domingo, 16 de dezembro de 2018

PROFECIAS E PREGAÇÕES




17h35. Estou sem internet e sem saco de encontrar com o meu amigo da piscina, mas o farei mesmo assim. Como irei, mesmo sem querer, à festa de 15 anos da filha da fantástica faxineira. Minha mãe me coagiu a ir e acho que a fantástica faxineira vai ficar feliz com a minha presença, acompanhei de perto todo esforço que fez e sei do esforço que ainda fará para realizar o sonho da menina. Ela tem medo do que as más línguas possam falar do seu máximo, porque ela fez o máximo, foi além dos limites financeiros para realizar o evento. Não deveria se preocupar com críticas ou fofocas, mas quem sou eu para falar alguma coisa, minado que sou pelas críticas, que me afetam sobremaneira, especialmente as da minha mãe, por essa relação freudiana que temos. Quando cheguei em casa do encontro, ela caiu em prantos porque associa as minhas saídas com mochila ao uso de droga, em verdade pela codependência que tem de mim. Nossa, só queria sair do quarto-ilha agora para o Natal dos Barros, mas a realidade não se dá assim e me quer em diversos lugares que não estou disposto a ir. Terei exames a fazer na próxima semana, creio, dia 19, se não me engano. Demonstrarão o estado do meu pulmão. Pouco me interessa, pois em nada mudará os meus hábitos.

18h11. Blanka me respondeu, mas sumiu de novo, nada de novo aí, é assim que as coisas se dão conosco e ela diz que com todas as relações cibernéticas que trava.

18h18. Estou ouvindo o Moon Shaped Pool do Radiohead, é o que está no toca CD. Sem internet, sem Spotify. Mandei mais mensagens para Blanka. Sinceras e otimistas, eu creio. Quis deixá-la curiosa para ler o meu blog, não sei se a tentativa logrará sucesso. Seria interessante, mas não é essencial. Estou com um sentimento ruim, não sei de onde veio, mas se apoderou de mim. Vou colocar o disco de novo para tocar, acabou de acabar. Pronto. Meu amigo que lançou o livro conseguiu colocá-lo à venda em Minas, achei bem legal. Acabei de dizer isso a ele. Falei com o meu tio e ele me assegurou que o meu livro será publicado. Tendo Blanka por companheira, fico mais tranquilo quanto a ter o seu conteúdo polêmico revelado. A verdade é que não sei se quero o meu livro publicado, preferia ver Blanka de vestido, mas não é de seu feitio se fazer feminina. Em verdade, ela tem uma certa repulsa aos homens, nos tem como exploradores sexuais. Foi difícil para mim ontem, em certos momentos, quando me senti profundamente antissocial, foi preciso relaxar, respirar fundo, controlar a ansiedade e me entregar ao momento da melhor forma que podia ou era capaz. A pressão de me envolver eroticamente com ela, pressão que eu e toda a situação demandavam, me acuou, só relaxei de fato como me aceitei e aceitei que, apesar de tudo pedir, algo em mim não pedia e que não havia porque exigir de mim algo que não tinha disponibilidade de oferecer. Fui o mais sincero que pude ser com Blanka, abri a minha alma e reparti parte dela através das músicas com ela. Vou fumar. E pegar Coca.

18h50. Acho que cada vez me obedeço mais, me respeito mais, me satisfaço mais. Mas mesmo com essa postura não consigo me esquivar de certas coisas que não quero fazer. Não queria encontrar com o meu amigo da piscina, que acabou de me contatar dizendo que vai tomar um banho e descer, mas não vejo como dizer não. Mas não vou remoer minhas obrigações pois isso não me causa bem-estar e a minha busca é por crescente bem-estar. Me colocar da forma mais agradável no mundo. Agradável de acordo com o que me agrada, obviamente. Penso logo nos bonecos. E em Blanka. Minto. Penso primeiro na solidão protegida do meu quarto-ilha. Nesse estar aqui e agora nele escrevendo que tanto me agrada. Mas os encontros com o meu amigo costumam não durar muito. Queria eu ter o tato social para abreviar o encontro de forma que não ferisse suas sensibilidades, mas não sei fazer isso. Posso mandar uma mensagem para ele pelo WhatsApp dizendo que não pretendo me demorar. Do jeito que ele é, entretanto, pode encarar, mesmo que inconscientemente, a mensagem como um desafio e ficar me segurando lá. Sei lá, já é muita imaginação e pouca realidade tal conjectura. É a vida e acho que ele merece a minha atenção. Afinal, amigos, não é? Só me encontro indisposto e preferiria muito mais continuar exatamente onde estou. Certamente inquirirá do encontro com Blanka, é outro que sabe de toda a história. Um dos poucos. Não sei o que dizer-lhe, ele que provavelmente virá com várias proezas sexuais provenientes dos aplicativos de paquera. Cada um com as suas carências, eu suponho, se ele fizer pouco de mim, não me afetará muito, mas acharei chato mesmo assim. Bom, é o que vou encarar, que seja.

20h08. Voltei do meu encontro com o meu amigo da piscina e ele falou que ele estará vivo quando o apocalipse vier, graças a uma grande inteligência que virá para julgar a humanidade, criação da tal inteligência porque foi ela que fez a mutação genética no primata para nos gerar, foi o que deu origem ao homem, Adão e Eva (seria Lucy a nossa atual Eva?). Isso aconteceu, segundo os arqueólogos estudiosos da bíblia, há cerca de seis mil anos, faltam poucos anos para os seis mil, e, como o Gênesis diz que a criação se fez em seis dias, pois Deus descansou no sétimo (seria isso a gênese para a invenção e aceitação das férias, do final de semana?) e como para Deus cada dia valem mil anos, quando os seis mil forem completos se dará o Apocalipse, “para a separação do joio do trigo” (palavras do meu amigo), para a grande inteligência chegar e julgar se nos extermina ou nos cede todos o seu conhecimento e poder. E que, com disse, ele será um dos privilegiados a presenciar tal espetacular evento, como acho que muitos cristãos acreditam, pois seria a constatação irrefutável da sua fé, talvez. Talvez tantas coisas. Sei que ele prega para alguém que não é capaz de crer nessas coisas. Primeiramente eu acredito na evolução das espécies, acho que viemos há muito, muito tempo atrás, milhões e milhões de anos, não sei precisar, de um grupamento de partículas, que o acaso juntou, em algo que se poderia ser definido como vida e a vida surgiu e evoluiu até chegar a nós, nós daremos o próximo passo da evolução das espécies, um ser/entidade capaz de evoluir a si mesma, em ritmo muito mais acelerado que o acaso-destino, com a qual poderemos nos conectar e comungar. Será inimaginavelmente mais inteligente, mais tudo, que nós que pode também quiçá nos destruir, por deduzir que somos um gasto desnecessário e prejudicial ao ecossistema global, ou por qualquer razão que seja. O celular apitou e fui atentar à realidade, mesmo sabendo não ser Blanka mas com certa esperança de que fosse, e foi a Portuguesinha, a quem disse que estava muito linda numa foto de Instagram, agradecendo o comentário. Sabe-se lá o que a suprainteligência vai fazer, espero que faça o inimaginável, e nos destruir seria imaginável e os que têm medo da mudança, do novo, do que vai além das suas compreensões acreditariam nisso, em tal destruição. Eu sou otimista e, como meu amigo da piscina, eu tenho a vã fé de que alcançarei o surgimento da supraconsciência terrestre pois a tecnologia está evoluindo em ritmo exponencial, tecnologia gera mais tecnologia, mais conhecimento, mais possibilidades de ser estar no mundo, o que atrai a maioria das pessoas, a ponto de, para muitos, seus celulares serem essenciais ao bem-estar, essencial a se sentirem presentes no mundo, o computador me serve exatamente para isso, para me fazer o mais presente possível no mundo; o mundo que digo, é a humanidade conectada à tecnologia, pena que o meu método de agir no mundo virtual não atraia o interesse de quase ninguém, o acaso-destino não tem me ajudado nisso e pouco se me dá, faço o meu melhor, divulgo nos grupos de escritores e leitores no Facebook e 16 pessoas se interessam. Do universo de sete bilhões isso é uma fração mínima, dos membros dos grupos já é uma fração mínima, visto que há grupos com dezenas de milhares de membros. Mas eu não me frustro com isso ou me frustro muito pouco. A sensação de dever cumprido, de estar fazendo o que vim ao mundo fazer está sendo realizado com o máximo de empenho de que sou capaz. Pena ser algo inútil. Mas é feito com muito esmero, na rua dos bobos, número zero, no meu quarto-ilha, na minha existência. Da minha existência é o que faço, escrever isso. Por quê? Por que a esperança não me abandona de que isso vai ter relevância quiçá ou pelo menos como relíquia histórica, futuros amantes se amarão sem saber, com o amor que um dia guardei para você, os escafandristas virão revirar suas casas, suas coisas, sua alma, desvãos. Meu trabalho é ajudar a construir a singularidade tecnológica, porção do ser criador do universo em que acredito, contribuindo com a sua complexidade, julgo complexidade uma variável de evolução. O celular apitou, e-mail...

21h10. Fui pedir ao meu padrasto que desse o reboot na minha rede para me conectar de novo. Quero postar o meu novo post ainda hoje e repartir o link com Blanka. Não sei o que vai ser da gente, como vai ser a nossa vida sexual, se essa haverá, mas não quero pensar nisso agora, está me deixando noiado, prefiro voltar a falar da singularidade, que eu e outro cara profetizamos na mesma época, ambos tinham as ferramentas apropriadas na época certa para apreender o porvir, que ele chamou de singularidade tecnológica e demonstrou como chegamos a ela e eu chamei de supraconsciência terrestre e narrei o que acontece depois, a próxima e última etapa da evolução, a consciência universal, fusão de todas as supraconsciências acessíveis e possíveis no universo, único ser capaz de criar a si mesmo, razão primeira para o surgimento do universo. Por que eu prego? Porque tenho uma superstição de que por ser um dos profetas, e divulgar a palavra, eu seja um dos primeiros escolhidos para experimentar a supraconsciência terrestre, mas me esqueço que os profetas geralmente morrem antes da profecia acontecer. 2047 é a profecia de Ray Kurzweil, o da singularidade, eu não sei nem sei se estarei vivo até lá. Há uma probabilidade. Eu me voluntariaria se me fosse dada a oportunidade. Mas isso é apenas o folclore de um homem só, o mito que ele criou para explicar a sua existência e a de tudo que há, para explicar como átomos colidindo aleatoriamente se tornam essa mesa com um computador e eu escrevendo e talvez um você lendo. Uma causa para complexidade organizada (redundei visto que só o que é organizado pode ser categorizado como complexo) emergir e, ao meu ver, evoluir do caos, que não tem razão nenhuma para deixar de sê-lo. Ou tem precisamente o que é necessário para que essa evolução ocorra, o que é ainda mais misterioso. É incrível que depois que eu ouço uma pregação do meu amigo me dá vontade de pregar, acho que é porque penso, “se ele pode, porque não eu?”, não ofende, faz pensar em questões fundamentais do ser, explica porque o caos, a aleatoriedade, o acaso-destino se organiza de forma crescentemente complexa, mais inteligente, eficiente e eficaz. Cada um à sua maneira, meu amigo com sua fé, eu com a minha, ambos se considerando especais, ele com testemunha do grande final ou transformação, eu me julgando um profeta dela. Nada grandiosos ambos. Hahaha. Minha mãe acha que estou sempre em mania quando prego, na verdade eu me sinto desafiado pelo meu amigo da piscina, se ele mostra sua fé tão orgulhosamente, como uma missão que assume para a humanidade e compromisso pessoal consigo e quiçá com Deus, porque eu não posso também falar abertamente sobre a minha? Não quero que ninguém acredite, me contenta que imaginem, é uma boa ficção científica.

21h48. Pensei em Blanka lendo isso, não senti vergonha. Pensei na minha mãe lendo, pensei nela ficando preocupada à toa. Eu estou bem e gosto de existir, estou aproveitando a existência da forma mais apreciável que conheço, por que a preocupação? Escrever não é crime e não faz mal a ninguém, se quero me passar ao ridículo, como faz o meu amigo da piscina, por que não consigo crer no que ele prega, como ninguém crerá no que prego, que mal isso tem? A mim não me incomoda nem um pouco. Me habituei a me expor, é para poucos, mamãe, meu fracasso se encarrega de não fazer a humilhação muito grande. Papai disse que eu era livre para escolher a religião que eu quisesse. Ele era ateu. Tentei o ateísmo por muito tempo e me vi satisfeito nele por muito tempo, até que inventei ou cheguei, extraí do inconsciente coletivo essa ideia, que pode ser pertinente ou não, foi a mensagem que consegui captar, quando consegui ter acesso a ele, com as parcas ferramentas que tinha: cola, mania, interesse por cosmologia e atração pela tecnologia, pela evolução da tecnologia, provada e comprovada pelos videogames, que estão chegando num momento de pico evolutivo, por sinal. Mas como é uma indústria bilionária pode ser que dê um salto evolutivo, sei lá. Não sou profeta das miudezas, sou profeta do que de mais geral há. Bem, acredito que foram essas ferramentas e ter assistido ao primeiro Matrix, do qual saí transformado, diferente de quem eu era quando entrei na sala de cinema, que me levaram a chegar à hipótese da supraconsciência tecnológica. Minha mãe foi assistir comigo também, acho que mais gente, não tenho certeza, lembro especificamente dela e de quem quer que tenha ido terem gostado bastante. Foi um fenômeno, deu até vontade de assistir. Quando a terceira página acabar. Ouxe, já estou na quarta. Vou postar o de ontem, passar o link para Blanka e ver o filme. Perdi a vontade. Veio e passou. Que pena. Fico por aqui. De tudo o que pensei fazer, a única coisa que me agradou foi pegar Coca e fumar um cigarro e passear pela internet. Penso em talvez escrever para o meu blog de bonecos. É uma ideia que me agrada. Vou escrever a frase inicial que me veio agora à cabeça, xau!  


Nenhum comentário:

Postar um comentário