14h54. Hoje é dia de Ju. Acordei com um astral bom, dormi muito, sonhei. Acordei
e decidi
que hoje não vou mandar nenhuma
mensagem para a garota do Instagram.
Isso me faz bem pois me liberta da
ansiedade de uma resposta e não a sufoco
com o excesso de mim. Acho que ambos saímos ganhando. A fantástica faxineira
a achou linda, talvez
tenha razão. Mostrarei a Ju, óbvio.
Por mim repartia com todo mundo, mas acho que é como gravidez, só
se anuncia passados os meses de risco.
Ademais não gosto de contar vantagem. Até porque não tenho do que contar
vantagem. E provavelmente nada terei, mas a esperança
é maior que o derrotismo. O acaso-destino me ofereceu essa oportunidade, farei o que
estiver ao meu alcance para concretizá-la em fato. 15h04. Preguiça de
tomar banho. De 15h15 eu vou. Pode ser
que chegue tarde. Não chegarei, sempre espero uns 20 minutos, meia hora por
Ju. Queria tirar um
selfie com ela para postar no
Instagram, acho que ela não vai
concordar. Também não sei se tenho
coragem de pedir. Vamos ver onde a existência me leva. 15h09. Vou tomar mais um
café com cigarro e tomar banho.
17h38. Voltei, como se faz óbvio. Pedi a foto, mas
Ju não curtiu a ideia. O que ficou
na minha cabeça foi a concepção
dela de que a vida é cíclica, confesso que não vejo
dessa forma, a encaro como uma tortuosa estrada rumo ao
desconhecido, mas gostaria muito de apreender esse conceito de
ciclos. Até entendo que
revisitemos velhos conceitos com
novos olhares, mas não vejo a vida passando pelos mesmos lugares, realmente
não compreendo a ideia
e não gosto de não compreender
algo. Ju achou que as minhas projeções a respeito da garota do Instagram são negras demais. Eu
diria que são realistas. Estou me coçando
para mandar um “oi” para ela, mas não o farei. Só um boa noite, que
quero tornar uma tradição, o que para mim já é. Adoraria que
ela puxasse papo, mas não vai ser o caso, tenho certeza. Apesar de
todo o desprezo, eu tenho
uma convicçãozinha, frágil,
mas firme, de que
vou conquistá-la. Não sei bem
como, acho que fazendo o que
faço, sendo eu. Acho também que esgotei as possibilidades que me apeteciam no Mario
Odyssey, já posso dar o meu
videogame com mais tranquilidade para os meus sobrinhos. Eu
definitivamente não tenho paciência
com crianças, interajo por
obrigação. Nossa, ainda bem que
não sou pai. Não sei se fosse um filho meu irromperia dessa condição um interesse gratuito e genuíno pela
figurinha e, provavelmente, a depender de mim apenas,
nunca saberei. Estou perdendo o jeito com as
palavras, acho que é
Instagram demais. O que mais decorreu
da terapia? Vejamos, começamos a olhar para a relação com a minha mãe. Ju
achou que eu estabeleci um limite quando
mantive o pacote de cigarros que
comprei à revelia da minha genitora. Ela
acha que eu preciso estabelecer
mais limites, não ser tão dependente. Assumir responsabilidades que me deixam mais livres. Liberdade igual a
responsabilidade, não há como fugir
disso. E nem todas as responsabilidades
são chatas, nem tudo em ser adulto é
desagradável. Leva ainda algumas sessões
para eu me aceitar como adulto, para eu enxergar como quero ser adulto. Acho
que a garota do Instagram é mais adulta que eu. Hahaha. Na verdade, nem
acho engraçado, me envergonha
e diminui tal visão e
o pior: não destoa da verdade.
Discutimos ainda a respeito de sexo, em
como acho uma coisa secundária, exagerada em demasia pela
sociedade. Não tenho essa fixação, essa
obsessão pelo orgasmo que os demais homens todos compartilham.
Disse-lhe que a sensação do orgasmo me
lembra a
de uma supermijada, é como se me
aliviasse de alguma necessidade fisiológica e
que depois me bate um
desânimo, um sentimento de esvaziamento, uma dormência emocional que nunca me agradou. Adoro entretanto chupar uma mulher, acho algo profundamente excitante e prazeroso. O coito em si, a
penetração me é menos
interessante. Sei que no clima tórrido eu me
entregaria e penetraria, como o
farei se a oportunidade se der. Acho que namorar comigo seria uma experiência nova para a garota do Instagram. Diferente
pela diferença de idade. Acho que descobriríamos coisas muito
interessantes sobre a vida um com o outro. Acho que o resultado seria maior que
a soma das partes. Mas por enquanto
isso é um projeto só meu.
19h29. As horas voam.
Hoje foi dia de cuidar da mente, amanhã
vai ser dia de cuidar do resto, tosar, cortar unhas,
levar o computador no conserto.
A Coca aqui de casa acabou. Vou
começar a minha dieta de café e água a partir de hoje,
quero ver se o bucho não diminui.
19h35. Comuniquei à minha
mãe da minha decisão e, surpreendentemente, não encontrei
oposição. Ela vai fazer café para
mim. Comuniquei-lhe também da
cafeteira que receberei da
minha tia. Espero conseguir manter essa
“dieta” e rezo para o meu estômago
aguentar.
19h41. A tecla de
espaço está cada vez pior, às vezes não reconhece o espaço dado. Ozzy.
Nossa, estou escrevendo muito mal.
Ozzy vezes dois. Queria que já
fosse hora de mandar a mensagem para a
garota do Instagram. Há uma pequena probabilidade de ela responder algo, puxar
um papo. Acho que não vai, mas sei o que vou mandar: um coração, depois “Good
night. Sweet dreams”, depois uma rosa vermelha, se rosas vermelhas houver entre os emoticons. Nossa, namorar é tão bom,
como sinto falta. Como queria que
tivesse chegado a hora. Depois
de uma
década. O tempo e minha incompetência têm sido cruéis e até agora não cessaram de ser.
20h11. Mamãe fez o
café. Delicioso. Vou tentar comer salada hoje quando bater a fome
dos remédios. A tecla de espaço está realmente nas últimas, espero que
haja conserto para isso. E que seja barato. Espero que o cara não invente que precisa trocar o teclado todo para me explorar. Seria perfeito que ele resolvesse
o problema enquanto eu cortava o
cabelo. Vamos ver como a coisa se dará. Não estou a fim de falar
nisso, queria era bater
um papo com alguma das garotas cibernéticas, mas tenho que
relaxar quanto a isso. Estou fumando desbragadamente. O café chama, pede
por cigarro. Vou segurar um pouco. Breeders
rolando no som, cai bem. Acho que meu astral melhora sobremaneira com
café. A garota do Instagram já sabe como eu sou,
a minha cara, o meu corpo, sabe
que não sou muita coisa fisicamente. Sabe bastante da minha
vida também. De mim, de como penso e
sou. Dela, sei apenas da
aparência, que muito me agrada e algumas coisas mais. Acho que vou fumar
outro cigarro, a vontade
bateu de novo. Não, vou
segurar mais uma vez, na próxima
cedo.
20h35. Detesto
essa minha mania de foco, por
assim dizer, quando eu encuco com
uma ideia é quase impossível tirá-la da cabeça. E
encuquei com a garota do
Instagram. Ela nem faz muito o meu tipo, mas acho que ela é gente boa, uma
pessoa do bem. E é o que de mais
concreto tenho afetivamente. É muito
pouco, mas me agarro como posso a isso. Colorblind do Counting Crows, achado do meu amado irmão.
Uma de suas bandas prediletas. Quando
essa música acabar, vou pegar
café e fumar. Queria muito que a garota do Instagram topasse me encontrar. Essa semana. Hahaha.
20h57. Mandei uma
mensagem para a
Gatinha pedindo um encontro para consultoria em sedução. Quando preciso ela está off-line.
Vive conectada, viciada no celular que
é. Bom, que seja. Quem sabe na quarta. Poderia conhecer o seu apartamento em
BV. Ah, mas ela trabalha. Nem rola dia
de semana, só se for à noite. O custo foi alto, mas me libertei da obrigação do trabalho, sem
abrir mão de ter uma remuneração vitalícia.
1h17. Conversei com a
Gatinha e ela disse
que vacilei várias vezes na
conversa com a garota do Instagram, além
de suspeitar de que é um perfil fake.
Não creio nisso, mas admito que
exagerei na dose com a garota do Instagram. Eu e minha língua
grande. Pedi desculpas
a ela, vamos ver no que isso resulta amanhã. O
negócio é ter paciência, não ser tão afoito. Se
é que ainda haverá negócio.
2h13. Pedi para fazer as
pazes antes de eu ir dormir. Vou
esperar mais meia hora e depois
caminha. O anjo do Tinder gostou das últimas
mensagens que mandei. Acho que
não receberei resposta hoje.
-x-x-x-x-
14h03. Hoje, está conversando comigo, pelo menos até agora.
14h16. Parece que voltou
o silêncio.
-x-x-x-x-
15h07. A Gatinha
suspeitou do perfil da garota do
Instagram e estava certa. Tremendo papel
de palhaço eu fiz. Fiquei muito
puto. Quando chamei ela para um encontro, ela – ou ele – deixou de me seguir. Reportei como spam e agora o seu nome nem aparece nas buscas. Acho que deve
ter me bloqueado. Foda-se. Agora
para me provar mais idiota do que
já sou, vou propor ao anjo do Tinder, talvez a garota mais linda que eu já vi, que seja
a minha namorada virtual. Só para eu ter o gostinho muito
leve de
que estou namorando. Não existe
limite para a minha babaquice. E
nem sei se ela vai aceitar. Eu gosto
dela, tem sido legal conversar e aconselhar, mas sei que, aos 21, seus pais jamais aceitariam que ela namorasse um coroa.
Mas uma brincadeira virtual, poder
tratar com carinho uma
garota, mesmo que só através de
palavras, é melhor do que o
platonismo puro. Levei o meu computador para o conserto e o cara disse que teria que
trocar o teclado todo e que nenhum fornecedor dele tinha do meu modelo (obviamente, é um modelo
americano) e a sugestão foi procurar no Mercado Livre ou comprar
um teclado USB para acoplar. Como acho que
não vou achar no ML, vou ter que apelar para o teclado extra, que não sei como caberá na minha bancada. Ozzy. Vi uma manifestação
de Rodrigo Amarante contra Bolsonaro e a quase totalidade dos comentários foi
defendendo o candidato. Espantoso. Acho que
a probabilidade de tê-lo como presidente
é real. Me confesso curioso.
15h43. Eu não sei o
que faça da minha afetiva. Tudo o que
vejo são becos sem saída. Não há luz no
fim do meu túnel. Estou desanimado.
E acho que vou desinstalar o
Tinder. Não me leva a lugar nenhum. Acho
que o anjo do Tinder não vai aceitar a
minha proposta. Se aceitar,
confesso que ficarei feliz com essa migalha virtual. Virtual é um
pouquinho mais real que o que não
existe ou não pode ser.
16h17. Minha mãe me
mandou um áudio de uma jovem mulher
defendendo Bolsonaro. Assutador. Cheio
de generalizações e totalmente cego para
todas as atrocidades contra a democracia
e os direitos humanos que ele representa. Bom, se é isso
que o Brasil quer, o Brasil
terá. Se minha mãe, que é uma
pessoa esclarecida, fecha os olhos para a ameaça, realmente, acho que
não há mais nada a fazer. Eu sinto
dentro de mim, como se emanasse no ar, nas
ondas do inconsciente coletivo,
que ele vai ganhar. E acabou a terceira
página.
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