domingo, 5 de agosto de 2018

QUALQUER COISA


O maravilhoso mundo dos bonecos é muito frenético, muito cheio de mensagens e postagens acontecendo, isso me deixa meio acelerado e eu me sinto entediado quando a coisa fica mais devagar. Para manter a vida interessante e me desligar da imensa miséria que ela é, eu corri para cá. As novidades são, um cara me fez uma proposta para ganhar dinheiro escrevendo ou reescrevendo textos sobre bonecos. Como acho antiético reescrever o que alguém teve o trabalho de redigir, além de muito pouco interessante e de a remuneração ser muito baixa, eu declinei da oferta. Tive uma ideia, entretanto, para o meu blog: entrevistar um colecionador. Eu achei a pessoa perfeita para a entrevista, elaborei as perguntas e mandei o convite para ver se ele se interessa. Acho que como parece ser um cara muito auto-confiante e orgulhoso de sua espantosa coleção, é bem provável aceitar. Só para constar ele tem 750 estátuas de todos os tamanhos, geralmente grandes, então todo sótão dele, que não é pequeno, foi desenhado para acomodar as peças. As fotos que ele publicou de seu “museu” ilustrarão o provável post. Estou me divertindo milhões com o maravilhoso mundo dos bonecos. Estou de volta com tudo. Minha excitação é tão grande que temo estar entrando em mania, mas acho que não seja o caso. Espero que não. Sei que quero duas estátuas, pretendo vender algumas para financiar a compra, mas tudo está nas mãos do meu irmão, já que as peças estão lá na casa dele nos EUA. Tenho que tomar coragem de cobrar à incrível revisora o meu livro devidamente enxuto. Acho que vou fazê-lo agora. Eis o que vou escrever:

Sei que você quer se livrar desse projeto e nunca mais tocar nele, então gostaria de saber se você tem uma estimativa de quando vai terminar a “lipo” do texto. Desculpe causar-lhe tanto desconforto, não era a minha intenção. Confesso que não olhei para o texto ainda, espero a versão enxuta para ver tudo o que você mexeu. Foi um erro e um acerto escolher você. Erro porque você nunca mais me verá como antes, acerto porque você conhece os personagens e pôde me aconselhar sobre o mais sensato a se fazer. Ou seja, não fazer. Pelo menos não por ora. O tempo é senhor de todas as coisas. ;)

Xêro, amiga, se ainda me considerar como tal. :/

18h40. Pronto. Vou mandar o que escrevi acima. Agora.

19h01. Mandei, fui fumar o meu último cigarro, dei uma olhada no Facebook e estou de volta. Já com outra ideia na cabeça. Sinto-me acelerado. Também tomei muita Coca e café hoje. Sinto-me bem. Quando me sinto bem tenho medo da mania, mas acho também que tenho o direito de me sentir bem de vez em quando. Por mais raro que isso seja. Queria que minha mãe se aposentasse e ao mesmo tempo tenho medo disso. Pode ser que ela, por falta de distração outra, resolva gerenciar ainda mais a minha vida. Ela melhorou bastante nesse aspecto, devo admitir. As coisas estão melhores do que nunca entre eu e ela.

19h54. O colecionador a ser entrevistado viu a minha mensagem e nada respondeu até agora. Me percebo excessivamente ansioso e imediatista. Ou sempre fui assim, não sei. Acho que me tornei mais com a velocidade cibernética. E por ter trabalhado em publicidade onde as coisas são sempre para ontem. Parece que realmente estou acelerado. O tempo é senhor de todas as coisas, como disse. O que tiver que ser, será. Ou não será. Preciso sossegar o facho e ter paciência. Melhor a falta de resposta imediata que um não. Já estou pensando na consulta de amanhã. Vou até mandar um WhatsApp para Ju para confirmar. Às vezes eu me sinto vivendo num sonho, numa espécie de delírio, em algo que não é real, que é fruto da minha imaginação. É uma sensação perturbadora. Acho que é a falta de contato humano real. Falta de mulher. É até estranho me ver dizendo essa frase. Hahaha. Parece até que estou desesperado por sexo. Talvez esteja e não sei. A mim não me parece. Queria tudo da mulher menos penetração. Queria a pessoa mulher, linda e encantada. O “encantada” eu tenho que riscar do meu dicionário por ser demasiado platônico. Aliás, não, eu adoro a palavra e me evoca o que há de mais belo na natureza feminina.

20h29. A saciedade da comida ultimamente tem me trazido também a vontade de morrer. De fato, me sinto morrendo, como se a força do meu existir fosse se esvaziando diariamente, que é o que deveras acontece com a idade que carrego, peso morto. Ou a morrer. O colecionador ainda não me respondeu. Gostaria de saber por que. Mas isso independe da minha vontade. Esperar. Esperanças? Tenho algumas, a maioria independe de mim, o que não é interessante. Mas não tenho muitas. Sou um ser incomodado de ser e que não vê maneira de ser de outra forma. Ou seja, um ser burro e inerte.

20h41. Não sei qual é a do colecionador. Mandei o link das minhas entrevistas para ele. Talvez isso faça alguma diferença, sei lá. Que pena. Por falar em entrevista, agora que me lembrei que este post deveria ser a entrevista da Gatinha, mas agora que comecei, vou até o final, depois parto para responder a entrevista. Vai ser uma boa forma de preencher a vacuidade da minha existência. Pensei que é aqui, nessas palavras que me sinto mais acolhido e mais eu no mundo. O blog de bonecos me traz uma sensação diferente, requer um esforço que aqui não necessito. Sonho que um dia alguém venha a dar valor a essas palavras, mas confesso que isso é irreal demais para ser classificado como uma das minhas esperanças. Minha prosa não chega tão longe, embora chegue algumas vezes a Portugal. É um lugar que me traz excepcionalmente boas recordações. Não esperava. Muito menos poderia esperar por uma presença tão encantadora e marcante quanto a da portuguesinha. Pobre portuguesinha que teve o azar de cruzar sua radiante existência comigo. A vida é surpreendente, por mais que meus olhos já tenham visto tudo o que há. Meus olhos nunca estão cansados de ver. A beleza especialmente. A beleza talvez seja a qualidade que mais admiro na existência. A capacidade de apreender a beleza do que julgo belo é talvez a melhor propriedade de mim. A que mais me agrada. Estou melancólico, minha vida definitivamente não se dá de uma forma que me contente ou me deixe contente. O que me surpreende é que ela é minha, que eu tenho poder sobre ela, eu e somente eu posso mudá-la e simplesmente não o faço, não de forma significativa. A última tentativa que fiz e que requereu enorme esforço, tive que lutar contra a minha natureza atual para fazê-lo, em nada resultou. Foi, claro, a abordagem que fiz à portuguesinha. Para ser completamente honesto, eu acho que estou sendo mais pessimista e miserável do que realmente sou, olhando apenas para os cantos escuros. Não sei por que isso. Me desagrada de todo tal comportamento e não consigo evitá-lo. Parece que o papel de vítima colou na minha alma e não quer sair de mim. Queria ter força de viver mais plenamente, mas me sinto fraco e débil. Fosse eu dado a misticismos, diria que há um encosto em mim. Talvez esteja oscilando entre o estado maníaco e depressivo e acho que estou falando merda. Quando não estou? Hahaha. A minha existência é por demais contraditória e aborrecida.

21h36. Eu sou abençoado e as bênçãos não param de surgir. Me sinto tremendamente culpado por isso, pois não faço nada para merecê-las. Não sou ingrato, de forma nenhuma, tenho profunda gratidão por todas elas, só acho injusto com os demais. Eu nada fiz, faço ou farei para merecer tudo o que a existência tão gentilmente me proporciona. Em troca exige só a mais completa solidão afetiva. Ou eu a imponho a mim mesmo. Eu não sei buscar e, quando porventura tento, não surte nenhum resultado. Eu me conformei com isso. Deveria voltar a me inconformar. Deposito todas as minhas esperanças na maior loucura que poderia fazer na vida (afora me matar), que certamente não terei coragem de fazer quando a hora chegar. Isso é ridículo. Se você soubesse, entenderia.

22h10. Estou em negociação com o possível entrevistado. Estou fazendo o meu melhor, vamos ver no que é que dá.

22h40. Ele praticamente aceitou, só falta eu mandar o e-mail com as perguntas. Dei um prazo de 15 dias para ele responder.

22h43. Como ele nada respondeu ainda, eu resolvi aproveitar e encurtar o deadline para a próxima quarta-feira. Hahaha. Disse que era o prazo sonhado. Hahaha. Seria ótimo, pois o post do museu que é a sua coleção ainda estaria quente na memória dos colecionadores. A Coca está acabando. Isto é mal. Preciso olhar o celular de mamãe para ver se tenho consulta com Ju amanhã.

22h50. Não vai ter consulta. Saco. Talvez meu quarto fique pronto esse ano. Assim como o banheiro. Está vendo como a minha vida é cheia de bênçãos? Não estou confiando muito em mamãe, mas vamos ver. Preciso acabar isso para responder a entrevista da Gatinha. Estou com uma louca superstição que em respondendo a minha entrevista, as que fiz fluirão. Pensamento totalmente irracional, eu sei. Não há conexão nenhuma entre os eventos. Mas agora entendo porque protelam responder minhas entrevistas. Hahaha.

23h11. Ainda lutando para acabar a terceira página. A Coca vai acabar, há muito pouca. Vou ter que passar para água. É bom que me dá sono logo e vou dormir. Preciso tomar um bom banho antes. O efeito da saciedade passou mais. Me sinto em um ânimo mais agradável. Será que sou uma pessoa agradável pessoalmente? Aqui seu sei que pareço o último dos seres humanos. Mas aqui eu mostro como eu realmente sou e o que realmente sinto. Ao vivo e em cores, há sempre máscaras, o personagem eu que se amolda a situação. Por mais que tente viver o mais autenticamente e sinceramente possível. Mas não acho que consiga com 100% de transparência como aqui. Talvez consiga e não me aperceba disso. O que queria conseguir era dinheiro para mais uma Coca. Não haverá. Minha mãe já se recolheu. Acho que fico por aqui. Vou revisar e postar. Ainda falta um pedaço de página em branco. Tudo isso para protelar a entrevista. Eu, hein? Vou protelar, não. Vou finalizar por aqui e responder.

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