terça-feira, 27 de novembro de 2012

A Love Supreme – John Coltrane (e lavagem de roupa suja)





Como prometi ao meu outro primo-irmão, ouvi de uma sentada só A Love Supreme de John Coltrane, sem escrever nada. Gostei mais não é um disco facilmente palatável, parece ter várias notas dissonantes e muita improvisação. A de mais fácil acesso é justamente a última, Psalm, a mais melodiosa e com uma bateria grandiloquente e o saxofone é mais calmo e mais contínuo (nas outras músicas ele parece entrar como pequenas inserções de bisturi, cortante e preciso). Há muito espaço para improvisação e cada um dos três músicos faz sua parte solo ao longo do álbum. Me impressionou o fato de haver um pequeno trecho cantado-falado no final da primeira faixa. Realmente não esperava. Enfim, não é um disco que ganha você na primeira audição. Vou escrever o resto do post ouvindo a versão ao vivo do disco para ver o que acontece, mas, primeiro, fumar. (Ah, o dia D, quando levarei os exames para o cardiologista foi adiado e remarcado para a quinta-feira, posto que os raios-X do tórax só ficarão prontos amanhã à tarde.)

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14h46. Estou de volta após três e meia xícaras de café e três cigarros. Ouvindo o mesmo disco de Coltrane só que ao vivo agora. Há mais improvisação e, mesmo assim, agora o som do sax parece mais contínuo. Estou até curtindo mais esta versão ao vivo. Talvez porque já tenha escutado uma vez o original e esteja mais ou menos acostumado com o som. Estou achando mais harmônico. E ele bota o sax para gemer visse?

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Hoje provavelmente voltarei ao manicômio para a confraternização de Natal. Estou com sentimentos misturados em relação a esta ida. Não sei se todos os internos vão participar ou só os ex-internos e seus parentes. Nem sei qual seria a melhor das condições para mim. Provavelmente a com todos os internos. Sinto saudades da galera do meu quarto e de outros velhos habituais do manicômio. Além da galera que trabalha lá. Pensando bem, meus sentimentos são positivos em relação a este evento. Mal não vai me fazer, isto é praticamente certo.

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15h01. O ao vivo é muito mais irado que o de estúdio, ele faz miséria com o sax.

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15h18. Meu amigo Pedro voltou a escrever em seu blog, não percam (principalmente se vocês têm dificuldade com Filosofia)! Para ver o boraver clique aqui.

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15h20. Fumar que a cabeça tá mais vazia que bexiga murcha. Porra, peraí que entrou um violoncelo irado na música agora (final Pursuance ao vivo).

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Queria ter a criatividade de Pedro para bolar temas criativos e divertidos de ler, mas algo na minha cabeça se quebrou e só consigo escrever sobre o que sinto e penso, baseado no pouco conhecimento que tenho. É só o que me interessa escrever, minha vida, meu eu e o que está ao meu redor. A mão de madeira que coloquei segurando uma caneta. Pelo menos dei-lhe alguma utilidade.

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15h29. Jô vem limpar meu quarto. Tempo para uma pausa.

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15h55. Mais três cigarros e três xícaras de café. (fiquei apenas com 4 cigarros na carteira, mais 8 do meu estoque especial [graças a deus tenho este estoque {que não terei amanhã}]). Psalm entrou muito mais agressiva que na versão do disco, o cara tá endiabrado no sax. Jô me parou aqui para ouvir MC Sheldon (ou seja lá qual for a grafia). Pense numa mudança brusca de som, de jazz enlouquecido para “mete o fio dental e passa óleo no bumbum”...

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16h01. Ouvindo agora os alternative takes das músicas de A Love Supreme. É um som bom para escrever. Se fosse falar de Filosofia, como Pedro, o que poderia dizer se toda a minha filosofia já está em Algo 0003? Penso que a natureza do homem, embora egoísta, seja também gregária, ou seja, vivemos o eterno dilema entre querermos tudo só para nós e o desejo de estarmos em contato com o outro, o que obrigatoriamente implica em repartir nem que seja tempo ou atenção. Mas esse repartir com o outro também é um ato egoísta, posto que satisfaz a necessidade gregária do próprio ego. Sobre o eterno vazio que nos move, não posso falar muito dele. Ou posso falar demais. Há momentos, não sei se por causa deste blog ou dos ansiolíticos – ou da soma dos dois – em que me sinto completo no meu atual estado e não abriria mão dele por nada nesse mundo (a não ser por [uma] Clementine). O vazio não me move. Eu não quero me mover. Eu tenho medo de me mover. Medo e preguiça. E eles me são mais insuportáveis que o vazio. O vazio já me é costumeiro. Tudo bem que aproveite qualquer oportunidade que tenha para sair na night. Mas, em geral, eu e minhas palavras me bastam. O ruim é quando elas me faltam, elas me fogem, se escondem de mim. Aí o vazio aflora. Aí o desespero bate. O vazio deve ser continuamente preenchido por ambições e desejos a realizar, mas a minha ambição é continuar exatamente como estou e que ninguém interfira nisso. Esse é o porquê o meu vazio às vezes não parece existir e me sinto plenamente realizado. Eu não preciso nem produzir o vil metal, pois minha mãe me provê tudo o que para mim é mais essencial. Claro que gostaria de comprar Pitanga, o novo CD de Mallu Magalhães ou um PS3, mas eu não preciso realmente dessas coisas, tendo minhas palavras, a capacidade de divulgá-las, casa, comida e roupa lavada; café, Coca e cigarro (esse três deverão sair da lista nos próximos meses [ou semanas {ou, o que é assustador ao extremo, dias}]). Além disso, repito, só Clementine. Rever meus amigos, a galera das antigas, de vez em quando seria muito bom também. Mas aprendi nesses últimos cinco, seis anos a viver sem isso. Aprendi a viver só olhando para uma tela de computador, escrevendo e fumando cigarros. E aprendi a me bastar nisso. Em troca de não ter todo o resto e ter de trabalhar para ter todo o resto, aprendi a me bastar nisso. Aprendi a amar isso. Sincera e verdadeiramente. Quando eu vejo que um post teve mais de 15 visitas é um regozijo para mim. Eu sei que é raro, mas vez por outra acontece e faz este meu “trabalho” valer ainda mais a pena. Pois o faço primeiramente para mim, para meu contentamento. Mas quando vejo que um texto é acolhido pelas pessoas isso faz um bem danado ao danado do ego.

Eu sou o mais egoísta dentre todos os egoístas, meu comportamento não poderia ser mais egoísta e egocêntrico e eu não sei por que eu me tornei assim. Ou sempre fui e decidi me revelar, me despir das máscaras, assumir meu verdadeiro eu. 16h31. Meu olhos estão ardendo e lacrimejando de olhar para a tela. Vou fumar.

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16h53. Acabou John Coltrane. Coloquei American Beauty do Grateful Dead, outro presente do meu primo. É meio country, pelo menos a primeira música, country com bluegrass. Mas, tentando voltar ao tema do egoísmo (do qual voei agora), eu simplesmente bati meu pé e disse não faço mais nada e vocês vão me sustentar, inclusive meus vícios. É isso ou eu virar mendigo (que eu ainda acredito que vá ser meu destino quando minha mãe se for). Por causa dos papéis de pais, os meus não tiveram opção senão aquiescer e me sustentar. Primeiro foi meu pai (que talvez gostasse mais desse Grateful Dead do que eu), que morreu dentre outras causas pelos desgostos que lho causei. (Mas eu fui a menor das causas, quero deixar isso bem claro.) Agora, estou com minha mãe. Até quando não sei. Eu me encontrei nesse papel social que construí para mim, é onde me sinto seguro e confortável, é uma pena que seja um papel extremamente malvisto pela sociedade em geral e principalmente por um casal que adora trabalhar. Não dá para ser mais egoísta que isso. Só se eu usar cola. Aí é o egoísmo mor, ainda bem que o inferno que habitava minha cabeça e me obrigava a fugir para a cola se aquietou. Eu não esperava mais que isso pudesse acontecer, já tinha perdido as esperanças. Mas o mundo deu suas voltas e cá estou eu sem fissura há mais de quatro meses. Foda vai ser lidar com a fissura do cigarro se as profecias catastróficas do médico que aferiu minha capacidade pulmonar forem verdadeiras. Aí quem se ferra é o profeta aqui. E eu que queria morrer fumando como Tio Benito. Morreu fumando e tomando uma cervejinha. Bem não foi tão idílico assim, mas foi quase isso. A morte raramente é idílica se é que pode ser. Eu pensei que tinha o espírito de Tio Benito em mim. Só se for a pior parte dele. Eu queria mudar o mundo, criar o paraíso na Terra e o máximo que consegui foi ter meu e-mail bloqueado. Que ridículo, eu queria ser o emissário de Deus, o homem a trazer as boas novas, a espalhar a palavra, e a média de visualizações dos meus posts é de quatro, cinco pessoas. Ha... ha... ha... Ripple, esta do Grateful Dead eu gostei. Mas definitivamente eu tenho um certo preconceito contra música country que desconhecia.

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17h20. A noite vai se derramando sobre o céu, engolindo o resto de luz que o sol deixou para trás. Logo, logo, minha mãe vai chegar e terei que me preparar para a ida ao manicômio. Não sei por que me bateu ansiedade agora que o momento se aproxima. Mas acredito que seja natural. Passei quase quatro meses lá. E o pior (ou melhor), não achando ruim, muitas vezes achando bom, geralmente achando bom. Pensar dessa forma diminui minha ansiedade. É só pura frescura, fricote meu mesmo. Profeta fricoteiro de uma figa. Vai fumar, profeta, vai!

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17h33. Pois é, o profeta aqui é um dos mais egoístas dos mortais a caminhar na face deste planeta. E até para caminhar ele tem preguiça. Pois é além de ser um dos mais egoístas é um dos mais preguiçosos dos mortais a existir na face desta Terra. E quer continuar assim e arrumar uma Clementine. Tá certo. É bem compatível uma coisa com a outra. Compatível como água e óleo. Homenzinho desprezível e ridículo procura por mulher linda, cheia de vida e amor para oferecer, para ser sua companheira de intimidade e risadas e namoro bem carinhoso e demorado. Quem se disponibiliza? O quê, só ouço o som de grilos a cricrilar? Mas eu quero uma humana, não uma gafanhota! É, tá difícil para você profeta. Tirando escrever isso, você não serve mais para nada. Ou não quer servir. 
- É, não quero servir, por que, alguma objeção? 
- Tenho várias, mas de nada adiantaria enumerá-las. 
- Ainda bem que você tem bom senso e não vai encher meu saco com besteiras. 
- E o seu bom senso, ó profeta, onde foi parar? 
- Sei lá, deixei por aí, dentro de uma lata de cola do caminho. 
- E vai ficar nessa até quando? 
- Até quando der, campeão. 
- Olhe que cigarro já vai morgar, o CAPS tá para começar (mas tá demorando pacas, será que não te querem lá?), você disse que ia entrar numa academia... você vai ter que se mexer profetinha de meia tigela.
- Ai, saco, você tem que me lembrar disso tudo? 
- Você é que não se deixa esquecer, tá lembrado?
- É vero, é vero, meu chapa... eu é que não consigo tirar essas coisas da cabeça.
- Então?
- Então... Então eu vou acabar essa discussão com você (que sou eu) por aqui, fumar e postar isso. O Natal no manicômio fica para o próximo post que este já está com quatro páginas. 17h52.    

4 comentários:

  1. Sua inclinição PopShow para a música te presenteia com um ouvido bem mais analítico e sensinvel do que o meu, primo.;)

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  2. Mário,

    Acho que você tá racionalizando muito, velho.

    Se você não se move por medo e preguiça, significa (a contrario sensu) que, sem medo e sem preguiça, você se moveria. Em outras palavras, você não tá confortável nessa situação, e isso fica bem claro no seu diálogo estilo Gollum. Não quero dizer que você precise se mover agora, imediatamente - você precisa se sentir seguro, tranquilo, "limpo" para tanto. Mas o que percebo é que você busca racionalizar sua situação demais, busca sempre uma explicação certa, definida, "escritível".

    Você é assim porque você é egoísta. Você é assim porque você é preguiçoso. Você é assim porque você tá satisfeito com sua situação. Você não quer servir pra nada. Isso tudo é balela, e tenho a impressão que você sabe disso. Como é que você diz que se "encontrou nesse papel social" se, no mesmo post, você mostra insatisfação com ele?

    Estar satisfeito é uma coisa, se contentar com uma situação é outra bem diferente. Você pode até se contentar com sua atual situação, mas dizer que está satisfeito com ela é (pelo menos de acordo com seus posts) forçar a barra, e, como um cara de Brasília disse, "mentir pra si mesmo é sempre a pior mentiiiiira".

    Talvez pelo seu auto-imposto exílio do mundo da ação, pela sua irrestrita entrega ao monstro do ócio, é que você fique nessa fissura de racionalizar e se explicar. Mas a vida segue dia após dia, após dia, com algumas noites no meio. O caos nos cerca. Nossa biologia nos limita ao mesmo tempo em que nos torna únicos. Ainda não alcançamos a singularidade - não há uma explicação para tudo (na verdade, acho que pra maioria das coisas não há explicação).

    Enfim... como esse blog é teu e não meu, vou sintetizar. Relaxe. Vá com calma. Siga em frente. Não busque explicar-se como um fim em si mesmo, mas como um meio para alcançar um objetivo, para entender uma situação, para conseguir mudar. E, para deixar claro o que já é solarmente perceptível, a brodagem estará sempre a postos.

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    1. "Racionalização" essa palavra me assombrou muito e parece que padeço realmente desse mal. Não sei como me livrar dele, por enquanto. E acredito que esteja satisfeito com minha atual situação. Tenho medo de perdê-la. Preciso de terapia, isso sim. Valeu pelas considerações pertinentíssimas, estou esperando para ver aquele filme que vai selar a comemoração da sua conquista.

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