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Fantástica faxineira – ou acaso – deixando sua marca no meu texto ao limpar o
meu computador.
9h55. Coloquei “Livro” de Caetano, trilha sonora da
portuguesinha, disco que costumava ouvir no quarto 401 do Novotel enquanto
escrevia e pensava nela. Penso nela agora. É um pensamento dos mais agradáveis.
E inútil. Mas os meus bonecos são completa e inteiramente inúteis e nem por
isso os aprecio menos. A existência tem coisas que aprecio. Ainda bem. Não
dormi desde ontem. Decidi emendar para ver se organizo um pouco mais o meu horário
de sono, embora ache que não vá funcionar. Meu cérebro não está funcionando com
capacidade total, mas meu astral é ótimo. Prefiro assim que o contrário. Nossa,
quando me lembro da portuguesinha tão cheia de vida e de aspirações, espetáculo
tão bonito de se ver, além de ser uma moçoila bastante encantadora
esteticamente, da cabeça aos pés, passando pelas lindas mãos, sou tomado por um
carinho profundo. E inteligente, raciocínio rápido, língua afiada, senso de
humor, profissionalismo, um exemplo de gente. Apaixonante é a palavra, tanto é
que a coisa se deu como se deu comigo. Mas eu tenho uma carência abismal. Isso
faz parte do fato de ela continuar a inundar os meus pensamentos. Que inunde,
que transborde. Quero apreciar esse sentimento torto nesse momento em que tenho
e não tenho sono. Já estou na quinta xícara de café forte. Ela tem um lar, a
portuguesinha. Como eu tive com a Gatinha. Não posso nem tenho capacidade de usurpar-lhe
essa divinal conquista. Contento-me com as migalhas que ela me joga aqui e
acolá num post ou outro. “Você é Minha” toca. É a música-tema dela. Nada
poderia estar mais distante da realidade, mas a realidade é que eu ouço a
música e lembro dela. Lembro do sorriso maroto-simpático-acolhedor dela ao me
trazer a Coca cheia de gelo logo que cheguei ao A Bicicleta antes mesmo que a
pedisse. Nunca me esquecerei. Detalhes. Detalhes são importantes em algumas
circunstâncias. Ela, você, sabe muito bem disso, atenta que é a todos eles.
Nossa, foi bom ter virado a noite. É como se pensando menos eu fosse mais leve
e mais feliz. Eu penso demais, racionalizo demais. Eu nunca vou beijar a
portuguesinha, mas cheguei a abraçá-la com um pouco mais de afeto, com afeto
mesmo diria, da segunda vez, na despedida para um bem possível sempre. Da primeira
vez foi um abraço receoso, tenso e formal. Detalhes. Não sei porque eles me vêm
nessas condições mentais. Ela me abraçou soltamente e distante em ambas as
ocasiões, abraço profissional-amigável. Mas a rosa que lhe dei disse sem que
precisasse ler o bilhete ou esse blog que carregava algo além de gratidão, algo
mais denso e mais íntimo. Não que a gratidão não possua densidade. A minha
gratidão por tudo o que tenho é incessante e chega a me torturar por não
compreender porque eu sou merecedor de tantas bênçãos. Não há razão. Talvez
seja o prêmio por suportar tão completa solidão. Que não sei extinguir. Quando
tento, dá em nada, ou em comentários esporádicos no meu blog que me acalentam a
alma e me fazem sentir sei lá o quê. Só sei que é bom.
10h44. Fui falar de você, portuguesinha, para a fantástica
faxineira e falei da minha vida afetiva e sexual praticamente nula há dez anos.
Ela disse que eu era muito exigente e eu concordei e disse que isso me
atrapalhava deveras. Falei da boneca e a expliquei em todos os seus detalhes.
Além de ser exigente, não sei ser gente perto de uma mulher que me atrai,
pareço um menino acanhado, eu sou um menino tímido e acanhado perto das
mulheres que me encantam. Para quebrar o gelo só sendo desenrolada como você,
portuguesinha, foi no nosso último dia. Parabéns por me fazer sentir
confortável, depois que me recuperei da ousadia que foi lhe presentear. A vida
é cheia de surpresas. Você foi a melhor surpresa em muito tempo. Recebi um WhatsApp
de uma pessoa muito querida, que me quer aparentemente igual bem, e que irá me
odiar caso o meu livro seja publicado. Por sinal ao reativar o WhatsApp e
comunicar aos meus contatos que tinha novamente acesso ao aplicativo, uma
colega veio me perguntar do livro. Quando disse que era impublicável, ela
brincou chamando de “proibidão”. Achei a alcunha divertida e pertinente, é como
chamam os funks que exaltam o tráfico e o crime no Rio. Eu cheguei a comprar um
CD de proibidão quando lá estive com a Gatinha, mas não sei por onde anda, meus
CDs estão no limbo desse apartamento cheio de obscuras gavetas e armários. Quando
da possível reforma, tentarei localizá-los todos. Gosto dos meus CDs. Na
Alemanha comprei os dois últimos CDs da discografia oficial de Björk que me
faltavam, mesmo os tendo disponíveis no Spotify. Joguei dinheiro fora, eu sei.
Mas mais vale um gosto que dois vinténs, já dizia o meu carbonizado pai, que agora
habita o meu armário. Meu pai tem vindo muito à tona nos meus pensamentos
ultimamente, acho que por causa da entrevista da Gatinha, outra que também se
faz bem presente nos últimos textos acho que por ter tido com ela há tão pouco
e ter sido bom e saudável para ambos, até onde eu sei. É triste pensar que não
mais terei o imenso prazer de dormir ao lado de alguém que ame. Não faço por
onde e nada tenho a oferecer a uma companheira. Nada tenho a oferecer a você,
portuguesinha. Não chego a unha do dedo do pé do seu “namorido”, tenho plena
convicção disso. Tenho todo o amor do mundo dentro de mim mas todo o resto me
falta. Não quero descambar para a autodepreciação. “Você é Minha” toca outra
vez. “Mas naquele tempo eu não sabia que isso é que dissiparia a treva em que o
amor lançou meu coração”. Quem me dera haver um “isso” para mim que eu não
saiba. Não adianta, vivo de enganos, mas me agrada mais a minha vida com os
comentários seus do que sem eles. Sem eles, seria mais doído, mais
completamente e claramente só. Estou pensando na boneca que encomendei. A
beleza, ah, a beleza... está no olho de quem vê. Aos meus olhos a beleza capaz
de me encantar é rara. Meus olhos já viram tanto que se tornaram cegos para o
ordinário, tem que ser extraordinário, como um detalhe de um vestido não vulgar
que sugere o seio e a nudez de forma singela e delicada, sem extravagância;
como uma enorme mariposa com a qual tive a sorte de me deparar um dia desses;
como todas as nuvens densas. As nuvens me encantam. São um espetáculo épico e
gratuito. Nada é maior e mais magnífico que o céu tomado por densas nuvens
durante o pôr-do-sol. E não nos custa nada apreciar, apenas o ímpeto de
fazê-lo. A natureza como a vejo é encantadora. Por mais que possua um lado
cruel, na injusta hierarquia da cadeia alimentar. Abençoado sou por estar no
topo dela, salvaguardado de toda miséria no meu quarto-ilha onde o meu egoísmo
e egolatria predominam. Onde me protejo de tudo e de todos. Me fecho para novas
possibilidades por livre e espontânea vontade. Eu não consigo me entender. Eu
me faço sofrer. Acho que sou masoquista. Não me sinto merecedor. De nada. De
menos que nada. Eu sou um ser nulo para a sociedade. Não gosto de pensar no que
penso a meu respeito. Machuca. E a pergunta de Ju ecoa, para que me serve isso?
Para que me serve me ter por tão pouco? Por algo negativo, corrompido, doente,
covarde, inútil e preguiçoso? Não sei, mas sei que essas qualidades negativas
todas me cabem, encaixam perfeitamente na mina autoimagem. São uma síntese da
minha autoimagem. Eu me nego. Me renego. Sei lá por quê. Eu não espero nada de
bom de mim. Nem quero fazer nada de bom, só se a oportunidade se oferecer e não
requerer muito esforço. Vou beber Coca e fumar.
12h28. Você me respondeu, portuguesinha! Disse-me, como bem
sabe (mas o leitor desconhece), que sempre estará aqui a ler. Que coisa pequena
para você e tão grande para mim, como é a diferença de tamanho entre os textos
que trocamos. Ou que eu te ofereço e você aceita. Não sei se por pena,
provavelmente por isso, creio, visto que carinho acho que você acharia uma
palavra exagerada para a sua motivação. Você não tem carinho por mim, bem sei.
Como poderia, lendo o que escrevo? Sonho, mas com os pés firmes no chão. Carinho
suporia uma carência de mim, um afeto, por mínimo que fosse, um bem querer que
não tem sentido me conhecendo tão a fundo como você me conhece através dessas
palavras. Definitivamente não tenho essa importância na sua vida. Você me lê
por pura piedade de psicóloga. Se é que existe tal coisa, mas creio que exista,
pois você me lê. “Você é Minha” acabou de tocar uma vez mais.
12h56. Será que alguém lê os horários que encabeçam os meus
parágrafos? Eu nunca leio quando reviso. Acho que ninguém o faz. É uma
informação desnecessária que insisto ou me habituei a enumerar. Nossa, estou
com muito sono. Acabei de entrar na terceira página. A palavra “sempre” me traz
uma garantia, uma gostosa sensação de companhia de quem realmente quero a
companhia. Estou hiperbolizando as coisas para variar. Se eu não gosto de mim e
elenco todas as razões pelas quais chego a essa conclusão, dando provas mais do
que concretas desse desgosto e da minha incapacidade de mudar, por que quem
lesse, por que você, teria impressão diferente da que tenho a meu respeito? Uma
amiga bastante religiosa, (tornou-se assim com os anos e o é há vários), disse
que “todos somos falhos, perfeito só Deus.” Há os mais falhos que a média e há
os menos falhos. Não aguento, vou dormir um pouco, estava cochilando aqui.
Preciso me deitar e deixar de ser eu por algumas horas.
-x-x-x-x-
12h29. Não aguentei ontem e dormi, fui acordado para a
arrumação do quarto pela fantástica faxineira, que provavelmente terá a sua
carteira profissional assinada quando mamãe se aposentar, tal como sugeri ser o
mais digno a se fazer, jantei uma gordurosa bisteca de porco e voltei a dormir
até as 11h de hoje. Tive sonhos e, como sempre, envolviam muitos personagens, a
maioria, pessoas da minha juventude aqui nas Ubaias, culpo a solidão por tais
onirismos tão populosos. Mas não guardo detalhes do que sonhei, só a certeza da
presença e aparição de uns e outros. Deixei esse texto refletindo sobre qual a
razão de a portuguesinha ler as minhas postagens e dizer que sempre lerá.
Elucubrei se era um traço de carinho ou “piedade de psicóloga”. Continuo ficando
com a segunda opção, pois não vejo razão para a primeira ainda mais me
revelando como sou. Sei que minha mãe adoraria a ter como nora, pois a adorou
como pessoa. Minha mãe, ao contrário de mim, ainda guarda a esperança que me
envolva em novo enlace afetivo. Com 41 anos e sendo tão seletivo, precisando de
alguém que julgue encantadora para me arrebatar a alma, acho difícil. Me
resignei à companhia dos meus bonecos. Como dormi muito, estou especialmente
disposto hoje. Quem sabe não encare um filme (hoje estou mais para filme que
videogame)? Veremos. A terceira página está quase no fim, a portuguesinha já
deve estar no hotel a iniciar o seu último dia de labuta na semana e eu sigo
ouvindo “Livro” de Caetano.
13h09. Que prazer tomar um café fumando um cigarro e
observando este ensolarado início de tarde de sol brasileiro. É um sol
diferente do que aparece do outro lado do oceano, mais quente, mais dourado,
mais alegre. A portuguesinha agora deve estar distribuindo sua exuberante
personalidade de forma gentil a pessoas que a veem como uma funcionária a
servi-los. Cegos, veem tão pouco. Se bem que o clima informal do A Bicicleta
meio que nivela as interações, mas há sempre aqueles que não entram em tal
clima. Queria muito que ela conseguisse um estágio, é uma pena como portugueses
encaram a psicologia, com tamanho preconceito, ademais parece que há uma
resistência dos veteranos a darem espaço para os novatos, só posso crer nisso
para que a portuguesinha, tão qualificada e tão determinada e apaixonada pela
profissão, não tenha conseguido ainda o tão sonhado ingresso na OPP. Isso não a
impede de se impor plena na vida. Ela tem segurança e não tem medo de desafios.
O estágio é um detalhe importante? É, é um sonho para ela, como pude aferir,
mas, como também pude aferir, ela lida muito bem com a situação como se dá e
segue adiante abarcando a vida a generosas colheradas. A terceira página
acabou. Vamos ver se a piedade de psicóloga me renderá um novo comentário.
Hahaha.
P.S.: acabei de ver no Instagram e acho que cabe
perfeitamente, além de ser genial.
“Como já foi dito:
O amor e a tosse
não podem ser disfarçados.
Nem mesmo uma pequena tosse.
Nem mesmo um pequeno amor.”
Anne Sexton
Que post tão lindo. Continua a achar que me vês de uma forma um pouco alterada da realidade embora goste da forma como me pintas. Em todo o caso, quem não se sente merecedora sou eu! Destes posts lindos de morte. Ainda por cima gosto imenso de ler e sou uma pessoa que se prende às palavras. Já imaginaste o quão extraordinário é vir para aqui ler o que escreves? Além de que eu gosto muito da tua escrita porque é super fluída e pessoal. Anyways, leio porque gosto mesmo e não por qualquer piedade psicológica. Não percebo porque és tão mau para ti mesmo! Estás sempre a inferir que faço as coisas por pena e nem sequer assumiste a hipótese de eu fazer o que faço porque gosto simplesmente. AI AI.
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