15h29. Sem muita vida para viver que me interesse, venho
para essas palavras. A tarde é minha, estou sozinho em casa. Gosto de uma tarde
solitária na minha casa.
15h40. De que me servem as palavras e toda essa solidão?
Estou meio down hoje. Tenho tudo e
algo me falta. Acho que vou jogar videogame. PS3 precisamente. Deus X, mais
precisamente ainda.
-x-x-x-x-
12h57. Joguei Little Big Planet 2 e não joguei muito. Os
gráficos são lindos, a física é perfeita, mas a diversão é miúda quando
comparada aos jogos de Mario. Controles muito complicados para o meu gosto. O
Mario é mais simples e mais gostoso de controlar e a física do jogo não é
realista, é voltada inteiramente para tornar o jogo o mais agradável e
intuitivo possível. Há uma grande parte no LBP 2 voltada à criação de fases,
talvez isso explique a mecânica do jogo. De toda sorte não gostei. Se tentar
hoje será realmente o Deus EX. Dizem que é possível finalizar o jogo sem matar
nenhum inimigo (exceto pelo chefão final) e essa vai ser a minha meta, parece
um desafio interessante. E trata da Singularidade Tecnológica, um tema que me é
muito importante e está no cerne da minha crença a respeito de tudo o que há. A
portuguesinha não respondeu o meu último post até o presente momento. Ju, por
outro lado, respondeu o WhatsApp que mandei do celular de mamãe marcando a
consulta para o mesmo dia e horário, ou seja, segunda que vem às 16h. Estou
menos ansioso para encontrá-la do que quando cheguei, mas sei que vai ser bom. Sempre
é. Estou mais sociável do que quando parti. Graças em grande parte à
convivência em Lisboa e com a minha família de Munique. Acho que há outra
razão, mas não posso comentá-la aqui. Vai para o Desabafos do Vate.
13h29. Estou tomando café aos montes, isso sempre me deixa
mais animado, o que não ocorreu ontem, quando tive uma forte crise de tédio.
Esses neurotransmissores associados à cafeína fazem milagres. Hahaha. O que a
portuguesinha vai achar do meu vídeo cantando, se é que vai assistir...
tremendo papel de palhaço. Que importa, melhor palhaço que tirano. O primeiro
pelo menos traz alegria ao populacho e não o reprime, liberta por um momento ou
dois da dureza de seus dias. Nunca achei graça em palhaços em verdade. Acho
muito poucas coisas genuinamente engraçadas, de me despertar gargalhadas.
13h33. Acho impressionante como a adolescência
comportamental chega cedo às crianças brasileiras. Não vi tanto disso na
Europa. Lá pareceu-me que as crianças são crianças por mais tempo, o que acho
deveras salutar, mas posso estar enganado e, num mundo conectado, essa trend pode ser global. Não sei. Acho que
estou a falar asneiras.
14h20. Passei um bom pedaço conversando com mamãe. Foi bom,
mamãe é outra, mais relaxada, menos severa e estressada que nos tempos idos da
minha juventude. Também não lhe dou tanto trabalho como costumava dar. Estou
sob controle, autocontrole, digo, e não sou dado mais a grandes paixões, que
não as platônicas. Essas são coisas que me afligirão até o último suspiro, pois
já perdi a esperança de concretizá-las. Vou ficar que nem o vizinho do sogro do
meu irmão em Aldeia, esperando o que nunca vem. Só e um tanto amargo por causa
da solidão. Ainda bem que tenho as palavras, elas são minhas companheiras
infatigáveis e leais. Por mais que às vezes me bata um cansaço delas. Vamos ver
se Ju vai tocar no assunto da AT na próxima consulta. Estou meio avesso à ideia
no momento, mas sei que em breve a solidão vai abrir completamente as suas asas
e talvez perceba essa presença estranha na minha vida como necessária. Não sei
e não quero pensar nisso agora pois me toma um sentimento ruim a respeito. Só
vou aceitar tal empreitada se e quando ela me trouxer um sentimento bom.
14h29. Estar em paz com a minha mãe é muito fixe. Amo-a
sinceramente e sempre tive dificuldade de amá-la, pois sempre achei que não me
deu amor, atenção e carinho suficientes e me sufocou, reprimiu e repreendeu
demais. Hoje não, me aceita como sou – o que é dizer muito por causa das minhas
peculiaridades – e tecemos, talvez até por causa das viagens, um vínculo de
amizade maior. Eu entendo e não critico as suas falhas cognitivas, pois elas me
acometem também, porém de forma bem mais branda. Ainda não me atrapalha (muito)
a vida e o que realmente me marca o memorizo, também tenho atenção especial a
compromissos. De resto, sou bastante desligado e passo a vida mais dentro da
minha cabeça que fora dela, talvez por isso muitas coisas passem batidas por
mim. E me esqueço de coisas com uma brevidade impressionante (exceto as
realmente marcantes). Às vezes sinto como se levasse a vida com um leve torpor,
uma embriaguez. Talvez sejam os remédios cobrando a sua taxa de efeitos
colaterais por me manterem equilibrado. Acho a troca justa.
14h45. Acho que aceitá-la, sou um sujeito relativamente
livre de preconceitos no geral, faz com que minha mãe também me aceite e
respeitemos ambos nossas inúmeras diferenças. Lembrei-me novamente de “Sacred
Deer”, acho que assisti-lo-ei hoje depois que a fantástica faxineira (uma
pessoa ímpar) acabar de arrumar o meu quarto. Tomara que essa ideia evolua para
um desejo sincero, o que é difícil, pois quando retorno ao quarto-ilha parece
que o magnetismo do computador aumenta e só quero ficar nele. Seria bom um
filme para desopilar e, geralmente, quando começo a assistir filmes, cresce em
mim uma vontade de vê-los com mais frequência, de inseri-los no meu cotidiano. Tomara
que tudo isso se dê. Gostaria de assistir um filme por dia, tenho certeza que isso
me faria bem ao espírito. Confesso que ainda não encontro disposição, mas o
primeiro passo é sempre o mais difícil da jornada.
14h53. Acho que café me dá flatulência. Meu quarto está
impenetrável. Hahaha. Coisas de ser um bicho, um animal. Vai ver que tenho
parentesco com as vacas. Hahaha.
15h04. Que ser humano seria tão despudorado a ponto de
tratar de peidos abertamente? Eu realmente me surpreendo comigo às vezes. Acho
que fui fumar um cigarro, não me lembro ao certo. Se o fiz foi tão
mecanicamente que se passou e eu não notei. Lembro-me de ter entrado em casa
pela porta de serviço – fumo no hall de serviço – então é bastante provável que
o tenha feito, não iria lá por outra razão. Já abriram as persianas e janelas
do meu quarto, então o ar tornou-se respirável uma vez mais. Os barulhos da
construção aqui em frente invadem o meu quarto. Acho que vou botar música
enquanto posso. Em breve migrarei para a varanda, para que a fantástica
faxineira opere a sua mágica no meu quarto. Por falar em mágica e no meu
quarto, tenho pena da arquiteta que terá que dobrar o espaço para fazer caber a
minha coleção de bonecas tal qual a imagino disposta. Pobre coitada. Se essa
reforma sair mesmo. É o meu maior sonho material, ter minha coleção enfim
exposta ao alcance dos meus olhos. Meu segundo sonho material e esse é
pernóstico até dizer basta, mais fútil até que as bonecas, é ter uma banheira
no meu banheiro. Achei a experiência de ser lentamente encoberto por água
quente extremamente relaxante em todos os aspectos. Tomei tantos banhos de
banheira quanto pude nessa minha estadia na Europa. Pelo pouco que conheço,
tenho que admitir que é um continente fascinante. A história do meu país começa
ali (não desmerecendo os índios que chegaram aqui sabe-se lá quando e foram
dizimados em sua maioria, vi inclusive no Twitter que o único sobrevivente de
uma tribo dizimada por fazendeiros e contrabandistas de madeira, mora há 22
anos sozinho na selva e foi chamado pela BBC de “o homem mais solitário do
mundo”, o que acho uma alcunha bastante apropriada, pois não tem laços
culturais ou de sangue com mais ninguém no planeta. Ele é acompanhado pela
FUNAI que lhe cede mantimentos e ferramentas para que siga sua solitária
jornada rumo ao completo extermínio de um povo). Isso é que é um parêntese
grande, hein? Acho que tenho um especial interesse por índios por ter nascido
no Dia do Índio e por saber que o capitalismo não é a única via de
sobrevivência de um povo, pode-se viver de maneira muito diversa, mais harmônica
e solidária, mais pacífica e menos estressante, menos neurótica e egoísta, em
suma, do que nós urbanoides de merda vivemos. Não sei se funcionaria para
tribos excessivamente grandes, mas são um exemplo de vida para o qual
deveríamos atentar, estudar, respeitar e aprender. Acho os índios mais felizes
na sua imensa simplicidade que nós na nossa complexa e complexada realidade. O
capitalismo leva a evolução tecnológica, isso não posso negar e é algo que me é
muito caro, pois é nesse desenvolvimento que ancoro a minha fé. O número de
produtos maravilhosos criados para suprir necessidades que nem sabíamos que
possuíamos é um deleite, o chato é que uma parcela tão pequena da população
mundial tenha direito a todas essas benesses. Apesar de tudo, de toda a
discrepância social e da violência em nome de valores que não valem a pena,
pois quase nenhuma violência é justificável para mim, logo não há causa que dê
razão ao seu uso, apesar de todos os pesares (e são muitos) sou um otimista,
vejo o futuro com bons olhos, pois olho para o passado e vejo que a humanidade
já esteve bem pior. Pode ser que tenha uma visão romântica dos anos vindouros,
mas acho que serão cada vez mais positivos. Há uma crescente consciência
ambiental, já ensinada pelos colégios às crianças, em certos casos até pelos
pais. Há um maior esclarecimento devido à internet. A internet é a grande
revolução, eu me sinto abençoado por viver num mundo conectado, nada se compara
ao impacto mundial que a grande rede teve. Nada desde a revolução industrial.
Eu sou péssimo em História, mas minha alienada opinião é essa. A internet é a
nona maravilha da humanidade. Daí, só a Singularidade Tecnológica, culminância
ou estopim da culminância das tecnologias humanas. Espero estar vivo para ver.
É algo como um “Broken Mirror” que dá certo. Muito certo. Inimaginavelmente certo,
pois a nós reles bípedes de cérebro superdesenvolvido não nos é dada a
capacidade de imaginar o que nossas míseras inteligências e abstrações não são
capazes de alcançar.
15h47. Nossa, cá estou eu pregando, portuguesinha. Às vezes
o meu lado profeta me acomete. Acho que é café demais. Hahaha.
15h58. Certamente é a cafeína a causa desse efeito, desse
bem-estar com a vida, obrigado existência por esse café que agora tomo, segunda
garrafa já, é absurdo o seu efeito sobre os meus ares. Portuguesinha, minha
portuguesinha que não é e nunca será minha, é bom imaginar que me lê. É bom
imaginar que do teu lado do Atlântico uma mulher apaixonante utiliza seu
apertado tempo comigo. Ou desperdiça, sei lá. Tenho muito carinho por você e
pelo “quase nada” que me ofereceu naquela breve semana no Novotel de Lisboa.
Como vê, apesar da minha memória fraca, você ainda impera nos meus pensamentos
e sou quase todo seu ainda. Ah, sonhar... não há limites geográficos,
relacionais, culturais, não há limites para os sonhos, só os da imaginação.
Confesso que minha imaginação não seja lá grande coisa, não sou dado à ficção,
narro o que me ocorre dentro e ao redor. A fantástica faxineira já vem para o meu
quarto e a terceira página está quase no fim.
16h23. Vim para a varanda. E a página chega ao fim. Espero
que a portuguesinha leia esta e a postagem anterior e dê sinal de vida. Nem sei
se quero que veja a postagem anterior por que passo por um ridículo sem tamanho
nela. Hahaha. Quer saber? Quero sim, eu sou ridículo mesmo, uma a mais uma a
menos não faz diferença para o conjunto da obra. :P
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