fantástica faxineira limpou o meu quarto. Mandei outra mensagem para o anjo dizendo que se ela não postasse fotos, o perfil dela pareceria fake. É a sensação que me dá, tendo em vista o meu comportamento fotográfico durante viagens. Pode ser que esteja postando no Facebook. Sei lá. Sei que há uma ponta de desconfiança me espetando. Seria uma frustração libertadora saber que seu perfil é falso.

15h15. Li um artigo contra Bolsonaro e me identifiquei, mesmo que seja fake news o discurso é coerente, pena ter letras demais para o eleitor mediano do candidato. Aliás, nem adianta mais nada, ele vai ser presidente do Brasil e se Deus é brasileiro, ele que nos proteja. Não estou com saco de escrever. Não estou com saco de fazer nada. Só fumar. Minha língua está ardida, coisas que como ou tomo ardem. O que será isso? Será que estou com câncer e não sei? Às vezes fico pensando que tenho câncer de garganta e que ele se espalha. Não sei de onde tiro essas ideias e elas ao mesmo tempo que me assombram, me aliviam, pois poderiam abreviar a minha existência. Vou fumar.

15h34. Sair da sombra do meu pai e do meu irmão me fez bem, mas não me livra do tédio. I’m a loser, baby, so why don’t you kill me?”. Espero que o perfil do anjo não seja falso. Voltar ao estado anterior de coisas do coração não seria legal para mim. Ela, o anjo, seria, sim, um coisa gloriosa na minha vida. Mas só engano a mim mesmo aqui. Não acho que seu perfil seja falso, mas também não dou certeza. Se for, foi habilmente construído. A vontade de fumar outro cigarro, minha espada contra o tédio, me acomete.

15h53. Fumei, pensei na minha língua ardendo como algo que me incomoda, tive vontade de contatar o meu amigo da piscina. Acho que o farei. Pelo menos saio da rotina.

15h56. Me comuniquei. Quem dera a resposta dele fosse afirmativa. Amanhã me submeterei a tal da massagem, não me sinto confortável com a ideia. Não sinto total repulsa, entretanto. Há uma vacuidade na minha cabeça que me desagrada. Mas nada ocorre, não há de onde extrair o novo se me protejo do novo enclausurado no quarto-ilha a escrever. Estou saturado de política. O anjo não vai me responder.

16h07. Me perdi no Instagram. A maior parte propaganda política. A maioria a favor de Haddad, pois vivo numa bolha de esquerda. Então estão só pregando para convertidos, de nada adianta. Nada mais adianta. Já registrei o blog “eu não sou cristão”. Não sei virei a publicar nele, mas é meu. O que mais queria agora? Uma foto do anjo lá onde ela está. Não sei se vai ocorrer. Acho que temos valores talvez muito diferentes, talvez sejamos pessoas muito diferentes, afinal eu sou bastante diferente das demais pessoas. Estou sem paciência. Não estou com disposição para fazer absolutamente nada. Meu amigo da piscina viu a mensagem e nada respondeu. Acho que devo entender como um não. Mas a paciência é uma virtude. Preciso praticá-la. Meu padrasto viajou, foi à China e visitará minha irmã na volta. Meu amigo da piscina respondeu. Não foi a resposta ideal nem tampouco a mais desalentadora. Foi o meio termo. Vou fumar tomando um café. E a língua arde.

16h39. Minha mãe acordou, gostaria muito que ela liberasse vinte reais para eu comprar Coca Zero na pizzaria. Não sei se vai se dar, especialmente a essa hora. Se fosse mais tarde, talvez.


17h05. Convenci mamãe a me dar o dinheiro para comprar na pizzaria. A terceira página acabou. Vou revisar e postar.