“[00:17, 12/23/2018] Mário Barros: Cheguei, fumei, obrigado,
avisa aí a titia, please. Preciso escrever ouvindo um som agora.
[00:19, 12/23/2018] Primo Mateus: Beleza Mariola. Vou
avisar. Boa noite irmão
[00:20, 12/23/2018] Mário Barros: 👊”
0h21. Blanka disse que lia meu blog,
queria tanto acreditar nisso. Acabo de voltar da casa da minha tia-mãe. Eu
tenho adoração pelo meu irmão. É algo que talvez nem seja saudável, mas que eu
acho muito bom, me é muito precioso privar da sua companhia, acho que somos
absolutamente sinceros e abertos um como o outro, ele é uma pessoa que me faz
singular bem. É o homem da minha vida que tem três homens da sua vida para
crescer. Para sempre. Eu não terei isso. Infelizmente a vida como eu a dirijo,
de acordo com as minhas escolhas, me priva disso. Talvez tenha medo de
compromisso tão sério e perene como esse. Talvez algo em mim deseje loucamente,
mas o medo sufoca. Há uma solução. E só uma. Que é lança-lo(a) no mundo e o
abandonar aos cuidados da mãe. Me eximir completamente da responsabilidade (e
também dos sabores e dessabores de levar uma vida acompanhado dele(a)). É a
única forma de ter um filho e não influir negativamente em sua formação. Sim,
porque me acho uma pessoa, um pai, nocivo e incompetente e preguiçoso. Não
seria um bom pai em uma palavra. Prejudicaria mais do que completaria aquele
ser que é metade de mim. Não sei como me sentiria quando me deparasse com
aquela figura. Com o choro, irritante manifestação de vida e humanidade. Sim,
porque me parece humano até o barulho de um bode, sei que não é, mas engana,
tem profunda semelhança, parece uma sílaba “mé” ou “bé” pronunciada por algo
com um tom de voz quase humano. Ao contrário do som do macaco, onde vejo menos
humanidade na vocalização, embora seja bicho de inteligência e cognição muito
mais elevados. Vou dar uma olhada na internet, mas antes vou tomar os meus
remédios, com um copo de Coca e fumar um cigarro.
0h49. Pensei muitas coisas enquanto
fumava. Toca Pictures of You que está
incluso em algo que eu pensei. Mas, primeiro, o pensamento mais recente: o
sogro do meu irmão falou comigo e eu confirmei que romperia o ano lá em Aldeia,
espero que tenha como concretizar essa vontade, tradição, compromisso,
oportunidade de conversar com o meu irmão. E de estar num lugar animado,
festivo com pessoas legais, de bem, mas com quem não tenho a intimidade que eu
acho que teria a obrigação social de ter. Pelo menos vou e nos tratamos com
carinho, eu acho. Pelo menos com cordialidade e amabilidade. Antes, me
questionei se Blanka lia realmente isso e imaginei um cruel teste enquanto
fumava olhando para o hall de serviço e sua portinha vermelha na parede de
azulejos verdes-claros, em frente ao elevador: seria uma prova irrefutável de
que Blanka leu isso: se ela me dissesse ou escrevesse: “eu leio, incêndio”.
Depois pensei em mamãe, que certamente lê esse blog, principalmente agora com o surgimento de Blanka, cujo nome deve relampejar no seu campo de leitura, ávida
que está a respeito do relacionamento, e intuí que provavelmente vá se
acovardar de encará-la no dia 29, pois não sabe como irá tratá-la, afinal crê
que é um ameaça que se fantasia de bênção, ou que quero enxergar como tal, em
sua opinião. Acha que eu irei sofrer me envolvendo com ela. Ela só não sabe que
eu só vou me envolver com ela se ela se envolver comigo e que não desistirei
fácil da luta. Caterpillar Girl, bem
pertinente, o tempo transforma, o tempo que passamos juntos fortalece o elo, quero
crer, mas a verdade é que nada sei, é tudo muito novo e muito doido para ambos,
há mais perguntas do que respostas em nossas cabeças. Acho que foi um grande
desafio social ao qual ela teve coragem de se submeter hoje. Mas certamente, se
ela quisesse, eu faria o mesmo e me apresentaria aos seus pais. Não ocorrerá
num futuro visível. Mas eu iria e teria que encarar o preconceito com a minha
idade, talvez. Sabe o que eu pensei em dizer a Blanka agora? “Se você não tiver
vontade de sair comigo no dia 27, no dia 29 ou em qualquer dia, se sua vida é
melhor e mais fácil sem a minha presença, não se preocupe, seguiremos cada um o
seu caminho agora, não me arrependo de nada e serei eternamente grato pelo que
você me proporcionou, pelo que me fez fazer e sentir, por me acompanhar, por, num
breve sopro, trilharmos juntos a estrada da vida, você me fez sentir um bem
enorme, se não consegui lhe retribuir ou cativar, se você acha que isso nunca
se dará, se está certa disso, acho que só nos cabe o adeus. Se eu sou mais uma
obrigação na sua vida, eu sou uma coisa da qual você não precisa e que, mais do
que isso, lhe desgasta e prejudica, pois obrigações pesam na alma, as fazemos a
contragosto. Não quero você dessa forma, quero você por que acha interessante, diferente,
novo trilhar parte da vida ao meu lado, que podem ser divertidos os momentos
que compartilhamos, que quer ir um pouco mais adiante para ver onde esse nós vai
dar. Quero que saiba que compartilho do interesse, curiosidade e receios, ou
receios outros, mas receios da mesma forma, receios não são bons, mas é o que o
novo sempre traz como efeito colateral, ainda mais um novo tão estranho como o
que temos agora. Se fosse lhe pedir uma coisa é: seja você, pois eu estou
tentando ser eu ao seu lado, e em tudo o que posso. O mais completamente que eu
posso. Embora o completamente não exista fora dessas palavras. Aqui eu sou
pleno, ouvindo The Cure e sendo pleno no meu quarto-ilha e colocando palavras
no Word. Exterminar metade da humanidade com um estalar de dedos é muito pouco
para o que posso aqui. Aqui o limite é a minha vontade absoluta e irrestrita,
pena a minha imaginação ter atrofiado e encontrar mais prazer fora da ficção, a
vontade é de botar para fora, acho que me botar para fora, a mim me parece que
sem isso, eu não suportaria levar a vida tal como escolhi nas permissões que o
acaso-destino me concedeu e às vezes me presenteou, como é o caso da curatela,
de Blanka, das palavras, das bonecas, da mãe, com quem a minha relação anda
tempestuosa, por ser um momento de transmutação meu que gera incômodo nela e preocupação,
sempre preocupação. Não digo infudada, mas digo excessiva. Talvez eu tenha uma
maturidade emocional que ela não reconhece, mas da qual me apodero, pois me
permite ser mais meu e menos filho dela. Vou tomar um Coca com cigarro e comer
uns biscoitos tortinhas de limão.
1h54. Não havia as tortinhas de limão,
mas havia Negresco. Comi uns quatro. Hoje não sinto vontade nenhuma de comer.
Para mamãe Blanka é o meu problema principal, o problema principal dela, ela
acha que a minha tentativa de viver momentos felizes com uma garota especial
(há vários significados para essa palavra e vários se aplicam) é problema dela,
que ela tem que tomar a responsabilidade e controle da minha vida afetiva, o
que a mim me parece um abuso de poder da parte dela, tem que haver um mínimo de
respeito, eu tenho que ter independência na vida, abro mão dela em vários
aspectos, mas nesse, não. Esse “problema” e sua solução sou eu que busco, que
escolho, eu que dou. Nossa, do que eu mais gosto é quando estamos só nós dois,
eu e Blanka. Parece que o resto do mundo não existe, certamente não importa, só
importa um e o outro e o que vamos fazer para nos aproveitarmos da situação. Como
podemos usufruir da melhor forma da companhia do outro, porque é tudo o que
temos nesses momentos, um ao outro. É uma experiência muito íntima. Que muito
me lembra uma terapia e quero que cada vez menos pareça com isso e torne-se uma
companhia, um troca de outra natureza, de um tipo de afeto diferente e mais
igual, embora em qualquer troca haja uma parte que está dando e outra que está
recebendo, entretanto, a troca de carinhos físicos possa e deva ser idealmente
simultânea, dá-se e recebe-se mutuamente e ao mesmo tempo. Compliquei para
definir namorar. Namorar... me sinto e não me sinto preparado, desejo e tenho
medo. Mas medo de quê? Acho de não ser retribuído e gerar a repulsa de Blanka.
Sei como se sente em relação a abordagens de homens, isso dificulta bastante.
Ela tem que se entregar, deveria tentar para ver como se sente. Precisamos
construir intimidade para isso. Acho que podemos dar esse passo no dia 27, se
mamãe der os meios, ou seja permitir que eu ponha em prática uma decisão que
tomei e que só cabe a mim. E a Blanka, que já consentiu, mesmo com tantos
poréns, tentar dar esse grande passo. Penso em colocar o Disintegration do Cure
para que o momento seja ainda mais perfeito, depois Blanka pode escolher a
música. Vou fumar e acho que vou dormir. Desculpem-me se fui redundante, a
cabeça orbitou sobre vários temas correlatos. Maria não veio para o Natal dos
Barros. Ficou um buraco que dói, pois acredito que ela acha que o esforço não vale
mais a pena. Nem eu, nem mesmo Paulo ou as crianças valem a pena o
deslocamento. Dá-se por satisfeita com o contato cibernético que é caudaloso,
creio. A idade lhe roubou dessas empreitadas cansativas. A recompensa já não
vale. Vou dormir, 2h41. Quando acordar, termino o restinho da página.
-x-x-x-x-
16h58. Acordei e há mensagens de
Blanka. Ainda estou acordando. A vontade é voltar para a cama. Prometi a mamãe
que não o faria, ela me ligou enquanto fumava o primeiro do dia. Foi um sono
bom. Queria mais. Parece que amanhã iremos a algum evento familiar encontrar o
meu irmão. Vou fumar outro com Coca e bastante gelo.
17h24. Já é hora de acender a luz para
enxergar o teclado. Björk toca e é exatamente o que desejo ouvir. Estou ainda
sem cérebro. Não sei se acho o desabafo que escrevi a Blanka acima ainda
pertinente, pois tenho medo de perdê-la dando-lhe a carta de alforria, por
outro lado, não quero forçá-la a nada embora saiba que cada começo, cada
construção exija um esforço e um desconforto de ambos os lados. Ontem não
estava normalmente em mim ou estava em mim demais. Maria não ter ido foi algo
que doeu em mim. Ainda dói. Mas eu compreendo. A sensação dela de não
pertencimento, o fato de passar a maior parte do dia esquecida num sofá da sala
sozinha, como aconteceu em anos anteriores. Eu entendo e respeito. E dói mesmo
assim. É uma ruptura para a qual não estava preparado. Muito provavelmente
definitiva. Acho que já estou com disposição de mandar uma mensagem para
Blanka. Eita, entrei na quarta página. Estou meio inseguro em relação a esse
post. Mas é o que sou, o que fui, o que sinto e penso ou pensei e senti.
Dane-se, vou revisar e postar. A internet melhorou bastante hoje. Graças, pois
passarei o resto do dia aqui escrevendo o que me ocorre depois daqui e
navegando no maravilhoso mundo dos bonecos. Hoje é antevéspera de Natal. Amanhã
é o dia dos Gonçalves. Que venha.
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