22h27. Este dia não tem mais sentido para mim, não há razão
para permanecer acordado.
22h42. No entanto, não estou com sono e me resta um pouco de
Coca, escreverei até que a Coca acabe. Pode ser que não se dê nada de drástico
com o governo Bolsonaro, nada que subverta a ordem constitucional. Torçamos
para que isso ocorra e que ele faça uma faxina na corrupção de Brasília.
Esperar pelo melhor é sempre mais agradável, mas o meu sentido aranha está
desconfiado desse conto de fadas. Olhei o Instagram agora e nada de novo
aconteceu.
23h23. Incrível, não consigo me desligar do Facebook e da
briga política, me estranho por estar tão engajado, não é do meu feitio e nunca
foi. Acho que porque agora toca nas minhas feridas, mexe com conceitos
basilares de civilização, de civilidade e humanismo (embora nem saiba o que
essa palavra significa em sua completude). Mexe com o ecossistema global, com a
Amazônia. Mexe com muitas coisas que me são preciosas e com outras que sou completamente
contra. Acho que Bolsonaro vai tentar varrer a corrupção do país? Tenho certeza
de que vai tentar. Me incomoda o liberalismo econômico? Não entendo de economia
o suficiente, mas garantidos os direitos do trabalhado não tenho nada de
objetivo ou subjetivo contra. Todo o resto me incomoda, entretanto. E tem muito
resto.
23h38. Estava namorando o site da Sideshow. Só há uma peça
que me interesse no momento, mas esperarei a reforma do quarto. Até porque
quero o Azure Dragon e não decidi qual das duas é mais importante para mim. Não
tenho e não farei dinheiro para ambas, eu assumo. Os itens que coloquei à venda
no eBay não estão saindo, emperraram. A Coca acabou, esse era o sinal para ir
dormir.
0h26. Não estou com sono e estou bebendo água. Vou fumar
mais um cigarro e encher o copo.
0h35. Meu irmão certa vez comentou que seu primogênito lhe
lembrava a mim. Não lembra mais porque a lembrança que ele tem é de outro eu
que não mais sou. O eu extrovertido, conversador e brincalhão deixou se ser, se
perdeu no emaranhado de mim. Tornei-me mais sério, mais grave, mais sereno. Não
sei se isso é bom ou é ruim, sei que gosto de ser quem eu sou e estar onde
estou, antes não gostava. A idade vem me trazendo maior paz comigo mesmo, os
embates entre o superego e o id são menos violentos e menos constantes. Entro
num ciclo de paz com o mundo e suas dores. É um momento salutar por mais que a
timidez e a esquiva social tenham se tornado parte desse eu que agora construo.
Não digo que sejam condições definitivas, mas me agrada o isolamento com as
minhas palavras. A solidão ainda fere e se me foco nela e ponho o dedo nessa
ferida, ela lateja um misto de frustração e desilusão. De falta de esperança
nesse âmbito. Não a perdi por completo, mas vejo o prospecto de realização
dessa esperança cada vez mais distante de mim. Serei só, é o que penso.
Permanecerei só, é o que meu coração me diz. Morrerei só, é para aí que a minha
vida aponta. Mas não quero cutucar a ferida agora, não preciso sofrer desnecessariamente,
me impingir sofrimento. Eu mereço mais que isso de mim. Eu mereço um pouco de
amor próprio e respeito próprio e acho que venho alcançando isso durante a
calejada existência que o universo me outorgou por forças as mais misteriosas.
Não entendo por que mais um escritor não lido no universo. Não sei qual a
relevância da minha existência para o esquema maior das coisas, para a
sociedade na qual estou inserido quase sem estar. Talvez exista para explorar
toda a liberdade magnífica de ser eu, ser da raça mais inteligente do planeta.
Certamente não vim parar aqui para ser um reprodutor ou assíduo do sexo e das
relações íntimas, certamente vim aqui para dar lucro à Sideshow Collectibles, o
que é um grande prazer e que está perto de se esgotar por falta de espaço.
Fumar e água.
Certamente. |
A beleza, a percepção da beleza acho que é a maior maravilha
da condição humana. Todos os tipos de beleza me encantam: gestos, palavras,
natureza, melodias, sabores, texturas, odores, arte, garotas. Confesso que
muitas vezes fico mesmerizado com a beleza, sou arrebatado por ela e fico por
alguns instantes sem ação, me recuperando da fascinação que ela desperta em mim.
É curioso isso e mais do que isso, extremamente prazeroso. A beleza eu diria
que é o que traz luz à minha vida. E há tantas coisas que julgo belas, o mundo
está repleto delas. O lado ruim de ter a beleza como a minha deusa é que sou
extremamente seletivo esteticamente no que tange garotas. Mas não quero entrar
nesse mérito agora. Minha última cartada, que talvez não lance na mesa da vida
jamais, é belíssima. No amor, posso dizer que sou o meu próprio carrasco, sob a
pena de sonhar mais alto do que as minhas asas suportam. Que seja, me aceito,
isso é mais do que poderia esperar de mim mesmo e já percebi que é um processo
contínuo e progressivo. A parte do progresso, mesmo que a passos de formiga, é
o que mais me agrada pois sugere que o melhor ainda não chegou, ainda está por
vir (e nunca chegará, em verdade, ao mesmo passo que cada vez mais me aproximo
do que quero ser e me distancio do que eu não queria ser e vivia a buscar e me
culpar pela minha incompetência, que não era incompetência de fato, mas
incompatibilidade entre as minhas verdadeiras aspirações e as aspirações que
julgava terem a meu respeito). Sou uma pessoa bastante limitada em diversos aspectos
e quase ilimitada em outros. Das minhas limitações não mais me envergonho ou
pelo menos a vergonha é bem menor. E vou comer algo. A fome bate.
2h03. Nossa, como amo o meu Hulk. Uma das melhores compras
que já fiz. Não tem utilidade nenhuma, mas para mim é uma obra de arte e a
utilidade está em si mesma, que é a beleza inerente à figura. Há beleza nos
monstros, nalguns tipos, pelo menos. Há beleza em tudo, se você vir com o olhar
certo. Como dizem, a beleza está nos olhos de quem vê. E eu estou sem saco para
escrever. Queria mandar uma mensagem para o anjo do Tinder, mas me conterei até
depois das eleições, como prometido.
3h24. O maior evento da Sideshow Collectibles está prestes a
começar, o Spooktacular. Não irei
dormir antes de ver o que vai acontecer, estou no site dedicado ao evento que
está em contagem regressiva. Eu tenho uma fixação por contagens regressivas ou
barras de carregamento, não sei o que tanto me atrai, mas gosto de observar os
números e porcentagens se desenrolando para a consecução de algo. Gera uma
antecipação, um frisson gostoso, como quem espera o Natal chegar. Esperar algo bom
que sei ou tenho convicção de que vai acontecer me agrada. É como uma certeza
agendada, esperando o seu momento de germinar. Tomara que lancem uma figura
nova, que geralmente fazem, revelam uma figura por dia, pois, como disse, é o
maior evento anual da Sideshow (afora as convenções, mas mesmo com essas, acho
o Spooktacular maior para a empresa).
Sou fã, tenho até camiseta com a marca. Dezoito minutos para o início, que pelo
visto vai se dar às 4h daqui, justamente quando mamãe disse que iria acordar.
Levarei esporro. Vale a pena, embora esteja ficando com sono. Vai ser rápido, a
revelação de uma nova estátua talvez. Quatorze minutos. Espero que seja uma
revelação bombástica, daria preferência a uma linda garota, aliás, não queria
isso, chega de tentações. Mas queria ver algo novo e impactante. Provavelmente
vou me decepcionar. Veremos dentro de breves minutos. Vou fumar um cigarro, é o
tempo.
4h05. Grande perda de tempo. Nenhum lançamento revelado, um
bando de bonecos encalhados com frete internacional grátis e alguns sorteios.
Espero que quando acordar as coisas estejam mais interessantes. Hoje é dia do
Sideshow Live, mas perdi o tesão de acompanhar. Lá distribuem códigos
promocionais e às vezes revelam lançamentos. Talvez assista hoje, quem sabe, só
para dar uma chance.
4h11. Vou fumar o saideiro e ir dormir.
4h19. Ainda não me sinto disposto a dormir. Quero visitar os
grupos de Facebook do maravilhoso mundo dos bonecos. E lançar a pergunta sobre qual
a última aquisição/encomenda dos usuários.
-x-x-x-x-
14h13. Lancei a pergunta, muitos responderam, mas isso não
me interessa. Minha dor nas costas deu uma piorada sensível durante a
madrugada, mas minha mãe me deu um remédio que a amenizou, estou praticamente
sem dor agora. Estou sem vontade de escrever – ainda despertando –, mas não
estou entediado, graças. O anjo do Tinder curtiu a postagem que fiz com o texto
do biscoito chinês no Instagram. Esse gesto mínimo é o suficiente para achar
que ela presta atenção em mim, que existe um interesse dela pela minha pessoa.
Nada mais distante da realidade. Vou cortar as minhas unhas. Coloquei a lista 6
em modo aleatório.
14h56. Cortei. A melancolia quer se chegar e lançar suas
garras negras sobre mim. Espero que seja passageiro. Vou fumar. Já estou na
terceira página, então esse post não tardará.
15h07. A política parece que exala pelos meus poros. E olhe
que me considero um ser muito pouco político. Muito pouco mesmo. A impressão
que eu tenho é que parte dos eleitores de Bolsonaro são como leões selvagens e
famintos acorrentados, esperando, irrequietos e irritados, que lhes soltem para
caçar. Hoje promete ser um dia menos interessante que ontem. U2 rola no som, In God’s Country. Gosto muito. Às vezes
me bate um medo de ser perseguido, coagido ou acuado de alguma forma por fazer
oposição a Bolsonaro. Minha mãe disse para eu não me preocupar. Às vezes me vem
à cabeça que a única forma de Bolsonaro ter governabilidade é através de um
golpe, o que alimenta o meu temor anterior. Às vezes penso que tudo vai ficar
bem e que serão só cinco anos – se ele mudar a regra da reeleição – e que cinco
anos na minha idade passam rápido. É o tempo de o anjo amadurecer. É o tempo de
muita coisa acontecer. Estou preparado para elas e as aceito, quaisquer que
sejam. Só está passando U2, o que é uma delícia. A existência tem sido bastante
generosa comigo, nada posso exigir dela além do que já tenho e do que me
espera.
16h19. Minha mãe chegou, isso me deixa feliz porque a amo.
Foi um caminho longo e tortuoso para amá-la, mas finalmente me permiti e ela
mudou o tanto que é capaz de fazê-lo no momento. Sou grato por ela ter operado
essa mudança, especialmente em relação à minha pessoa e meus hábitos
peculiares. Realmente muito grato. Ela hoje contribui mais do que rouba a minha
qualidade de vida, presente inesperado da existência. Falo muito a palavra
existência, né? Fato é que não encontro palavra mais abrangente e ao mesmo
tempo mais precisa para nomear o que experimento. Acabou a terceira página.
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