Ao final de “Logan” – finalmente assisti com a minha mãe –
fui assaltado por várias sensações familiares e boas, como se fossem
premonições desconexas da minha morte. Ou assim percebi. Minha mãe tem sofrido
bastante por conta da queimadura na axila. Ela acha que não vai durar muito.
Verbalizou isso. Acha que está morrendo. Isso me preocupa. Queria que ela
procurasse logo o psicólogo. Será que morrerei hoje? Seria surpreendente. Não
me falta nada. Já cumpri o que tinha que fazer na aqui na Terra, é tudo uma espera
pela morte agora. Claro que queria namorar novamente, com calma e cuidado, sem
partir logo para o sexo. Mas posso morrer sem isso. Acho que tudo o que estou
escrevendo é uma grande asneira. Ainda tenho tempo de vida. Mas foi estranha
essa sensação de morte. Não sei porque me veio. Não gosto da sensação de morte
de mamãe. Da minha, a acolho, mas não queria morrer agora. Queria digitar...
0h26. Fui fumar um cigarro de verdade no hall de serviço.
Ouvi o elevador subindo e pensei que poderia ser Clementine. E não é que era de
fato ela com o seu namorado? Seria curioso se fossem as últimas duas pessoas
que me vissem vivo. Não sei que emoções despertariam neles, mas acho que
poucas. Quase nenhuma, pois os vínculos são muito frágeis, quase inexistentes.
Falam comigo por mera cortesia social. Estou com uma leve dor de cabeça, mas
não acredito de fato que vá ter um derrame ou um ataque fulminante do coração e
morrer no meio da noite. Amanhã será um domingo tedioso, prévia indesejada da
segunda. E muitas segundas se seguirão até o meu fim. Não sei nem por que estou
escrevendo tais delírios funestos. Acho que vou colocar Infected Mushroom para
rolar. Nunca mais ouvi. Kurt Cobain deu um tiro na cabeça. Quantas vezes
cogitei nessa possibilidade. Aliás, contratar alguém que fizesse o trabalho por
mim. Nunca consegui. Faltou-me coragem. E não quero morrer agora. Embora a
morte venha muitas vezes sem maiores avisos. Botar IM para ouvir.
0h40. Gostaria de saber por que essa sensação de morte me
assaltou. Como uma série de microflashbacks de sensações prazerosas seguidas
por uma intuição de que iria morrer. Seria uma pena morrer sem ter todos os
meus bonecos dispostos no meu quarto reformado para recebê-los. Mas tudo isso
torna-se irrelevante, pois da vida nada se leva. Gostaria de levar a cabo o
projeto Aurora, se ainda houver Aurora em meu peito depois de tanto tempo. Acho
que ainda vai haver. Como resquício de Clementine ainda há, ainda bem que de
forma bem mais branda e menos pungente que no passado não tão distante. Mas não
tenho por que falar da minha morte pois acho que essa não vai ser minha última
noite na Terra. Ainda guardo esperanças de presenciar a Singularidade. Mas não
muitas, elas foram abaladas pelas opiniões dos naysayers, sou facilmente impressionável por críticas. Elas sempre
me parecem mais verídicas que argumentos positivos. Talvez por ter ouvido
tantas de pessoas que tinham gigantesca ascendência sobre mim. Não sei bem o
que estou escrevendo. Só sei que se tiver morte cerebral quero que meus órgãos
sejam doados e se morrer de modo mais inútil gostaria que meu corpo fosse doado
para uma Faculdade de Medicina para dissecação em aulas de anatomia. Em último
caso, cremação. Não quero enterro. E quero que a Gatinha distribua meus bonecos
e videogames para crianças carentes. Esse tom de despedida não condiz com a
realidade, não é porque fui acometido dessas sensações e estou com dor de
cabeça que a morte me ronda. Acredito que, se a ciência médica não evoluir,
minha morte vá ser lenta, incapacitante e repleta de sofrimento. Não sei por
que encasquetei com isso, mas tenho essa crença desde que comecei a fumar
muito. E de ver parentes tendo ou morrendo por conta de câncer. Acho que é mal
de família. Acredito que seja uma sina minha. Acho que vou digitar mais do
caderno da internação. Não estou com disposição para escrever aspirações para a
minha morte. Quando encher o saco, volto para cá. 0h56. Já é domingo e continuo
vivinho da silva. Ao caderno, então.
1h46. Vou me preparar para dormir.
-x-x-x-x-
15h22. Como previ acordei vivo. A impressão de morte nada
mais foi que isso, uma impressão. Não tenho almoçado. Isso para mamãe é um caso
de evitar a “família”, ela e meu padrasto. Fato é que não estou com fome
nenhuma. Fato também que acho que eles se dão melhor almoçando sós, pois conversam
suas conversas entre si, eu seria um ser alienígena ao universo pessoal deles.
Minha mãe está superiormente alegre hoje. Porque a queimadura em sua axila
finalmente parece melhorar aos seus olhos e porque acho que tomou vinho. Que
meu padrasto não saiba. É da política de saúde dele que ela nunca mais beba na
vida. Acho severo demais de sua parte. Não posso botar o Spotify aqui, pois
minha mãe o está usando na cozinha a partir do seu celular. Não possuímos conta
família, apenas uma conta individual que ela usa do celular e eu do computador.
Deixe que ela aproveite um pouco o serviço, eu o uso a imensa maioria do tempo.
E ela está num astral tão bom, só diminuído pela minha ausência no almoço.
15h40. Guardei parte do almoço na geladeira a pedido dela.
Ela achou que eu apareci na cozinha logo após o almoço deles para comer. Eu
reiterei sinceramente que não estava com fome. Mas ela acertou que só me
arrisquei a ir para a cozinha quando ouvi meu padrasto se fechar em seu
escritório, ou seja, quando haviam acabado o almoço.
16h05. Acho que vou assistir um filme “Life” que é
classificado como horror e sci-fi no site que baixo. Acho que a produção deve
ser bem cuidada, o que conta muito em filmes de ficção científica, dados os
atores envolvidos. A nota o IMDb foi baixa, mas a de “Logan” foi alta,
entretanto, ficou aquém das minhas expectativas, mais altas ainda. Fiquei
decepcionado e não consegui realmente criar um vínculo afetivo com os
personagens, o que é essencial para a boa apreciação da película. Meu pai é que
costumava chamar filmes de “película”, acho que hoje nem usam mais isso, é tudo
digital. Mas deu para entender, eu creio. Falava sobre morte. E velhice me
assombra muito mais do que morte. Vejo minha mãe, debilitada por diversas
razões da velhice e isso me assusta. Não incapacitada, mas debilitada. Não sei
quantos anos restam de uma coisa para a outra. Tudo isso me assusta deveras, e
temo pela minha velhice. Pela minha incapacidade, pela minha dependência. Por
contrair, por exemplo, um enfisema pulmonar. Acredito na evolução da medicina e
nela deposito todas as minhas fichas. Porém, é bom lembrar que a evolução da
medicina é guiada pelo interesse da superpoderosa indústria farmacêutica. Que
pode ao mesmo tempo acelerar alguns desenvolvimentos e brecar outros, por serem
soluções mais baratas, logo menos lucrativas, para os males de saúde que
afligem a humanidade. Só vejo solução para o fim dessa máfia com o advento da
Singularidade. Mas talvez não veja isso, por ser uma ficção ou por surgir após
a minha morte. Novamente não acho problemático deixar de existir, vejo problema
no modo como deixarei de existir. Que pode ser lento, sofrido e doloroso.
16h30. Não quero que reformem o meu banheiro. O do meu
padrasto, ou do ex-quarto da minha irmã, como queiram, já apresenta algum tipo
de vazamento, pois já vi duas vezes a água saindo do banheiro e adentrando o
chão do quarto. Não sei se é por causa da cortina que está curta, mas fato é
que o meu banheiro não apresenta vazamento nenhum há mais de 20 anos. E não
quero que isso mude. Gosto do meu banheiro do jeito que está. Quero que
permaneça assim. O meu quarto já são outros quinhentos. Não quero mudar o piso
tampouco, mas preciso de prateleiras adequadas para exibir minha coleção. O
elefante branco que amealhei para mim. A verdade é que queria viver aqui nesse
apartamento até a minha morte. Mas isso me parece cada vez mais uma
impossibilidade. A que se me afigura é viver nos EUA quando a minha mãe se for.
Isso não é um futuro que observe como agradável, visto que tenho toda a minha
rede social aqui. Minha vida toda é fincada aqui em solo recifense. Ir para um
país estranho viver com a família nuclear do meu irmão não é algo que me
apeteça. Pois meu isolamento social não vai ser escolha minha, me será forçado.
E inescapável. Aqui, tenho minhas saídas, tenho o CAPS, tenho amigos, colegas,
conhecidos, família. Sei lá, é uma coisa que evito pensar, mas que vai e vem me
assalta e me incomoda tremendamente. Não posso forçar meu irmão a mudar o seu
destino para se alinhar ao meu. É muito mais simples e fácil o inverso. E irei
sem reclamar. Mas provavelmente, não querendo ser trágico nem nada, cairei em
depressão profunda com esta nova realidade. Como caí quando tive que me mudar
de São Paulo para Recife sem conhecer ninguém aqui e tendo minha família
distante de mim. Foi uma transição difícil e pensava em morrer todos os dias.
Só se fez aceitável quando me mudei para cá, para este prédio e formamos uma
turma superunida e onde conheci o amor e o desamor com minhas duas primeiras
namoradas. Aprendi muito aqui. Depois houve a turma da faculdade, com quem
muitíssimo esporadicamente me encontro. Encontrar com eles agora me assusta,
pois não tenho intimidade mais nenhuma com a turma, cada um que tenha
construído sua vida da forma que lhe foi possível, mas acho que colocaria todo
o receio de lado se a ocasião se apresentasse. Eu poderia postar no Facebook
uma mensagem dizendo algo como “Que tal um reencontro da turma de Publicidade
da UFPE? Já faz tempo, né?”. Mas não farei isso, algo maior me impede. Minha
mãe me mandou um e-mail da pré-venda dos ingressos da nova turnê do U2.
Confesso que não estou nenhum pouco animado a ir. Acho que não vou, para ser
sincero. É em São Paulo e talvez pudesse ficar na casa do meu amigo cineasta,
mas admito que me falta a motivação para tanto. Ainda mais que terei acabado de
chegar da viagem da Alemanha, que também não me agrada nem um pouco, para
emendar em outra que não me fede nem cheira, ou se cheira, o odor não me
agrada. Afora isso, os ingressos devem ser uma fortuna, os da área VIP, onde
queria ficar, se fosse, provavelmente se esgotam em minutos e a verdade é que
não estou com vontade de reencontrar Bono e companhia. Posso queimar a boca e à
meia-noite estar com mamãe em seu computador comprando o ingresso, mas não me
vejo nessa cena por enquanto. Pior que mamãe quer ir talvez para os EUA no
final do ano para visitar o meu irmão, no meio da maior neve. Não queria isso
também, por mais que seja uma oportunidade de trazer bonecos para o Brasil. Mas
ir só por essa causa frívola não me apetece. Nossa, já estou na terceira página
desse monte de nada que escrevo. Isso vai sempre me impressionar.
17h12. Peguei um copo de Coca. O estoque de gelo durará
muito mal para hoje. Meu padrasto está na sala, logo não posso fumar um cigarro
de verdade, o que anseio desde que acordei. Mas o título do post é digressões
sobre a morte. Eu nem sei o que significa direito digressões, mas achei que a
palavra cabia, desde que trate sobre a morte. Ficarei espantado, abestalhado
se, depois de morrer, o meu eu continuar existindo. Se for como os espíritas
pregam, eu não deverei “despertar” em um plano muito evoluído. Mas não acredito
nessas crendices. Acredito que a mente humana tem potencialidades desconhecidas
e que isso deve servir de justificativa para as experiências místicas de que
muitos falam. Conversamos sobre o chá do daime e que foi uma experiência
transformadora para o meu amigo que disse que tomou, porém ele disse que para
quem é viciado ou está com a vida meio conturbada a viagem pode ser bastante
pesada. Eu continuo tendo curiosidade, por mais que não me sinta emocionalmente
preparado para a experiência. Sei lá, a vida me levará ao encontro ou
desencontro dessa substância. Fato é que não queria morrer sem experimentar
algo realmente alucinógeno. Conhecer essa parte de mim que fica obscurecida
pela plena consciência. Senti que esse meu amigo anda muito solitário, tanto é
que pegou meu primo-irmão e alugou-lhe os ouvidos aparentemente falando de sua
vida pessoal. Sugeriria a ele um psicólogo, mas ele, até onde sei, é um, que
talvez esteja vivendo num isolamento tão grande quanto o meu, porém sem as
palavras para desabafar. Sinto meu corpo já apresentando a flacidez que é
peculiar a idade que ostenta e isso me enche de desgosto pelo meu físico. Ainda
bem que tenho os genes corpulentos da família do meu pai e da minha mãe, então
não ache que vá ficar tão flácido como muitos por aí. O meu sedentarismo, junto
com o fumo é que me destroem. E não quero abdicar nem de um, nem do outro. Me
são muito preciosos para o meu bem-estar nesse aqui e agora, por mais custosos
que me sejam no futuro. Queria perder o meu bucho, mas esse parece grudado em
mim com firmeza e minha dieta, que anda muito capenga, não consegue expurgá-lo.
Não queria ir à Alemanha. As passagens já estão compradas e uma tem o meu nome.
Saco. Não queria ter uma morte na qual o meu corpo ficasse todo despedaçado ou
disforme, uma morte por acidente de trânsito, por exemplo, ou da queda de um
avião, porém queria uma morte rápida e indolor como essas. Pelo menos acredito
que sejam rápidas e indolores.
17h40. Liguei o celular agora e vi toda a movimentação da
minha turma, afora a sexta, não participei ou participarei de mais nada. Meu
primo-irmão foi para as “Diretas Já” no Marco Zero. Nem sei se ainda está
rolando. Amanhã tenho CAPS e não estou com nenhuma disposição para sair,
prefiro ficar aqui falando sobre morte. Que programão. Hahahahaha. Pior é que
sei que me arrependerei de não ter ido, mas só lembrei de ligar o celular
agora.
17h58. Me perdi no Facebook, mas parece que a festa das
“Diretas Já” ainda está rolando, vi uma filmagem ao vivo do local. Deu até
vontade de ir. Mas como encontrar meu primo-irmão lá? Eis a questão. Parece que
está tranquilo e não tão lotado quando poderia julgar. Eu tenho medo de onde a
onda feminista vá parar. Temo que possa gerar uma antipatia das mulheres em
relação aos homens, o que não é legal. As meninas daqui já são tão frescas,
como o meu primo-irmão diz, imagina que olhar para a bunda da menina, para os
peitos da menina é desrespeito agora. Algo que é intrínseco ao homem, na minha
opinião, da mesma forma que a as fêmeas escolhem o pavão pela cauda. Não posso
crer que olhar seja um ato de machismo, assim estamos criando um abismo social
entre homens e mulheres. Elas estão criando. Se não querem ser olhadas por que
não vestem burcas? Não gosto nem de tocar nesses assuntos polêmicos aqui porque
posso perder leitoras. As únicas duas que sei que tenho. Talvez eu é que seja o
machista da história e esteja desacostumado com os novos tempos. Antigamente
quando me achava pior do que a bosta do cavalo do bandido, evitava olhar para
as pessoas, olhava sempre para o chão. Agora que consigo olhar no mais das
vezes para as pessoas, e aí incluem-se as do sexo feminino, não posso reparar
nos detalhes que me agradam? A visão é o sentido mais importante para mim. É o
que empresta mais sentido à vida, principalmente observar o que é belo. E
muitas vezes acho peitos e bundas belos. Que mal há nisso? Se quiserem olhar
minha bunda, meu bucho, minha cara, com intuito sexual ou não, não vejo
problema algum nisso, mas o feminismo está indo por aí e acho isso de uma
rigidez ideológica perigosa, que tende a afastar mulheres de homens. Vai ver que
é a natureza se encarregando de controlar o crescimento populacional dos
humanos com extremismos sociais, sei lá. Ainda bem que a parte que primeiro me
agrada numa garota é o rosto, mas confesso que logo depois é inevitável uma
análise do conjunto. Não acho isso moralmente errado ou acintoso para com as
mulheres. É de minha natureza, ninguém me condicionou a isso. Não que tenha
percebido. Acho que é simplesmente como os homens são. Eu julgo, sim, uma
potencial parceira pela aparência. Infelizmente a beleza é algo que me agrada
muito. Queria até que agradasse menos, mas sou assim, para o bem ou para o mal,
geralmente para o mal, pois estou sozinho esse tempo todo. Já começo a duvidar
se o verbo é “estar” ou “ser” sozinho. Achava horrível a ideia de que certas
mulheres ficavam para titias, agora sou eu que me vejo nessa posição de ficar
para tiozinho. Isso me soa tão antinatural, tão não-eu. Mas a solidão parece
que fez casa na minha vida e está bastante agradada da sua morada. Eu poderia
começar a jogar “Persona 4”. É só ligar o PS3 e jogar. Mas não tenho a mínima
disposição. Morte, morte, morte... o que dizer mais acerca desse tema? Que cada
dia é um dia a menos. Que me peguei com medo de que Aurora morresse? Ela vai
morrer, eu sei, mas agora, seria uma dor inescrutável para mim. Ainda bem que
foi só pensamento. Um pensamento que não me sei porque veio. Será que nutri por
alguns instantes o desejo inconsciente de sua morte? Se sim, por quê? Não
consigo alcançar uma maneira em que isso beneficiasse o meu ego. Aliás, só vejo
uma, mas infelizmente não posso comentar aqui. E é deveras egoísta e deveras
libertadora. Mas não desejo isso. Não desejo a morte de ninguém, só de doentes
terminais em sofrimento. Já desejei, como disse, muito a minha morte, mas não
mais. A não ser que perdesse a pensão da curatela. Isso me desnortearia por
completo. Não sei se guardaria a paz de espírito que tenho agora graças a esse
provento sem ele. Me desestabilizaria
financeira e emocionalmente. Não quero mais falar sobre a morte, se vier mais
algo veio, quero só falar por falar. Vou pegar outro copo de Coca. 18h44.
18h54. Aproveitei que meu padrasto deu uma saída para fumar
um cigarro de verdade no hall de serviço. Sobre o que falar? Estou tomado por
um assunto que não encontra espaço nesse blog. Então pensarei em outros. Queria
ter liberdade de tratar abertamente de tudo o que concerne a minha vida aqui,
mas não é prudente, nem oportuno. Talvez um dia seja. Mas não nessa década.
Talvez no final da próxima. Não quero que minha mãe por acaso leia nem o que
agora coloco, imagine se expandir o leque ao que coloco no meu blog secreto.
Mas não sinto necessidade dele agora. Posso falar aqui. Cada vez mais me
desencanto com o boneco que comprei. É o anticlímax pós-compra. Não que eu
queira ardentemente outro. Não há esse que me cause esse frisson, nem há coisa
outra que eu queira comprar, talvez só mais e-liquid
para o Vaporfi. Não sei se o que tenho durará até que a reposição venha. Gosto
de como o meu amigo da piscina encara a sua idade com tranquilidade e até como
sendo bem-vinda. Gosta quando alguém o chama de “coroa”. É um pensamento
diametralmente oposto ao meu, que não quero crescer, não quero ser visto como
coroa, que quero arrumar uma namorada com menos de 30 anos. Isso não vai acontecer,
tenho que introjetar esse pensamento. É tudo fantasia. Vou ficar sozinho até o
final da vida, essa é a realidade. Mas pretendo levar a minha ideia da caixa a
cabo. Se tudo permanecer como está até que o momento se faça presente. Dentro e
fora de mim. Acho que nem isso terei coragem de fazer. Guardo a caixa como um
ás na manga, como a jogada decisiva da minha vida. Mas isso são asneiras que
não posso repartir aqui. E não passam disso, asneiras, sandices. Queria mesmo
era esquecer tudo isso. Literalmente apagar da minha memória, talvez uma das
memórias mais preciosas que guardo. Talvez a memória mais preciosa. Mas se
fosse me dada a alternativa, escolheria apagá-la da minha mente. Seria melhor
em quase todos os sentidos. Seria melhor para todos, menos para mim e a maioria
sempre vence. E prova como estou equivocado. Fico melhor de barba. Tenho um
rosto demasiado disforme e feio, a barba vem delinear os traços um pouco, me
emprestar um pouco de unidade a um rosto onde, ainda mais gordo, as partes que
o compões parecem perdidas no bolachão que é a minha cara. Sou um cara feio,
infelizmente. E mais infelizmente ainda, um cara feio que aspira por belezas
sublimes. Sou um cara feio por dentro também. Já fui melhor, mas acho que
depois de tantas internações e contato cotidiano com pessoas de moral duvidosa algo
em mim se corrompeu. Afora o seu isolacionismo dentro da minha casa, onde vivo
somente para essas palavras. Por sinal já estou na sexta página e já me expus
demais. Porém, não sinto vontade de parar de escrever. Devia era estar
digitando o caderno da internação, mas tenho achado aquilo tão vazio e chato
que nem sei por que continuo digitando. Acho que para ser fiel à promessa que
fiz para mim mesmo de que digitaria tudo e tentaria publicar. Só por isso. E por
isso e porque este post já está muito extenso, eu vou digitar mais um pouco.
23h34. Digitei até que um trecho grande, acho que três ou
quatro dias, mas já começo a divagar sobre coisas fora da internação e me
contradizer em relação ao que havia dito previamente. Manterei assim, pois
assim se deu. É um diário besta, exatamente nos moldes deste aqui só que
escrito dentro de um sanatório privado onde meu grupo de amigos é um bando de
viciados. Não há muito de interessante na narrativa, muitas vezes fico sem assunto
e reclamando do tédio. Mas levarei a cabo. Preciso tomar banho e me preparar
para dormir. São 23h39 e amanhã tenho CAPS. Mas confesso que não estou com o
mínimo de sono. Por mim, ficava de virote aqui escrevendo até amanhã. É muito
cedo para prever ou promover isso, entretanto. Espero decididamente a pré-venda
de ingressos do show do U2 abrir para clientes especiais do BB, como minha mãe
me encaminhou no e-mail que recebeu e que começará à 0h01 de amanhã, ou seja,
dentro de alguns minutos. Quero ver os preços, só para ter uma ideia. Se me
forem acessáveis os preços mesmo sem eu estar com o cartão de mamãe aqui para
poder inclusive comprar se quisesse. Ela já foi dormir e acho que os ingresso
se esgotarão rapidamente. Vai ser interessante acompanhar a movimentação,
novamente se conseguir ter acesso.
0h32. Vi, esperei na fila virtual a minha vez e quando fui
simular a compra a “Red Zone” que parece ser o melhor lugar do show e custa
absurdos R$ 1.250,00 já estavam indisponíveis. Bom, o show do U2 eu perdi. Não
sei o custo de produção, mas esse negócio vai movimentar uma grana preta. Se
forem 50 mil pessoas, o que não é impossível, são 50 milhões de reais, por
baixo. Digamos que o custo de produção seja 25 milhões de reais, já inclusos os
cachês dos artistas. São 25 milhões de lucro. Uau. Não serei um dos
financiadores dessa fortuna instantânea. Saberei em breve se a minha prima e seu
marido compraram. Aposto que sim. Ele não perderia um show desses.
1h09. Me perdi nas notícias da E3, a maior feira de
videogames do mundo. Confesso que nada me empolgou, tudo parece complexo demais
e monotemático ou reciclado demais. É como se visse mais do mesmo em alta
resolução. Acho que assim como vejo que a indústria de bonecos atingiu seu
ápice e agora vai tender a encolher novamente e se estabilizar – ou até deixar
de existir – os videogames estão passando por seu ápice e gradativamente vão minguar
também, até que uma nova revolução se alevante nesse universo que hoje é mais
lucrativo que a indústria de cinema. Mas isso são tudo especulações ou eu
projetando o meu desinteresse por esses dois hobbies como sendo um fenômeno de
massa. Mas não consigo ver o que virá depois do Xbox One X. Não tem mais muito
para onde correr nesse formato que o Playstation e o Xbox seguem. Esse Xbox One
X já oferece gráficos em 4K, para onde ir além disso? Sinceramente não sei.
1h39. Finalmente passou. Fui atacado por uma crise do que eu e meu padrasto
julgamos ser um mal chamado proctalgia fulgax. É uma dor muito incômoda e,
graças aos céus, rápida, não dura mais de quinze minutos. Mas são quinze
minutos muito sofridos. Eu achei a de hoje leve, achei que não doeu muito o meu
cóccix. Tem umas vezes que são de lascar. A anterior a essa foi bastante forte.
1h42 já. Vou dormir ou vou de virote? Não me decidi ainda. Acho que vou dormir.
Algum dispositivo Bluetooth está conectando o meu som. Só espero que não seja o
do vizinho. Tomara que seja o celular da minha mãe que ela deixou com o
Bluetooth ativado porque estava ouvindo hoje. Mas acho que vi a palavra desktop
quando estava conectando. Se for, ou é o do meu padrasto ou o do vizinho, pois
mamãe não ligou nem está ligada a CPU dela agora. O lado ruim disso? É que não
consigo conectar o meu desktop no som e pior estou ouvindo um CD e ele para
porque aparentemente o som dá primazia às conexões por Bluetooth. Ozzy. Amanhã
vejo isso. Espero muito que seja o celular de mamãe. E acho que vou dormir
mesmo. Meu ombro está dolorido depois de tanta digitação no caderno. E isso já
está com sete páginas. Vou colocar o despertador para as 8h00, pois estou sem a
mínima coragem de tomar banho agora. Tomo quando acordar. O que também tenho
minhas dúvidas que vá acontecer. Não custa tentar. Um café forte logo pela
manhã pode ajudar no processo. Vou pegar o meu último copo de Coca da noite.
1h55.
2h00. Não resisti e comi um pedaço da barra de 500 gramas de
chocolate meio amargo que mamãe comprou. Ou será de um quilo? Nem sei. Sei que
foi muito gostoso.
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