domingo, 19 de fevereiro de 2017

VERGONHA

Que vergonha do post que publiquei ontem, cheio de erros. Acho que foi o cansaço. Perdoem-me os leitores. E agora vergonha de ir à Vila Edna a qual estava tão empolgado de ir ontem. Maldito sono que sempre opera essas mudanças de ímpeto em mim. Também minha mãe descansa e só posso sair com o seu consentimento. Essa é uma boa e verdadeira desculpa. Vamos ver, se ela acordar antes das 16h30, eu peço para ir. Depois disso é tarde demais. Me prometi digitar o diário hoje. Se não for à Vila Edna é o que farei. E começar a assistir “Walking Dead”. Estou num marasmo tremendo hoje. Dormi umas boas 12 horas e isso já é o bastante para me deixar numa rotação mais lenta. Tenho vontade de dormir mais, mas não cederei a esta vontade. Só me trará prejuízo. Espero que a Coca-Cola me estimule, por sinal vou encher outro copo. 15h48.

15h59. Falei com mamãe, aliás, ela falou comigo primeiro pedindo para eu guardar os pratos da lava-louças. Pedi para ir à Vila Edna, disse que tinha visto a filha do meu amigo lá e ela titubeante meio que consentiu. É o horário ideal para ir. Preciso reunir forças para esta missão.

16h03. Estou num vou, não vou danado aqui. Minha vontade maior é ficar aqui. Mas é uma boa oportunidade de socialização, talvez até melhor do que o bloco, pois não tem barulho, fuzarca e cada um está mais focado no outro. É esse um focado no outro que me assusta. Mas sei que o medo é passageiro. Uma vez que estiver lá, acredito que vá me soltar mais.

16h09. Fui olhar pela varanda uma vez mais e não vi ninguém, mas tenho quase certeza que ouvi vozes. Eles estão lá, eu vi a filha do meu amigo. Eles estão lá e ficam até umas 18h, 18h30. Não muito mais que isso. Se for, preciso agir rápido.

16h16. Vou pedir a mamãe o consentimento definitivo.

19h22. Acabo de voltar da Vila Edna. Foi muito bom estar lá, por mais que tenha sido 99% do tempo como ouvinte. Tive uma conversa breve, mas profunda com Kilma sobre noias e sobre como enfrentá-las, ou melhor, como conviver com elas e ela mencionou uma frase de Lacan que queria recordar, mas não decorei, mas que diz mais ou menos que eu não me enxergo em mim, eu me vejo em você, no outro. Algo assim. Entendo vagamente o que isso significa, mas gostaria de conversar com a psicóloga do CAPS que é lacaniana, se não me engano – sim, minha memória está uma porcaria – sobre o significado dessa colocação. Eu estou me sentindo meio burro ultimamente, há certas colocações que não consigo apreender completamente. A outra vez que senti isso foi ontem quando um conhecido falava de relatividade na Física. Eu entendi, mas não compreendi realmente o que ele disse, da mesma forma que agora há pouco com Kilma e sua frase de Lacan. Talvez não tenha entendido essa última porque não acredite realmente nela, acredito que um processo de autodescoberta pode ser feito através da introspecção e do autoquestionamento. É claro que me enxergar no outro – e mais especificamente o que me desagrada – é uma experiência que abre as portas da autopercepção, muitas vezes de forma desagradável. Pelo menos no meu caso, que não gosto de mim. Se bem que gosto de mim mais calado do que falador, como costumava ser, pois assim falo menos besteiras. E, embora falar sobre mim para os psicólogos do CAPS seja bastante divertido, é muito interessante ouvir o outro. Eu aprendo. Por mais que esqueça depois. Mas é uma troca muito rica. Em que quem sai ganhando sou eu, o ouvinte. Obviamente há ganhos para o orador, visto que todos querem ser ouvidos, todos necessitam de atenção. Como satisfaço minha necessidade de atenção no CAPS, posso ser todo ouvidos nas demais ocasiões. Acho que é isso que procede comigo ultimamente. Ou melhor há algum tempo já. Mas tem se intensificado de uma forma quase patológica e é isso que venho tentando combater. O problema é que não tenho muito sobre o que conversar, já que a maior parte do tempo falo ou escrevo sobre mim e isso não é um assunto que eu vá trazer à baila numa roda de conversa. Do mais, pouco sei. Sei agora de Black Mirror, o que aumentou meu repertório consideravelmente. Para se ter ideia de como estava escasso. Preciso cantar mais, para ver se volto a ser mais afinadinho como costumava ser. Sim, era uma das qualidades que eu tinha, eu era relativamente bem afinado. Se bem que hoje nem me lembro mais as letras completas das músicas, minha memória vive a me pregar peças. E minha dicção anda péssima, acho que porque meus dentes saíram gradativamente de lugar e porque tenho falado pouco também, acho eu. Mas principalmente por causa dos dentes. Porém não tenho intuito de usar aparelho de novo. Já estou meio velho para isso. Há uma garota linda e inteligente que trabalha nos Correios de Casa Amarela. Ela não parece ser casada. Mas não tenho certeza. Olhei para a sua mão a procura de uma aliança e, pelo que me lembro, não havia nenhuma. Tenho quase certeza disso. Mas não tenho cem por cento de certeza. Como já, disse, minha memória. Mas, quando o sonho X for destruído, pode ser que arrume coragem para convidar essa moça dos Correios – Mahele, se não me engano – para tomar um café na Praça depois do expediente para descobrirmos se temos algo em comum. Claro que isso é outro autoengano. Não terei nunca coragem de fazer isso. Ou sei lá, sem mais ilusões às quais me agarrar, possa ser que eu faça tal proposta. Mas duvido. E X tem muito mais a ver comigo. Culturalmente falando. O trabalho que ela quer fazer com pacientes com câncer me parece supernobre. São pessoas com problemas graves de fato, talvez preparando-se para a morte. E seu trabalho seria ajudá-los nessa preparação. Não sei se isso é uma simplificação exagerada do emprego dos seus sonhos, mas me parece que em essência seria isso. Vou até perguntar a ela se ela resolver reaparecer no CAPS. Na quarta ainda. Puxa, vai ser uma espera longa. Estou acostumado a duas doses de X por semana. A ausência dela na sexta-feira me quebrou na emenda. Voltando à Vila Edna, fui convocado a reaparecer lá, o que é um prazer, por mais que não fale muito, pelo menos estou lá com pessoas amadas. Acho que vou digitar o diário. Olhei pro Wii U e pensei em jogar Mario Kart, mas vou digitar mesmo. Depois talvez volte aqui. 20h22.

21h02. Minha mãe chegou de sua ida ao shopping. Resolvi parar de digitar o diário porque ela pode achar que há alguma correlação entre este afazer e a minha quase-recaída. Não quero que ela fique com minhocas na cabeça, então parei. Acho que vou jogar um Mario Kart.  Quando ela for dormir, o que não deve tardar, volto a digitar o diário.

22h34. Digitei mais um dia completo do diário. Acho que por estar tratando com o momento em que estava ainda fissurado pela cola, isso me afete negativamente, me dando um pouco de fissura. Quero ver quando chegar o momento do uso lá dentro do Manicômio. Espero me segurar. Agora recair por causa disso é burrice. E não é impossível. Acredito até que esse diário tenha sido o principal motivador da minha quase-recaída. Esqueci de mencionar isso no CAPS, talvez o faça amanhã. Por mais que esteja mais seguro agora do que antes. É bom não brincar. Não dar uma de Ícaro.


22h51. Fumei um cigarro de verdade e coloquei o meu último copo de Coca da noite. Estou meio sonolento, afinal é enfadonho digitar o diário, e vou aproveitar que estou assim e ir dormir, embora o cigarro tenha roubado minha sonolência. Mesmo assim, vou tentar me deitar. 

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