Conversei com X hoje e foi ótimo. Falei de tudo o que me
propus e ainda desmistifiquei sua pessoa, sem com isso deixar de estar
encantado por ela. Disse-lhe que era a pessoa de todo o meu universo com a qual
tinha mais intimidade, descobri que seus filmes prediletos eram "Jurassic
Park" e "A Mosca", me esqueci quais foram seus livros prediletos
(teve um de Freud) e a banda foi Nação Zumbi. Disse-lhe meus filmes -
"Her" e "Matrix" -, meus livros - "The Singularity Is
Near", "Dom Casmurro" e a autobiografia de Jung - e minha banda
predileta - The Cure -. Descobri que, enquanto eu adoro Los Hermanos, ela não
gosta nem um pouco. Também descobri que seu estágio vai até junho e disse-lhe
que provavelmente as psicólogas daqui a chamariam para Os Barbas. Ela não
parece ter nenhum traço de atração por mim, mas pelo menos me escuta com
interesse.
12:02. Coloquei o som e perdi o fio da meada. Fato é que ela
estava particularmente interessante de vestido. Preciso lembrar de elogiar isso
dela quando a vir da próxima vez. X falou também de um filme de surrealismo,
mas não lembro o nome nem detalhes. Ela também não deu muitos. Ela é uma
figurinha que me cativa. Uma coisa que percebi é que ela tem um forte medo da
figura masculina como agressor sexual. Esse é um assunto que vira e mexe
aparece em seu discurso. E acho que por minha natureza não agressiva
sexualmente, crio um elo de empatia com ela. Gostaria que tal característica
pessoal despertasse em X a imagem de que sou o homem ideal para ela. Mas, para
isso vai ainda um longo caminho, se é que caminho há. Provavelmente não há. Mas
continuarei tendo minhas conversas com ela porque isso me faz um bem danado.
Outra coisa que percebi nela é que provavelmente nunca usou aparelho, visto que
tem alguns dentes tortos. Não sei se é de origem humilde ou não quis usar
aparelho. Se for de origem humilde, teve mesmo assim uma ótima formação, pois
fala um Português bastante bem articulado. Preciso perguntar onde ela estuda. E
perguntar qual é o futuro profissional perfeito ou sonhado por ela. Preciso
saber se quer ter filhos. Em verdade quero saber tudo sobre ela, pois tudo nela
me interessa. Falando agora tanto sobre X, parece que o sentimento arrefece um
pouco, faz parecer que é tudo uma ilusão passageira que já-já passa. Não queria
me sentir assim. Queria um sentimento mais sólido como nos últimos dias. Não
queria que acontecesse como aconteceu quando do meu primeiro beijo com V,
quando o primeiro pensamento que me cruzou a cabeça foi "em que que eu fui
me meter?! ", pois não senti que a amava nem um pouco naquele primeiro
momento de nossa duradoura e atribulada relação. É certo que com o tempo veio o
entrosamento e o amor, mas o que queria era o amor desde o começo, o que não
aconteceu. Não quero me sentir assim de novo, pois tenho medo de a relação
seguir pela mesma trilha da anterior, o que é uma preocupação besta, pois os
sujeitos são outros, eu sou outro e X certamente é outra pessoa muito diferente
de V. Pelo menos pelo pouco que vi dela e nela. Mas pode ser que o que sinto
não seja tão profundo quanto se me afigura. Não importa, ainda tenho meses para
ver no que isso vai dar e é muito provável que não dê em nada, mas não sei por
que eu enxergo um futuro aí. Um futuro a dois. O embrião de uma relação. Parece
que o grupo vai começar. Vou fumar um cigarro. Verdadeiro.
-x-x-x-x-
17h59. Já estou em casa e acabo de acordar e de reler o que
escrevi e venho deitar novas palavras sobre o papel eletrônico. Fui dormir
pensando nela. Acordei e, depois de pegar um copo cheio de gelo e Coca, vim
para cá, onde tudo gira em torno de X. Acho que o que diria a ela se
encontrasse abertura, é que há homens sexualmente violentos, mas há muitos
outros que não são, como eu. Que ela não nivele todos os homens por baixo. Na
verdade, não sei se diria isso a ela. Não acho que eu dou um bom psicólogo.
Prefiro mais ir como sair, de improviso, de coração. É uma pena que não vá
vê-la amanhã e pior ainda que tenha que acordar cedo do mesmo jeito para ir ao
grupo no Manicômio. Isso é o ó do borogodó. Estou com uma leve vontade de jogar
Mario Kart na copa de 100cc. 18h25. Me perdi por alguns inúteis minutos no
Facebook.
18h50. Apaguei o que escrevi agora. É raro eu ter um momento
de autocensura no meu blog mas tratava de um assunto que para mim já está
resolvido, de uma pessoa que infelizmente tive que cortar da minha vida. Além
disso, pessoas ficaram me chamando para falar no Facebook. Vou é me desconectar
daquilo agora. Mais do que Mario Kart eu estou com vontade de jogar o Zeldinha
16 Bits. Mas a inércia faz o desejo evanescer logo que nasce. Não estou muito
instigado para jogar o novo Zelda que vão lançar. Espero que o mundo não seja
tão grande quanto eu estou esperando. Senão será muito cansativo, como um jogo
de PS3. Se bem que amei FarCry3. Mas o mundo de FarCry3 não é muito grande. Não
é nenhuma Grand Theft Auto. Não sei. Não queria começar a falar de videogames
de novo, por mais que eles sejam um dos pilares do meu mundinho. O Wolverine
brasileiro está a caminho. Já foi postado e expedido. Não sei o que direi à
minha mãe sobre ele. Provavelmente a verdade. É incrível, mas ainda não consigo
montar uma imagem nítida de X na minha cabeça, só de relance, por frações de
segundo. Ela usa vestido, será que isso quer dizer que ela não é lésbica? Não
entendo nada do mundo LGBT e posso estar soando até preconceituoso com essa
colocação. Mas é que vejo que a maioria das lésbicas não usa vestido. Pelo que
me recordo. Posso estar redondamente enganado. Devo estar. Só não queria que X
fosse lésbica, isso destruiria qualquer possibilidade de fantasia. E talvez até
me desmotivasse a ter com ela. Se bem que ela é tão legal que acho que isso não
ocorreria. De toda forma sinto que ela não é lésbica. Senão ela viveria mais
dentro desse contexto e pelo que ela me falou de suas amigas, deu a entender
que elas não são lésbicas, não sei por quê. Bom, parto do pressuposto que X não
seja lésbica. E de que não sente nenhum afeto por mim. Que sou apenas só mais
um usuário do serviço no qual ela estagia. Mas quero nesses quatro meses que
restam até o seu estágio acabar, mudar esse cenário. Quero que ela se apaixone
por mim. Acho que vou convidá-la para o Sai Dessa Noia. Não custa nada tentar,
eu acho. É o carnaval mais tranquilo do Recife. Pelo menos foi no ano passado.
Acho que o bloco estará maior esse ano, mas não tão maior assim. O problema é
que já está saindo nos jornais, capaz de atrair mais gente do que eu julgo
ideal. Veremos. Já dei com várias pessoas que não conhecia na pintura das
camisas, o que significa que teremos muitas caras novas esse ano. Uma delas
poderia muito bem ser a de X. Mas acho essa uma possibilidade demasiado
distante da realidade objetiva até para mim que sou dado a sonhar. Duvido que
ela vá para o Sai Dessa Noia. Não acho impossível que vá para Os Barbas se a
turma do CAPS a convidar. Embora ela não me pareça tão enturmada com a esquipe
do CAPS. É outro assunto para tratar com ela. Essa minha percepção de não
pertencimento ao grupo. Pode ser porque eu não vou nas terças e quintas, quando
talvez haja mais interação dela para com os seus companheiros de trabalho. O
que me dá uma sensação de que ela é uma pessoa como eu que gosta de resolver as
coisas sozinhas, não seja boa de trabalhar em equipe. Outro ponto a se
averiguar. Vixe, são tantos pontos que certamente não me lembrarei de nenhum!
Hahahahahaha. Acho que não vou entrar na seara da violência sexual masculina.
Não sei. Vou seguir o fluxo da minha alma. O que vier, veio. Ou virá. Encaro o
Zeldinha agora? Minha mãe me chamou para ver “La La Land”. Parece que só viram
a primeira música, mas minha mãe disse que é um filme bem alto-astral e estou
precisando de uma dose disso. Não sei se verão agora e se voltarão o filme para
que eu veja a primeira música, de abertura dos créditos. Não gosto de perder
nada de um filme.
20h28. Fui jogar o Zeldinha, mas morri 4 vezes sem passar no
primeiro dungeon e sempre começando do começo da fase, tudo de novo, que
desisti. Temporariamente, digo. Aí tentei o Gran Prix Mushroom com a princesa
em 100cc e ganhei todas. Um a menos para conquistar e aproveitei e peguei já o
adesivo dela. Aí dei um tempo. Coincidiu que quando eu liguei o Wii U o
computador pediu para reinicializar para fazer atualizações. Foi legal essa
sincronicidade. Quando acabei a pequena jogatina, ele estava pronto esperando
por mim. Graças também a essa parada, percebi que o meu Vaporfi estava quase
sem líquido e coloquei, senão iria empestar o filtro com um gosto de queimado
que teria que me fazer trocá-lo. Acho que já estão assistindo “La La Land” lá
na sala. Ouço uma música vinda de lá, além do maracatu que ouço da minha
janela, vindo da rua. Um ensaio semanal que fazem por aqui. Não sei se é
semanal, pode até ser mais frequente, nunca prestei atenção. Estão inclusive
com uma batida nova, mais variada, estão evoluindo. Bom para eles. Eu vou
colocar “Kid A” para ouvir porque não sou um cara de “raiz”. Sou enraizado no
meu cotidiano que acho bom e agradável, mas não tenho essa paixão pela cultura
pernambucana. Até porque não sou daqui. Mas é como se fosse, já estou aqui há
quase 30 anos. Nunca me apeguei. Como me apeguei ao pós-punk do Reino Unido ou
a Chico Buarque. Não gosto de carnaval. Não entendo como desperta tantas
paixões. Principalmente o carnaval de Olinda. Mas confesso que há uma energia
que toma conta da cidade e que muitas vezes ela me arrastou para lá. Não mais.
Só vou a Olinda se arrumar um lugar decente para dormir e comer e beber
Coca-Cola que me dê vista privilegiada da folia. Para que fique desse lugar
vendo o povo se amassar em todos os sentidos. Gosto de ver as fantasias. Todo
ano tem coisa nova e criativa, é impressionante isso. Mas vejo essa parte da
TV. Meu carnaval é o Sai Dessa Noia e, se muito, uma esticada para Os Barbas. Definitivamente
uma passada pelos Barbas se X estiver lá. Conversamos muito hoje. Foi muito
bom. Contei da minha traição e da minha vontade de pedir perdão a V e de nunca
ter cruzado com ela desde que acabamos o namoro. Mesmo com os pais dela morando
no mesmo prédio que eu e do fato de a minha irmã, que mora na Alemanha, já
tê-la visto por aqui e eu não. O que, como X apontou, é espantoso. Não sei se
de alguma forma ela me evita. Mas seria muito infantil da parte dela após
tantos anos. Mais de 15 anos nas minhas contas. Não é possível que ainda
perdure nela tanta mágoa e tanta raiva de mim para isto. Aliás, tudo é
possível. Foi muito e dolorido para ambos os últimos anos da relação. Mais para
ela que para mim. Para mim doeu mais quando a perdi. Mas valeu a pena, perdemos
a virgindade juntos e apaixonados e vivemos grandes e belos momentos. Houve um
momento que nossa afinidade era tão grande que acontecia algo semelhante à “telepatia”,
quando um meio que pressente que o outro vai ligar ou chegar e a pessoa
efetivamente liga ou chega. A imagem de X me vem mais completa agora, que bom.
Gosto de relembrar seu rosto. Não é lindo, mas tem seu encanto, me agrada, me
agrada bastante. E acho o seu corpo bonito. E acho sua cabeça legal. Ela tem
senso de humor. Que mais posso eu querer de uma garota? Que ela também me
queira. Só. E esse só é tão muito que nem sei. Tive esse lance de “telepatia”
com a Gatinha também. Não queria perder a amizade dela. Nunca. E, da mesma
forma que ela, se eu arrumar uma namorada, esta vai ter que entender que a
presença da Gatinha na minha vida é algo que não vai mudar em nenhuma
instância. Mas acho que a própria Gatinha está se distanciando aos poucos de
mim. Acho que ela mesmo percebe isso. E não quer ver. Ou vê e cala. Estou
sonhando em relação a X. Que droga. Agora isso me caiu como um raio na cabeça.
Quem iria querer namorar um viciado? Se bem que conheço viciados declarados que
têm suas garotas, suas esposas. Que os conheceram nessa condição e mesmo assim
se dispuseram a construir uma relação. A vontade de voltar ao Wii me ataca.
Para um Zeldinha muito mais que para um Mario Kart. O Super Mario eu estou meio
que com aversão de tão difícil que está. Acho que vai ser o quarto Mario que
vou deixar sem zerar. Não zerei o Super Mario Bros. original, não zerei o Super
Mario Bros. 2, não zerei o Super Mario Sunshine e agora este. Mas zerei mais
Marios do que deixei de zerar. E ainda tenho a oportunidade de zerar os que não
zerei, pois tenho todos aqui, eu acho. Só não tenho certeza do Sunshine. Que é
o que mais queria jogar de todos, pois é 3D. Eu acho que matei o chefe final,
mas não peguei todas as estrelas. Ou “shines” como eram chamados nesse jogo
específico. Me lembro que me diverti bastante jogando até chegar ao nível de
frustração deste novo. Mas acho que, hoje em dia, mais acostumado com o 3D
talvez me desse melhor nele. E lá vou eu falar de videogame novamente. Que
ozzy. Não consigo evitar. Minha mãe está bastante bem para quem fez uma quimioterapia
ontem. Fico feliz com isso. Ainda tenho pensamentos maus – meus – em relação à
próxima sessão, mas espero que dê tudo certo. Queria eu ter assunto para falar
de bonecas quanto tenho para falar de videogames. Estaria escrevendo no meu
outro blog e gerando polêmica. Mas não há boneco que me interesse ultimamente e
minha fissura por bonecos praticamente desapareceu. Só quero comprar mais um
boneco, uma boneca, no caso, a She-Ra da Sideshow Collectibles para gastar meus
reward points. 21h20. Vou pegar uma Coca-Cola. Não sei se volto para cá ou para
o Zeldinha. Veremos. Estou com fome. Há um dos meus pratos prediletos, bife à
milanesa na geladeira. Mas vou esperar pela fome insana dos remédios e me empanturrar
de carne. Meu irmão vegano que me perdoe.
21h24. Minha mãe disse que “La La Land” é um filme que eu
não vou gostar, que é um filme “bem adolescente”, “bem 12 anos”. Mas eu acho
que minha idade mental é por aí, então vou dar uma chance, por mais que eu
esteja na cabeça assistir o “Massacre da Serra Elétrica” original desde que
esta ideia me surgiu em um outro post. Também fiquei entristecido pela minha
incapacidade de escrever contos como costumava fazer. Acho que a cola destruiu
a parte do meu cérebro destinada à criatividade literária. Não sei. Não sei o
que aconteceu que agora só consigo escrever isto que você lê, um diário das
minhas próprios pensamentos e atos e os acontecimentos que meus sentidos
alcançam, ou que vêm até eles. “Kid A” é um disco massa e muito bonito. Foi o
começo da diluição do som do Radiohead, mas ainda bem no começo da diluição. É
disco que é uma fase de transição e um caminho diferente, que eles devem ter
considerado uma evolução do “Ok Computer”. Ou não consideraram nada, só fizeram
o que lhes deu na telha. E ficou excelente. Gosto do disco cada vez mais a cada
nova audição (o que não aconteceu com Moon Shaped Pool). Por falar em discos
que ficaram melhor a cada nova audição, faz tempo que não ouço “Blackstar” de
Bowie. Acho que vou tirar o “Kid A” e colocar ele.
21h37. Vixe, o disco estava tão entocado que eu quase não
conseguir encontrar. Incrível o disco me remete diretamente ao tempo em que
escrevia incansável o meu blog de bonecos. Que onda. Por um segundo eu pensei
que de fato o fazia. Isso me deu até a instigação de produzir um texto para o
blog de bonecos. Mas antes disso, estava matutando tentar escrever um conto.
Pensei que ele começaria assim: uma menina dança sozinha no quarto. Só ela e
sua solidão. Que é muito sua e muito bem-vinda. Ela rodopia ao som da música
que ela mesma cantarola para preencher aquela solidão toda. Ela se sente
contente. Até que sua dança e sua solidão são interrompidas por uma batida
insistente no vidro da janela do seu quarto. Curiosa do que poderia ser, ela
corre ainda bailando e cantarolando para janela. Lá, vê um passarinho, ou
deveria dizer passarão? Pois a ave era enorme. Maior do que um cachorro São Bernardo
e multicolorida, furta cor resplandecente pelo sol de depois do almoço que
reluzia dourado em suas penas.
A menina, à primeira vista ficou com medo da imensa criatura.
Será que queria devorá-la? Ou lhe furar todinha com seu afiado bico? Foi em meio
aos seus pensamentos amedrontados que a ave falou com a uma voz muito suave e
aveludada. “Vamos, abra a janela! Quero lhe mostrar uma coisa.”
A menina relutou um instante, talvez dois, e num impulso da
mesma velocidade com que se engole xarope quando se está com febre abriu as
janelas de supetão. A ave entrou majestosa, mas mansa e calmamente no seu
quarto para que não assustasse ainda mais a menina. Por alguma razão o enorme
bicho sabia do receio da menina à sua presença.
“Quem é você?” Indagou a menina querendo se encolher num
canto do quarto. “Você quer me comer, me ferir, me matar? Por favor não faça
isso, eu sou uma menina boazinha e apenas sou solitária, só isso.”
“Eu sei. Eu sei tudo sobre você. Eu a vejo todos os dias
brincando com a sua solidão. Não vim lhe fazer mal algum. Acontece que, por
algum motivo que nem eu sei explicar, ontem eu era apenas um passarinho como
outro qualquer, mas alguma coisa aconteceu quando vi o tamanho da sua solidão
que comecei a crescer e as minhas ideias também começaram a crescer até que
pensei e pensei que falava e quando dei por mim falei. Com você. Sabia que se
tivesse que fazer algo tão incrível teria que ser com você.” A ave explicou com
sua melodiosa voz aveludada a incrível situação que se passara consigo.
A menina se acalmou e foi tomada pela curiosidade. “Quer
dizer que você ficava me olhando da árvore? E eu que pensava que estava sozinha
o tempo inteiro. Mas corra, diga-me, o que é que você queria me mostrar?”
“Pegue o lençol da sua cama, passe-o em volta do meu pescoço
e suba nas minhas costas.” Falou gentilmente a grande ave. “Vamos dar um
passeio. Quero lhe mostrar o mundo pelos olhos de uma ave. Também sou muito
solitário sabe? Sou uma ave muito rara e não encontro par para mim, por isso
vôo sozinho por aí, de galho em galho, mas sempre venho parar para apreciar a
sua solidão pois me solidarizo com ela.”
Enquanto a ave falava, ela se abaixou de forma a permitir
que a menina passasse o lençol por seu pescoço e subisse em suas costas. “Puxa
suas penas são tão macias e sedosas”, disse a menina, agora encantada pela
criatura que havia lhe roubado a solidão.
“Está confortável? Prenda bem as pernas em volta do meu pescoço,
pois vamos levantar vôo.”
“Pronto.” Disse a menina se acomodando da maneira mais
segura que podia. Ambos partiram em direção aos céus daquela tarde dourada. Ela
viu a cidade ficando cada vez menor à medida que o pássaro ganhava altitude e
ficava maravilhada com o vento em seu rosto, a sensação de liberdade, de
não-solidão, o sentimento de ser maior que o mundo, que de fato agora parecia
bem pequenino lá embaixo, com as pessoas fazendo as coisas que pessoas fazem. O
som das possantes assas rasgando o ar rufavam perto do seu ouvido e era
agradável ouvi-las. “Vamos a algum lugar em especial?”
“Para bem longe da solidão do seu quarto.” E voaram tão alto
e tão longe que da janela do quarto da menina não era mais possível divisá-los.
Quando enfim a menina retornou à sua casa. E passou-se muito tempo para isso.
Mas muito tempo mesmo. Não horas, não dias, não meses, mas anos. A menina havia
se tornado uma mulher e chorava muito. Seu pai, viúvo desde o tempo em que a
menina era menina abriu a porta incrédulo, pois acreditava que jamais voltaria
a ver a filha querida e surpreso em como havia se tornado uma mulher de longos
cabelos negros, pois nunca os cortara, e vestida de folhas e flores, pois há
muito suas roupas haviam deixado de caber. “Minha filha, você está viva! Venha,
dê cá um abraço” A menina, em prantos abraçou o rosto envelhecido e arranhando
pela barba mal-feita de um pai que há muito havia perdido o gosto pela vida
ß Esse final estava
ficando ruim, melhor terminar o conto ali onde pretendia. Vocês não sabem como
tive vontade de matar a menina a fazendo cair da ave. Por quê? Porque ela era
uma criação minha e eu tinha o poder de fazê-lo. Teria tornado o conto mais
curto. Mas confesso que fiquei impressionado que o conto saiu. Deveria ser uma
mulher, em vez de uma menina, penso agora. Uma mulher solitária. É algo mais
real porque as crianças geralmente têm algum tipo de cuidador ou, se são
meninos de rua, sem pai nem mãe, acredito que costumem se agrupar. Uma mulher
solitária seria mais plausível. E talvez ela voltasse velhinha já, ao invés de
adulta como a menina, e voltasse porque a ave havia morrido e ela dançaria
lentamente e sozinha no seu quarto, cantando a mais triste das melodias que
terminaria com seu último suspiro. Voltaria também coberta de folhas e flores.
É uma visão interessante uma velha de longuíssimos cabelos brancos coberta de
flores e folhas. Muito melhor. Mas deixa pra lá, saiu como saiu. Não posso me
dizer orgulhoso, mas confesso que estou impressionado que algo fictício saiu da
minha caixola. Não esperava mais por isso. Talvez me aventure mais vezes.
Queria até que X lesse este post. Aliás queria que ela lesse o meu blog. Mas ao
mesmo tempo isso seria um tiro meu pé, pois não posso revelá-la a minha “transferência”,
pelo menos não ainda. Talvez nunca. Gosto da minha solidão cada vez mais. Mas
às vezes cansa também. Não sei se tenho a alma preparada para um
relacionamento, para as frescuras, aparar arestas, brigas, divergências. Eu sei
que tem o lado bom e mágico também – como voar num pássaro gigante e majestoso –
que é gostoso. Que se sentir amado do amor de paixão é prazeroso. Mas não sei
quanto dessa fantasia é real. Tenho medo de acontecer como aconteceu com V. Não
sei porque estou com tanto medo disso. Será uma intuição? Mas novamente nada
preciso temer, ela não vai querer um coroa buchudo, drogado e fracassado como
parceiro para a vida, para trocar afetos. Eu sei, eu sei; eu não sou só isso.
Eu sou algo mais e tenho lá minhas qualidades e coisas interessantes.
22h43. Mamãe veio me dar os remédios e disse que gostou de “La
La Land”. Talvez o assista agora. Ou ele ou “Texas Chainsaw Massacre”. Queria
que amanhã fosse sexta e eu pudesse falar com X novamente. Não queria que fosse
quinta e que eu tivesse que ir ao Manicômio. Tenho que pegar o telefone de um
bróder para dar a outro bróder. Preciso me lembrar disso. Eu posso passar no
CAPS depois disso! Afinal, vi hoje que na terça fui marcado como “ausente”,
quando a minha prescrição era para vir na terça só nas duas primeiras semanas.
E já estou na terceira. Mas poderia usar isso como desculpa e ainda esclarecer
as coisas para a moça que marca as presenças. E poderia ver talvez X. Não. É
demais. Vou assistir o filme de terror e amanhã vejo “La La Land” Quero tê-lo
fresco na cabeça para poder conversar com X sobre o filme na sexta. Embora não
pareça a praia dela. Mas acho que vai me fazer chorar. E quero chorar. Faz
tempo que não choro. Por isso tem até que ser durante a tarde quando não estou
lombrado de remédios que moderam ou anulam meu humor. Vou tentar o Zeldinha só
mais uma vez e depois vejo o filme.
23h56. Muito tarde para ver o filme. Estou com sono depois
dos bifes à milanesa que comi. Vou comer mais um pouco deles e me deitar.
Amanhã levanto cedo. Ah, e morri mais três vezes no Zeldinha e desisti por
hoje. Vou postar para ir me organizar para dormir.
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