Vamos ver se ainda tenho alguma mágica disponível. Se a
torrente de inspiração que me tomou nos últimos dias ainda reside em mim.
Acordei na hora que queria acordar, 14h00, mais ou menos, são 14h18. Dormi o
quanto o meu corpo pediu. Tive sonhos, meu irmão estava em algum deles, lembro
da sua presença e é tudo o que me lembro. Deve ter sido em decorrência da
belíssima carta que escreveu para papai e distribuiu no Facebook. Ela me
impressionou bastante. Sinto saudades de perguntar as coisas a papai e obter as
respostas corretas ou sensatas, mas sinto que ele vive em mim como uma persona
repressora. Uma parte de mim que me descredita e me ofende. Não sei realmente
se a parte que faz isso comigo é de mim e já era de mim, mas sinto uma forte
influência do meu pai na descrença nos meus mirabolantes sonhos. Nesse momento
não acredito em nenhum. É um saco isso, quando esse lado aflora.
14h51. Fui à cozinha fazer alguns dos meus deveres domésticos
e mamãe falou que está com tanta dor no joelho que mal pode falar. Quero ver
isso na viagem. Embora vá fazer uma infiltração às vésperas do evento. Espero
que ajude. Muito. Ontem, o “DIVERSOS V” foi para o Vate, pois resolvi soltar os
bichos mais sem rédeas do que aqui. Foi bom. Eu acho que eu aprendi, com tantas
mudanças geográficas, a não me apegar as pessoas e por isso não sinto tanta
saudade quando das suas partidas definitivas. Vejo como uma etapa desagradável
e essencial à vida. Não acredito no além. Acabou, acabou. Preciso responder à
minha amiga do ateliê chinês. Para ser sincero fiquei um pouco desapontado com
os olhos e com o cabelo sem variações de tom da Asuka na moto. Mas a base é
linda e todo o resto fico perfeito. Não vou pedir alterações das quais possa me
arrepender como da última vez. Estou tomando o café requentado da quinta-feira.
Está de bom tamanho, já tomei toda qualidade de café nos meus internamentos. Café
é outro item valioso nas internações. Café e cigarros. Tinha um dos perenes que
estava tomando a água do cinzeiro que improvisávamos com um copo de plástico e
água ou café para apagar as cinzas. Não sei como ele conseguia e o que o
motivava a fazer aquilo. Sem dúvida não tem lá muito paladar. Sei lá. É
inescrutável sem uma boa conversa o que vai na cabeça das pessoas e ele não era
muito afeito a diálogos. Aliás era uma pessoa solitária, rejeitado por quase
todos os outros, sãos, não tão sãos e afins. Vivia a cismar com o cigarro que
tinha em mãos e com a sua chinela e a pedir góias. Insistentemente, irritantemente,
pedir góias, no que era mais bem-sucedido que mal, por incrível que pareça.
Pelo menos comigo. Eu sempre fui muito mão aberta em relação a cigarros. Talvez
a minha contribuição aos seus pedidos não sirva de parâmetro. Mas era o ser
mais chato do Manicômio, por isso repudiado pelos demais. Deveria ter feito
esse tipo de descrição quando do internamento. Até tentei em alguns momentos,
mas são breves. Deveria haver mais disso no livro. Mas o livro já está
caudaloso demais, a missão é enxugá-lo no que não for pertinente, no que for
irrelevante. Eu só consegui eliminar duas páginas de Word.
15h19. Mandei uma mensagem de e-mail para a incrível
revisora avisando da minha viagem. Parte da magia que possuía já se perdeu, mas
não posso desanimar. Eu sinto que fiz uma conexão mais íntima comigo mesmo, ao
mesmo tempo que mais abrangente. Encompassando percepções que antes não me
saltavam às sensibilidades. Vou ligar o ar.
15h25. Não estou com saco de ir para a Casa Astral hoje. O
máximo que posso fazer é descer para a piscina. Não quero socializações
demandantes. Acho que vou fazer o panfleto do meu amigo da piscina. Quero me
distrair com algo outro que as palavras.
16h08. Interessante, nos momentos de desalento, descrença,
busco as palavras. Fiz o volante para o meu amigo da piscina, sem muito
esforço, mas dentro dos conformes e mandei para ele.
16h23. Ele já demanda alterações, mas eu acho que hoje vou
para Casa Astral, se achar astral dentro de mim para tanto. Há muitos
conhecidos num nível de conhecimento que me incomoda. Muito superficial e cheio
de oba-oba, com os organizadores e funcionários da casa. Mas talvez me arme de
um pouco de ousadia e vá, nem que seja para observar as beldades, se beldades
do quilate que aprecio houver. Afora os amigos que podem ir. Meu primo-irmão já
se manifestou a respeito. Talvez o meu amigo cervejeiro.
16h32. Sinto, percebo que essa limitação de três páginas,
por mais que produza mais posts por dia, faz, afora outros elementos, com que
me conecte mais profundamente com a minha alma, comigo mesmo. Mergulhe um
pouquinho mais fundo. Pode ser impressão apenas. E impressões podem ser
ilusórias quando se tratam das minhas. Gostaria de ter um gráfico estatístico
de quantas das minhas impressões condizem com a realidade, não me surpreenderia
que a maioria não condissesse. Gostaria que algumas não condissessem mesmo e
outras desejaria do tamanho da minha alma que fossem plausíveis, compatíveis com
a realidade. Factíveis. Mas são tudo impressões apenas e, como disse, me
impressiono de forma equivocada, geralmente.
16h44. Olhando o meu blogspot. Vi a palavra-chave AT. É um
assunto que tem me gerado um rebuliço ruim na alma.
16h52. Pensando sobre cigarros, no prazer de fumar quando me
apetece, que não tenho, acendi automaticamente um, foi sem perceber, só me dei
conta quando do primeiro trago. Enquanto degustava o cigarro, pensei no caso
AT. E só vejo duas alternativas de pessoas que me fariam bem a companhia. Terei
que dizer isso a Ju, por mais que me pareça uma tarefa difícil, por mais que
banal. O que imagino que uma AT pode me proporcionar? Companhia que me agrade,
não me intimide e que haja uma conexão. Vou enumerar as duas únicas
alternativas que visualizo e ver o que Ju pode fazer e o que acha. E a
tentativa da AT vai ficar para depois da viagem.
17h03. Acabei de mandar um WhatsApp para Ju, acerca do
pagamento e do recibo. Eu tenho que aprender a revisar o que escrevo pelo
WhatsApp. Sempre, sempre passa um erro. Vergonhoso. A realidade me agrada ao
passo que me agride. Achei a frase bonita e significativa de mim e escrevi.
Estou com minha alma já alinhada para a Casa Astral.
17h24. Já comuniquei ao meu amigo da piscina do meu destino
hoje, já firmei parceria com meu primo-irmão para ir, só falta a minha mãe
despertar para iniciar o movimento de partida. Estou com refluxo quando durmo.
Talvez por comer justamente perto da hora do sono. Aliás, eu como e vou dormir.
E como bastante. Acho o verbo comer tão animal, tão coisa de bicho, mas eu sou
um bicho e preciso comer como todos eles. Só faço isso na hora mais inadequada
para os ditames médicos. Estou bem, com saúde, então, afora os refluxos, nenhuma
reza de médico vai mudar o meu horário de alimentação. Empaquei. Não sei o que
dizer. Vou pegar água com gelo.
17h32. Os bonecos do meu quarto-ilha, os abertos, pegam
poeira, por isso a proteção de vidro é essencial, por mais que os quisesse
menos confinados e mais tangíveis, os prefiro sem poeira. Vidro, então. A
incrível revisora me respondeu o e-mail, dizendo que já está terminando a
segunda leitura do livro, sugerindo algumas mudanças da edição e que quer
conversar comigo na semana que vem. Disse-lhe que estava intimidado para um a
conversa presencial pela grande carga emocional que coloquei nesse projeto ao
mesmo tempo que tenho várias perguntas a fazer para ela. Pedi que ela decidisse
entre o diálogo se dar presencialmente ou pela internet. Mas acho que deveria
ter investido no presencial. Algo em mim diz isso.
17h52. Ela me respondeu e repliquei dizendo que estou mais
inclinado para o presencial, mas que precisava de uma dose de terapia para
enfrentar e que segunda ou terça dou a resposta a ela. Se estivesse com a AT, uma
das duas, me fazendo companhia, eu encararia muito mais de boa.
17h55. Cadê mamãe que não acorda? Acho que estou me
permitindo ser mais eu nesses textos, por mais que mais concisos. Eita, já
estou na terceira página, perdido em pensamentos mil com essa história da
incrível revisora estar acabando a revisão e da fase quatro do projeto poder
ser engatilhada. Isso me assusta. O contato com o meu tio que poderá ser a via
para a publicação do livro me põe muito empulhado. A vontade que eclode
primeiro é a de desistir de tudo, mas isso é o choque da novidade, da
transformação da minha realidade de forma significativa. Fundamental. É um
passo que dou para a concretização do meu sonho. E para a possível reverberação
negativa que terá, se publicado. Nossa, como queria que o meu tio fosse o meu
anjo, que viabilizasse a publicação da obra. Estou excitado com a notícia do
final da revisão, mas ainda não a degluti, a ficha ainda não caiu.
18h19. Minha mãe ainda não acordou. Ozzy. Mas, se a véia
precisa descansar, que seja. Não tenho pressa nenhuma de ir para a Casa Astral.
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