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terça-feira, 30 de outubro de 2018

ELES NÃO



14h14. Acabada a publicação de um, volto aqui para despejar mais palavras pois elas são o centro da minha existência. Penso palavras, sinto (muitas vezes em palavras) e escrevo, faço uma confissão, um desabafo onde pouco resta de mim não revelado. É o que faço, é o que sei fazer de melhor e, sei, não é muito bom. Dane-se, me preenche. Não tenho mais a gana de ser reconhecido como escritor, não faz mais diferença e nunca fez, em verdade, era fruto de uma vaidade que não mais possuo porque pesa carregá-la, é impossível de concretizar e não levarei tal título para lugar nenhum. Minha mãe veio me perguntar se eu achava certo ter bebido no dia da eleição, respondi prontamente que sim. E se não beberei mais é porque eu não quero e não por causa das ameaças dela. Foi um dia singular e queria extravasar, pronto, passou. A vida segue. Não me arrependo e nem ressaca tive. Foi ótimo, um momento em que transbordei amor quando tudo era ódio e revolta. Foi um bom antídoto para a situação. Especialmente para a situação dentro de mim. E aprendi bastante sobre mim com essa embriaguez. Ela facilita a socialização, mas numa medida menor do que eu supunha. Também a fissura do crack não me veio, não deu nem sinal. Mas não arriscarei. Não preciso. Eu não preciso de álcool, essa foi a minha percepção. Ele dá alegria, ele deixa me deixa mais sentimental e expansivo, mas não é necessário para o meu bem-estar. Não me fará falta. Valeu a pena me conceder esse momento, acho que precisava. Até para fazer essas descobertas. Bom experimento. Desde já tenho vontade de voltar à Vila Edna. Sem álcool. Mas acho que esse assunto já deu. Se não tiver dado, voltará. Não tenho restrições em relação a isso.

14h37. Me sinto sensivelmente mais maduro do que da última vez que tomei um porre, isso me agrada. Aprendi alguma coisa ou algumas coisas ao longo desses seis, sete anos que estava sem beber. Pus minha mãe em modo paranoico porque ela descobriu the hard way que tem menos controle sobre mim do que supunha. Que eu sou mais independente do que ela gostaria. Bom é nesses choques de realidade que as relações se redimensionam, tomam novas formas e direções. Não sei se ela terá mente aberta para isso, creio que não, mas nada posso fazer a não ser seguir o meu caminho da melhor forma que encontro. Que sei e aprendi. Mais com a vida até que com eles, meus pais. A fase de influência formadora deles se esvaiu há algumas décadas. O resto foram experiências, escolhas, consequências e toda a gama de lições que a vida me proporcionou, muitas vezes de formas bem duras. Dei muitas cabeçadas, mas acho que aprendi algo. Tirei lições, me dou mais ao respeito, me respeito mais, me gosto mais também. Eu amo a vida, nunca pensei, depois da infância, que gostaria de ser eu novamente, mas me encontro satisfeito com quem sou. Tenho até um tiquinho de orgulho desse eu que se transmuta e do que já foi transmutado. Vou fumar com café. Me deu um branco agora pensando que darei o meu Nintendo Switch para os meus sobrinhos.

15h04. Mamãe me mostrou charges da oposição a Bolsonaro e as taxou de “ridículas” e fomentadoras da “separação social”. Bom, praticamente metade do Brasil é oposta ao presidente, o que ela queria? Que porque o cara foi eleito, todo mundo iria abaixar a cabeça e aceitar? Todo mundo se abraçar em delirante e desvairada alegria? Muita ingenuidade. Bom, me botou um áudio sobre a situação da Venezuela, onde o estado tomou conta de tudo. Não acho que seja esse o caminho. Não sou comunista nem radical. O que acho é que não podem ser maculados os direitos humanos e a democracia. A oposição e o povo em geral acompanhará mais de perto esse governo do que qualquer outro que tenha havido antes. Ou não, esse movimento pode ser como um carnaval que se dá de quatro em quatro anos. Não sei bem o que falo pois estou em verdade pensando na minha coleção de bonecos no momento. No Batman branco. Em como trazê-lo para cá. Acho que ele vai ser maior do que imagino. Como espero que Bolsonaro seja menor, menos perigoso do que imagino. Tenho minhas dúvidas a respeito do Batman e do presidente. Não aguento mais café por enquanto. Vou tomar uma Coca com gelo. E fumar mais um cigarro.

15h32. Minha mãe aparentemente foi dormir... de novo. Realmente está de saco cheio de lecionar. Não sei por que não desiste logo. Já deu, já fez demais, está de bom tamanho. Bem, a vida é dela, tem mais chão que eu, sabe o que é melhor para ela. Embora sejamos sempre aprendizes porque a vida nunca para de ensinar, é uma eterna e ininterrupta aula. Isso me dá esperanças de ser alguém melhor para mim com o passar dos anos.

15h37. Estou entediado, isso é um saco. Olhar para o Hulk me acalenta. Vi um rumor de que uma das pessoas cotadas para o ministério da educação tem como um dos planos ensinar criacionismo no colégio. Espero que seja fake news, afinal é inconstitucional, visto que o Brasil é um país laico. Não se pode dar predileção a uma religião em detrimento das demais. Estou com vontade de começar a escrever no “Eu Não Sou Cristão”. Se bem que posso dizer o que penso aqui mesmo, não faz muita diferença o endereço e sim o conteúdo. Não tenho muito deste último, é verdade, mas o pouco que eu tenho acha um acinte tal possibilidade. Ainda mais não sendo cristão.

15h55. Minha mãe me ligou, chamou no quarto e me cortou o Chartreuse. Descobri que o meu lar não é uma democracia. Não para mim. Eu sou tido como alguém de uma hierarquia inferior, um subordinado, alguém a quem é negado o direito de decidir acerca de diversos aspectos da minha vida. É certo que consolidei alguns direitos, mas outros me são vetados. Melhor ficar no meu quarto-ilha e reinar absoluto aqui, dono das minhas palavras. A relação que tenho com a minha mãe aos 41 anos de idade é adoecida e o pior disso é que é assim em grande parte porque o permito. Não sei como consertar isso. Não sei se tem conserto. Ou eu não tenho coragem de consertar, tenho medo como um garotinho tem medo da mãe. Eu acho que ainda sou o garotinho em relação à minha mãe e acho que ela me vê da mesma forma, foi uma relação que não amadureceu, que estancou e isso parece ser cômodo para os dois, por mais que agora me incomode. Ela consegue incutir culpa onde não há razão para tal. Tomei um porre e daí? Não fiz nada de errado, não destratei ninguém, não busquei outras drogas, vim para casa escrever. Passou. Ah, quer saber? Foda-se. Não vou me encher de energia negativa por conta da reação da minha mãe a esse episódio. Vou seguir, mas agora não me sinto bem. Depois do novo ataque dela ao meu ego com essa história do Chartreuse. Se ela vai esperar por arrependimento da minha parte, é melhor jogar o Chartreuse fora. Não me arrependo. Meditei muito sobre o assunto antes de tomar a decisão de beber. Achei que estava seguro e pedi a um amigo que me apontasse se estivesse sendo excessivo em algum momento. Não me excedi. Sepultar esse assunto nesse parágrafo. Já deu. Vou fumar.

16h24. Meu astral está baixo, o convívio com a minha mãe está pesado. Saco isso. Não queria voltar ao tema, mas até me culpar pela sua improdutividade no trabalho colocou em minha conta. É muito drama, chantagem emocional para cima de mim. O pior é que sucumbo. E sucumbido sigo escrevendo sem muito gosto. Meu irmão vem para Recife no final do ano e nem isso me anima, a reforma do meu quarto me apetece mais. Me peguei pensando enquanto fumava que, no meu leito de morte – que espero muito que seja o meu quarto-ilha –, definhando e sentindo as dores do câncer que me carcomerá por dentro, chamarei o filho da fantástica faxineira para escolher as três figuras que quiser da minha coleção, com exceção do Hulk. O Hulk com todos os seus defeitos e humanidade, pois foi esculpido à mão, é a peça mais impressionante que eu já vi e que tenho o orgulho de possuir. Quero que me faça companhia até o meu último suspiro. Pode ser que o meu leito de morte seja num mórbido e impessoal hospital, isso seria deveras triste. Creio na evolução da medicina, entretanto e essa crença me anima, pois me lembra da evolução tecnológica como o todo, da qual sou fiel, e que transcenderá Bolsonaro, eu transcenderei Bolsonaro. A não ser que ele engrosse e cace e mate a oposição, mas acho que não se dará. Falou tanto em democracia. Embora não saiba o que democracia signifique para mente tão estreita. Quero fumar outro cigarro, mas não vivo numa democracia e certamente sofrerei uma retaliação desnecessária se for. Não estou a fim. Prefiro segurar mais meia hora para fumar tranquilo. Estou intranquilo no momento. A constatação de que sou da classe oprimida aqui em casa me causa desgosto, mas não me rebelo, não me sinto preparado para uma revolução. Nem sei se jamais estarei. Porque doerá na minha mãe, ela iria sofrer com a mudança. Não gosto de fazê-la sofrer pois isso me dói. Sou tão codependente desta situação patética quanto ela. Mereço ser oprimido. Tenho quase toda a liberdade que anseio, está de bom tamanho. Aceitar as coisas como são. Ou seja, só vou fumar às 17h. Faltam 15 minutos. Não gosto do estado de espírito em que me encontro. Como mudá-lo? Dando uma olhada no Tinder.

16h55. Nada no Tinder. Li algumas matérias sobre Bolsonaro. Não me agradaram. Tampouco me surpreenderam. 16h59. Estou de baixo astral. Hoje não está sendo um dia bom, preciso de sono, de um novo despertar e um novo amanhecer para me sentir tranquilo. O sono tem essa vocação de amansar os meus demônios interiores. Vou fumar.

17h12. A luz escapa, a noite se anuncia. Estou ouvindo Valsa Brasileira de Zizi Possi e estou ouvindo há tempo demais. Vou botar a lista 6 em modo aleatório. Pronto. Começou bem com Ella e Louis cantando Can’t We Be Friends?, um retrato da maioria das minhas paixões. Não sei porque essa vocação, provavelmente por ser feio. Ou mais especificamente por me achar e me portar como feio. Tenho que largar mão disso. Dar um foda-se para isso também. A vida é muito curta para me privar por me achar feio, mas o Tinder e o Badoo comprovam, nesse tempo que estou disponível nos aplicativos só me curtiram barangas velhas. Sou só opção para isso. As gatas me descartam como eu descarto todas as mulheres feias. A sina da solidão vem se somar ao desgosto da vida que agora me toma. Vai passar, é só um momento em que me desequilibrei emocionalmente. Não se pode estar bem todos os dias.

17h29. Mandei um foda-se para o anjo do Tinder. Não ia dar em nada mesmo. Nem sei se era real. Foda-se. Uma fedelha e eu me desmanchando por ela, tendo ansiedade e sofrendo por sua atenção cibernética. Mereço mais que isso. Mereço ter mais respeito comigo. Não me aguento vou escrever mais coisa para ela. Preciso desabafar.

17h38. Desabafei, me sinto melhor. Adoro passar lição de moral para o anjo do Tinder. Acho que essa foi a última, pois duvido que ela vá puxar papo comigo de novo. Preciso acender a luz, não enxergo mais as letras e não decorei suas localizações nesse teclado USB que uso em substituição ao do notebook, que quebrou. Acho que vou fumar. Que dia mais chato, vixe.

18h03. Fui lá e beijei minha mãe. Ela me beijou de volta. O Badoo estava programado para cobrar automaticamente que ozzy. Só descobri quando recebi o recibo por e-mail. Já desprogramei isso.

18h12. Me perdi na internet, nada de interessante. Eu estou usando do meu subterfúgio para melhorar meu dia. Aumentei o volume de 10 para 12. Agora está legal. Não aumento mais porque minha mãe reclamaria. E acho que o 12 está perfeito, potente, com clareza, mas não incomoda. Ouvindo Virus, de Björk. O momento pede Björk. Gosto do universo musical para o qual ela me transporta. Acho que preciso fumar. Vou fumar. Não. Esperar dar 18h30. Estou sem inspiração, com mais vontade de pensar do que de escrever. São pensamentos bestas sobre minha mãe achar que eu estou fumando muito. A vida, a existência é fantástica como a enxergo nesse momento, parece mágica, incrivelmente complexa, o universo em que estou inserido do quarto-ilha com seus bonecos é um fantástico cenário. Meu quarto vai ser um fantástico cenário que muito me agradará admirar e ocupar. Sabe o que eu queria? Estar perfeitamente aclimatado com este teclado, pois as letras já estão apagando e eu ainda não as decorei com perfeição. Mas gosto do teclado, pois é bom de dar porrada, teclo com força e certa violência, é mais prazeroso assim. 18h27. Como foram longos esses minutos. Às vezes o tempo se dilata inesperadamente. A percepção do tempo, digo. A espera do momento de fumar, dada a vontade que tenho, faz com que se alooonguem... 18h29. Falta pouco para saciar tal vontade. Deu.

18h36. Enquanto fumava na escada, lembrei da atleta da escada, uma vizinha a quem convidei para um papo, sugerindo interesses afetivos, e me respondeu não convir porque tinha noivo. E, pensando nela, pensei numa ficção. FICÇÃO: estava agora fumando na escada e a atleta da escada apareceu praticando o seu treinamento vespertino de descer e subir degraus. Ao passar por mim parou para me cumprimentar. Eu não tive dúvida e sugeri: “e se a gente se beijasse agora inesperadamente, sem pensar? Seria o nosso segredo e sua oportunidade de experimentar outra boca. Vem cá”. E nos beijamos apaixonada e vorazmente. Ao nos descolarmos eu digo: “filmei tudinho no celular e vou mandar para o seu noivo”. Ela empalidece. Eu digo: mentira, mulher, nem celular tenho aqui”. FIM. Já estou com vontade de fumar outro cigarro, mas só de 19h. Nossa que vontade de fumar. Olhei que alguém me deu like no Badoo, mas, para ver esse like ou eu dou like para aquela pessoa, que não dá para saber quem é, seria obra do acaso-destino, ou assino o Badoo premium. Me contentarei se alguma para quem eu dei crush der chat para mim. É o que me interessa em verdade. Toquei numa parte do meu corpo que me deu desconforto mental, que onda. Não aguento, vou fumar. 18h53. Passou. Vou quando a música acabar. Fantástica, por sinal, New World, de Björk, do filme Dançando no Escuro, de Lars Von Trier pelo qual a cantora islandesa, protagonista, ganhou a palma de ouro de Cannes. O filme mais triste que eu já vi, de longe. Em uma linha o filme trata da incompreensão, pela sociedade, de uma pessoa com caráter perfeito. Vou fumar, enquanto entra Army Of Me, que foi trilha de um filme que de que gosto muito, Sucker Punch. Acho que até o assistiria agora.

19h07. Mudei de ideia, escrever é mais interessante e não sei onde o filme está salvo. Tenho o Dancer In The Dark em Blu-ray. Achei na Alemanha com legendas em alemão. Mas comprei, tenho que o assistir também em algum momento. Agora quero agradecer à existência por me permitir fumar e extrair o prazer que extraio disso. Acho “existência” uma palavra tão bela e tão carregada de complexidade. A miraculosa dança dos átomos que origina coisas como eu, como Björk, como a porra do anjo do Tinder, como esse evento incomensurável que é o agora no universo. É realmente uma das palavras mais preciosas do meu vocabulário e uma fartamente utilizada porque a amo. Ela me possibilita, me permite, me cede parte de si para que eu seja. Não há palavra outra que não gratidão. E amor profundo. Meu humor mudou completamente, volto a estar encantado com a vida, o beijo fez diferença. Nossa, quero fumar outro tomando uma Coca-Cola. Acho que um dia ainda crio coragem para experimentar o meu esperma. Tenho essa curiosidade sobre o seu sabor. Quem o sabia bem era a minha segunda namorada.

19h23. Puxa, deve ser uma sensação estranha, se é que Bolsonaro teve essa consciência, que todos os brasileiros passaram quinze dias pensando nele, mesmos os que votavam em Haddad. Parte com devoção cega e parte com medo ou raiva, mas todos pensando em uma só pessoa. Milhões e milhões de pessoas com você na cabeça. É muito doido. Foi um momento muito doido da democracia e pode continuar sendo. Ou não. É uma incógnita. O grande mistério nacional. As expectativas são quase irreais de ambos os lados, gente esperando um golpe militar, uns com anseio, uns com medo. É muito doido. Eu espero tudo com muita curiosidade, estou praticamente blindado da sociedade encastelado no meu quarto-ilha. Mas quando sair com o meu primo-irmão na noite não acho improvável ver, ao menos uma vez, um bêbado puxando a arma para outro. Mas isso por ora é ficção. O Brasil vai ter o que merece, o que pediu, o que demandou com o voto. A vontade do povo se fez. Estupradores serão castrados quimicamente. Entendo a ideia “preventiva”, mas acho desumano demais. O ato do estupro é desumano também (para os dias de hoje, afinal na época da escravidão era praxe brancos estuprarem negrxs e índixs, ou assim tenho para mim, pois até a tortura era permitida e o assassinato). Acho um passo atrás no nosso padrão civilizatório, mas talvez faça o estuprador pensar duas vezes antes de fazer uma vítima. Não sei. Penso nos possíveis inocentes que poderiam ser punidos injustamente. As feministas devem defender tal medida. FICÇÃO: casal briga e se separa. Mulher vingativa, lacera a vagina e o ânus com algo e se agride. Diz que estava sendo estuprada pelo ex-marido, por isso se separou. O cara é condenado, preso, violado e agredido e torturado por todos os outros presos e pela polícia, pois estuprador é repudiado até por marginais, depois é castrado quimicamente. E tudo o que pode fazer é chorar e gritar sua inocência, sem efeito. FIM. Vou fumar. Estou fumando muito hoje. Espero que traga boas ideias.

19h57. Vi parte de uma entrevista de Bolsonaro para o Jornal Nacional, meu padrasto torce para que Moro vá para o STF. Fumando só me veio a garota do último vídeo pornô que eu vi, linda, mignon, namoraria com ela, não parecia vulgar como uma atriz pornô geralmente me parece e, no entanto, foi a forma que escolheu de levar a vida. Ou de levar na vida. Desculpe a piada infame. Estou meio sem ideias. Acho que vou navegar um pouco. Li um texto que parecia sobre alguém com aversão à penetração. Perguntei se podia publicar aqui dando a autoria. Nossa, agora que percebi, estou na quinta página! Me descontrolei. Vou seguir, o blog é meu. Ela permitiu. Vou postar.

“Eles não.

Para tudo se tem uma primeira vez, e nem sempre são boas. Talvez nem as segundas, ou terceiras vezes são. Talvez nunca passem a ser. A culpa não foi sua. Foi minha por não saber dizer não. Se despiu, me invadiu. Fiquei sem reação. Não, eu não disse não. Ninguém viu, nem ouviu. Me senti nada, fiquei sem nada. Para ele não foi nada. E por que ninguém disse nada? Não foi a primeira, nem a segunda, nem vai ser a última. Não foi bom, nem vai ser. Me senti pó. E por isso, hoje, prefiro ficar só. Eles não, dessa vez não.”

Texto: Júlia Comelato, 30.10.18.

Já que tenho o texto, vou encerrar por aqui, revisar e postar porque a autora quer o link. Foi um post repleto de sexo. Curioso. Imagino que reação ela vai ter a respeito da minha colocação. O nome do post será “ELES NÃO” em homenagem a escritora iniciante. E usarei a imagem que ela usou para ilustrar. Curioso. A existência, a existência... cheia de inesperados.

domingo, 28 de outubro de 2018

BEBEDEIRA?

18h49. Nada me é mais aprazível que uma folha de Word em branco. Penso que ela guarda todas as possibilidades do universo, mas sei que em verdade, quando a tomo, ela se limita somente ao que há em mim e ao que estou disposto a oferecer. Mesmo assim, constrita dessa forma, me agrada muito. Estou ouvindo In Utero, do Nirvana. É um disco que gosto bastante, é meio desgovernado, desesperado, sombrio. Estava dando uma navegada na internet. Vou fumar e pegar Coca.

19h16. Mamãe me comunicou que vai deixar a fantástica faxineira em casa e que irei acompanhá-la. Saíram duas pesquisas, uma indicando empate entre os presidenciáveis e outra com larga vantagem para Bolsonaro. Acredito mais na segunda, não acho que tenha jeito.

21h16. Finalmente, depois de pegar os filhos e deixar a fantástica faxineira em casa, passar no Bompreço para comprar Cocas e uns poucos outros pertences e minha mãe botar alguns vídeos de Sandy para eu ver, sento aqui culpado. Ela queria que eu a fizesse mais companhia. Mas faz tanto tempo que não escrevo, escrevi pouco hoje por causa da faxina. Estou ouvindo Sandy e pensando no Azure Dragon. Foi só falar e o anjo do Tinder me surgiu na cabeça porque lembrei das eleições e que lhe disse que voltaria a me comunicar após tal evento, ou seja, amanhã. Penso em beber bebidas alcoólicas amanhã. Tomar um porre. Extravasar toda a tensão desse período conturbado da história nacional. Não sei se faça isso mesmo, mas é uma ideia que vem ganhando força ao longo dos dias. Não terei dinheiro, nem sei onde vende crack por aqui, não acredito que buscaria a droga, que é a razão pela qual parei de beber. Se me bater fissura, é realmente um sinal de que não devo beber.  

21h32. Não sei o que fui fazer além de fumar outro cigarro, mas a ideia de beber amanhã pulsa em mim. Veremos. Como já chegarei em casa bêbado, mamãe não poderá fazer nada a não ser encarar os fatos. Talvez vá querer me proibir de ir à Vila Edna, alguma maneira de me punir há de inventar. Mas um porre na vida não vai me matar. Porra, é a minha vida e só vou passar por ela uma vez! Nada vai acontecer comigo além da possível e provável ressaca. E da retaliação da minha mãe. Vale a pena. Eu acho. Nem lembro mais como é estar embriagado. Mas não quero mais falar disso. Talvez nem o faça. Comentei com o meu primo-irmão e ele questionou se eu estou podendo beber. Escrevi mais ou menos o que disse aqui.

22h24. Fiz uma coisa que não fazia há semanas: fechei o Chrome. Confesso que me sinto meio órfão. Vamos ver quanto tempo resistirei. É um hábito já bastante consolidado, alternar entre as palavras e a internet. Ainda mais com o Tinder acessível pelo navegador. Peguei o tique de olhar de tempos em tempos se surge alguém. Ainda estou decepcionado com o fato de não ter conseguido a atenção da balconista. Não há nada que eu possa fazer. É seguir dando os meus superlikes e confesso que estou cada vez menos exigente em relação às garotas que o merecem, mesmo assim os que dei não resultaram em nenhum match. Peguei no mouse para olhar o Tinder motivado pela frase anterior, mas me lembrei que havia fechado o Chrome. Não sei porque me privo. Acho que vou fazer uma limpeza do HD. Momento.

22h55. Em vez de abrir o aplicativo de limpeza de disco eu, sem pensar, reabri o Chrome e, uma vez aberto, não resisti e fui navegar. Tem jeito não. Botei para baixar o filme que mamãe queria ver, sugestão da fantástica faxineira, e Ant-Man and Wasp.

23h05. Fui fumar um cigarro. Estou ansioso por amanhã. Acho que mais pela possibilidade de beber. É bom trelar, quebrar barreiras, embora não esteja certo de que realmente farei isso. Escrevendo a frase anterior me desanimei. Não sei, não sei. Não quero ir muito tarde para lá, mas também ignoro que horas vou acordar. Ter fechado o Chrome, mesmo que o tenha reaberto, parece que deixou o computador mais rápido, curioso. Vou pedir ao pai da Vila Edna que guarde o conteúdo do livro só para si. E, se preferir, nem leia. Não sei. Estou cheio de dúvidas hoje. Coloquei o novo disco do U2 para ouvir, ele tem um significado especial na minha vida. Significa liberdade, em particular da cola e do manicômio. Indo além, a liberdade que experimento na minha vida, limitada como é. Minha liberdade é de um tipo diferente, pouco correlato com a liberdade de ir e vir, que é identificada, creio, como a liberdade mais primordial. Eu raramente saio do meu quarto e, quando saio, não tardo a sentir falta de estar nele. O meu isolamento eu julgo já ser algo meio patológico. Tal isolamento acho que é reflexo da condição – e decorrente condicionamento – experimentada no período que passei praticamente em prisão domiciliar quando morava com meu pai. Foi a medida encontrada por ele para me impedir de usar cola. Não guardo ressentimentos de sua decisão, morando em Boa Viagem, longe da minha turma, não havia muitos lugares para onde quisesse ir. Sofro também privação financeira, por mais que receba pensão, só posso utilizar dinheiro quando outorgado pela minha mãe. Isso também não me incomoda (muito), não fora pelas bonecas e pelos cigarros. Nossa, queria muito que mamãe passasse a me dar uma carteira por dia. Acho que vou pedir isso de Natal a ela. Por falar nisso, preciso ir ao banco desbloquear o meu celular para poder efetuar saques da poupança. Não agora no final do mês, mas no começo do mês que vem. Vou fumar. Não sei. Talvez acabe tentando ir na terça, visto que segunda tenho Ju.

0h18. Já é dia da eleição. Daqui a 7h41 minutos, começará. Tomei os meus remédios, me despedi de mamãe e agora tenho a noite só para mim. Meu amigo cineasta me mandou uma música de Caetano para ouvir: Amanhã. Ouvirei agora. Momento.

0h48. Era uma música linda e positiva de Guilherme Arantes, interpretada por Caê. Resolvi botar o disco todo para ouvir. Saudade danada me bateu do meu amigo cineasta. Amo-o muito. Me dei conta do imenso após ouvir a música. Dei um crush para uma garota muito interessante do Badoo. Pois, é estou apelando para dois aplicativos de paquera. Tentando o que não me invade. Já dei superlikes e crushes para várias garotas e nada. Aliás, houve o anjo do Tinder e a garota do Instagram, mas não sei se são/eram perfis reais. Estou com saudade do meu anjo, apesar da insegurança em relação à sua identidade. Findada a apuração ou confirmada a vitória, mandarei mensagem para ela. Talvez ébrio, talvez não. A vontade que tenho tenho que calar dentro de mim. O tempo virá, é só ter paciência. Acho que vou comer.

1h36. Devidamente alimentado. Foi um jantar digno, gostei. Primeira coisa que me veio? O anjo. Não que haja esperança em algo que não sei nem da veracidade. Gostaria que a garota que curti no Badoo me desse bola, é bastante interessante e possui um piercing argola no nariz como o anjo e é loira como o anjo e é apetitosa como o anjo. E fuma, o que, para mim, é um plus. Bom, dei várias curtidas, pode ser que alguma vingue apesar da minha idade e do meu bucho.

1h48. Acho que vou me retirar dentro em breve...

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13h28. Acordei há algum tempo. Recebi um match no Badoo, mas estou sem coragem de começar uma interação, acho que porque não é alguém que me encante de verdade. Dentro em breve me arrumarei para ir à Vila Edna, mas confesso que não estou muito disposto para birita hoje, agora. Botei meu celular para carregar mesmo não tendo descarregado, pois quero ter bateria para mandar a mensagem para o anjo do Tinder quando o resultado da eleição se der. Sei que é contraditório querer falar com alguém que talvez seja fake e que não me dá a mínima e não querer falar com uma garota que revelou um interesse sincero pela minha pessoa. Façamos o seguinte: quando o meu celular carregar, eu vou me aprontar para ir à Vila Edna. Uma vez lá, inicio o papo com a garota que me deu o match no Badoo.

14h22. Acho que vou para a Vila Edna às 16h. Um bom horário eu creio. Nem muito cedo, nem muito tarde, bem, talvez só um pouquinho tarde. Em verdade, acho adequado. Sobre beber lá, confesso que não me decidi. Acho que só chegando lá. A antecipação já me causa desconforto, as vésperas sempre me dão vontade de desistir, sei bem como sou. Coloquei uma Coca para gelar no congelador para levar para a Vila. Estou com mil pensamentos na cabeça como formigas de asa em volta da luz em dia de chuva. Vontade de fumar tomando uma Coca bem gelada. Resistirei um pouco mais. Confesso que estou puto com um amigo de infância meu que mora no Canadá e defende Bolsonaro. Mas não deixarei o antagonismo político macular a nossa relação. Essa raiva passará. Vou fumar, não há por que esperar. A vida é muito curta para ser desperdiçada com esperas sem sentido. Isso deveria se aplicar ao anjo, mas em relação a ela guardo uma terna esperança.

14h53. Não estou muito inspirado para a escrita. Estou curioso para escrever embriagado, se isso se der. Minha mãe vai pirar na batatinha. Vai dar um escândalo. Ameaçar, internação inclusive, sei tudo o que me espera. Não acho que seja um ato irresponsável. Estou plenamente consciente. Não quero me prejudicar. Não acho que vá me bater fissura de crack embora não tenha certeza disso. Descobrirei. Ou não. Não decidi sobre a bebedeira, mas como é um pensamento dominante, acho que levarei o meu projeto a cabo. Não sei também se haverá resistência por parte dos habitantes da Vila Edna à minha ideia. Creio que não, mas nunca se sabe.

15h07. Creio que ébrio eu não conseguirei resistir ao impulso, visto que o id vai estar sem rédeas, e não encomendar uma das duas últimas estátuas que quero. A Harley Quinn. Espero que me controle. Pretendo beber seis long necks. Mas sei que quando começo é difícil parar. Esse é um dia sui generis em muitos aspectos. Confesso que estou com um pouco de medo de beber e ser inapropriado. Pedirei que me sinalizem se eu agir dessa forma. E que me coajam a manter as estribeiras. Vixe, que fixação chata. Ainda bem que já estou na terceira página e que daqui a pouco em vez de projetar o futuro, estarei efetivamente vivendo esse futuro que projeto. O Brasil, meu amado Brasil, fazendo uma escolha odiosa. E eu entendo, o povo cansou do PT, o povo é conservador e violento. Se vão haver casualidades na guerra contra o tráfico, isso não incomoda o eleitor porque eles creem que não será com eles. Ansiosos por “segurança”, anseiam por armas. Sei bem que tipos vão querer ter armas em casa. São os piores tipos. Vou fumar.


15h26. Está quase na hora de me aprontar. Está quase no final da terceira página. Quando ela acabar, vou me preparar. Colocarei o meu melhor perfume, colarei o adesivo de Haddad e vou para o ninho de resistência e de amor que é a Vila Edna. Me dói um pouco deixar a minha mãe sozinha, mas ela concordou. Ademais tem que preparar aula e prova. Não teria tempo para companhia, companhia essa que poderia estar oferendo agora, em vez de estar aqui a escrever e não ofereço. Então é hipocrisia da minha parte o que acabo de falar. Ainda acho que Bolsonaro, na coletiva que dará após a apuração dos votos dirá algo como “petralhada, agora vocês vão ter que me engolir!”. Bom, acabou a terceira página. Vou revisar, postar, tomar banho e ir.

quinta-feira, 25 de outubro de 2018

MAIS TINDER

22h00. Acho que hoje vou dormir cedo. Achei uma supergata, nível modelo mesmo, no Tinder. Tudo de bom. Dei o superlike, mas cometi o equívoco de não copiar o seu Instagram, por onde eu poderia puxar conversa com ela. Estou aqui profundamente arrependido. Se bem que quando a esmola é boa, o santo desconfia, de toda sorte, tenho que tentar. E a coincidência: ela tem o mesmo nome do anjo do Tinder.

23h08. Santo Tinder plus! Apareceu uma nova garota e eu pude apertar o botão de rewind e voltar ao perfil dela. Já a adicionei no Instagram e joguei aberto com ela, vamos ver se ela vai ver ou responder. Não acho que tenha tanta sorte, mas ela está lançada. Já tinha me esquecido da paranoia de ficar olhando o Instagram para ver se a figura visualizou a minha mensagem. Estou nessa no momento, mas vou desencucar. Só há seis por cento de bateria, então mesmo que ela quisesse não poderia bater um papo hoje.

0h06. O evento cibernético Spooktacular da Sideshow Collectibles me roubou um tempo agora, tentando faturar uma figura do Flash bem legal num sorteio. Era um que não me incomodaria ganhar. Entro em todos da Sideshow, mas nunca levei nada, não vai ser dessa vez. A bateria do celular vai acabar a qualquer momento. Acho que hoje realmente vou me retirar dentro em breve, se bem que sempre me proponho a isso e me embrenho madrugada adentro.

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13h15. Cá estou, acordei há mais ou menos uma hora com política na cabeça. Estou cansado disso e aliviado que o pleito se dará nesse domingo.

13h22. Já fiz a minha imagem de perfil para depois da eleição.




13h23. Não acredito que Haddad vá ganhar. Se ganhar, até eu vou duvidar da lisura do processo eleitoral. Não será um alívio, pelo contrário, será a confirmação de que o sistema político é mais podre e corrupto do que eu poderia supor. E nem posso imaginar qual será a reação da população frente a um resultado contrário a Bolsonaro. A nova garota do Tinder não viu as minhas mensagens e não creio que as verá. A outra que adicionei da mesma forma, pelo Instagram, nunca me respondeu nem olhou minhas mensagens. Vou pegar Coca e fumar um cigarro.

13h45. Li uma matéria sobre o show de Sandy que acontecerá hoje à noite e uma pontada leve de arrependimento me bateu por não ter comprado o ingresso quando ainda havia relativamente perto do palco. É a vida e segue. Mergulhei um pouco na internet, tudo gira em torno da política. Botei Björk alto para ouvir. Five Years ao vivo. Era uma música que não me apetecia muito, mas, ao prestar atenção na letra, me conquistou, é uma das minhas várias prediletas hoje em dia e a versão ao vivo é bem massa. Sobre assuntos do coração, confesso que o Tinder não tem me trazido grande sucesso. Sucesso nenhum para ser honesto.

14h16. Botei café na cafeteira elétrica que ganhei da minha tia jornalista para fazer. Quero economizar Coca e, especialmente, gelo. A verdade é que não estou encontrando muita disposição para as palavras esses dias, não é desmotivação, é falta do que dizer. Seria muito mais conveniente a Bolsonaro fechar o congresso e legislar a seu bel prazer. Não imagino como terá maioria no congresso. É claro que, como ele, eu sonhe com congressistas que votem de acordo com suas convicções, consciência e vontade de seu eleitorado, sem ser necessária nenhuma barganha ou transação política. Mas acho difícil que isso se dê. Se ele conseguir, só por isso já valerá o seu papel como presidente. Acredito que seria algo realmente novo na política mundial. Seria um exemplo, mas me parece conto de fadas. Estou desconcentrado, não sei direito o que escrevo. Queria ser presidente. Tenho medo, porém, de me corromper com o poder, como mencionei em post anterior. Vou ver o café e fumar.

14h36. Estava pronto e está bom. Tenho uma xícara ao meu lado. Não sou o único que escreve na minha família, tampouco o melhor, menos ainda o mais esforçado, mas sou o que mais se dedica à palavra por ter construído tempo para isso. Não acredito que nesse caso a prática leve à perfeição, o que me aproximaria dela seria ler uma boa gramática, mas sou um escritor preguiçoso e, agora, despretensioso. Nunca serei grande, aceitei isso. Não sei como, nem tenho talento para tanto. Sei me narrar e isso me contenta, então faço. É algo como uma conversa que travo comigo mesmo, um estudo das minhas percepções e experiências. O marido de uma amiga minha, artista de verdade e completamente, disse-me artista, fiquei lisonjeado com isso, mas não mereço ser alçado a tão grande altura. Pintei um punhado de quadros e deito palavras, nada mais. Pintar, não pinto mais. Foi paixão passageira, abortada pela necessidade de minha mãe de que eu me aprimorasse e dominasse a técnica, de que não ficasse “parado”, o que roubou da pintura a sua liberdade e seu aspecto lúdico para mim. Não a culpo, entendo tudo o que se passava na sua cabeça, sei que queria o meu melhor e que se sentia angustiada em me ver sem fazer nada, pois para ela era inadmissível tal posição na vida àquele tempo. Não gosto de apontar culpados. Se fosse culpar, culparia a mim mesmo que nunca gostei de fazer nada por obrigação e sempre odiei estudar (ódio que depois se voltou ao trabalho, quando esse parou de me recompensar à altura do meu sofrimento e empenho). Por não ter que me submeter a nada disso mais, me sinto abençoado e acredito que encontrei o meu lugar no mundo. Sou um covarde preguiçoso que ama se exibir através das palavras. Talvez seja um pouco mais que isso, mas esse pouco mais me escapa agora. Mais café e cigarro. Vou à Vila Edna no domingo, acabei de confirmar, minha alma precisa disso, será bom.

15h06. O café me faz bem, me deixa mais alerta, mais esperto, com mais energia, criativa inclusive. Não que eu crie algo quando escrevo, pois em verdade não escrevo, descrevo o que me vem à cabeça. É uma coisa menor, mas, como disse reiteradas vezes, é o que me cabe e agrada fazer, é a liberdade que exerço, é a minha forma de expressão, minha satisfação egoísta e ególatra. Não tenho vergonha de ser assim, aceito, me faz bem e me ajuda a tocar o barco do que, de outra forma, seria uma existência sem sentido. Não há utilidade outra no que produzo que não a satisfação pessoal. Acho que é o que todo mundo busca, eu encontrei nessa forma de expressão que, se tem algum diferencial, é ser muito minha, muito própria visto que absolutamente subjetiva. Não pesquiso, não analiso fatos, exceto pela campanha eleitoral. Isso passará e eu permanecerei. Com minhas paixões impossíveis e meus bonecos. E as palavras, sempre as palavras, em doses bem servidas, meu eu pede por elas como alguém que sufoca precisa de ar. Respiro palavras, as vomito irresponsavelmente, despretensiosamente pois abandonei a pretensão. Ela não me cabe e não me serve. Me resignei de que os meus planos de ser publicado falharam todos. Meu texto não merece a tinta e o papel. Que seja, isso não me impedirá ou me constrangerá de produzi-lo. Não sei porque me meto às vezes a essa “metalinguagem” e não importa saber, obedeço o que vem de mim, cada impulso, cada intenção. Claro, há o superego e ele é cada vez mais o meu superego que o do meu pai ou do meu irmão. Isso me agrada sobremaneira e alivia, dá leveza, à minha vida. Tenho certamente mais defeitos que as duas figuras supramencionadas, ou pelo menos os tenho de natureza mais repudiada pelo senso comum. Danem-se todos e me atirem a primeira pedra aqueles que não possuem defeitos. Sou um sujeito incomum, isso cria uma ruptura social que me desagrada e, ao mesmo tempo, me permite me exercer de forma mais plena e minha. Eu tenho exatamente o que busquei. Nem a mais, nem a menos. Bem, talvez um pouco a mais. Mas não me culparei por esse excedente de benesses. É o que a existência me oferta e colho o que me interessa. E pouco me interessa. Tento plantar, mas não tenho mão boa para o plantio. Que seja, se é solidão o que me cabe, acatarei e subsistirei, tenho minhas palavras por companheiras, fiéis e submissas. Por falar nisso dei um like em uma garota de 26 anos BDSM, uma categoria de perversão curiosa que envolve submissão, sadomasoquismo e dominação. Ela seria a parte dominada. Tentei adicionar ao meu WhatsApp, mas não tive êxito, seu telefone está no meu celular, mas não sei se teria coragem de machucar alguém, mesmo que ela pedisse por isso. Há um lado sádico e comodista meu que adoraria ter uma “escrava voluntária”, mas não consigo ver como uma relação que fosse me trazer satisfação. Por mais que, não vou mentir, uma mulher submissa me pareça uma ideia curiosa e atraente. Tenho pensamentos e sentimentos contraditórios sobre o tema. Não gosto de dor e não entendo como alguém pode desejá-la, mas sei que há pessoas assim. Eu acho que tentaria “curar” a pessoa dessa posição, pelo menos tentar compreender o que a levou a tal condição, a desejar ser subjugada, humilhada e sofrer pequenas torturas. É um universo que desconheço inteiramente e que por estar no limiar da marginalidade, por ser tabu, me atrai. O proibido, o que foge ao padrão sempre me causou profundo interesse. Não sei por que isso se dá, coisas do id, eu acho.

15h55. O meu texto é tão simplório e pobre, meu repertório vocabular tão limitado que chego a cansar de algumas palavras que uso, uso-as apenas por falta de alternativa. E tome repetição. Também – e isso sou eu passando a mão na minha própria cabeça – escrevo muito, não há como escapar das repetições. Vivo para escrita, mesmo que redundante. É o meu bem mais precioso, minha paixão maior, espero nunca desencantar dela. Aí sim, tudo se tornará extremamente redundante. O som está alto. Acho que vou, depois do café com cigarro, botar Björk de novo e aumentá-lo ainda mais, só estou eu aqui em casa. E o máximo que posso me dar nessa condição é ouvir a música na altura que eu quiser. Não sei se é pouco isso, mas me apraz. Vou lá fumar.

16h13. Voltei e soltei um Alice In Chains no volume 30. Massa. Só falta a minha mãe chegar agora, estou me sentido amplamente livre. O bróder que recolhe o lixo aqui do prédio apareceu enquanto fumava e chamou Bolsonaro de uma coisa que não tinha ouvido ainda: “psicopata”. Achei que lhe cabia de certo modo, por mais que esteja de posse de todas as faculdades mentais. Me divertiu tal colocação. Eita, estou sem nada na cabeça para dizer. O ar está ligado, a tarde cai, penso no anjo e mandei uma mensagem para a sua homônima, pedindo que lesse as minhas mensagens. Não sei se o fará, sei que é o máximo que posso fazer.


16h24. Minha mãe chegou e me intimou a ir ao shopping com ela hoje. Um cara me alertou que a homônima do anjo é um perfil fake. O que me faz suspeitar do anjo também. Sei lá. Sou muito ingênuo em termos de internet. Voltarei a falar com o meu anjo no domingo, assim que souber quem será o novo presidente, como prometido. Ela tem curtido as minhas fotos. Todas as que publico. Não sei. Sigo acreditando por falta de crença mais sólida. Essa eu sei ser demasiado vaporosa, mas é a que tenho. Por ora. Acabei de olhar o Tinder e parei numa moça de 20 anos até jeitosa que se diz “apaixonada por Homens Mais velhos”. Vou esperar até ter superlikes de novo para mandar-lhe um. É balconista e isso não me incomoda. Quem sabe a sorte não me sorri aí? Quem sabe não é ela que vai acabar com a minha solidão? Estou criando expectativas muito altas. Melhor baixar o facho. Mas ela não é de se jogar fora. Não sei quanto tempo o Tinder vai demorar para me conceder os superlikes, mas não tirarei de seu perfil até que aconteça. Ansiedade. Sou um cara ansioso e imediatista vivendo em tempos ansiosos e imediatistas. É a era do agora ou nunca. Acho que exagero, mas também acho que a internet e a informática de forma geral trouxe esse senso de urgência e velocidade que antes não existia. Eita, já entrei na quarta página. É revisar e postar. Acompanhe o que vai se dar em relação à garota no próximo post. Como se isso lhe interessasse. Hahaha.   

quarta-feira, 24 de outubro de 2018

BISCOITO DA SORTE

22h27. Este dia não tem mais sentido para mim, não há razão para permanecer acordado.

22h42. No entanto, não estou com sono e me resta um pouco de Coca, escreverei até que a Coca acabe. Pode ser que não se dê nada de drástico com o governo Bolsonaro, nada que subverta a ordem constitucional. Torçamos para que isso ocorra e que ele faça uma faxina na corrupção de Brasília. Esperar pelo melhor é sempre mais agradável, mas o meu sentido aranha está desconfiado desse conto de fadas. Olhei o Instagram agora e nada de novo aconteceu.

23h23. Incrível, não consigo me desligar do Facebook e da briga política, me estranho por estar tão engajado, não é do meu feitio e nunca foi. Acho que porque agora toca nas minhas feridas, mexe com conceitos basilares de civilização, de civilidade e humanismo (embora nem saiba o que essa palavra significa em sua completude). Mexe com o ecossistema global, com a Amazônia. Mexe com muitas coisas que me são preciosas e com outras que sou completamente contra. Acho que Bolsonaro vai tentar varrer a corrupção do país? Tenho certeza de que vai tentar. Me incomoda o liberalismo econômico? Não entendo de economia o suficiente, mas garantidos os direitos do trabalhado não tenho nada de objetivo ou subjetivo contra. Todo o resto me incomoda, entretanto. E tem muito resto.

23h38. Estava namorando o site da Sideshow. Só há uma peça que me interesse no momento, mas esperarei a reforma do quarto. Até porque quero o Azure Dragon e não decidi qual das duas é mais importante para mim. Não tenho e não farei dinheiro para ambas, eu assumo. Os itens que coloquei à venda no eBay não estão saindo, emperraram. A Coca acabou, esse era o sinal para ir dormir.

0h26. Não estou com sono e estou bebendo água. Vou fumar mais um cigarro e encher o copo.

0h35. Meu irmão certa vez comentou que seu primogênito lhe lembrava a mim. Não lembra mais porque a lembrança que ele tem é de outro eu que não mais sou. O eu extrovertido, conversador e brincalhão deixou se ser, se perdeu no emaranhado de mim. Tornei-me mais sério, mais grave, mais sereno. Não sei se isso é bom ou é ruim, sei que gosto de ser quem eu sou e estar onde estou, antes não gostava. A idade vem me trazendo maior paz comigo mesmo, os embates entre o superego e o id são menos violentos e menos constantes. Entro num ciclo de paz com o mundo e suas dores. É um momento salutar por mais que a timidez e a esquiva social tenham se tornado parte desse eu que agora construo. Não digo que sejam condições definitivas, mas me agrada o isolamento com as minhas palavras. A solidão ainda fere e se me foco nela e ponho o dedo nessa ferida, ela lateja um misto de frustração e desilusão. De falta de esperança nesse âmbito. Não a perdi por completo, mas vejo o prospecto de realização dessa esperança cada vez mais distante de mim. Serei só, é o que penso. Permanecerei só, é o que meu coração me diz. Morrerei só, é para aí que a minha vida aponta. Mas não quero cutucar a ferida agora, não preciso sofrer desnecessariamente, me impingir sofrimento. Eu mereço mais que isso de mim. Eu mereço um pouco de amor próprio e respeito próprio e acho que venho alcançando isso durante a calejada existência que o universo me outorgou por forças as mais misteriosas. Não entendo por que mais um escritor não lido no universo. Não sei qual a relevância da minha existência para o esquema maior das coisas, para a sociedade na qual estou inserido quase sem estar. Talvez exista para explorar toda a liberdade magnífica de ser eu, ser da raça mais inteligente do planeta. Certamente não vim parar aqui para ser um reprodutor ou assíduo do sexo e das relações íntimas, certamente vim aqui para dar lucro à Sideshow Collectibles, o que é um grande prazer e que está perto de se esgotar por falta de espaço. Fumar e água.


Certamente.



A beleza, a percepção da beleza acho que é a maior maravilha da condição humana. Todos os tipos de beleza me encantam: gestos, palavras, natureza, melodias, sabores, texturas, odores, arte, garotas. Confesso que muitas vezes fico mesmerizado com a beleza, sou arrebatado por ela e fico por alguns instantes sem ação, me recuperando da fascinação que ela desperta em mim. É curioso isso e mais do que isso, extremamente prazeroso. A beleza eu diria que é o que traz luz à minha vida. E há tantas coisas que julgo belas, o mundo está repleto delas. O lado ruim de ter a beleza como a minha deusa é que sou extremamente seletivo esteticamente no que tange garotas. Mas não quero entrar nesse mérito agora. Minha última cartada, que talvez não lance na mesa da vida jamais, é belíssima. No amor, posso dizer que sou o meu próprio carrasco, sob a pena de sonhar mais alto do que as minhas asas suportam. Que seja, me aceito, isso é mais do que poderia esperar de mim mesmo e já percebi que é um processo contínuo e progressivo. A parte do progresso, mesmo que a passos de formiga, é o que mais me agrada pois sugere que o melhor ainda não chegou, ainda está por vir (e nunca chegará, em verdade, ao mesmo passo que cada vez mais me aproximo do que quero ser e me distancio do que eu não queria ser e vivia a buscar e me culpar pela minha incompetência, que não era incompetência de fato, mas incompatibilidade entre as minhas verdadeiras aspirações e as aspirações que julgava terem a meu respeito). Sou uma pessoa bastante limitada em diversos aspectos e quase ilimitada em outros. Das minhas limitações não mais me envergonho ou pelo menos a vergonha é bem menor. E vou comer algo. A fome bate.

2h03. Nossa, como amo o meu Hulk. Uma das melhores compras que já fiz. Não tem utilidade nenhuma, mas para mim é uma obra de arte e a utilidade está em si mesma, que é a beleza inerente à figura. Há beleza nos monstros, nalguns tipos, pelo menos. Há beleza em tudo, se você vir com o olhar certo. Como dizem, a beleza está nos olhos de quem vê. E eu estou sem saco para escrever. Queria mandar uma mensagem para o anjo do Tinder, mas me conterei até depois das eleições, como prometido.

3h24. O maior evento da Sideshow Collectibles está prestes a começar, o Spooktacular. Não irei dormir antes de ver o que vai acontecer, estou no site dedicado ao evento que está em contagem regressiva. Eu tenho uma fixação por contagens regressivas ou barras de carregamento, não sei o que tanto me atrai, mas gosto de observar os números e porcentagens se desenrolando para a consecução de algo. Gera uma antecipação, um frisson gostoso, como quem espera o Natal chegar. Esperar algo bom que sei ou tenho convicção de que vai acontecer me agrada. É como uma certeza agendada, esperando o seu momento de germinar. Tomara que lancem uma figura nova, que geralmente fazem, revelam uma figura por dia, pois, como disse, é o maior evento anual da Sideshow (afora as convenções, mas mesmo com essas, acho o Spooktacular maior para a empresa). Sou fã, tenho até camiseta com a marca. Dezoito minutos para o início, que pelo visto vai se dar às 4h daqui, justamente quando mamãe disse que iria acordar. Levarei esporro. Vale a pena, embora esteja ficando com sono. Vai ser rápido, a revelação de uma nova estátua talvez. Quatorze minutos. Espero que seja uma revelação bombástica, daria preferência a uma linda garota, aliás, não queria isso, chega de tentações. Mas queria ver algo novo e impactante. Provavelmente vou me decepcionar. Veremos dentro de breves minutos. Vou fumar um cigarro, é o tempo.

4h05. Grande perda de tempo. Nenhum lançamento revelado, um bando de bonecos encalhados com frete internacional grátis e alguns sorteios. Espero que quando acordar as coisas estejam mais interessantes. Hoje é dia do Sideshow Live, mas perdi o tesão de acompanhar. Lá distribuem códigos promocionais e às vezes revelam lançamentos. Talvez assista hoje, quem sabe, só para dar uma chance.

4h11. Vou fumar o saideiro e ir dormir.

4h19. Ainda não me sinto disposto a dormir. Quero visitar os grupos de Facebook do maravilhoso mundo dos bonecos. E lançar a pergunta sobre qual a última aquisição/encomenda dos usuários.

-x-x-x-x-

14h13. Lancei a pergunta, muitos responderam, mas isso não me interessa. Minha dor nas costas deu uma piorada sensível durante a madrugada, mas minha mãe me deu um remédio que a amenizou, estou praticamente sem dor agora. Estou sem vontade de escrever – ainda despertando –, mas não estou entediado, graças. O anjo do Tinder curtiu a postagem que fiz com o texto do biscoito chinês no Instagram. Esse gesto mínimo é o suficiente para achar que ela presta atenção em mim, que existe um interesse dela pela minha pessoa. Nada mais distante da realidade. Vou cortar as minhas unhas. Coloquei a lista 6 em modo aleatório.

14h56. Cortei. A melancolia quer se chegar e lançar suas garras negras sobre mim. Espero que seja passageiro. Vou fumar. Já estou na terceira página, então esse post não tardará.

15h07. A política parece que exala pelos meus poros. E olhe que me considero um ser muito pouco político. Muito pouco mesmo. A impressão que eu tenho é que parte dos eleitores de Bolsonaro são como leões selvagens e famintos acorrentados, esperando, irrequietos e irritados, que lhes soltem para caçar. Hoje promete ser um dia menos interessante que ontem. U2 rola no som, In God’s Country. Gosto muito. Às vezes me bate um medo de ser perseguido, coagido ou acuado de alguma forma por fazer oposição a Bolsonaro. Minha mãe disse para eu não me preocupar. Às vezes me vem à cabeça que a única forma de Bolsonaro ter governabilidade é através de um golpe, o que alimenta o meu temor anterior. Às vezes penso que tudo vai ficar bem e que serão só cinco anos – se ele mudar a regra da reeleição – e que cinco anos na minha idade passam rápido. É o tempo de o anjo amadurecer. É o tempo de muita coisa acontecer. Estou preparado para elas e as aceito, quaisquer que sejam. Só está passando U2, o que é uma delícia. A existência tem sido bastante generosa comigo, nada posso exigir dela além do que já tenho e do que me espera.


16h19. Minha mãe chegou, isso me deixa feliz porque a amo. Foi um caminho longo e tortuoso para amá-la, mas finalmente me permiti e ela mudou o tanto que é capaz de fazê-lo no momento. Sou grato por ela ter operado essa mudança, especialmente em relação à minha pessoa e meus hábitos peculiares. Realmente muito grato. Ela hoje contribui mais do que rouba a minha qualidade de vida, presente inesperado da existência. Falo muito a palavra existência, né? Fato é que não encontro palavra mais abrangente e ao mesmo tempo mais precisa para nomear o que experimento. Acabou a terceira página.

terça-feira, 23 de outubro de 2018

BRANCO, PRETO E CINZAS



21h16. Falei com o meu amado irmão, sempre me faz um bem enorme. Aparentemente iremos a Areias quando ele vier no final do ano, possivelmente com Maria e poderemos, enfim, levar as cinzas de papai para jogar na maré de Macau. Estou sem saber o que dizer e sem vontade de dizer. Vou bisbilhotar a internet.

21h32. Nada de interessante. Aliás, só uma garota de cabelos azuis que é de Recife e está no Adote um Cara, mas que não apareceu no aplicativo quando o reinstalei. Deixa para lá. Estava começando a me bater um tédio, então voltei para cá, meu porto seguro, minha salvação, meu ofício que amo. Não tenho nada a dizer, por que será? Sinto uma conexão maior com o maravilhoso mundo dos bonecos. Há tempos não sentia.

22h03. Estive mergulhado no maravilhoso mundo dos bonecos até que enchi o saco. A paz do post anterior me abandonou. Sinto que cada vez significo menos. Não só para mim, mas especialmente para os demais. Eu me esvazio de conteúdo, de coisas novas, de vivências. Meu irmão ficou feliz que estou entrando em apps de relacionamento, confessei-lhe que não tenho dado muita sorte. Para que escrever? Para que dizer da minha miséria afetiva? Em que isso vai me ajudar, em que vai mudar alguma coisa? É só pela catarse do desabafo? Acredito que sim. Só penso no anjo e na impossibilidade do anjo. Me dói não ser ideal como o anjo é para mim. Não desistirei. Ainda. Mas, como em relação à campanha eleitoral, as coisas já estão virtualmente decididas e são contrárias ao meu desejo. Não me espantaria nada, Bolsonaro dar um golpe de estado. Bom, o que será, será.

-x-x-x-x-

14h06. Sem a mínima disposição de ir para Ju, mas irei. O país está doente. Ou já era doente e agora os sintomas irromperam. Estamos longe de ser uma nação civilizada. Apostamos numa “moralização” do Estado. Os custos dessa suposta “moralização” cabe ao futuro revelar. Às vezes me parece uma moralização com gosto de sangue, sedenta de sangue, portanto uma moralização que fere, inclusive a democracia.

14h25. Pouco mais de meia-hora até entrar no banho. Preciso ver o programa de ontem de Bolsonaro.

14h41. Não achei e perdi o meu tempo na internet, li que ele declarou que vai caçar petistas e vermelhos, ou seja, a oposição. Isso não me soa lá muito democrático ou constitucional. Bom, espero que sejam palavras vazias, como ele diz que todos os seus depoimentos passados foram.

14h53. A hora de tomar banho se aproxima, galopante. Não estou com saco para nada hoje, essa é uma sensação que se apresenta repetidamente nos últimos dias. Não me desagrada, porém não convém hoje. Queria ficar aqui escrevendo, tomando café e Coca, ouvindo música, que ainda não coloquei. Não terei tempo para isso agora. Quando voltar de Ju. Não sei o que dizer a ela. Vou olhar o Tinder.

15h03. Nada que tenha feito os meus olhos brilharem, mas dei um superlike em uma. Preciso tomar banho. Antes, preciso tomar coragem. Estou satisfeito com a vida por me apresentar poucas, mas grandes contrariedades. Estou com medo da censura de Bolsonaro e de ser uma de suas vítimas.

17h32. O que ficou de mais marcante da minha consulta com Ju foi justamente a declaração final dela: “tenho muito carinho por tu”. Me calou bem e profundamente. Me fez muito bem, o que demonstra a enorme carência afetiva a que me submeto. Eu poderia amar Ju, acho que seria fácil e bom. Mas não vou misturar as coisas pois não devem ser misturadas. Nem sei bem o que digo, estou com uma dor chata nas costas que me impede de me concentrar propriamente.

17h49. Estou sem saco de escrever.

19h43. Estava vendo um programa que meu irmão JP, aniversariando hoje, me mandou. Sem comentários porque não estou com paciência para eles. A dor nas minhas costas me incomoda, tenho que caminhar muito lentamente para minimizá-la e só com algum tempo em pé a coisa melhora um pouco. Estou ficando velho, isso jamais aconteceria aos meus 18 anos. Ficar velho me assusta, a velhice sempre me foi assustadora e torna-se ainda mais quando vejo como se apodera da minha mãe, debilitando-a. Tomei um Dorflex dado pela fantástica faxineira, mas acho que ainda não fez efeito, ou se fez, não foi muito grande. Queria muito mandar uma mensagem para o anjo do Tinder.

21h04. Minha mãe chegou, disse que vai botar uma compressa de água morna para eu deitar em cima. Minhas costas estão demais. Se for como da primeira vez que ocorreu, vou passar uma semana sentindo essa dor. Coisas da vida, é aceitar e suportar. Mandei o discurso de Bolsonaro para a minha mãe ler. Não sei se o fará. Tanto faz, em verdade. Eu pelo menos dormirei com dor nas costas e a consciência limpa de não ter apoiado o ser. Queria tanto falar com o anjo, mas esperarei. Tenho todo tempo que a existência me concede. A frase de Ju ainda ecoa dentro de mim e ter vindo quando falo do meu lado afetivo é estranho e errado. Pensei em mandar um WhatsApp dizendo que o carinho é recíproco, mas não o farei, não sei que interpretação ela teria e não quero abrir margens. É algo desnecessário em nossa relação. Não estou com vontade de escrever, acho que vou comer e me deitar. Não quero isso também. Não ainda.

21h39. Interessante como a dor atrapalha o raciocínio, o constante desconforto, meu corpo gritando que não é mais o que costumava ser.

22h37. A Gatinha me ligou. Foi bom, é bom ouvi-la, sabê-la, sempre. Estou mais despretensioso em relação a vida, já não me importa mais ser escritor, importa apenas escrever. Se é válido ou lixo não cabe a mim julgar, nem me importa mais o julgamento alheio. Tenho em minha cabeça que nunca serei publicado e tal constatação já não me afeta ou frustra como antigamente. Em verdade tenho vergonha de como me apresento no Diário do Manicômio. Talvez hoje seja um pouco mais do que fui, devo ser, errar e reconhecer os erros é crescer. Acho que consegui rever alguns e não mais os cometo. Não sou uma pessoa exemplar, longe disso, nunca o serei, mas estou contente com a minha humilde pequenez. Queria muito, muito, muito ter uma namorada jovem, gata e legal, mas eu não sou jovem gato e não sei se sou legal, logo a probabilidade de isso acontecer é mínima. Nas redes sociais quase tudo é política e toda a luta da esquerda é em vão. Pelo menos teremos a consciência limpa de que tentamos e alertamos, restar-nos-á sofrer as consequências. O que mais me dói não é o que fará à democracia e aos brasileiros, mas o que objetiva fazer contra a Mãe Natureza, um dano que será irreparável, irresponsável e burro. Nossa, que desastre.

23h20. Cansei de política por hoje, já tive a minha avalanche de notícias e contranotícias. Aceitação, acho que estou nessa fase agora. Aceitando a vida como ela é. E sendo extremamente grato por ser assim comigo. Acho que o meu lugar no mundo, que é muito peculiar e muito meu, valeu todo o sofrimento pregresso pelo qual passei e me submeti. Estar livre da depressão, da escravidão do trabalho, podendo me dedicar ao meu ofício que tanto amo e que não me remunera economicamente, mas me recompensa das demais formas, é sem dúvida uma existência abençoada. Apesar da dor nas costas, apesar de Bolsonaro, apesar de não ter uma namorada e de abdicar da vida social (não alcanço e cada vez mais distante fica), apesar desses pesares, gosto de quem vou me tornando, gosto de ser e de estar no mundo. Não tenho lá muitas convicções ou opiniões formadas acerca das coisas dos homens e elas não me interessam e se interessam, interessam cada vez menos. Me fecho em mim, me tranco na minha gaiola – o quarto-ilha – onde posso ser completamente livre através do meu texto.

23h46. Vi as top do Tinder e havia um par de mulheres deformadas de tanta malhação, negócio horrível, não me atrai nem um pouco. Eu não vou mentir, o anjo não me sai da cabeça. Pode ser que outra surja, mas eu já desenvolvi afeto por ela. Acho ela especial. Em verdade, acho que é uma patricinha de Boa Viagem sem muita coisa na cabeça, mas é absolutamente linda e parece ser alegre, ter a alma leve e fresca, do frescor que só a juventude proporciona. Ela me encanta. Eu que também sou um desmiolado sem muito na cabeça. Outra coisa que não me sai da cabeça é a liberação do desmatamento da Amazônia pelo odioso. É de uma estupidez tão desmensurada que me faltam palavras, é inconcebível. E pode se tornar um fato.

-x-x-x-x-

12h11. Depois de devidamente acordado pela minha dose matinal de café e nicotina, venho me pôr à disposição das palavras. A dor nas costas melhorou sensivelmente, mas está longe da normalidade. Acordei pensando em garotas. A declaração de Ju ainda encontra eco em meu peito, acho que pela imensidão da minha carência. Mas não posso nem vou confundir as coisas. Mal começo e já me encontro sem assunto.

13h22. Postei um monte agora no Facebook para protestar sobre Bolsonaro. É uma situação calamitosa a que vivemos.

14h27. Fiz um elogio sincero à Portuguesinha, gosto de fazer elogios sinceros às pessoas, por outro lado, tenho imensa dificuldade em fazer críticas, não me sinto autorizado ou com envergadura moral para criticar ninguém. Acompanhar ciberneticamente o dia-a-dia da Portuguesinha é algo que me traz enorme satisfação, me dá a falsa sensação de proximidade e me deixo iludir por isso.


16h08. Embebido na política novamente. É a campanha de mais baixo nível que já presenciei, o que demonstra o nosso nível de civilidade. Estou com vergonha do Brasil, não o reconheço como a pátria que eu amo, a mim me parece um monstro desfigurado moralmente. Mas sou um ser ignorante politicamente, não entendo de política e acho uma profissão ingrata no país. Sigo acreditando que é preciso ter uma alma muito nobre para não se corromper com o poder. Eu não sei se eu teria essa lisura de caráter, creio que não, tendo em vista todos os malfeitos que já cometi em minha vida. Sou uma pessoa um pouco diferente hoje, é verdade, e seguirei me lapidando no que for capaz, mas não afasto de mim o risco de ser corruptível. Minha reputação não é nada ilibada e cometi diversas atrocidades morais das quais me arrependo e que não pretendo repetir, mas cuja própria existência deixa margens para novos erros. Não quero poder para além do que é meu e de mim. Até gostaria de ter o poder de seduzir uma garota que me interesse (e penso logo no anjo do Tinder), mas aí paira a minha incompetência social com o sexo oposto. E como sou incompetente nesse aspecto e como me é custosa tal incompetência. O preço é a solidão. Pago reclamando o mínimo que posso e não tenho outro a quem cobrar senão a mim mesmo pelo meu absoluto fracasso. Me conforto está em já ter amado muito e profundamente e de ter experimentado todos os ônus e os bônus do amor. Amei. Posso dizer com absoluta convicção. Absorvi e compreendi o amor, sei o que é, do que se trata, o que traz e o que deixa. E acabou-se a terceira página. 

domingo, 21 de outubro de 2018

COMO QUE ILUMINADO



15h58. Recebi duas notificações do Tinder, de duas garotas diferentes. Vou investigar. No mais acordei tarde hoje e recebi uma carrada de protestos e ameaças da minha mãe, as que mais me assustaram foi a de trocar de psicóloga e psiquiatra. Não vou trocar de psicóloga, o que minha mãe não parece entender é que não há psicóloga que vá me transformar na pessoa que ela deseja que eu seja, simplesmente porque eu não sou nem quero ser essa pessoa. Ela acha que eu estou obcecado por aplicativos de paquera, eu os tenho usado como último recurso para conhecer alguém que me agrade levando a vida de ostracismo que voluntariamente levo. Se tenho fixação é por uma garota específica, o que outras pessoas chamariam de paixão (bastante platônica até o momento). A medida que o tempo foi passando, minha mãe foi se acalmando e agora repousa antes de encarar a aula que vai ter que preparar. Vou ver o que o Tinder me trouxe.

16h16. É uma supergata, do tipo que me intimida mais do que me atrai e ela mandou a mensagem “Vielas”, não sei se isso é bom dia ou olá em outra língua, sei que respondi “ruas estreitas”. Hahaha. Não acho que isso vá para canto nenhum. Até porque demorei a responder.

16h34. Fui atender ao chamado da natureza, que não me deixa esquecer que sou um bicho, colocar Coca e fumar um cigarro. Nenhuma resposta da supergata. Perguntei o que ela achou de interessante em mim.

16h40. Apareceram novas garotas no Tinder, dei um superlike em uma. Não acho que vai rolar. Não acho que o Tinder é o caminho e infelizmente ainda só tenho olhos para o anjo. Vou colocar a lista 6 do começo.

16h44. Estou sem muita inspiração, mas seguirei a perseguir palavras porque não há mais nada que me apeteça. Estou cansado de política, as redes sociais são dominadas pelo assunto, cansa. Já se sabe o resultado do pleito, já se sabe muito bem quem o novo presidente é como pessoa, medíocre, preconceituoso e autoritário. Vai ser bom para o amadurecimento político da nação. Para o meu amadurecimento político. Eu que sou um néscio politicamente falando. E em outros muitos aspectos também. Não tenho vergonha da minha ignorância. Tenho vergonha do meu bucho e do meu pau pequeno, o que mostra a exata dimensão da minha ignorância. Vou mergulhar um pouco nos Instagram. Em verdade vou ver se o anjo postou uma nova foto. Ou a Portuguesinha alguma de suas histórias.

16h58. Nada, só minha ex-madrasta postando incansavelmente posts em defesa de Bolsonaro e pouco mais que isso. Acho que vou fumar outro cigarro.

17h09. Não estou com vontade de nada, basta-me existir apenas. Parece pouco e é. Mas estou começando a me acostumar a ter só isso. O tédio não me acomete e isso para mim é o suficiente. Em verdade, não entendo como não me acomete, mas prefiro não entender e não o sentir. Não estou nem com saco de pensar no anjo. Quero apenas estar, me basta ser e estar. É quase um estado meditativo. Essas coisas esotéricas me lembraram o cara da massagem. Confesso que não tenho o menor interesse em me submeter àquilo de novo. Se há uma coisa que deseje? Ver o Batman branco que encomendei. Afora isso, nada. Qualquer mudança na minha atual condição me gera desconforto. Estou extremamente bem existindo por existir nesse momento, tomando minha Coca Zero e fumando os meus cigarros com minha mãe dormindo. Tudo na mais perfeita paz e harmonia, todas as minhas necessidades satisfeitas. Até estranho que não sinta tédio. Talvez a medicação tenha começado a surtir efeito. Ou eu realmente estou em paz com a existência no momento. Quando penso na existência, a imagem que me vem é a de uma nébula. Engraçado, nunca tinha parado para reparar nessa visão platônica minha. Grandiosa, para dizer o mínimo, e mesmo assim uma fração insignificante do universo, por mais que ache que nada no universo seja insignificante, tudo tem seu sentido de ser, seu papel. Vou pegar mais Coca e fumar.

17h35. Não sinto necessidade de nada e isso me traz uma bem-estar singular. Não preciso, não anseio, não há vazio, estou e me sinto pleno. Não há aperreios, estresses, angústias, incômodos. Só o contentamento de ser eu comigo mesmo nesse momento, acho um estado muito raro de alcançar e me surpreendo com ele. Não sei como cheguei até aqui nem quanto tempo vai durar. Björk no som me completa e repito, não preciso de mais nada. Como investigar esse estado? Quais as causas? Não sei e sinceramente não importa, nada mais importa além de estar aqui e agora. Pensar no futuro gera desconforto, quero sorver o presente, o agora, o que virá, virá, o que tiver de ser será, não há nada que eu possa fazer, o fluxo da existência é mais poderoso que eu, o controle é uma ilusão. Sou apenas um conjunto de átomos que se dá demasiada importância. Um ser que finge ser especial, que se acredita especial, sou poeira cósmica complexamente estruturada pelo acaso-destino tentando fazer o melhor dessa condição sui generis e efêmera. Assim como Bolsonaro e Haddad. Postei tal constatação no Facebook. Achei que deveria, segui o impulso que me veio. Minha mãe acordou e continuo em paz. Que paz gigantesca e absoluta experimento. Se for por causa da medicação minha profunda gratidão a ela e pelo acesso a ela. Mas acho que há um algo mais hoje, como houve ontem. Só que hoje o contentamento é maior, a paz é maior. É um prazer existir assim, sem expectativas ou desejos, momento a momento.

18h14. Me perdi no Facebook. Não deveria, mas já foi, passou. Tenho que compartilhar com a minha mãe da minha paz grandiosa e bela e inexplicável.

18h23. Ela estava ao telefone com o meu padrasto o que me deu uma luz sobre o que experimento nesse momento, é como se tivesse me desligado da minha humanidade, como se, através dela, eu aceitasse o que sou e o que não sou, que sou um fluxo do universo, me sinto em completa sintonia e harmonia com o universo, com a existência. As questões humanas, as neuroses humanas perdem o sentido nessa visão ampliada, elas me parecem como que ilusões, delírios, abstrações (que deveras são) e que não me importam ou me incomodam nesse momento. Parecem coisas pequenas e insignificantes, a paz e o desapego são mais importantes que qualquer outra coisa, a aceitação das coisas como são é o mais importante, a gratidão por esse momento é mais importante e a gratidão que sinto é imensa. Até o amor me parece algo menor, a paz é maior que o amor, é realmente uma sensação curiosa, de desligamento, de liberdade, de grandeza na minha imensa pequenez. Minha pequenez é bela, como é bela uma pequena pérola. Não sei quanto tempo esse estado vai durar, não sei quando aterrissarei desse estado, mas queria continuar planando indefinidamente. Sei que isso não durará para sempre, que pode ser um rompante de mania (é sempre o que penso e desconfio quando estou bem). Só tenho um desejo: comprar mais Coca porque a que tenho está no fim. Afora isso não desejo mais nada. Minto, desejo continuar carregando essa sensação de paz comigo e com tudo o que há enquanto me for permitido. Me lembra muito o sentimento de “nirvana” que experimentei em um delírio de cola, só que agora completamente lúcido. Só preciso de mim e do que me cerca, não preciso que nada venha e que nada parta. Permanecer assim é o que me interessa. Acho que já redundo, mas que redunde, esse momento é completamente meu, a existência me deu esse presente e agradeço. Obrigado universo por permitir minha existência com a consciência dessa forma.

18h56. Aceitação. “Não tem jeito, Bolsonaro vai ser presidente. É necessário para o amadurecimento político e democrático do país. As lições mais duras são as mais difíceis de serem esquecidas”. Postei no Facebook e saí. Entrei no meu Facebook de bonecos, preciso de um pouco de fantasia.

19h11. Minha mãe veio falar para eu deixar o Diário do Manicômio de lado, esquecer do assunto. O livro, nesse agora que experimento, me parece uma ilusão. O meu próprio eu me parece uma ilusão que permite ao animal Mário existir na sua condição de homem. Tudo parece distante e irrelevante. Só o momento importa. O momento e a paz do momento. Falei da paz que estou sentindo para a minha mãe e ela não pensou duas vezes em dizer que era por causa do remédio. Que seja, me importa a transcendência do momento, não suas causas. Pensei novamente no massagista e quero desistir dele. Não faz sentido para mim. Não me agrada, não quero. Voltando ao livro, acho que só iria me ferir com a sua publicação. Nada mais vou fazer em relação a ele. Os estragos já estão feitos e não sei se conseguirei desfazê-los. Isso abala a minha paz, o futuro abala a minha paz. E o livro está entregue ao meu tio que tenho convicção que não tomará atitude para publicá-lo, então fico mais tranquilo. É algo que teve seu momento e que passou. Não sinto necessidade de me reconhecer escritor. Isso é outra ilusão, fruto do egoísmo e da egolatria. A Coca acabou e minha mãe consentiu em me financiar mais uma. Vou de café enquanto isso não acontece, mas não agora. A garantia do café roubou a urgência que me tomava. Não devo quase nada a quase ninguém. Devo respeito à minha mãe desde que ela me respeite em retorno. O retorno independe de mim. Não estou preocupado com retorno. O momento é maior que qualquer desejo. O momento é de não-desejar. De viver e apreciar essa extraordinária condição. Esmiuçá-la em palavras ouvindo Björk no meu quarto-ilha é tudo o que preciso. Penso no anjo do Tinder, na sua beleza extasiante para mim. Beleza que nunca se entregará a mim. E, se a solidão tivesse sempre o aspecto que agora possui, não me faria falta nenhuma. Seria indescritivelmente bom e belo tê-la deitada na minha cama, mas a possibilidade inexiste, não é o que a existência quer para mim. Só me resta ter a humildade de aceitar. Se eu não faço nada para mudar, não há como as coisas mudarem. Simples assim. Tenho medo que mudem. Simples assim. Dono dessa paz, para que mudar? Hoje é um dia especial. O celebro fazendo o que usualmente faço. O que parece sugerir que faço a coisa certa. Se me agrada e não fere a mais ninguém, não há erro. Vou no café e cigarro.


19h55. Meu amigo jurista não gostou da colocação sobre Bolsonaro que eu postei no Facebook. Disse-lhe que continuasse a lutar, eu joguei a toalha, pois acho inevitável. E porque tal assunto não me importa agora. Arcarei com as consequências das escolhas do meu país. Não estou com o espírito de combate, só quero paz e tenho paz no momento, estou num momento muito meu, não estou pensando em mais ninguém, só na maravilha que é a existência, é tão raro esse alumbramento, não quero que a disputa presidencial o atrapalhe. Vou comprar a Coca, mamãe já me deu o dinheiro. Não, não agora. Dentro em breve. Não quero sair do quarto-ilha, não quero abandonar as palavras. Se bem que estou sem ter o que dizer. Já me repeti demais. 

sábado, 20 de outubro de 2018

APLICATIVOS DE PAQUERA

22h05. O anjo do Tinder está online no Instagram e nada de ver as minhas mensagens. Coloquei até um “Não leia!” como última mensagem para ver se avivava sua curiosidade, mas não surtiu efeito. Volto eu a ansiedade de ficar olhando de cinco em cinco ou de dez em dez minutos se ela visualizou. Eu sou um nada na vida dessa garota. Um nada querendo se tornar um tudo. Tudo é muita pretensão e demasiado sufocante, mas um alguém. Passando por papel de palhaço por uma ninfeta de 21 anos. É isso que 41 anos de “maturidade” me proporcionam. Acho que é porque se tivesse uma chance e ela fosse legal, tentaria não mais largar. Ela envelhecerá bem, tenho para mim. Embora tenha medo que pela cultura, vá se meter a fazer plásticas desnecessárias ao invés de enfrentar a idade com dignidade. Mas agora estou mais poderoso no que tange o Tinder, pois assinei o modo plus por um mês. Talvez outra gata apareça.

22h26. Me perdi vendo a internet e os doze milhões que atrapalham a vida de Bolsonaro pipocar na minha bolha de esquerda.

23h12. Parece que foi fogo-fátuo não vai dar em nada. Seremos governados por um idiota, um completo e perfeito idiota. Nossa, como sou diferente daquela pessoa e como não compactuo com nada que ele defende. Mas isso é a democracia, ninguém aguenta mais PT. É a vida e seguirá sabe-se lá como. Confesso que estou atordoado com a situação e em como o “mito” conseguiu arrebanhar tanta gente, beira a devoção, é uma fé cega que depositam nele, irrestrita e imponderada. É assustador. O injusto é que os que não o apoiaram pagarão a conta também. Mas sempre soube que a vida é tudo menos justa. Se fosse justa, o anjo do Tinder leria as minhas mensagens e puxaria papo comigo. Por quê? Por ser o que mais se dedica a ela. Tenho convicção disso. Mas a vida não é assim e um abismo de 20 anos nos separa.

0h07. Encontrei outra gata no Tinder. Não tão gata quanto o anjo, mas muito interessante, meio maluquete, 19 aninhos, a dez quilômetros de mim. Aumentei o raio de abrangência do Tinder em dois quilômetros.

2h10. Baixei o Adote um Cara, não tinha ninguém próxima a mim. Baixei o Badoo com problema para mostrar as fotos. Acho que é melhor ficar no Tinder mesmo, já conheço a interface e assinei por um mês. Baixei o vídeo do U2 em VR para usar nos óculos que o meu padrasto me deu, o que é uma viagem, e baixarei mais, é porque a bateria está muito baixa.

3h06. Fiquei até a bateria acabar no Badoo, dei um monte de crushes no aplicativo e espero que eles funcionem como superlikes no Tinder. Ninguém ainda à altura do meu anjo, mas havia algumas interessantes. Isso vai me divertir bastante amanhã. E há muito mais opções que no Tinder. Obviamente nenhuma manifestação do anjo até o presente momento. Agora só saberei quando a minha bateria carregar, ou seja, quando acordar.

3h40. Boas notícias, advindas de dois e-mails, um foi do fabricante do Batman com suas precisas dimensões a outra foi que alguém me mandou uma mensagem pelo Tinder. Nessa última é mais difícil de acreditar porque já recebi mensagens de mesmo teor e não havia mensagem nenhuma. Bom, ficará para amanhã. Apliquei o golpe no MOAF uma vez mais. Não sei se colará, como não sei se o anterior também irá passar despercebido. Time will tell. Estou curioso a respeito da mensagem, mas não o suficiente para ligar o meu celular agora, pode ser a garota de programa na qual cliquei sem querer e dei um superlike. Coisas de principiante.

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14h05. Não era ninguém no Tinder. O anjo me perguntou o que era “acompanhante” a respeito da garota de programa que deu like em mim, informação que reparti com ela porque me apetece me repartir com ela.

15h33. Falei um monte para o anjo agora (para variar). Tentei mostrar que o babaca aqui tem sentimentos. Fui muito malsucedido.

16h03. Ela demora um século para ver as minhas mensagens.

23h16. Abri o jogo todo para o anjo, falei as três palavrinhas, disse que esperava quatro anos até ela ter maturidade, a merda toda. Desabafei. Falei tudo o que ia na minha cabeça a respeito dela. E, para variar, ela demora em ver. E se vir, provavelmente nada vai dizer. Meu amigo jurista quer que eu faça umas memes contra Bolsonaro. Vou ajudá-lo. Vou é comer.

0h08. Vou é dormir.

1h44. Fiquei a cismar na cama até agora tentando dormir sem sucesso. Tenho toda a minha alma voltada para o meu anjinho amado. Ela nunca vai querer nada comigo, nem hoje, nem daqui a quatro anos, nem nunca. Mas uma esperança em mim, uma vontade plena de dar amor a ela me toma.


Anjo. Boca mais linda. Tudo mais lindo.



2h01. Depois de ter desejado boa noite a ela quando me deitei, mandei agora uma mensagem dizendo que não estava conseguindo dormir depois de tudo o que falei. Nossa, como é bom dizer “eu te amo” para a garota por quem se está apaixonado. Não faço isso há tanto tempo que havia me esquecido do prazer, da satisfação, da alegria e do frio na barriga que é repartir um sentimento tão bom à pessoa a que se destina. Pena que não vá mudar nada, continuarei a escrever no quarto-ilha, na solidão até o final dos meus dias. Ao menos não posso me culpar de não ter tentado. E continuarei tentando se assim ela me permitir. Percebo que ela prefere coisas mais agressivas e polêmicas. Embora essas estejam em falta. Não sei como colocaria pimenta no meu molho.

2h37. Meu amigo jurista fez um texto muito bom sobre a proposta de Bolsonaro cortar direitos do trabalhador com a inserção da carteira de trabalho verde e amarela.

3h14. Levei uma cortada pesada do anjo. Agora é que que a ficha caiu! O “nc” que ela colocou deve significar “no chance”. É melhor eu me conscientizar da dura, cruel e previsível realidade. Ela disse que não estava “afim” de conversar e inventou qualquer desculpa. Respondi que só iria falar com ela depois da eleição mas a água do balde foi tão fria que tenho as minhas dúvidas. Enquanto isso vou aproveitar a minha assinatura do Tinder plus (onde raramente tem aparecido alguém...).

3h47. Assisti a análise de uma pesquisa do Datafolha na GloboNews que parecia ter sido encomendada para ver qual o grau de aceitação que uma ditadura teria no Brasil, com perguntas como “você aceitaria que o governo matasse sem julgamento” ou que “se o governo utilizasse a tortura para colher informações” ou ainda “que o governo fechasse o congresso” e outras que agora me escapam, só sei que não me desceu bem tal enquete e não entendo as motivações para tal, ou melhor, entendo muito bem, o que é mais terrível.

4h05. Hora de dormir. Estou gordo. Eu sou um nada para as mulheres. É uma situação miserável a minha.

4h18. Fumei um cigarro e relaxei mais. Se não me quer, quem está perdendo é ela. Eu cá perco também, mas perco menos. Vou me deitar.

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16h56. Acordei há algum tempo, estava a tomar café, meditar e despertar. Obviamente o anjo me veio à cabeça, dessa vez com uma dose de desencanto que pensei doeria mais. A Portuguesinha me questionou sob a colocação sobre ela no post anterior e respondi. Me sinto sozinho hoje, desprovido de esperanças afetivas. Meu amigo que mora no Canadá, amigo de adolescência, que é contra o PT, me mandou uma entrevista para assistir. Assistirei.

19h41. A entrevista foi boa, ponderada, mas inconclusiva. Não trouxe nada de novo para mim. Eu confesso que estou menos amedrontado a respeito de Bolsonaro. A principal coisa que me preocupa não é nem sua inépcia ou seus preconceitos, mas o descaso, o desrespeito com o meio-ambiente. Estou menos apavorado em relação a um golpe militar.

20h03. Hoje não quero nada, nem namorada. Hoje eu queria me deitar e ficar deitado, mas sei que isso não seria o mais saudável a se fazer. Pensar que é um sábado só piora as coisas. Estou com pouca energia, desmotivado, desinteressado. Acho que ainda é a rebordosa do anjo. O que é uma idiotice, meu coração está todo errado. Não quero que o Diário do Manicômio seja publicado. Meus sonhos são grandes idiotices que só me fazem mal. Gordo, velho e cada vez mais idiota. Escrevendo cada vez pior. Não acho que esteja tendo um dia ruim, acho que estou tendo um dia nulo, sem sentido ou significado especial. Não estou angustiado ou entediado. Eu não estou nada, nulo como o dia.

20h52. Me prometi não falar com o anjo até depois da eleição, mas isso não impede que eu comente as suas fotos. Não sei por que me passo por esse papel ridículo. Aliás, sei, quero me fazer presente em sua vida, por mais que ela tenha me mandado um fatídico “nc” ontem. Não sei se deseje boa noite a ela como costumeiramente faço ou se mantenho o silêncio. Manter o silêncio é melhor.

21h39. Mamãe pediu chinês para o almoço-jantar. A Coca vai acabar. Tentei ligar para o meu amigo da piscina que parece estar com raiva de mim e ter me bloqueado do WhatsApp porque acha que eu mandei um vírus para o seu celular; ele não atendeu.

22h35. Acho que não sou um bom partido, caso fosse não estaria só. Os fatos falam por si. Combinei com mamãe que só compraria Coca amanhã, a que tenho está no fim, bem no fim, nem sei se dá mais um copo.

22h46. Me perdi no Instagram. Incrível como garotas podem transformar os hábitos de uma pessoa. Hoje é a rede social que mais uso. E acho interessante, bacana. Não cheguei ao ponto de criar stories nem pretendo, por mais que uma curiosidade me cutuque, não tenho conteúdo para compartilhar por esse meio. Nossa, sem a mínima inspiração, um dia desperdiçado de vida. Sim, eu sei, fui eu quem escolheu desperdiçá-lo, talvez houvesse um zilhão de coisas interessantes para se fazer, mas não estava nem estou disposto a nenhuma.

22h57. Vi uma foto da boca do anjo, que desenho mais perfeito da natureza. Fiquei hipnotizado pela imagem. Vou fumar e pegar o resto da Coca.

23h08. Estou com vontade de fumar outro cigarro. Eita, a terceira página acabou. Vou fumar, revisar e postar.


23h33. Se eu tivesse dinheiro e espaço na parede, eu comprava essa arte da Mística para colocar ao lado da minha da Mulher-Aranha. O conceito é o mesmo, da fusão da cor de fundo com as das personagens. Iria amar mas não pode ser.