terça-feira, 4 de dezembro de 2018

NECA, BLANKA E DAISY


6h50. Estou preocupado com Blanka e sua mãe. Ela ficou de me mandar notícias assim que a mãe voltasse da operação e ainda não o fez. A operação estava marcada para 15h de ontem e era simples, segundo ela. Não sei o que pensar.

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21h19. Estava nauseado, passei o dia inteiro assim e até tentei induzir o vômito durante o banho para ir a Ju, que não veio, até que mamãe me deu há alguns minutos um milagroso remédio com gosto de cereja. Também estava com o corpo mole e ainda estou, mas já fiquei muito tempo deitado e ainda mais tempo sem escrever. Cruzei com Seu Hélio quando voltava de Ju, e ele me pareceu muito mais enrugado que da última vez que o vi, pensei comigo que o tempo é lento e gracioso no início e veloz e cruel no final. Antes de Ju, conheci um serzinho muito especial, resultado das minhas andanças pelo Tinder, Neca, uma garota de 18 anos que encontrei na pizzaria em frente de casa mesmo, onde havia ido comprar Coca, tudo o que consumimos lá, visto que não tinha dinheiro para pagar-lhe uma pizza. A conversa foi boa, aprendi um pouco sobre candomblé e a sua diferença para a umbanda e ainda mais para a quimbanda. Mencionei que antigamente vendia bonecos da religião para os gringos no eBay, mas que o mercado minguou de forma inexplicável e desisti da empreitada. Falei um pouco sobre a minha vida, sobre a festa de 15 anos da minha prima caçula, das internações, da curatela e essas peculiaridades que há na minha vida. Ela ouviu a tudo e concluiu, apesar desse tudo, que eu era uma pessoa boa, que deveria me amar mais. Mas disse que eu era sum ser bonito e levantou a minha bola. Foi um encontro feliz para ambos eu creio. Curiosamente, enquanto esperava o Uber de Neca chegar, Blanka finalmente contatou-se comigo, justificou seu desaparecimento por conta do celular e que estava se conectando comigo através do da mãe. Disse que voltaria a se comunicar à tarde e não o fez até o presente momento. Não sei o que pensar, o que intuir do seu comportamento. Sinto-me desrespeitado, isso é fato. Sinto que ela não nutre nenhuma preocupação comigo, portanto, nenhum afeto. Sinto que só se fará mais presente após o dia 22 por uma razão que me desagrada, mas é quando a janela de tempo se abre para romper a couraça e construir algum afeto. Não sei se serei bem-sucedido. Gostaria muito de ser. Acho que é possível alcançar a alma boa que tem. Que eu acredito que tenha. Ela parece estar online no Instagram e não me manda notícia sequer. Sempre há a possibilidade de a namorada estar lá. Mas não resisti e mandei uma pergunta a ela. Foda-se também, disse que ia falar comigo à tarde. Toda vez que diz “já, já” demora mais de um dia para responder. Isso é desrespeito. Se não pode cumprir não promete. Estou com raiva agora. Não gosto do sentimento e não gosto de tê-lo causado por Blanka, disso é o que menos gosto. Vou fumar um cigarro para desopilar. O enjoo está voltando. Quando mamãe e meu padrasto forem dormir, vou induzir o vômito de novo. Acho que só botando para fora o que quer que seja eu ficarei aliviado. Prometi a Neca lhe passar o endereço desse blog, mas acho que só devo fazer isso escrevendo um post em que ela apareça. Não é todo dia que alguém me compara com o anjo, palavra que só vejo bem aplicada se relacionada a meu irmão. Falei do meu irmão para Neca, do ser iluminado que é e de como se sinto pequeno em todos os sentidos perto dele. Ela disse que eu não devo me comparar a ninguém, mas hábitos são difíceis de morrer, por mais que eu tenha chegado à conclusão, no meu segundo livro, que nunca vai ser publicado, de que eu sou assim e ninguém tem nada com isso. Infelizmente às vezes tal convicção me abandona e recaio em velhos comportamentos.

23h03. Me deixei perder no maravilhoso mundo dos bonecos para ver se desanuviava da falta de comunicação de Blanka. Resultou na seguinte mensagem, que não sei quando ela lerá:

22:59 - Você não pode imaginar como se comprometer a falar comigo e não fazer me deixa ansioso e desapontado contigo...

23h05. Infelizmente Neca, apesar de ser um amor de pessoa, não faz meu tipo (nem eu creio que faça o tipo dela), Blanka é a minha aposta para um relacionamento aberto e a alagoana para uma semana de curtição. Queria usufruir das duas dessa maneira, mas sou escravo da disponibilidade e do interesse delas. Da alagoana não sei, me pareceu indecisa sobre a minha proposta mas disse que tentaria me contatar quando o “boy” viajasse (pois é, há um “boy” na jogada, eu só arrumo coisa complicada). Confesso ainda estar com raiva de Blanka. Ela poderia se comunicar agora à noite comigo. Não é possível que sua mãe tarde tanto a dormir. Lembro que disse que o pai as visitava no hospital e ficava até as 23h, então há ainda uma réstia de esperança em mim. Minha esperança não raro me machuca, especialmente com garotas. Não sei se quero mais do que devo ou mereço, mas creio que não. Sei que primo por garotas jovens, a juventude me atrai sobremaneira, como já disse e redisse aqui. Nunca sairia com uma mulher da minha idade, me sentiria inseguro, com medo mesmo e não me excitaria. Acompanhar uma ninfa envelhecer ao meu lado me parece uma ideia muito mais agradável e honestamente bem-vinda. Conversei com Ju sobre as minhas inseguranças e desconfianças a respeito de Blanka, sobre supor que nem tudo que ela diz é verdade. Não sou de guardar mágoas, mas fico magoado com a desatenção e o desprezo. Quem é que não fica? Especialmente vindos da pessoa com quem se quer construir um complicadíssimo relacionamento? Eu sei que sempre estarei em segundo lugar, mas nem sei se esse posto agora me pertence, eu pareço não pertencer de fato à vida dela, se o faço é como uma obrigação ou problema. Ainda há a história de ter provas até o dia 17 de dezembro, bem dizer em cima do Natal dos Barros, o que significa, em teoria, que não poderemos nos ver antes. Queria encontrá-la pelo menos uma vez antes do evento para tentar ter vínculos um pouco mais fortes, mais íntimos, sermos menos desconhecidos. Os remédios da noite, que já tomei, começam a me dar a larica noturna. Hoje resistirei, pois sinto ainda leve enjoo e acho uma experiência detestável vomitar sólidos, se for para vomitar que vomite líquidos apenas. Não estou com muita vontade ou cabeça, ou conteúdo para escrever. Acho que vou fumar um cigarro, repor a Coca e viajar mais um pouco pelo maravilhoso mundo dos bonecos, sempre atraente, sempre uma sadia distração, desde que não gaste nada. Vou lá. O encontro com Neca ainda encontra eco na minha cabeça. Vou fumar o meu penúltimo Marlboro.

23h38. Fumei e resolvi voltar para cá. Espero que Blanka vá ao Natal dos Barros ao menos e que seja bem acolhida lá. Seria também nos 15 anos, mas a vida complicou tudo. Ela nada me respondeu no Instagram, embora a sua foto esteja com a bolinha verde. Isso me põe bastante chateado. Não sei lidar com garotas, não sei esperar e às vezes acho que espero demais. Acho que espero demais de Blanka, talvez o que eu deseje ela não possa oferecer, embora tenha dito que poderia, que estava disposta e disponível a isso. Quero ver quando e se entrar em contato comigo, o que ela vai dar como justificativa. Sempre há uma. E cada vez menos creio nelas. Talvez o melhor fosse desistir, mas algo em mim insiste. Está decidido, se ela não puder ir ao Natal dos Barros eu acabo o que nem sequer chegou a começar. Não gosto de me sentir ludibriado e esse é o sentimento mais recorrente na nossa relação. Caso haja o encontro no dia 22 vou cobrar dela que nem mentiras grandes nem miúdas têm espaço na nossa relação. Que ela precisa se desabituar delas, pelo menos quando tratar comigo. Sei que estou sendo repetitivo, mas esse blog tem muito a função de desabafo. Então o faço. Vou para o mundo dos bonecos guardando ainda uma esperança de comunicação dela pelo Tinder.

5h06. Passei esse tempo todo mergulhado no maravilhoso mundo dos bonecos. Coincidentemente, Daisy da YetiArt, o ateliê chinês que tem três figuras minhas para serem montadas e pintadas, entrou em contato comigo, dizendo que no terceiro quarto desse ano teria brecha para pintar uma das minhas figuras, se eu desse a entrada agora. Estou esperando o invoice, vai ser o meu presente de Natal e aniversário para mim mesmo.

5h14. Vou fumar e vou dormir.

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12h39. Tico e Teco ainda estão meio desencontrados. Não sei como minha mãe vai processar esse gasto extra da pintura do meu kit, mas o tempo é senhor de tudo. Se a ira vier, ela há de passar, como tudo passa nessa vida. Vou tomar mais café e fumar mais um cigarro.

12h51. Estou de volta. Neca me vem à cabeça, é tão bom encontrar alguém que me dá valor, que vê coisas boas em mim. Faz bem para a alma, eleva o espírito e me faz sentir mais válido no mundo. Há coisas nessa vida que o dinheiro não compra, que a vida oferece de graça. Ou rouba. Certamente a reação de mamãe ao saber do valor do cartão vai me roubar a paz e a tranquilidade. Só de projetar a sua reação já me sinto desconfortável e intranquilo. Mas acho que suportar toda a sua ira e ter a minha coleção completa vale a pena. Só há figuras maravilhosas, do meu ponto de vista, na coleção. Meu quarto se transformará num pequeno e aconchegante museu, ou assim espero. Esse é o meu sonho, pelo menos. Sobre Daisy e a YetiArt, pretendo mandar pintar uma figura por ano, pois a pintura customizada é algo caro, das coisas mais caras que há no maravilhoso mundo dos bonecos. Blanka ainda não deu sinal de vida e isso machuca. Tentarei entender as limitações que a impedem, se me parecerem plausíveis. Sei que não posso exigir de ninguém receber a atenção que estou disposto a dar. Eu tenho muito tempo livre, tenho-o quase todo para mim, não estou com a minha mãe no hospital nem com o celular quebrado.

15h34. Blanka se comunicou comigo, conversamos e conversaremos mais quando ela acabar de lavar as roupas. Ela sonha em conhecer a minha casa. Isso é bom. Mostra que ela pensa em algo a longo prazo. Falei da alagoana e ela perguntou se isso mudava algo entre nós, eu disse que não, que por ela eu tinha afeto e pela alagoana era algo meramente sexual.

19h21. Conversei com Blanka até agora e combinamos de ter outro encontro antes do dia 22, provavelmente no sábado, dia 15, após o trabalho dela. Se ela arrumar alguém para ficar com a mãe, talvez logo nesse próximo sábado. Quem me dera, por mais que me dê medo, um frio na barriga, parece algo forçado para ela, eu sinto. Precisamos quebrar essa barreira, entretanto. Esse é o momento em que desacredito de toda a construção que fiz. Não posso desanimar quando chega a hora de colher os frutos. É idiota, para dizer o mínimo. O mais difícil eu já fiz.

19h42. Eis o que mandei para ela há alguns minutos:

“19:34 - Esse nosso encontro me deixa com um turbilhão de sentimentos: ansiedade, excitação, curiosidade, vergonha, receio, esperança, uma salada mista emocional. Hahaha.”

E a terceira página acabou e eu vou ter que lidar com esse turbilhão de sentimentos e encarar o desafio de construir afeto, de ultrapassar a couraça emocional que Blanka veste. Vou fumar, pegar Coca, revisar e postar. E me preparar para o esporro da minha mãe quando vir a conta do cartão. Nossa, fortes emoções hoje.

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