0:37. Estou num voo rumo a Lisboa, uma bela mãe, uma bela
mulher, embala seu filho em pé no avião. Realmente uma bela mulher. Madura,
mãe, mas atraente. Me atrai. Seria capaz de me apaixonar por uma mulher assim.
Seria bem mais desafiador. Uma mulher mais vivida, mais velha, lembra uma Zizi
Possi melhorada. Me agradou. Quanto à Garota da Rabeca, ah, foi a morte da
ilusão da forma mais delicada possível, com seu jeito agradável e
necessariamente esquivo. Volto a lembrar que ela é mulher jovem e lindíssima,
logo deve ser escolada na arte de dar cortadas proporcionais à abordagem. A
minha foi muito branda, sutil, prova de que talvez não tenha sido tão má a
minha elegia, por assim dizer, à sua pessoa. Embora tenha ficado claro pelos seus
gestos e modos que parou aí, que não quer mais conversa comigo, fui uma reles
curiosidade que virou passado para ela. Pelo menos disse-me que leu e que achou
bem legal e me respondeu seu nome, quando a perguntei, numa última ousadia
minha. E não é que tenho o nome dela tatuado no meu braço? Com a caligrafia ou
o desenho de minha amada babá, visto que ela é completamente analfabeta, não
sabe compreender ler o próprio nome que desenhou com carinho e cuidado para
ficar bem bonito para mim, mesmo sem saber que estava fazendo para ficar sempre
impresso no meu corpo. Porque ela é assim, uma santa; a melhor pessoa que já
conheci, empatada com meu irmão. Eles são dignos de representar a humanidade, o
que de mais maravilhoso pode haver nela.
-x-x-x-x-
Primeira parada em Lisboa, o fumódromo. |
10:14. Estamos no restaurante do hotel à espera do check in,
mamãe dorme à mesa. Já deu a hora, mas o lobby está cheio. Estou esperando
aliviar para acordá-la. Parece transmissão de pensamento. Foi só escrever que
ela acordou. Hahaha. A atendente do restaurante do hotel é jovem e um doce, mas
não tem o encanto da Garota da Rabeca. Perguntei-lhe se iria ao Rock in Rio e
ela disse sorridente que não, mas fez uma expressão momentânea de estranhamento
com o meu questionamento.
11h31. Não consegui dormir, talvez porque tenha dormido
muito no voo, talvez pela excitação da mudança. Deitei na cama, é bastante
confortável, e o ar deixa o quarto com uma temperatura bem agradável. Meu amigo
que está em Lisboa acaba para me chamar para ver o jogo de Portugal aqui em Portugal.
Na Praça do Comércio se não me engano. O jogo é às 19h. São quase 16h. Disse
para ele passar de 17h30. Não estou muito animado, mas prefiro ir que ficar
aqui escrevendo. Pode ser bom. Ainda falarei da Garota da Rabeca.
12h20. Não consegui dormir, embora esteja cansado. Não estou
com disposição para escrever e por isso a saída vai me ser tão benéfica. Ainda
sobre o nome da Garota da Rabeca. É a primeira opção de nome que eu daria a uma
filha, caso irrompesse das profundezas do impossível a vontade de me
reproduzir. A garota teria que ser muito persuasiva, mas muito mesmo para me
convencer a me meter numa aventura sem volta dessas. Embora eu saiba que a
maternidade tenha um significado importantíssimo para a mulher. Acho que a
criança não teria um pai inteiro, apenas metade, que é o que acho que sou capaz
de dar. Acho que eu seria um pai careta. Será? Bom, isso tudo com a vida que eu
levo, da forma como a levo, sonhando com namorada dos outros dentre outras
ilusões, não passa de mero sonho com tendência a pesadelo. Uma filha, veja só.
Mamãe acha que se eu me reproduzisse, ela é que ficaria com o encargo de cuidar
do bebê, adivinhando ou diminuindo à exclusão a minha participação como pai. Hahaha.
Eu poderia ter ousado mais com a Garota da Rabeca, mas acho que aí passaria do
sensato, pedindo-lhe que me acrescentasse como amigo do Facebook. Não para que
ficasse passando cantadas, mas para trocarmos uma ideia, tenho profundo
interesse naquele ser maravilhoso. Ainda bem que não ousei. Mas, caso leia,
Garota da Rabeca reitero que meu endereço no Facebook é mario.barros.75 e que,
se me adicionar, pode da mesma forma me bloquear. Bom, pelo menos você me deu o
final da história, escrever para a garota dos seus sonhos pode agradá-la, mas
só isso. Especialmente se ela já ama outrem. A hora se aproxima da chegada do
meu amigo corretor. Às vezes cai a ficha que eu cruzei o oceano e estou no país
que colonizou em sua grande parte o meu país, o saqueou; estuprou e depredou os
que aqui habitavam e impôs o modo português de civilização com escravagismo
como status quo. É bem surreal isso. E no final não ficou tão português quando
se poderia supor. Lá vou eu falando do que não entendo. Mas sinto pena dos
índios, viviam no paraíso, respeitavam o paraíso e se tornaram praticamente
nada hoje. E o paraíso foi amplamente devorado pela fome de capital. Mas, mais uma
vez, não vou falar do que não entendo. Sei que falta menos de meia-hora para o
meu amigo chegar. Tédio em Portugal. Acho que vou descer para beber uma Coca-Cola
e fumar um cigarro no restaurante do hotel.
15h51. Desisti de ir com o meu amigo, ficou muito tarde para
ir de ônibus.
18h49. Assistimos eu e mamãe o jogo no restaurante do hotel,
que estou achando muito agradável e com lindas moças, em especial a que
chamarei aqui de Garota do Hotel para não expô-la, que embora tenha um nome que
não me agrada, é uma graça. E usa batom vermelho com pele alva e cabelos pretos.
O que adoro, acho uma combinação perfeita, matadora. Muito simpática, mas
parece ter algum cargo de gerência, papel em que aparenta ser muito durona.
Penso em comprar uma camisa para ela caso vá mesmo ao Rock in Rio. E uma para
mim também. Se o dinheiro só der para uma? Aí a coisa complica, mas negociarei
com mamãe. Penso em um cartão com o meu endereço do Facebook. É uma abordagem
muito semelhante às demais, diria que é o meu jeito de agir e que, infelizmente,
não surte muito efeito. Aliás, nunca surtiu nenhum efeito substancial, qual
seja, conquistar uma garota. Mas de que adiantaria conquistar a Garota do Hotel,
deixar meu coração em Portugal e retornar ao Brasil. Seria doído demais. Afora
que só sendo muito chata ou muito dedicada para não ter um namorado bonitão já.
Acho que vou deixar essa ideia de lado. Ou não. Ela é como se fosse uma Garota
da Noite melhorada, sei lá, uma mistura Natalie Portman com Laura Pausini. Estou
sem cabeça para escrever. Melhor deixar para a amanhã. Ou abro outra Coca?
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O bonequinho do sinal é diferente aqui, tem pés. |
7h40 (11h40, horário de Portugal). Fui deixar mamãe num
shopping e comprar Coca-Cola. Voltei e estavam arrumando o meu quarto, por
isso, desci e tomei uma extorsiva Coca-Cola no bar do hotel. Gostei do hotel. É
quatro estrelas e essa é a medida exata de estrelas que merece e que me faz
sentir bem. Acho que um cinco estrelas seria afrescalhado demais para os meus
padrões.
7h54. Há mais gente que não tem emprego formal dentre os que
conheço, que não vingou profissionalmente do que eu gostaria de supor. Vendo o
Facebook me dei conta disso.
8h09. Fumei o último cigarro da carteira. Acho que vou tirar
um cochilo. Penso em, no meio da tarde, descer com o meu notebook lá para o bar
só para mudar de ares. Preciso ver se é possível e se posso também debitar na
conta do hotel as coisas que eu consumir. E principalmente se a Garota do Hotel
lá estará. Gostaria de ter coragem de pedir para tirar uma selfie com ela,
visto que foi a coisa mais interessante e bela que vi em Portugal até agora.
Juro.
8h24. Estava revisando o que escrevi até agora e percebo que
tenho encontrado garotas interessantes num espaço mais curto de tempo. A vida
me sorri nesse aspecto. Mas não é um sorriso tão largo que possa qualificar de amor
ou paixão recíproca. Infelizmente de recíprocas elas não tem nada o que é uma
pena. Perguntei a um segundo taxista quando daria para me levar ao Rock in Rio
e ele me respondeu o mesmo que o primeiro, cerca de dez euros. Estou no mínimo
curioso para rever a Garota do Hotel. Ela tem um lindo sorriso. Ela é toda
linda. Se eu pudesse optar entre ela e a Garota da Rabeca? Eu poderia optar
onde iria morar? Essa pergunta é a melhor resposta que eu posso dar. Portugal é
uma cidade de primeiro mundo, europeia, mas por ter a mesma língua e ser a
cultura mãe do Brasil, eu me sinto muito mais em casa do que na Alemanha. Em Munique
eu me sinto mais estrangeiro, mais estranho a tudo aquilo, embora goste muito
da cidade e especificamente de onde a minha irmã mora. Mais estranho ainda,
talvez por ter ido menos vezes, eu me sinto nos Estados Unidos. Como Bono (do
U2) muito bem pôs, os EUA são um sonho que o mundo inteiro possui. Para mim, em
grande parte por conta da indústria cinematográfica de lá. Estou estranho desde
aqui cheguei. Não sei se é por conta do fuso-horário diferente. Sei que algo em
mim não é o mesmo de quem deixou Recife. Ou melhor é o mesmo ainda não adaptado
à nova realidade. Não faz parte da minha realidade acordar de 4h40 da manhã
para comer linguiça croissants, pastéis de nata e cappuccino. Mas tenho que admitir
que a comida daqui é simplesmente divina.
9h46. Experimentei o prato de mamãe e estava delicioso,
talvez peça no jantar. Por mim, não sairia do hotel a não ser para o jogo do
Brasil e para o Rock in Rio. Pode ser que no final de semana, meu amigo daqui
tenha algum plano. Sei lá. Sei que me sinto meio sonolento desde que cheguei
aqui. Talvez esse cochilo à tarde me reanime. Me ponha nos eixos e me tire essa
leseira que me acomete desde que aportei aqui. Mamãe confirmou que posso pedir
coisas no bar/restaurante do hotel e, com a minha assinatura, colocar na conta
do quarto, então não preciso de dinheiro. Também me informei e posso levar o
computador para o bar e escrever lá. Certamente será um programa que
considerarei com muito carinho. Especialmente se a Garota do Hotel estiver lá. Grande
troca, uma garota com namorado por uma garota que mora em outro país, qual será
a próxima, uma marciana? Hahaha.
10h50. Fui descer para esperar mamãe trocar de roupa e me
informei quanto era o táxi para a Praça do Comércio, já pensando no jogo
amanhã. Sete ou oito euros, respondeu o taxista. Minha mãe concordou com o
valor. Então de táxi irei. Estava com uma música de Djavan na cabeça, mas não
me lembro o nome...
Banheiro do hotel em que estamos o Novotel Lisboa |
12h14. Cara tomei aquele banho agora. Como nunca havia
tomado. Bem longamente na banheira, bem quente, ouvindo só anos 80 e relaxando por
longos e longos minutos, uma experiência uterina, e depois, para finalizar, uma
boa chuveirada. Estou novo. Vou dizer ao meu amigo que, se ele quiser, pode vir
que estou pronto. Dormir só embolaria a minha adaptação ao fuso-horário daqui.
Estou meio sonolento, mas não há grande problema nisso. A terceira página está
prestes acabar. Última linha. Fico por aqui. Relaxado, relaxado.
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