15h40. O anjo se distancia de mim, sinto que a vou perdendo
e não sei mais o que possa fazer, visto que faço tudo o que posso. Não sei se
será o suficiente. Ela antes via as minhas mensagens com mais frequência. Bom,
é não esmorecer e pensar que é um investimento de anos, mais quatro. Até a
próxima eleição para presidente, se golpe não houver. Bem, vou pegar café e
fumar um cigarro, pois na cabeça só tenho dois assuntos que são os mesmos de
ontem. Eita, não liguei para o cara da massagem e parece que hoje é feriado. Só
segunda agora. Ju vai ficar decepcionada comigo ou esperará por isso. Se bem
que posso ligar antes da sessão. Tentarei fazer isso.
15h57. Quando bati o olho no anjo, em sua foto de abertura
do Tinder, o encantamento foi instantâneo. Eu acredito muito nesses
encantamentos instantâneos, são os mais valiosos para mim. Por isso o empenho.
Por isso essa força estranha que me move e me faz continuar semeando, mesmo sem
colheita. Como Ju disse, teve um grupamento de pessoas que plantava, plantava e
nada dava, mas continuaram insistindo até que a terra respondeu e as sementes
germinaram. Sei que a cada vez que o anjo lê as minhas mensagens, que usa seu
tempo para mim, é a oportunidade de semear uma vez mais. É preciso, entretanto,
respeitar o ciclo da Mãe Natureza e, por isso, tenho enviado menos mensagens,
mas nunca deixando de enviá-las. Meu anjo é muito importante para mim, tenho um
carinho enorme por ela, não me digo apaixonado, porque ainda falta um tanto
para isso, falta mais troca, mais intimidade. Mas se estou disposto a investir
quatro anos da minha vida nela é porque algum sentimento que eu não sei o nome
há. Postei a foto abaixo no Instagram em homenagem ao Dia das Crianças.
16h39. Me perdi pela internet. Mas três dos cinco
relacionamentos que tive, os mais apaixonados e felizes, começaram com um “é
ela” ou “ah, se fosse ela” logo de cara. Por isso acredito tanto na minha
história com o anjo, que ainda está no prefácio, talvez um pouco mais adiante,
mas muito longe do que ainda pode ser, de onde estou mal se distingue a luz no
fim do túnel. Pode ser mera ilusão, sei que no momento para ela uma relação
comigo está totalmente fora de cogitação. Nem passa pela cabeça dela, é
impossível, inviável e indesejado. Não sou um parceiro que figure em seus
planos e estereótipos.
16h52. Me perdi novamente na Internet vendo coisas de
política. Eu sei que tem coisas em que eu acredito que não se realizam.
Acreditei que alguma das camisas que criei veriam a luz do dia, mas isso nunca
se concretizou, achava as ideias realmente boas, mas a execução deixava a
desejar e talvez aí tenha sido a minha falha, querer fazer tudo sozinho. Mas
não tinha com quem contar e sempre gostei de fazer os meus projetos sozinho.
Isso é limitador, eu sei, e bem sei que nisso sempre me limitei. Nunca soube
fazer network, nunca soube vender o meu peixe. Nunca gostei de trabalhar em
grupo, sempre tive a sensação de que eu fazia a maior parte do trabalho e era o
mesmo que fazer sozinho só que sendo explorado pelos demais integrantes. A
verdade é que nunca gostei de estudar. Continuo não gostando e isso me deixa
mais burro, eu sei, atravanca o meu crescimento, mas nasci para me dizer, não
para ler o que os outros têm a dizer. É onde me encontro e realizo. É o que me
faz manter o equilíbrio desequilibrado (para os demais) da minha vida. Eu não
sei se a possibilidade do anjo é real. Sei que nesse momento não é. Gostaria de
imaginar que ela sente algum tipo de satisfação por ver que sempre há uma
mensagem minha para ela quando abre o Instagram. Que essa presença de alguma
forma que nem ela sabe identificar a faz bem, seria um sentimento que se
assemelharia talvez à confiança, à fidelidade, a um porto seguro. Não sei, se
se assemelhasse a isso seria extremamente positivo, acho eu. Afinal são
atributos que se esperam de um companheiro.
17h50. Mas estou eu a divagar impossibilidades. Admito que
tive raiva agora. Um amigo meu que há anos mora e trabalha no Canadá veio fazer
piada – engraçada por sinal – sobre Haddad. Não me segurei e comentei: “Se
Bolsonaro ganhar, você volta para o Brasil? Estou com saudade”. Isso me aliviou
mais.
19h45. Estive com o meu amigo da piscina até agora e vi
vídeos do programa de YouTube mamaefalei,
o que me deixou impressionado foi como o povo pode ser manipulado facilmente,
defendendo causas que não entendem, no caso, como o programa é de direita,
mostrando a alienação das manadas de esquerda. Alunos que ocupam universidades,
pessoas no que pareciam estar num movimento da CUT. E petistas em geral. Meu
amigo da piscina disse que o protagonista desse programa foi eleito a um cargo
político.
[19:51, 10/12/2018] Mário Barros: O caar foi eleito a que? O
do mamaefalei? Não vi ainda o vídeo, estou escrevendo do impacto que o programa
teve em mim.
[19:52, 10/12/2018] amigo da piscina: que programa?
[19:54, 10/12/2018] Mário Barros: mamafalei
[19:55, 10/12/2018] Mário Barros: O cara foi eleito a que?
[19:56, 10/12/2018] amigo da piscina: deputado
[19:57, 10/12/2018] Mário Barros: estadual ou federal, tu
sabes?
[19:57, 10/12/2018] amigo da piscina: acho que fed
[19:57, 10/12/2018] amigo da piscina: mas oque te impactou ?
[19:58, 10/12/2018] Mário Barros: Ok. Valeu. Obrigado por me
mostrar. Você sempre traz coisas interessantes ao meu universo particular.
[19:58, 10/12/2018] amigo da piscina: ???
[19:58, 10/12/2018] amigo da piscina: tem muito mais videos
[19:58, 10/12/2018] amigo da piscina: assiste ai e conversa
com a galera
[19:59, 10/12/2018] Mário Barros: Como o povo é manipulável,
é massa de manobra, ignorantes que são tangidos como uma manada.
20h01. É uma pena que não faça com eleitores de Bolsonaro.
Sobre o cara ser deputado provavelmente federal? É um cara muito inteligente
será um bom representante de direita e me parece ter princípios. E é jovem, não
é nenhuma raposa. Me espanta é YouTube ter esse impacto midiático a ponto de
eleger um deputado supostamente federal. Criei uma lista com os melhores discos
do The Cure que eu acho, os que estava com mais saudade, e botei para tocar em
modo aleatório; largamente satisfatório, excelente ideia. Vou fumar. Quero que
mais ideias afluam.
20h16. Tive três ideia: registrar o nome de um blog caso
Bolsonaro seja eleito; uma texto para o meu amigo da piscina ler; e escrever
sobre armas. Cumprirei as missões nessa ordem.
20h19. Não havia o blog, agora é meu:
eunaosoucristao.blogspot.com (LINK). Vou criar o primeiro post e esse ser o
texto que enviarei ao meu amigo. Agora. Valendo. Eu não sou cristão mas
acredito no “amar ao próximo como a si mesmo”, tento praticá-lo e falho, não
reparto o meu com o próximo que tem menos, só reparto o que não me afeta abrir
mão. A última coisa que reparti foram sete reais (dei dez e pedi para trazer o
troco, que nunca veio) para um miserável comprar um sanduíche para comer
porque, segundo ele, não havia comido o dia inteiro, que seja. Fato é que isso
e assinar petições a favor de causas que acredito e reparti-las é tudo o que
faço de bom no mundo. Como não sigo esse princípio basilar na sua completude,
nem que fosse batizado, poderia me considerar cristão. Se abrigasse alguns
mendigos aqui desde que se educassem, talvez me considerasse mais cristão. Não
o faço, nem a vida me permitirá que eu faça. Vou fumar um cigarro e depois
copiar o que eu acho que deveria ser a constituição de toda a nação na Terra.
Com um adendo.
20h45. Procurei e não encontrei o que eu queria. Era a
Declaração Universal dos Direitos Humanos. Onde eu incluiria a inclusão digital
como direito universal do homem. Não adianta mandar isso para o meu amigo da
piscina sem a Declaração.
Meu amigo da piscina mandou um vídeo que reproduzo embaixo
(se conseguir). Acho que sintetiza bem a sua posição política. É como se fosse
tudo numa pílula de 32 segundos.
21h06. Minha mãe leu o meu último post e me acho muito
obcecado pelo anjo. Não sei se sei fazer de outra forma. Vou tentar. Mas o anjo
sabe das condições especiais em que tive aquela viagem, mamãe não. Condições
especiais que experimento agora. Meu padrasto foi ver o maamefalei e disse que o cara é do MBL (Movimento Brasil Livre de
direita ultraliberal) que patrocina canais do YouTube pelo que entendi. Meu
deus, o mundo é muito plural, eu vivo numa bolha muito pequena, quem expande
mais a minha bolha e me faz repensar as minhas convicções é o meu amigo da
piscina. Acho salutar esse questionamento. Quais eram os tópicos mesmo, sei que
o segundo falhou. O post vai o que escrevi mesmo, estou sem paciência de
escrever mais. Quem sabe não poste também a Novíssima
Religião? Será divertido. Fá-lo-ei. Mas havia o último tema. Vou ver.
21h19. Armas. Sim há uma percepção e uma ficção. Vamos nessa
ordem. A minha percepção é que não apenas a proposta de liberar o porte de
arma, mas principalmente a glorificação da arma, o marketing a respeito de
possuir uma arma gerou uma demanda, um desejo antes inexistente no povo
brasileiro, a sensação que dá é que muitos vão querer ter uma arma e acho que
geralmente quem quer as armas, o tipo de pessoa que quer comprar uma arma, é
aquele que tem um desejo mesmo que enrustido de usá-la e digo mais: contra
alguém. Acho que os estressados, aqueles que puxam briga no trânsito, briga de
bar, têm este perfil. Adoraria estar equivocado. Vou fumar e vamos à ficção. É
curtinha.
21h34. Minha tia-vizinha, meu tio, Clementine (minha
primeira grande paixão platônica e a mais duradoura) e seu namorado conversam
como uma família, algo que a minha ausência no seio familiar não permite aqui.
Acho que minha ausência é bem-vinda ao meu padrasto e mais extensivamente ao
casal, que pode viver desfrutar da “conjugalidade” de suas vidas. Eu me prefiro
aqui escrevendo e ouvindo The Cure no ar condicionado, com o Hulk me velando.
Vamos à ficção. Ficção: Bolsonaro libera o ataque à Rocinha para exterminar os
traficantes de lá. Joga os panfletos anunciando que em seis horas vai começar a
invasão. Como é uma fantasia, o êxodo o ocorre sem nenhuma intercorrência, mas
os traficantes resolvem ficar lá e lutar até o fim. As forças de Bolsonaro vão
avançando de exterminando os bandidos, e subindo rumo ao covil do chefe da
facção. Quando lá chega há um escudo humano formado por civis, moradores da
Rocinha de todas as idades e sexos, amarrados. O líder da operação em terra
fala reporta a situação ao comando perguntando como proceder. O comando está
sob tutela do próprio Bolsonaro que se exalta: filhos da puta! Querem me
foder... Os direitos humanos vão cair em cima de mim... foda-se; não há guerra
sem casualidades, sem sangue inocente derramado, eles não vão foder a minha
operação, diga que a ordem é passar bala, quero todos os traficantes mortos! Só
saem daí com a cabeça do chefe! Assim o fazem e matando dezenas de inocentes,
limpam a Rocinha. De posse daquela informação, na próxima favela da lista, o
Morro do Alemão, algo inesperado acontece, muitos dos civis não-traficantes
resolvem se armar e se juntar na defesa da comunidade, gerando um massacre
ainda maior. FIM.
21h51. Agora fiquei sem o que escrever.
21h55. Vou fumar para ver se me vem algo.
22h02. Só me veio um devaneio besta sobre a Singularidade
Tecnológica. Por que escolhi o nome do blog “Eu não sou cristão”? Porque aquele
insano disse que o Brasil não era um país laico, era um país cristão. Eu ouvi
isso saindo da boca dele hoje ou ontem. Será um blog de contestação. Vamos ver
se vou ter ânimo e liberdade para a empreitada uma vez que Bolsonaro assuma o
poder. Pode ser que queira esmagar a oposição. Meu amigo da piscina ficou sem ter
o que dizer sobre a ausência do “mito” dos debates. Ele disse que vai seguir a
Constituição à risca e lá diz que o Brasil é um país laico, é uma cláusula pétrea.
Sei não, viu? Espero que todo o medo se mostre em vão, pois só tenho para me
defender as palavras, nada mais. Vou fumar de novo. A novidade do anjo é que
não vê mais o que escrevo. Isso é triste. E já entrei na quarta página desse
post vou revisar e postar.
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