quinta-feira, 18 de outubro de 2018

BANHEIRA

Me agredindo-deleitando


0h07. Ouvindo Adriana Calcanhotto e pensando e como poderia amar de novo. Não vejo como passando o dia enfurnado no meu quarto-ilha.

0h21. Uma banheira. Provavelmente terei uma, é quase certo. Nunca pensei que uma banheira seria mais possível na minha vida que uma namorada e eis que a vida assim se dá. Pensei que passarei, durante as reformas do quarto e banheiro, um tempo na casa da minha tia-mãe, o que muito me agrada, pois agora que minha prima foi tentar a sorte em Sampa, deve estar repleta de solidão. Talvez eu venha emprestar um pouco de vida e variedade à rotina dos meus tios. Não sei. Ficarei tão recluso quanto aqui, então não é lá grande acréscimo. Mas acho que alguma diferença faz. Não queria ir a Ju nesse período. Não que eu não goste dos nossos encontros, eles são um sopro de vida para mim. Nem acredito que já seja madrugada da quinta; essa semana passou num piscar de olhos. Mais do que normalmente se dá. Acho que vou fumar. Aliás, eu sei que vou. Penso que estou com câncer de boca. Isso me apavora, pois ficaria deformado pela retirada do tumor. E a aparência que hoje me desagrada, se tornaria um distante e precioso sonho. Se for o caso, fiz por merecer e arco com as consequências. Mas sinceramente não queria que fosse assim. Seria o adeus a qualquer gatinha, seria a condenação definitiva ao meu quarto-ilha. Seria melhor a morte. Vou fumar.

0h46. Algo em mim entristece quando a luz automática do hall se apaga me relegando à escuridão esquecida do lugar, me sinto um tanto mais só, um tanto mais desprezível. Diabos, ainda não me acostumei com o novo teclado. É muito contraproducente. Gosto de me vomitar com mais facilidade. O pai da Vila Edna disse que todos os grandes escritores começaram vomitando suas ideias, mas sei que disso não passarei, pois é exatamente isso que me apraz. Não quero enredo ou personagens fictícios, o enredo é a vida e os personagens aqueles que cruzam comigo e me impactam de alguma forma. Eu percebo que à medida que o tempo passa eu me torno menos o cara do “por quê?” e passo a ser o cara do “por que não?”, talvez seja isso que esteja incomodando o meu primo urbano em relação a mim. Não sei. Sei que inventei uma adivinhação que só eu sei a resposta: o que é o que é; que quando tenho sinto falta e quando não tenho falta nenhuma me faz? Que coisa mais pueril. Deixa ser. Não estou aqui para agradar ninguém a não ser a mim mesmo. Preencher o vazio das minhas horas com algo minimamente digno, microscopicamente digno. Sou apenas um nó insignificante na imensa rede cibernética, todo o sumo da minha existência é essa irrelevância. Não nasci para ser um exemplo a ser seguido, um transformador de vidas. Sou um ser neurótico e insignificante para o nosso belo quadro social como a maioria de nós, o chato é que não me abandona certa mania de grandeza, grandeza essa que nunca alcançarei, tenho os pés bem firmes no chão. Não tenho talento nem conteúdo para ser escritor. Sei disso. Li alguns grandes livros na vida e sei o que é talento e conteúdo e difere bastante dos meus desabafos e neuroses. Mas é o que me agrada fazer, o que me é mais fácil, o que espanta o tédio então sigo fazendo. Vou fumar.

1h23. Virus remix, estava precisando. Sinto que esse post traz um tom mais sombrio e melancólico que os demais. Que seja, não sou uma pessoa constante, ninguém o é. Tenho uma penca de medicamentos para equilibrar as minhas emoções e elas realmente não oscilam muito. Também como oscilar estando quase que integralmente diante do computador? Bom, foi a paz que construí para mim depois de uma carrada de sofrimento profundo. Agradeço à existência por tudo o que tenho. Inclusive a vindoura banheira, quiçá o Batman no final do ano que vem. Sei que o anjo não se conecta ao Instagram há mais de 15 horas. Isso me deixa menos ansioso do que se estivesse conectada e não me respondesse, que é precisamente o que vai acontecer uma vez que acesse o aplicativo. Não tenho nada a acrescentar ao que já foi dito. E disse em inglês, pois em tese ela está em outro país e sabe inglês. Me peguei pensando na Portuguesinha enquanto fumava, ela está muito mais presente na minha vida desde que nos seguimos pelo Instagram. Ela é uma publicadora bastante ativa lá, tem lá o seu quinhão de exibicionismo como eu. Adoro. Daria direitinho comigo, não tivesse dono e um oceano nos separando. É, apenas isso.

2h47. Comi, o sono bateu. Vou fumar um cigarro e ir dormir.

2h58. Voltei. É difícil me desatrelar das palavras quando estou sem sono. Nossa, li uma atrocidade de Bolsonaro que calou fundo em mim, ele pretende liberar o desmatamento indiscriminado da Floresta Amazônica para criação de gado e plantio de soja, disse que vai perseguir ativistas ambientais “xiitas” e encena até sair da ONU.

-x-x-x-x-

11h33. Café e cigarro. Preciso.

11h42. Acordei, mas meu despertar é gradual obedece a ritmo e leis misteriosos. As primeiras coisas que me vêm é Bolsonaro e o anjo, para variar. Sobre o primeiro serei amplamente informado se assim me aprouver, já a segunda é uma incógnita que não quer ou não pode se manifestar. O café me desce meio quadrado, será que é uma agressão começar o dia tomando o negro líquido com cigarros? Deve ser, mas já causei numerosos danos muitos piores ao organismo, o que não exime a conduta que tomo hoje de seus danos. Mais cigarro e café.

12h03. Não estou com muita cabeça ainda para escrever. As palavras não me vêm e ainda há esse teclado novo me atrapalhando. Vou aumentar o som, passa Guns n’ Roses, não é particularmente do meu gosto, mas marcou uma época da minha vida, por mais que não tenha jamais adquirido um CD da banda. Spotify me permite. É a lista 6 que deixei rolando durante a madrugada. O meu cérebro ainda reluta em se sentir completamente alerta, há uma letargia chata me dominando. Acho que vou revisar e postar o texto de ontem, é menos demandante.

12h13. Estou sem saco de revisar o texto no momento. Estou sem saco de nada. Fumar agora não vou, preciso ter o mínimo de controle, só às 12h30. Não sei ao certo o que pensar sobre o pai da Vila Edna ler o meu livro. Ele pediu por isso. Eu cedi pelo mais completo exibicionismo e porque ele seria uma das três pessoas para quem eu enviaria o texto para apreciação, por julgar uma pessoa de mente aberta e que eu amo e respeito bastante, além de intelectual. O pedido dele coincidiu com um desejo meu, mas o temor do preconceito me aflige. Está feito e não pode ser mais desfeito. Não sei como a vida me cobrará por isso. Maldito teclado. Infected Mushroom tocando. Tenho dois discos deles. Ainda bem que não vai haver saída nesse final de semana. Agora encasquetei com a ideia do livro. Não me levará a lugar algum, a não ser elucubrações catastróficas. Deixemos isso de lado. Eu acho que enfastiei de sexo. Tanto tempo sem praticar atrofiaram a minha libido e a importância do sexo em minha vida. É uma coisa que não me faz mais falta, algo que não preciso praticar para me sentir homem e inteiro. Sei que vou contra a opressão midiática do sexo, mas tal opressão não me afeta, apenas me intriga, pois não tenho disposição para gastar tanta energia com o tema nem cultivo a obsessão de trocar fluidos indiscriminadamente como se houvesse uma meta ou placar a ser alcançado e suplantado. Não é a minha. Vários anos de celibato me trouxeram a esse lugar e não me animo a sair dele. Me animo, sim, a fumar mais um cigarro com café.

13h00. Conversei um pouco com a fantástica faxineira sobre a reforma do meu quarto, isso me trouxe para pensamentos mais amenos e bons, a sonhos mais possíveis. Incrível, ter meu quarto remodelado para receber as minhas bonecas sempre me pareceu inalcançável. Esperei isso por mais de década e parece que em janeiro a transmutação terá início. Entretanto levará mais tempo para que todos os bonecos estejam aqui para exposição. Há vários na casa do meu irmão. Talvez só os tenha de fato todos e todas no final do ano que vem. Talvez além. O Batman sei que não vem esse ano, ficará um enorme espaço vazio à sua espera.

13h22. Por não saber exatamente o tamanho desse espaço, mandei uma carta para o fabricante pedindo as dimensões. Espero que me atendam. Vou fumar.

14h41. A fantástica faxineira estava arrumando o quarto-ilha, fiquei no celular vendo propaganda política contra Bolsonaro. É bom que muitos não esmaeçam, mas eu joguei a toalha, admiti a derrota. Tempos sombrios, talvez com consequências irreversíveis ao ecossistema global, estão à frente. A democracia está em perigo, mas juro que o que me preocupa mais que os direitos humanos, que podem ser reestabelecidos, é a riqueza e a biodiversidade natural do Brasil que não pode ser recomposta. Um homem que pretende vender a interesses escusos o nosso patrimônio natural em vez de explorá-lo sustentavelmente, nem sei que nome dar a essa monstruosidade. Preciso postar isso no Facebook.

15h18. Fui e me perdi na enxurrada de posts. Alguns nojentos, que só podem ser fake, um cara dizendo que vai mandar uns quatro “pra cova”, dizendo que pobre e bandido é tudo igual, matar pobre é um bolsa família a menos nas costas. Não creio que a bestialidade tenha chegado a esse ponto. Se bem que em se tratando do estado mencionado, não duvido tampouco.

15h32. Eu tenho que buscar conforto na incompetência do gestor em articular as suas políticas de governo. É o que para mim salva o Brasil de uma calamidade. Se bem que ele foi inteligente o suficiente para escolher um militar como vice, pois, se alguém o tirar do jogo quem assume é o general e ninguém quer isso. Já sei até o que ele vai falar quando da posse, vai citar Zagallo e dizer que os petistas vão ter que o engolir. Sei lá, aí já é ficção demais. O Brasil pede por isso, é aberrante, grotesco e todos pagaremos.

15h57. Sem querer, dei um superlike numa prostituta e perdi de usá-lo numa supergatinha que veio depois dela, me embananei, caralho! Era uma gatinha quase no top do anjo. Era do jeitinho que eu gosto. Nossa, se desse um superlike na certa...

16h29. Minha mãe vai ficar indignada comigo, mas assinei o Tinder plus por um mês na tentativa de dar o rewind e, depois de assinado, descobri que na modalidade peba eu só tenho possibilidade de dar um rewind e não foi o suficiente, que merda. Superinteressante a garota. Vi as sugestões top às quais o Tinder me deu acesso e dei um superlike numa gostosuda de rosto bonitinho que certamente não vai querer nada comigo. Mamãe vai dar a porra. Agora já foi. O interessante é que ter feito uma vez me motiva a fazer mais, não farei isso, me controlarei, mas é curioso o rush de adrenalina que pode levar à compulsão.

17h02. Minha mãe chegou. Tomaremos Chartreuse verde na varanda agora, quando contarei do meu gasto.

19h28. Tomamos o licor, ela aceitou bem a assinatura que eu fiz do Tinder, dei match numa garota que tinha dado like em mim através do aplicativo e ela se revelou uma “acompanhante”. Batemos um bom papo. Ela não acredita no amor e eu sou um fiel convicto do sentimento, então houve um sadio embate de ideias, mas um lado não conseguiu convencer o outro. Até que ela se cansou da conversa e educadamente se despediu. E acabou-se a terceira folha. Dois posts para publicar. Dois posts para revisar.



2 comentários:

  1. "Me peguei pensando na Portuguesinha enquanto fumava, ela está muito mais presente na minha vida desde que nos seguimos pelo Instagram. Ela é uma publicadora bastante ativa lá, tem lá o seu quinhão de exibicionismo como eu. Adoro." Não sei do que falas :p

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    1. Que com o Instagram, eu acompanho um pouco da sua vida, da sua paixão pelo canto, do seu dia-a-dia e isso dá um gostoso sentimento de proximidade que antes de segui-la no Instagram não possuía. Só isso.

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