sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

TEXTO CATÁRTICO


16h27. Estava revisando e preparando imagens para postar o texto anterior. Meu amigo cineasta disse que vai vir me filmar amanhã. Veio realmente para o carnaval e foi para uma praia. Os equipamentos de som do meu primo urbano ainda estão na minha cabeça. Quando se tem um repertório tão restrito quanto o meu qualquer estímulo mais interessante se fixa à memória com a maior facilidade. Não sei se isso é bom ou ruim, mas é fato.

16h40. Fui fumar um cigarro que não me desceu muito bem. Tirei fotos do cantinho do cigarro no hall de serviço. Vou postar aqui.





16h44. A ficha sobre a filmagem de amanhã ainda não caiu, não tenho nenhum sentimento sobre o assunto ainda. Minha mãe parece mais relaxada comigo. Principalmente porque vê que eu me alimento bem, até demais, durante a noite. Talvez tenha se acostumado de novo à minha rotina de reclusão. Não conectei o Switch ainda. Nem estou disposto a fazê-lo ou jogar no momento. Acho que vou fazer mais café para mim. Aposto que mamãe vai reclamar. É um preço menor a se pagar. Não estou com vontade de beber Coca, o que é uma novidade para mim. Prefiro o café. Liguei um pouco o ar, mas não me sinto confortável com o frio agora, vou deixar só ele espantar um pouco do calor e desligar. Imagino o tempo que o meu primo urbano levou para conjurar a música que me mostrou. E disse que ainda vai mexer muito nela até considerar pronta. Nem imagino o que poderia acrescentar ou fazer à música, mas cada um com as suas viagens. Ele tem um padrão de qualidade que espera alcançar e que sente que ainda não alcançou no arquivo que me mostrou. Eu o entendo. Me lembrou muito o ato de pintar, era difícil parar na hora certa, sempre parecia ter algo a retocar, principalmente com tinta a óleo que demora mais para secar. Acho que por isso preferia acrílica, me dava menos tempo para mudanças e retoques. Ou me dava o tempo adequado. Sei que muitas vezes mexi demais e o resultado saiu aquém do que estava antes. Um comentário que fiz na foto de uma conhecida foi marcado como spam. Não falei nada demais, disse que “filhos são coisinhas surpreendentes mesmo...” ao ler a história que ela contou sobre a sua filha. Não mais comentarei ou exibirei nenhuma reação a nenhum dos seus posts. Ouxe. Deixa para lá. É que não lido bem com rejeição. E tenho traumas do Facebook. Coisas ruins que não merecem ser revisitadas. Eu não quero revisitar. Mas realmente eu não conheço a etiqueta da internet e pouco se me dá. Sei que posso escrever aqui o que quiser e isso me basta. Aqui ninguém vai me bloquear ou vetar porque é o meu espaço, é uma das grandes maravilhas da internet a disponibilização desses locais gratuitos para expressão. Acho fantástico e democrático ao extremo. Por mais que a maioria das pessoas comecem blogs e os abandonem. Eu não abandono porque é o que de mais precioso possuo. Vou fazer o café agora. 17h16.

17h36. Café feito, sob supervisão de mamãe, mas acabei botando um pouco mais de pó do que ela havia inicialmente posto, muito pouco, na minha opinião. Ela me mostrou um notebook da Samsung que intenta comprar. Nossa, meu café está bem melhor do que o que a fantástica faxineira fez. Mais encorpado e saboroso. É assim que gosto. O sabor parece mais complexo e completo. Mas não vou discorrer sobre café, pois não sou um entendido do assunto. Tomo o meu bem adoçado, não concebo tomar café sem nenhum tipo de adoçante, puro e amargo, como fazem os admiradores de verdade da bebida. Eu percebo, tomando esse café que eu fiz, que ele tem um sabor com várias notas de sabor que se manifestam durante e depois de ingerido, o aftertaste. Mas nomear quais são tais sabores está para além de mim. Deixo para quem leva a sério a minha fonte de cafeína. Não sei porque hoje encasquetei com café e deixei para depois a fonte de cafeína preferida que é a Coca Zero. Sei que estou com vontade de tomar café alternado com uma água gelada. Preciso pôr líquido no Vaporfi.

17h51. Coloquei. Sem muito assunto hoje, ainda perplexo com a cortada que recebi da conhecida no Facebook. Dane-se, não se pode agradar a todos. Mamãe quer que eu coloque os remédios da semana. O farei daqui a duas xícaras de café. Vou pegar outra agora, enquanto está recém feito. Eita, “New World” de Björk e Lars Von Trier para o filme “Dançando no Escuro”, o filme mais triste que já vi.

17h58. “Valsa dos Clowns”, de “O Grande Circo Místico”, disco de Edu Lobo e Chico Buarque com participações especialíssimas de Gil, Zizi Possi, Gal, Tim Maia, Jane Duboc e por aí vai. Vi o espetáculo teatral que deu origem ao disco, numa montagem atualizada, há cerca de 20 anos. Coincidentemente fui no mesmo mês ao Circo da China, que fez as acrobacias do Teatro Guaíra parecerem simplórias em comparação, embora estas fossem esteticamente muito mais ricas que a dos fenômenos chineses. Foi interessante a existência me proporcionar dois espetáculos cheios de semelhanças num curto intervalo de tempo. Um complementou a visão que tive do outro. Acho que tenho a camisa do Circo Místico até hoje. Dei uma para o marido da minha amiga psicóloga que se encantou pela amarela e fiquei apenas com a vermelha. A camisa está bem velha e surrada, com um buraco que foi preenchido de uma forma bastante diferente. Se achasse a camisa, tirava uma foto. Vou dar uma rápida olhada no armário para ver se acho.

18h07. Não achei. Isso é missão para a fantástica faxineira. Quero muito localizar a camisa, pois é uma das minhas prediletas. Ainda a uso para sair. Visto com muito orgulho. Por falar nisso, deveria me vestir de forma mais apresentável, isso causa impressão às garotas. As garotas, as garotas, seres dos quais não sei me aproximar exalando desejo para que fique claro que as quero não apenas como amigas.

18h15. Me veio a ideia de mandar uma mensagem para a garota da noite. Mas a ideia foi embora bruscamente quando visualizei sua página. Não saberia o que dizer. Talvez que não deixei de pensar nela, só parei de comunicar-lhe o fato. Não sei, me parece obcecado demais. Mas não tenho nenhuma outra personagem para personalizar o papel de namorada na minha imaginação. Então quando penso em namorar, só me vem ela à cabeça e, como namorar é um pensamento recorrente, acabo pensando nela quase todos os dias. Que inutilidade. Realmente, em termos afetivos, desaprendi a viver a vida. Em quase todos os termos e condições desaprendi como levar a vida. Quando saio do meu quarto-ilha para o mundão, levo a vida como um estrangeiro, um ET que aporta num planeta diferente e tenta apreender aquela realidade alienígena. Não difere muito disso, tamanho é meu distanciamento do mundo. O bom é que cada saída é uma aventura, cheia de estímulos novos e ricos, para alguém desacostumado com eles. Eles me causam impressões mais profundas e marcantes pois não caíram na banalidade da repetição excessiva. Por mais que soe interessante, tal distanciamento me tem sido sofrido. Pois sofro com a maioria das interações sociais. Leva tempo para me aclimatar com atmosfera do local, com as pessoas. E prefiro observar passivamente que impor algum estímulo à realidade, prefiro não interferir ou interferir o mínimo possível nos acontecimentos. Isso não é necessariamente bom. A verdade é que me sinto oprimido pelas pessoas. Quando falam comigo e me roubam do papel de figurante para protagonizar um diálogo, sinto o desconforto da falta de hábito. A vontade que me bate é de tomar umas duas cervejas para que o superego dê uma aliviada e eu saia dessa postura defensiva para outra mais descontraída. Não farei isso, entretanto, terei que enfrentar tais situações a cru mesmo. E a interação social me parece tão mais assustadora quanto é minha distância dela. Quando estou efetivamente inserido no meio social, tudo se torna mais fácil, mas ainda assim não me vem com a espontaneidade que me antes me vinha. Quando foi esse antes? Antes da internações, antes há uns dois ou três anos atrás. Ainda era outro nessa época. As coisas se intensificaram após as minhas duas últimas internações quando descobri que podia fugir da realidade e viver a minha própria através da escrita. Foi quando comecei a escrever os meus diários de internamento com a assiduidade com que escrevo agora. Acho que esse foi o momento de ruptura. Quando eu percebi que para grande parte das coisas eu me bastava, que para fugir do mundo eu podia achar guarida na escrita. Então escrevia e escrevia e escrevia, como, até esse exato momento, eu escrevo, escrevo e escrevo. Estou até com uma ponta de curiosidade para ver como tocaremos e abordaremos a escrita na terapia. Será que Ju verá como uma coisa nociva para mim? Será que eu vejo como algo nocivo para mim? Eu vejo como o grande remédio para levar a vida como a levo e que, como todo remédio, tem seus efeitos colaterais. Nesse caso severos, pois estou desaprendendo aos poucos a estar em sociedade e lenta, mas ininterruptamente me isolo em mim. Cada vez mais me sinto confortável e pleno apenas no quarto-ilha. Minha tia percebeu o meu movimento de isolamento. Eu fico pensando... eu penso demais, eis a verdade. Mas me dá prazer pensar. Mas um pensamento solitário nem sempre se adequa à realidade. A realidade, o que é senão matéria em movimento e energia decaindo para mover tal matéria através do tempo-espaço? Eu sou apenas isso. Ou tudo isso, pois eu sou matéria altamente organizada, de forma magistralmente complexa e capaz de produzir abstrações. É um fenômeno formidável. Eu sou um fenômeno formidável, como você é também. Somos verdadeiros milagres termodinâmicos, como diria Dr. Manhattan. Mas, sendo sincero, não cheguei a esse nível de distanciamento da realidade de forma a me objetificar e objetificar as pessoas. Acho as pessoas incríveis e me admira vê-las existindo, especialmente jovens mulheres, no entanto sinto menos e menos o desejo de interagir. Isso é doentio, eu sei, e é por isso que recorrerei à terapia. Como disse em outro post, me enfiei num buraco do qual não sei como sair e cada vez escorrego mais fundo nele, rumo ao isolamento completo. É precisamente aí que o buraco me leva. E embora me apoie nas paredes do buraco para não escorregar de vez até o fundo, a gravidade me atrai e o esforço para subir de novo me parece demasiado para as minhas forças, minha compleição psicossocial.  

19h07. Meu amigo cineasta me mandou um roteiro. Parece realismo mágico ou o que entendo por realismo mágico, visto que nunca li nada de realismo mágico, misturado com um retrato da demência galopante e uma pitada de espiritismo. Não darei detalhes, pois creio que é algo secreto que confiou a mim em primeira mão. Não sei como ele conseguiu engendrar a história, eu nunca conseguiria imaginar algo tão complexo e onírico. Acho que ele tem uma imaginação muito visual visto que cineasta e consegue imaginar a narrativa toda. Difícil transcrevê-la em palavras, mas acho que ele conseguiu. Não sei nem se já contei demais do roteiro aqui. Acho que vou suprimir essa parte do texto.

19h20. Peguei mais café, não há muito mais, é uma pena. Quando acabar, irei comprar Coca. E fumar um cigarro na piscina tomando um copo. Poderia ir escrever na piscina hoje. Não. Vou deixar isso para a próxima quinta, quando a fantástica faxineira poderá tirar gelo e encher todas as caçambas, como geralmente faz. Ela veio ontem e não o fez porque eu iria sair para a casa do meu primo urbano. Ou porque não pedi. Se fosse traçar uma comparação do roteiro do meu amigo cineasta com algum filme, o primeiro que me vem à mente é “Mulholland Drive”. Preciso reler o roteiro para ter uma ideia mais concreta para poder debater com ele amanhã. Parece um roteiro desafiante para o diretor. Não saberia como contar certas partes da narrativa com imagens ou sequências de imagens. Talvez o filme seja uma ode ao esquecimento, sei lá, sei que vou parar de comentar aqui, senão meu amigo não repartirá mais nada comigo.

19h38. O tempo passou voando, é como goste que passe, não se arrastando como quando o tédio bate. Sinto que a cafeína é algo que define o meu humor. Estou me sentindo bem agora e acho que em grande parte por causa da cafeína. O texto flui melhor e não vejo o tempo passar. Ainda estou doído com a denúncia de spam no meu comentário, mas é a vida, gostaria só de saber qual a gafe que cometi. Bom, nada me vem à cabeça, vai ver estou mesmo me tornando um ser esquisito e minhas palavras refletem isso, tornando-se truncadas para os demais. Posso ter soado irônico, sei lá. Não vou buscar entender, vou acolher e suplantar essa rejeição, estou de consciência limpa de que não quis agredir ou ofender ninguém e deixa a vida rolar. Foda-se a etiqueta da internet! Hahaha. Quando eu nasci não tinha dessas coisas não, seu moço. Sou do tempo da TV em preto e branco. Só uso o Facebook porque ele é o meu canal de divulgação do blog. E para me informar dos aniversários dos meus. Não acredito que um acontecimento besta desses me dê vontade de abandonar o Facebook. Não o farei. Mas que a vontade dá, dá. Mandar um grande foda-se para o mundo virtual. Mas não vou fazer isso, senão vou ficar mais alienado e não vou alcançar mais que dez leitores para o meu blog.

19h51. Será que revelei muito do roteiro do meu amigo cineasta? Espero que não. Não tenho nem certeza se peguei o sentido da estória. Preciso reler, mas não agora. Voltando ao mundo virtual, estou pensando em colocar o Tinder no meu celular. Passou a vontade. Se não consigo me comunicar direito nem com conhecidos que dirá com desconhecidas? Hahaha. Tô ferrado. Vou ver se acho o telefone da minha terapeuta aqui na bagunça do quarto-ilha.

20h01. Não achei. Que ozzy. Como vou pegar, não sei. Só se for aonde ela atende e pegar o fone lá. Não vejo nenhuma outra solução. Aliás, vejo. A internet. A tão falada internet, óbvio. Vou ver isso agora.

20h09. Achei o endereço de e-mail dela. Mandei um dizendo que queria fazer terapia com ela e perguntando o que preciso fazer para isso acontecer. Botei as engrenagens do destino para girar. Agora é esperar uma resposta. Se for ela mesmo, que acredito que seja. No momento acho uma péssima ideia como quem toma um remédio amargo. Veremos em que esse e-mail vai dar. Será que obterei resposta? Saberei e você saberá comigo quem sabe ainda hoje ou amanhã. Ou ela não responderá ao e-mail, sabe-se lá. Vou fazer o que mamãe me pediu para fazer, colocar os remédios e água na geladeira. Não queria sair daqui agora, mas me sinto impelido a me livrar logo dessas obrigações e escrever mais livremente. Embora esteja me sentindo meio pesado na escrita nesse momento, como se o texto que estou escrevendo não estivesse leve, não sei bem dizer. Vou lá. 20h17.

20h36. Voltei. Fiz tudo o que me foi pedido e o que queria fazer, botei remédio para 14 dias, troquei o botijão e coloquei água na geladeira, comi um pouco e peguei mais água e café. A minha próxima parada aqui será para comprar a Coca, espero.

20h50. Reli o roteiro do meu amigo cineasta, mas não vou comentar dessa vez, já falei demais sobre o assunto, o que não deveria fazer. Deve ter sido uma ideia muito difícil de ser colocada no papel. Eu não sei o que vou comentar com ele, acho que precisarei ler mais uma vez. Liguei o ar, existe algo me causando desconforto. Não sei foi o fato de ter comido. Estou diferente de como estava. Como se as palavras me fugissem agora, como se enfastiado delas. Mas vou continuar para ver onde isso vai dar. Narrarei tudo o que me passa pela cabeça. Penso na resposta da psicóloga e em como isso vai me fazer ficar ruborizado e sentir um frio na espinha, ou um buraco no estômago. Jorro de adrenalina. Se ela responder. Se ela responder estarei dando um passo praticamente definitivo em direção à terapia, coisa que vejo com bons olhos, mas que me mete um certo receio. Principalmente porque conheço Ju e porque, se não funcionar, não sei como vou comunicar isso a ela. Simples, mando um e-mail. Bem a minha cara. Mas não posso ensaiar um primeiro passo achando que vá dar errado. Eu não sei o que busco com a terapia, se aceitar o meu isolamento ou revertê-lo. Acho que o que mais quero alcançar na vida é uma namorada, mas para isso preciso transitar pela sociedade sem entraves, desinibidamente, desenvoltamente, como costumava fazer. Ou será que eu só consegui ficar sociável por causa do álcool? Boa pergunta. Sei que hoje eu sou um fiasco social e isso me causa enorme constrangimento. Estou me sentindo constrangido nesse exato momento rememorando alguns momentos sociais pelos quais passei. Tal sentimento me dá vontade de rejeitar a sociedade como um todo. Fincar-me aqui nesse lugar e não sair mais dele. Por isso precisamente é que preciso de terapia. O celular pisca sem parar no meu canto de olho, vou ver o que é e interromper essa sinalização irritante. Meu ombro dói. Pronto, parou de piscar. Apitou de novo, que saco. Pronto. Eu acho que tenho bonecos demais para fazer um display bonito. Espero que a arquiteta ache diferente. Que solucione o problema nas poucas paredes que tenho. Não sei nem se essa reforma vai se dar. Se não se der e o meu Hulk chegar eu vou botar ele no lugar da impressora e boto a impressora no chão ou lá atrás ou no quarto do meio, sei lá. Se bem que é um lugar meio arriscado para colocar o Hulk. É menor que o busto, ele iria ficar projetado para fora da bancada e eu poderia, desacostumado com ele, bater de noite com sono e derrubá-lo no chão, visto que a base que suporta o busto não oferece lá um apoio muito grande à imagem. A não ser que seja bem pesada, o que não acho que seja o caso. Não sei nem se o pagamento final foi efetivado, estava marcado para hoje, mas não recebi nenhum e-mail de confirmação. Sei lá, não queria falar sobre isso. Não estou com saco de falar agora, mas é o que tenho para fazer. Não posso nem quero correr para o Mario Odyssey. Estou ficando entediado. E estou desconectado da escrita, estava pensando sobre a visita que fiz ontem ao meu primo urbano e o esporte que ele acompanha, “curling” ou algo assim.

21h22. Mas o tempo passou rápido. Mesmo estando agora um tanto distante daqui, distante de mim. Björk canta “Jóga” no som. Desliguei o ar. Minhas costas doem também. Estou ficando curvado de tanto escrever. Curvado para frente, os ombros caídos, uma postura horrível. Estou me deformando de tanto escrever, isso é ridículo. Mas é também um fato. Espero que seja reversível. Mas reversível, como, Mário, se você intui que vai continuar escrevendo nesse ritmo até o final da vida? Boa pergunta. Estou achando que a boia vai ser a terapia. Ela terá que mover montanhas, viu? Hahaha. Estou empedernido nessa situação que só faz se agravar à medida que me distancio cada vez mais do mundo. Nossa, às vezes olho de fora e me vejo como um personagem, às vezes não creio que fui eu quem escreveu e sentiu essas coisas. Que negócio mais estranho. Se deu agora. Será que há uma outra personalidade escondida em mim, um ser maior, que vai além da janela dos meus olhos? Será que existe um eu mais completo que observa tudo o que faço e digo e sinto e que tudo o que faço e sinto é apenas uma faceta do meu eu total? Que especulação mais curiosa. Tal sensação do eu maior se deu por causa de uma crise de tosse do Vaporfi, que geralmente me deixa meio zonzo, não sei por que cargas d’água. Me perdi agora. Mas a sensação de que estou olhando apenas por uma fresta de mim permanece e essa sensação é libertadora. Não sei se é verdadeira. Está muito metafísica, muito espiritual para os meus gostos materialistas. Mas acredito que há o id que é insondável e inacessível e que é gigantesco. Uma pergunta que me empulha é porque essa situação em que me encontro satisfaz o meu ego. Se não satisfizesse, se o desagradasse profundamente, eu tentaria mudar com todas as minhas forças, mas isso não ocorre. Parece que eu gosto de ser um freak, um weido que vive a vida de forma totalmente diversa de todos os que conhece. Um ser único. Mas que não consegue ver que o preço de ser único dessa forma é muito alto. Qual é o preço que pago? O isolamento social crescente. A perda de todas as habilidades sociais. Isso é um preço alto para um ser social como dizem ser o ser humano. E até onde eu sei, eu pertenço a essa espécie. Sou o mesmo bicho com as mesmas necessidades sociais, que não satisfaço a contento nem aqui nem na China. Eu concluí que o sentido da minha vida é escrever. Concluí um dia desses. Mas é um sentido muito limitador. Por mais que seja, por outro lado, um sentido muito tangível, muito real, muito pleno no que se propõe. Eu vejo o sentido da minha vida se manifestar diante dos meus olhos, sob meus dedos e me sinto preenchido por ele. O nó da questão é que existem buracos outros que deixo de preencher por causa desse sentido que defini. Quais? Tudo o que diz respeito ao social. Eu estou me tornando antissocial. Não há palavra melhor para me descrever. Eu sou um escritor antissocial. Eis em uma frase tudo que sou hoje. Por escritor, entenda-se alguém que escreve por inclinação da alma, não necessariamente um bom escritor. Isso acho que não sou, ou a Editora Hórus que aprova as publicações em um dos grupos onde divulgo isso aqui, já teria me contatado. Não me importo muito com isso. Me interessa fugir do tédio e de sentimentos depressivos. Por mais que não consiga evitar que me torno um ser deprimente. Um ser que ninguém gosta. Não sei o que estou dizendo direito. Sei que há conflito interno e narro ele aqui. De um lado, o ser social que sou, muito doente, pedindo ajuda. Do outro, um ser egoísta e solitário que acha que seu destino é escrever e segue fazendo isso à revelia do outro. Essa faceta é dominante, o ser social é subjacente, secundário, o papel principal é o do narrador, do escritor solitário. O papel principal é avesso a quase tudo o que é social, vai para o mundo como quem vai para um museu, onde é observador passivo. Eu me tornei isso? Será que não estou exagerando? Por que esse distanciamento todo do mundo? Não sou eu mesmo mais um no mundo? Eu sou um ególatra de marca maior. Meu narcisismo todo exposto aqui nessas palavras que são a forma de me amar e me adorar, já que não consigo amealhar amor e adoração dos demais. Admiração de ninguém. Então fico eu a me admirar como quem olha os músculos no espelho da academia, eu me espelho e reflito nos meus textos. É aqui que passo os dias a me observar incessantemente com o maior interesse do mundo. Me parece algo extremamente surreal pondo assim e só sei que é real porque é o que deveras faço. É ridículo, mas não consigo nem quero parar. Me condicionei profundamente a este jeito de ser e estar no mundo. Que dilema. Tudo porque me falta uma namorada. Hahaha. Depositar a salvação na relação mais improvável de acontecer comigo é patético. É irreal. É só vácuo, não existe. Da forma que sou, não há possibilidade para namorada nem espaço na minha vida para ela. Ela? Não tem ela nenhuma. Não há espaço para ela nenhuma na realidade que delimito para mim. Acho que gosto desta realidade que delimito para mim, pois nela sou todo-poderoso, sou onisciente, onipresente e onipotente. Estou em tudo o que são as minhas palavras, elas me obedecem, são minhas súditas fieis, me servem e se subjugam a qualquer propósito que me convier, eu sei tudo o que foi escrito, pois sou eu mesmo quem o diz. Se no princípio era o verbo, eu sou o verbo, o substantivo e todas as demais palavras do meu parco vocabulário. Eu dou as cartas aqui, é muito pouco, escrever no Word e ser deusinho de um arquivo docx, que eventualmente virará este post que você lê, você e mais um punhado de gatos pingados. Que existência medíocre. Eu que sempre sonhei ser grande. Eu de quem todos esperaram uma grandeza que não fui capaz de emular. Eu que era tido como tantas coisas boas, reduzido a mesquinhez das minhas palavras. Eu sou o aborto, o inverso de tudo o que prometia ser. Quando penso no mundo fora desse quarto e longe do computador sinto uma coisa ruim, medo, apreensão, sou como um bebê dentro de um útero onde todas as minhas necessidades são saciadas, menos a de carinho. Rapaz, eu estou me achando muito pouco hoje. Estou me sentindo a menor pessoa que eu conheço, o ser mais desprezível que eu conheço e o pior é que essa percepção me parece correta. E parece que ser desprezível me agrada mais que reverter essa situação. Este texto está muito estranho. Como alguém que diz se adorar através das palavras só faz se depreciar? Não sei. Só sei que o que faço é me narrar e isso é uma forma de louvação, de ode a mim mesmo. Não me agrada muito o que vejo, porém morro de medo, tenho pavor, fobia, aversão a alternativa. Qual seria a alternativa? Parar de racionalizar e ir viver o mundo. As pessoas, a vida. Sair da frente do Word e viver a vida de fato, pois isso que vivo não é vida que se digne a ser chamada de vida. Aí me pergunto por que não é válida? E não consigo achar resposta. A vida está lá fora, não aqui dentro desse quarto, enfurnado a escrever. Não consigo ver essa última afirmação como verdadeira. Eu acho que faço o mais válido que sei fazer da minha vida, me dedico integralmente, de corpo e alma, comprometendo corpo e alma, inclusive, para fazer o meu melhor no que sei e gosto mais de fazer que é escrever. Desde que tive o clique de que o que eu queria fazer da minha vida era escrever, me foi concedido pela existência esse desejo maior de todos e cá estou a escrever. Isso me dá prazer? Me dá, como também me dá todos os tipos de sentimentos, agora mesmo estou com a alma pesada e cheia de dúvida sobre a validade desse rumo que dei e dou à minha efêmera passagem pelo planeta azul, organizado com ser humano, no topo da cadeia evolutiva e alimentar. Sou um felizardo e escolhi dentre todos os afazeres possíveis na condição de ser humano, escrever um blog sob as minhas percepções da experiência de existir. E sobre os conflitos internos que um ser humano nessa muito específica situação em que me encontro, passa. Mandei o e-mail para Ju. Não sei se o endereço de e-mail está atualizado, com que frequência ela acessa tal e-mail, se vai responder e quando, em suma. Perdi o papel do Rizoma, ou minha mãe o guardou, o que é quase o mesmo que perdê-lo. Prefiro até assim, não gosto de falar ao telefone, embora talvez essa parte seja inevitável. Mas começar pela forma escrita, foi um começo mais fácil para mim. E gera um suspense de quando e se ela vai responder. Poxa, fiz um verdadeiro descarrego agora um brainstorming. Saí escrevendo tudo o que me deu na telha. Estou virando um cara esquisitão mesmo. Preciso da terapia, para que outra pessoa que não eu me olhe, me veja, me ouça e me oriente, ou me faça vislumbrar outros caminhos que não apenas os dois que vislumbro. Talvez haja um meio-termo. Que eu possa escrever e viver o mundo em doses mais equilibradas. Não sei se quero isso. Não sei o que quero. Quero escrever nesse exato momento, tenho certeza disso. Mas sinto que ter uma namorada seria algo que revolucionaria o meu mundo. Sinto isso há muito tempo e nesse tempo todo movi pouquíssimas palhas para conseguir uma namorada. E cada vez me sinto menos preparado ou adequado a namorar. Não sei se realmente tenho disponibilidade para um investimento pessoal tão completo, tão total quanto um namoro. Recordando o meu último namoro, eu acho que vale a pena. Amar e ser amado sempre vale a pena, pelo menos é assim que eu percebo. Eu despiroquei legal nesse post, viu? Entrei no modo catártico e saí dizendo tudo quanto é porcaria que me veio e vem à cabeça. Me prestando a um papel ridículo no processo. Mas me divertindo e sofrendo com o prazer da escrita e a dor do conteúdo. Vou fumar um cigarro, esse parágrafo precisa de um fim e eu de uma pausa, para ver se volto com a alma menos convoluta. Espero só que volte falastrona como agora, pois isso me diverte muito. Quando entro nessa de escrever como der na telha sai cada pedrada na minha cabeça, mas me divirto mais que pegando power moons no Mario Odyssey. Bem, vou lá fumar um cigarro. 22h49.

22h56. Será que saí do modo catártico com essa pausa? Acho que não. Amo muito a minha mãe, sei de todo o esforço que está fazendo pela família de três que compõe o núcleo familiar da nossa casa e não acho que demonstre gratidão suficiente. Sou um filho no mais das vezes ingrato. Isso me preenche de profunda culpa. Não consigo ser melhor que isso. Talvez possa agradecer mais o que ela faz. Ela agradece cada mínima coisa que faço em prol do lar. Talvez o faça porque espere a recíproca, vou tentar atentar mais para isso. Agradecimentos nunca são demais, especialmente para ela. Ela talvez ache que eu não reconheça a envergadura de seus esforços em gerenciar e manter esse lar, mas eu estou atento a tudo, mesmo à distância, na ilha que é o meu quarto, que mesmo sendo ilha faz parte do país que é essa casa. Por isso, mãe, não sinta que o que faz é em vão ou vai despercebido por mim o seu esforço em fazer deste lugar um lugar bom e agradável de se viver. Acho que você deveria ligar para Dona Carmelita, por sinal, mesmo que ela diga que não vem mais, seria uma forma de selar uma parceria que foi tão duradoura e frutífera de forma digna e simpática. Não sei você vai ler esse post, muito menos chegar até aqui. Caso leia, ficam aí registradas as minhas impressões e sentimentos. Se há algum defeito na minha mãe? Controladora em excesso e ainda bastante neurótica em relação a mim. Ela me vê sempre como uma bomba de pavio curto prestes a explodir e por isso vive em clima de eterna tensão a meu respeito, o que não é uma postura saudável para nenhum dos dois. Acho que o efeito catártico passou, estou pensando na filmagem amanhã e mais especificamente sobre o que direi ao meu amigo cineasta a respeito de seu roteiro. Confesso que não sei, mas tentarei ser sincero. Sobre eu me dizer em palavras escritas, me direi em palavras faladas na terapia e nela talvez encontre um feedback diferente das minhas próprias conclusões acerca da minha vida e das decisões limitadoras que aplico a ela. O lugar mais solitário do Recife é o meu quarto-ilha. Louis Armstrong empresta um pouco de simpatia e classe ao ambiente. E Ella entra para encantar o meu reino. É, o modo catártico passou. Mas talvez consiga entrar nele de novo, se me concentrar um pouco mais na escrita. Estou com pensamentos intrusivos, lembro agora do meu primo urbano e do seu equipamento, da brincadeira que fez ontem nele. Olho para os bonecos que tenho em volta do computador, isso me alegra. Estão livres das caixas para sempre, pois não há mais suas caixas. É um ato temerário ter me desfeito das caixas, pois, sem caixas, é praticamente impossível vendê-los. Não que eu queira. Não quero. Nem há espaço para tantas caixas na minha casa. As caixas são grande e ocupam um espaço monstro no quarto. Falando em caixas e monstro. A caixa do Hulk será a maior caixa de bonecos que eu já recebi. Se receber. Se o pagamento foi efetivamente convertido e tudo o que mencionei acima. Já redundo, isso é um saco. Não sei porque me lembrei do Imperador da Casqueira. Será que ele leria o meu blog? Seria uma honra se o fizesse. Uma das únicas pessoas próximas que me daria grande prazer de ser lido por. Infelizmente, está morto. Meu pai lendo isso caso vivo fosse? Acho que me intimidaria muito. E certamente teceria uma série de críticas a respeito desta autobiografia em tempo real que vou desenhando com palavras. Diria que para escrever bem é preciso ler, só para começar. Que eu não tenho uma voz própria, um estilo, e que meu vocabulário é pouco e pobre, que as frases são mal construídas e por aí sairia a destruir o meu labor. Não sei se agiria assim, talvez respeitasse o meu espaço e a minha forma de me dizer, sei lá. Parei para ouvir “O Resto do Mundo” de Gabriel O Pensador. Tenho uma forte identificação com essa música. Se acreditasse em reencarnação, eu pensaria que na encarnação anterior eu fui uma mulher mendiga, moradora de rua.

23h24. Acho que isso aqui já deu. Não sei. Vou seguir dizendo. Aquele desabafo, o tal modo catártico, foi uma experiência cansativa e pesada para mim. Me dizer bebê dentro de um útero artificial não é uma afirmação fácil para mim. Mas é precisamente como me sinto. E todo bebê dentro do útero se sente bem. Não é diferente comigo, não fora o fato de que eu não sou bebê e já conheço o mundo. O mundo tem maravilhas a serem desfrutadas, mas cada vez mais elas me enchem menos os olhos. Como voltar a ter interesse sincero pelo mundo, eu não sei. Novamente a terapia pode me auxiliar. Nossa como me arrependo de ter mandado o e-mail. Não estou com a mínima vontade de embarcar numa terapia. Estou com medo da terapia, mas terei que enfrentar meus receios e me abrir para essa possibilidade, pois é a única que diviso para organizar e poder olhar de forma mais estruturada os meus dilemas existenciais. Um olhar de fora, saudável (na medida do possível) será de grande valia, eu suponho. Vou ver se ainda tem um restinho de café. 23h35.

23h39. Tinha! Massa. Peguei água também. Estou intelectualmente exausto. Acho que botei tudo de mim na briga que travei comigo mesmo. E não houve ganhadores, ou melhor, tudo continua do mesmo jeito, eu sem vontade de encarar o mundão e preferindo ficar isolado a escrever. Tendo cafeína, acho que o tédio não me acomete. A ausência de cafeína me põe de baixo astral. Mas já falei isso. Meh. O que poderia dizer de novo? Não tenho, então fico por aqui.

1h07. Estava no Vate, mas não foi produtivo. Não sei por que alguém me lê. Alguém que não me conhece, principalmente. Isso é um mistério. Não coloco títulos muito chamativos, não escrevo sobre temas que entretém, não consigo imaginar o que leva alguém a ler isso aqui de cabo a rabo. Se esse milagre acontece, só posso ser grato. Pois esse é o pífio resultado dos meus melhores esforços. Me dedico a esse blog, como se minha vida dependesse disso. Acho que de certa forma depende, pois, desprovido dele, minha vida fica desprovida de qualquer sentido e gosto muito de ter um sentido na vida. Já vivi uma vida sem sentido e isso foi terrível e trouxe consequências terríveis que me perseguem até hoje. Por isso escrevo, porque é o sentido que dei a minha vida. O único labor que exerço com prazer. Ser lido é um bônus que me acalenta a alma profundamente. Empresta um senso de utilidade pública ao meu ofício que, se fosse feito só para mim, me pareceria muito vazio de significado e significância. Seria um esforço inútil, completamente estéril, sem reverberação social nenhuma. Não impactaria realidade outra que não a minha. Ter o meu punhado de leitores dá corpo ao meu texto, uma materialidade que sem eles – você, neste exato momento – não haveria. E por isso sou profundamente grato. Eita, lembrei do meu amigo cineasta que vem aqui amanhã.

1h22. Queria falar de alguma coisa mais leve. Não sei do quê. Uma pena flutua ao sabor da brisa marinha que vem da praia de Boa Viagem. É uma pena de pombo acinzentada. E entra por uma janela do 801 e vai pousar em cima do diário de uma garota de 15 anos. Ela assiste anime pelo computador. Está vendo pela primeira vez o clássico Evangelion. Na página do diário está marcado dentro de corações “Hoje é o Dia” e “Dia D” e abaixo a citação de uma música de Chico Buarque, gosto herdado de seu pai. “Quero ficar no teu corpo feito tatuagem” são os versos na página rosa do diário da Hello Kitty. Ela engravida e vira mãe aos 16. Está com o pai de Maria até hoje. FIM

1h56. Conectei o Switch. Para já complementar a cenografia amanhã. Hahaha. Estou de alma leve agora, não sei qual a causa, talvez ter feito o enorme desabafo acima, tenha descomprimido um pouco o meu eu. Bom. Muito bom. Aliviou minhas neuroses por um tempo. Quem me dera me sentisse nessa paz todo o tempo. De astral bom, satisfeito com a vida, sem dilemas para lidar agora e sem tesão para eles. Se a minha vida fosse sempre assim não teria o que escrever. Hahaha. O universo, o universo é mesmo uma caixinha de surpresas, palco do inesperado e do esperado, do normal e do anormal, de tudo até da perfeição na forma de abstrações como o círculo. Saudades de Areias me deu agora. Como queria ir para lá. Queria passar um tempo lá. Não muito. Uma semana. Ou mais. Mas não queria ir sozinho. Meio que abomino a solidão completa. Com o computador, é claro. E o celular para tirar umas fotos para o blog. Pena que não haja internet lá, que eu saiba. Mas isso só vem comprovar que o lugar ainda continua distante da civilização. Vou dormir. Produzi muitas páginas hoje, isso esgota o juízo. E preciso acordar para receber o meu amigo amanhã. E minha mãe parece que adivinha, veio me mandar dormir também. Ai, ai...



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