Recife, 14 de março de 2017.
A Gatinha vem hoje para conversarmos. Ela disse que precisa
desanuviar a cabeça. Que queria alguém das antigas para fazer isso e, para
minha honra e orgulho, me escolheu. Ela deve sair do trabalho umas 17h, 17h30.
São 16h34. Quando der 17h vou tomar banho para me arrumar. Queria muito ir na
Cultura, mas acho que nem a Gatinha, nem minha mãe irão querer. Tudo bem, já
estou meio conformado com isso. De qualquer forma vai ser bom hoje. Encontrar a
Gatinha sempre é bom. Acho que faz bem a ambos. Vamos ver o que ela vai achar
do meu cabelo. Estou curioso. 16h44. Mais 16 minutos para o banho. Realmente
não tenho muito a dizer. Minha noite seria perfeita se fôssemos na Cultura e eu
comprasse os CDs de Sandy e o do Nirvana. Depois podíamos dar um rolé no Recife
Antigo e tomar umas Cocas e, se ela quiser, umas cervejas por lá. Estou me
tornando disléxico, estou engolindo palavras, talvez seja porque os pensamentos
vêm aos borbotões na minha cabeça fantasiando essa ida ao Antigo. Mas acho que
é uma mudança radical de planos para a Gatinha, que já deve ter bem
cristalizado que iremos ao barzinho aqui perto de casa. E ela já está
estressada. Uma mudança de planos só a estressaria mais, eu creio. De qualquer
forma sugerirei. 16h53. Sete minutos. Acho que vou botar a camisa do Sai Dessa
Noia hoje. Preciso botar uma camisa branca por causa da caspa. Queria saber
como me livrar da caspa se os xampus anticaspa não funcionam. Ou não os estou
usando corretamente. 16h57. Três minutos. Essa pressão de tempo me lembra à
Publicidade. Não gosto. 16h59. Vou tomar banho logo.
17h32. Tomei banho, me aprontei e até agora nenhum contato
da Gatinha. Ela deve estar largando do trabalho por volta desse horário. Falei
com mamãe da minha ideia de ir na Cultura comprar os CDs e ela foi contra. A
pirangagem chegou ali e ficou. Por mais que a pensão seja minha. Isso me deixou
razoavelmente frustrado. Ela disse que eu posso ouvir do celular dela pelo
Spotfy. Ligado a uma caixa JBL porradona que meu padrasto a deu de presente. É
uma solução, mas sou um velho dinossauro que gosta de ter a mídia física, o CD,
não sou tão dinossauro a ponto de comprar vinis, como o nosso amigo fã de
música e de cerveja – que encontramos na Cibrew – que investe em vinis, a
preços exorbitantes, porque acha que os graves e a “profundidade” do som são
maiores na velha-nova mídia. Não tenho ouvido tão afinado para perceber isso.
Ou é um luxo que não experimentei e, nesse caso, a ignorância é realmente uma
bênção. Para o meu bolso. Por falar em música coloquei “Blackstar” de Bowie
para ouvir. A Gatinha ligou já de dentro do Uber e está a caminho. Disse que
chegaria dentro de 40 minutos. Talvez antes, mas a hora do rush em Recife é
infernal. 17h50. Não vou nem ligar o Yoshi, pois não vou ter tempo para passar
de fase. Incrível como esse disco de Bowie me lembra o período em que escrevia
no blog de bonecos. Uma coisa ficou bem ligada à outra. E toda vez que ouço, me
dá vontade de voltar a escrever sobre bonecos. Por falar nisso, tenho que fazer
umas alterações no dito blog pois algumas informações estão desatualizadas. 18h02.
Fiz uma das alterações. A Gatinha deve estar chegando. Tenho que parar de
carregar o meu celular sem ele ter descarregado por completo. Isso vai ferrar a
bateria dele. Obviamente minha mãe falou do Spotfy, mas, como ela não desgruda
do celular, não terei oportunidade de ouvir as músicas de Sandy, só se for
depois que ela for dormir. O pior que não sei nem usar Spotfy. Mas deixa para
lá, um dia compro o CD, se me aprouver. Meu repertório de palavras está muito
limitado. Aí só com mais leitura eu poderia resolver isso. Mas talvez começasse
a usar termos que não são cotidianos aos possíveis leitores e eles ficassem sem
entender. 18h11 e nada da Gatinha.
21h59. A Gatinha acabou de partir. Ela está paranoica com a
violência. Mas acho que toda mulher deve estar. Conversamos bastante. Ela
falando mais e eu ouvindo, afinal o intuito da vinda para cá era que ela
descomprimisse um pouco a panela de pressão que estava a sua cuca. Espero ter
ajudado. Ela afirmou que estava mais tranquila quando estava partindo. Espero
que estivesse sendo sincera. De toda forma, disse a ela que, se achasse que
fosse surtar mesmo, tomasse o remédio que tomava em momentos de crise. Sou
contra automedicação, mas a grana dela é contada e não sei se ela teria como
pagar uma psiquiatra. E ela foi aconselhada a tomar o remédio sempre que
sentisse os sintomas tomando conta da sua alma. Não, ela não é doida como eu,
mas já teve uma crise de pânico e obviamente não quer ter outra, por isso a
aconselhei a tomar o remédio se sentir que o bicho está pegando. É, eu confio
muito nos remédios, para ser sincero, eu deposito a minha sanidade na conta
deles. Não sei – e nem quero descobrir – se conseguiria manter o relativo
equilíbrio agora que estou aposentado e sem maiores estresses. Talvez até
conseguisse, mas o temor de voltar ao inferno é mais forte do que a vontade de
fazer o experimento de me privar dos remédios. Acredito também que os remédios
produzem efeitos colaterais no meu cérebro, principalmente no que condiz à
memória. Tento me enganar, talvez, dizendo que foram os eletrochoques que
destruíram minha memória, mas o fato é que faz anos que me submeti a tais
procedimentos e me esqueço de coisas do presente e passado recente, que nada
têm a ver com os eletrochoques. Talvez seja um mal de família que se manifesta
já em mim, visto que Alzheimer é um mal que ataca ambos os braços da minha
família, então a probabilidade é grande, como acho que é grande a possibilidade
de que a ciência ache uma cura para a doença antes que essa me ponha
completamente demente. Mas não quero falar de mau agouros aqui. Eu e a Gatinha
arriscamos ir no bar do caranguejo que costumávamos ir com a amiga dela, mas
ela já ficou reticente, com razão, porque havia dois carros da polícia
estacionados praticamente em frente ao bar com as luzes ligadas, o que para ela
sugeriu logo que uma ocorrência havia acontecido no local. Chegamos lá e o
garçom disse que nada havia se passado, entretanto o bar estava vazio. Esses
dois fatores a puseram bastante desconfortável com o lugar e ela tomou apenas
um caldinho enquanto eu bebia duas Cocas e retornamos para o prédio, onde
passamos a maior parte do nosso encontro. Estava havendo a reunião de
condomínio e aproveitei para escrever um bilhete para o síndico requerendo a
geladeira da piscina de volta. Gostaria muito de ser atendido. Acho que à
medida que o tempo passa eu passo a escrever de forma mais rebuscada. Não sei
se isso é uma coisa boa ou ruim. Certamente é uma coisa mais chata para o
leitor (que nem sei se há). Mas é uma coisa meio incontrolável e ocorre
naturalmente, não me esforço para isso, as construções se me apresentam dessa
forma e eu apenas as descrevo. Estou ouvindo “How to Desmantle an Atomic Bomb”
do U2. Ouvi esse disco numa fase relativamente má da minha vida, sofrendo de
depressão. E o disco me lembra o jogo “Halo” que joguei no PC do meu falecido
pai, quando morava com ele. Jogo muito bom, muito divertido e que, no parco
conhecimento de FPS que tinha à época, considerei inovador. Isso me lembra que
tenho Half-Life 2 para jogar aqui e esse é um jogo que quero sinceramente
jogar. Mais do que “Assassin’s Creed IV” ou qualquer outro da Nintendo. Acho
que quando e se zerar o Yoshi, eu mergulhe nele. Este, mais do que “Halo”, foi
considerado um jogo altamente inovador à época, quase 20 anos atrás. Era um
boneco que gostaria de ter, o do protagonista de Half-Life, mas hoje acho que é
edição esgotada e deve custar uma nota. Então, não o terei. Tenho um robozinho
da 3A que faz uma homenagem ao jogo e está de bom tamanho. É uma homenagem
sutil, só os entendidos em games a captarão, mas não importa, eu entendo e foi
por esta razão que comprei o bonequinho do robô em primeiro lugar. O disco
acabou. Vou ver se acho "No Line On The Horizon” também do U2. É um disco
mais estranho do U2, com muitos coros do próprios integrantes e me deu
curiosidade e vontade de ouvi-lo agora para descobrir minha percepção do disco
atualmente. Difícil é achar. 22h55. Não achei. Botei outro que há muito tempo
não ouço: “Songs Of Faith And Devotion” do Depeche Mode. Me espantei que o
disco seja de 1993, 24 anos atrás. O tempo realmente voa. Meu deus, estou
ficando realmente velho. Comprei quando tinha 16 anos. Namorava V ou I.
Namorava, enfim. Coisa que há muito não faço. Namorei com a ficante que me
pegou há um ou dois anos durante duas noites em que fui um desastre sexual. Eu
satisfiz a minha parte, que era ter uma relação afetiva, com conversa e troca
de carinhos, abraços, beijos, mas não satisfiz a parte dela que era ter um
orgasmo. Shame on me. Boto estas
expressões em Inglês porque elas me vêm mais fáceis e mais adequadas do que
qualquer coisa que conjurasse em Português, eis a verdade. Mas pode me achar
pernóstico também, não me importo. Como digo lá abaixo do título do blog, “aqui
eu posso tudo”. Bem, quase tudo. Ainda há uma autocensura que me impede de me
expor por completo, mas acho o retrato já deveras transparente. Mais do que
isso seria pedir para ser crucificado, pois há recônditos da alma que não devem
ser revelados por prudência e por autopreservação. Se bem que, se um dia
publicar os diários, toda a verdade sobre mim vai ser posta às claras. Como
duvido que tal evento aconteça, por enquanto estou seguro. Mas seguirei
digitando o diário. Por sinal, acho que vou fazê-lo agora. Um pouco. Até a
meia-noite ou uma da manhã. Se não encher o saco antes. Está tocando uma música
que não me lembrava do disco. Não é das melhores, mas também não é ruim. Ela me
é vagamente familiar, mas só vagamente. É quase uma música nova do Depeche Mode
para mim. Interessante. Vou lá digitar o diário. Quem sabe não volte aqui para
expor mais alguma coisa quando me encher da digitação?
0h21. Acabei de digitar o dia em que estava e comecei a
digitar o comecinho do novo dia. Mas estou achando o texto um saco. Muita
repetição. Coloquei – pasme – Maurício Manieri para tocar. A fome do remédio
caiu matando e comi um pratázio de paçoca com feijão verde com muita manteiga
do sertão. Ainda comi uns cinco Bono de morango. Estou sonado. Vou fechar o
computador e ficar só fumando e tomando Coca.
P.S.: A Gatinha nada falou sobre o meu cabelo. Falou do dela. Hahahahaha.
Nenhum comentário:
Postar um comentário