sábado, 19 de janeiro de 2019

RESTAURADOR E BLANKA


6h09. Despertei antes da hora. É um momento agradável para se despertar, principalmente porque raro. O dia que se inicia é belo e ensolarado como só dias tropicais podem ser. Meu irmão retornou aos Estados Unidos. Meu primo historiador, que veio tomar conta de Maria ontem (não a delegam a mim com justa razão), elaborou 20 perguntas para eu responder no postanterior (LINK).

15h59. Hoje dormirei cheio de fios, farei um polissonografia do meu sono. Já não posso beber mais Coca ou café ou qualquer coisa estimulante. O restaurador ligou hoje, um tanto chateado pela nossa falta de contato. Eu só acordei agora, pois levantei às 5h e só voltei a dormir perto das 11h, com o telefonema dele, ou melhor, com a minha mãe que coincidentemente chegou ao quarto quando o meu celular estava tocando. Não sei se ele ligou mais vezes, eu estava apagado. Mas isso tudo é papo muito chato. Entretanto são variações da rotina, dão um contexto onde me insiro. Blanka nunca mais deu notícias.

16h17. Mandei um Instagram para Blanka, ela disse que fala comigo à noite. Meu coração esquenta e derrete. Ai, ai, sou bobo mesmo.

16h35. Pedi a mamãe um café, ela concordou e fez uma xícara de expresso. Delícia. Depois disso, só água, saco. Talvez o suco de morango que ela abriu. Vou acender a luz e botar um som. The Cure. Maria não fez a cirurgia para a retirada dos caroços hoje, mas ela e titia não estavam em casa para me dar mais informações. Várias esperas se acumularam desde que acordei: o restaurador, Blanka, Maria, fora o exame do sono que já me esperava desde antes de eu me deitar. Minha prima aparentemente não viu a mensagem que a mandei ainda ou viu e configurou o WhatsApp para não mostrar quando as mensagens são visualizadas. Acho que isso é possível de se configurar no aplicativo. De toda sorte, o não está embutido no post que compartilhei e, por conseguinte, na mensagem enviada. Incrível como os Barros têm muito mais desenvolvido o hábito da leitura que os Gonçalves. Inclusive entre os da minha geração. Já li, pero non mucho, hoje me apetece escrever e escrever somente, me falta paciência e interesse para textos alheios. Tentei ler O Mundo de Sofia, um carinhoso presente de uma pessoa querida, mas empaquei. Coloquei o som no volume 10, o padrão para mim e sinto que minha qualidade de vida aumentou com o volume. A familiaridade, por vezes tediosa, no mais das vezes, querida. Tive uma ideia para um jogo de implementação fácil e focado em VR que queria passar para o meu irmão. Chamar-se-ia Kaleidoscope 3D ou VR.  E seria exatamente isso: um caleidoscópio onde pedrinhas da mesma cor e tamanho teriam profundidades diferentes, algumas saltariam muito da tela outras menos e assim sucessivamente, quando o usuário mexesse a cabeça, as pedras se misturariam de acordo, formando novas figuras e seria possível tirar fotografias 3D das imagens formadas. Simples, belo e que faz bom uso dos recursos dos capacetes de realidade virtual. Ou assim quero crer. Pode ser que seja uma ideia idiota, sei lá. Vou postar esse trecho da conversa no WhatsApp do meu irmão e ligar para ele dizendo que o fiz. Quem sabe ele não enxergue potencial e desenvolva o jogo.  

17h30. Está feito, entregue às mãos do meu irmão, do acaso-destino. Cutuquei a existência, gosto quando faço isso, meus textos são cutucadas muito irrelevantes, inexpressivas, embora sejam a minha forma de expressão maior. Minha mãe deu uma ideia para o projeto, quando o reparti com ela, que achei muito pertinente, desenvolver conjuntos de “pedrinhas” diferentes, temáticas para o caleidoscópio, o exemplo que ela deu foram flores. Sugeri a meu irmão que adquirir os demais conjuntos ou versão “full” do jogo fosse uma experiência paga, para tornar a empreitada lucrativa para ele.

17h46. Sem inspiração. Vou ao cigarro.

18h46. Fui ver Maria e saber porque não arrancou os caroços hoje. Descobri, mas a razão é demasiado enfadonha para explicá-la aqui. Estava contente com o sapato que ganhou da minha tia-vizinha, embora tenha ficado com um preto, que não lhe cabia, na cabeça.

 “Não sei quanto a ideia do jogo... tenho que pensar a respeito”. Foi a resposta do meu irmão. Tenho uma sensação estranha de que está se distanciando de mim. Espero que seja ilusória. Mas sinto – e novamente podem ser só caraminholas da minha cabeça – um ranço, um repúdio dele em relação à minha pessoa. Isso me fere, essa impressão que talvez nada tenha de real. Talvez seja mais uma forma que meu sádico ego arrumou de me maltratar. Estou com sono e calor. Nada posso fazer em relação ao sono até os fios chegarem, o calor é facilmente solucionável basta apertar o botão azul do controle branco.

19h23. Vou me deitar. Tentar um último cigarro antes de ir.

19h33. Mamãe foi redondamente contra a ideia de eu me deitar. Tentarei não sucumbir ao sono. Vou para o maravilhoso mundo dos bonecos.

22h22. Acordei para ir no banheiro, comer e fumar. Não estou conseguindo dormir direito, menos pelo aparelho e mais pela hora em que me deitei, muito mais cedo que o habitual.

22h41. Volto a tentar dormir.

1h44. Acordei por biscoitos e porque o sono me fugiu de novo.

6h06. Acordei para comer e fumar

11h51. Acordei definitivamente.

13h07. Fiquei conversando com a empregada da minha tia-vizinha e Maria. São primas. Maria volta amanhã para Natal. Estou ainda pela metade, não despertei propriamente e meu despertar é pleno de desgosto por existir. Tomo café recém-feito e fumo.

“[15:18, 1/17/2019] Mário Barros: Não vai rolar tirar os caroços de Maria agora, pois, devido à idade, o procedimento tem que ser feito num hospital e, para isso, é necessária a permissão do plano. Ela voltará a Natal amanhã com titio, que vai a uma missa de sétimo dia lá.
[15:21, 1/17/2019] Mário Barros: Estou à espera do restaurador. Ele disse que chegaria por volta das 15h. As bonecas já estão todas dispostas na mesa da sala, nem o machado, nem as flechas, nem a espada foram danificados, pude averiguar agora. Mais uma vez obrigado, amado irmão.”





15h27. Passei um bom tempo conversando com Maria e a prima na casa da minha tia-vizinha. Voltei porque o restaurador está prestes a chegar. Preciso ficar atento ao interfone.

16h23. Nada do restaurador. Mamãe – e eu concordo – acha que a reparação tem que ser realizada aqui em casa.

16h26. Acabei de ligar para o restaurador que disse que está chegando. Blanka criou uma conta do Instagram para falar comigo. Disse que está ausente porque está cuidando de si, está enfrentando uma crise depressiva e a compreendo. Mamãe vai achar que é mentira, mas ela havia mencionado sobre a questão na grande conversa que foi o nosso último encontro.

18h34. O restaurador cobrou um preço super em conta para reparar as três peças danificadas, seriam muito mais caros tais serviços no exterior. Blanka me respondeu e disse que tinha o dia todo para falar comigo.

20h46. Fui comprar Coca na pizzaria e um bróder de lá me perguntou sobre Blanka. O que significava. Expliquei que era a minha paquera de 19 anos. Por sinal, vamos nos encontrar amanhã, ao que tudo indica, para assistir Glass no Plaza, comer pastel na Praça e tomar um sorvete para conversar sobre o filme. Queria tanto poder beijá-la, no entanto não sei se será possível, pois está com um furúnculo ou coisa que o valha estourado no rosto e está dolorido. Bem, veremos. Descobrirei.

21h37. Já estou com os ingressos para o filme comprados e impressos. O desejo que surgiu da conversa com a minha tia caçula está próximo da realidade. A realidade é que não sei como me aproximar de Blanka, como alcançar o seu afeto. Mamãe acredita que nunca conseguirei, eu sou um pouco mais otimista e persistente. Blanka foi jantar e arrumar a casa, quando for deitar volta a falar comigo.

22h08. Comi e isso geralmente me dá sono, não sei aguentarei esperar por Blanka.

3h56. Disse a Blanka que ia me deitar e acabei vagando pelo maravilhoso mundo dos bonecos até agora. Vou dormir, senão posso melar tudo amanhã.

-x-x-x-x-




23h19. Eu tive um dia diferente e especial. Comecei acordando atrasado. Fui ao Manicômio pegar receitas para as minhas medicações, depois fui tosar os pelos da cabeça. Me aprontei e enfim o momento mais esperado, o encontro com Blanka. Apresentei-a ao pessoal da pizzaria, alimentamos os peixes e tartarugas da Praça de Casa Forte, andamos de mãos dadas até o shopping, um deleite há muito desejado por mim que adoro andar de mãos dadas com a razão dos meus afetos. Conversamos e surpreendentemente ela falou mais, outro deleite, adoro saber dela. Assistimos Vidro (recomendo vivamente a quem for assistir que veja antes Corpo Fechado e especialmente Fragmentado, que acho o melhor dos três e que perde muito do seu elã se Vidro for visto primeiro). Fiquei com pena de Blanka, que não havia visto os predecessores e ficou a ver navios na primeira meia-hora de filme. Saí do cinema me urinando e louco para fumar, vontades do corpo empatadas, mas como Blanka também queria ir ao banheiro, acabamos fazendo a escolha certa. Ainda comemos pastel na Praça e depois sentamos num banco do bucólico local para conversar, outro sonho meu, que sempre via os casais se curtindo lá e me indagava quando a minha vez chegaria. Bem, chegou, foi rápida, mas foi outro deleite. No final roubei um selinho de Blanka que, fechada como é estranhou o gesto e entrou no Uber. Voltei para casa contente de ter vivido a vida em grande amplitude de situações num dia para mim diferente do senta-fuma-bebe-algo-negro-escreve. Ela é uma pessoa que se diz de difícil socialização e de fato é, mas estamos seguindo sei lá para onde ou o quê. Queria muito poder levá-la para Gravatá nesse domingo, mas sei que não é o momento nem a ocasião, ademais está com um furúnculo nas partes íntimas, dificilmente poderia desfrutar da piscina aquecida, onde pretendo passar a maior parte do meu tempo. Em verdade, tenho monte de carinho represado para dedicar a ela, mas fico acanhado porque ela parece um bicho do mato em relação a isso. Espero que, aos poucos, se o tempo me for concedido e as oportunidades acontecerem, eu consiga habituá-la a receber os meus afagos. O tempo dirá. Eita, entrei na quarta página. Uma última frase. Blanka me faz bem, quero fazer o mesmo por ela. Somos muito parecidos no isolamento do mundo e nas relações cada vez mais pontuais e curtas com os demais e somos diferentes em tudo o que tange amar e num monte de outras coisas. Descobrimos mais diferenças que semelhanças a cada novo encontro, mas isso não me desestimula ou me faz descrente, tudo é possível. Escolhi a trilha mais difícil, para muitos, um espinhoso caminho, mas dizem que os caminhos mais difíceis levam aos lugares mais belos. Veremos.  

2 comentários:

  1. Infelizmente dps de 2 anos estou lendo isso, tudo que você falou é verdade sou uma pessoa muito difícil para socializar hoje em dia bem mais que antes.. Desculpa não ter priorizado nossa relação eu era bem mais nova do que você pensava eu tinha 16 anos não entendia muito bem oq você queria, terminei priorizando coisas matériais, me sinto culpada por não ter feito diferente, me perdoa

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  2. Não sinta culpa, as coisas são como são.

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