terça-feira, 20 de novembro de 2018

BLANKA III E UM POUCO DE BONECOS



6h50. Acordei para meu saque à cozinha e mamãe já estava acordada. Fumei um cigarro, tossi como um condenado (que sou por causa desse hábito) e isso me despertou. Queria um café. Acho que vou fazer.

7h05. Botei café para fazer e fumei mais um. Vou mandar uma mensagem para Blanka. Escrevi um e-mail para o meu irmão contando todos os pormenores dessa vindoura relação. Se vindoura for. Me perdi no maravilhoso mundo dos bonecos. Vou tomar um café e fumar.

7h34. Queria que Blanka me respondesse cedo. Se é que vai me responder hoje. Vou botar um Audioslave para me animar. Cochise para já começar na instiga. A enfermeira disse que o meu português é impecável. Ela seria a minha namorada ideal, tivesse eu alguma atração por ela. Mas não tenho. Seremos amigos. Por sinal, outra amiga de Tinder, essa uma gata de 18 anos que me atrai, disse que viria a Casa Forte tomar uma comigo se eu trouxesse um pedaço do bolo da festa de 15 anos para ela. E, pelo diálogo, a aparência é a de que vem mesmo. Já estou com vontade de mais café com cigarro.

7h52. Espero falar com Blanka hoje. Estou com vontade de ter a sua atenção. De saber dela. De pedir que não minta para mim. Não sei se mente. Mas acho que mentir faz uma parte tão integral da sua rotina que penso que tenho que estar sempre lembrando que não o faça comigo, nem as mentiras pequenas, nem as bobas. Não precisa, não há necessidade. Estou com a mente convoluta de pensamentos acerca de Blanka, da confissão que fiz ao meu irmão, de como ele digerirá o que disse, espero que aceite. Não sei quão mente aberta ele é a esse respeito. Espero que pelo menos a parte do sigilo ele possa assegurar. Minha mente também é tomada pelos bonecos, especialmente as femininas, meu deus, que bem me faz tê-las todas encaminhadas. Obrigado. Especialmente a minha mãezinha e à minha pensão que possibilitou que completasse a minha coleção, por ora. Espero que a arquiteta deixe espaço para duas ou três a mais. De todas a que eu salvaria de um incêndio ainda seria o busto do Hulk, criei um vínculo, uma intimidade com ele, por estar aqui ao meu lado, que dificilmente outra substituirá. Mas gosto de todos os que tenho. Os que não gostava vendi ou estão à venda. Tem umas quatro ou cinco aqui que venderia. Depois de I’m The Highway, eu vou fumar um cigarro.

8h26. A fantástica faxineira já chegou ao recinto e perguntou se eu tinha motivos para estar cantando, mas não tenho a não ser que ouvi uma música que amo e há muito não escutava e ela ficou na minha cabeça. Não foi por amor, não foi por Blanka. Eu acho. Mas que estou entusiasmado, na expectativa e um tanto receoso e amedrontado com o seu contato, estou. O que tiver de ser será. Estou com medo de ela mudar de ideia. Esse tempo sem contato pode ter feito ela rever e mudar a sua decisão. Serei otimista, entretanto. Custa-me pouco no presente embora seu preço aumente se o futuro me frustrar. O que mandei para Blanka hoje:

“07:06 - Bom dia, flor do dia. Madruguei hoje, não sei por quê.
09:06 - Toda mudança, o novo, traz expectativas e receios, né? Mesmo o que a gente quer. Com você acontece isso?”

9h08. Não mais mandarei mensagens, eu espero, até que ela me responda. Se responder. Mas intuo que vá. Estou fumando muito essa manhã. Vou lá fumar outro.

9h20. Me dá satisfação adentrar o meu quarto geladinho, nessa manhã quente com Audioslave tocando alto. Me sinto verdadeiramente no meu reino, na minha ilha particular e personalíssima, meu quarto-ilha, que espero que acomode toda a minha coleção. E um dia acomode Blanka também. Nossa, estou falando demais nesse assunto. Falei com o meu amigo cineasta e ele vai estar por aqui em dezembro, poderemos conversar sobre o que ele quiser, inclusive desabafos sempre necessários. Eu me esqueci dele e de tudo desde que entrei nessa caça insana nos aplicativos de paquera. Caça essa que espero ter acabado com o advento de Blanka. E novamente volto a ela. Se ela soubesse quantas palavras lhe dedico... Acho que não faria diferença alguma. Palavras inúteis, palavras cuja única utilidade é me servir e me livrar do ócio, palavras que são um reflexo dos meus estados interiores. E que são a minha produção, o meu legado para o mundo. Talvez ensine alguém, nalgum tempo, a não escolher as minhas escolhas. Nem todos suportariam, eu quase não suportei. Agora parece que a vida quer sorrir para mim. Espero que não franza os lábios quando eu estiver entregue de braços abertos para receber tal graça.

10h12. Queria travar contato com Blanka, acordei cedo demais para isso. Saco. Vou para o maravilhoso mundo dos bonecos. Existe uma estátua que eu queria muito ter, mas ela custa nada menos que três mil dólares. Não tenho de onde tirar isso e é inviável de todas as formas e maneiras. Teria que mandar para o Brasil, o que duplicaria o valor. Estou fora. É fabulosa, talvez a estátua mais impressionante que eu já vi, mas não é para o meu bico. Passa longe.





10h19. Vou ter que me contentar com o meu Batman Beyond White Version, o que acho uma excelente compensação. E me custou uma fração desse valor, ademais, meu irmão pode trazê-lo na bagagem. Ocupará um tremendo espaço, mas é possível, ao contrário da peça acima, intitulada Batman Sanity da XM Studios. Ela é que nem o Hulk OG, areia demais para o meu caminhãozinho. E meu caminhãozinho já está carregado de areia, estou satisfeito com ele. Blanka eu já acho a areia certa para o meu outro caminhãozinho, o dos afetos. Nossa, como queria conversar com ela. Como queria que nada tivesse mudado de nossos planos. Em mim, nada mudou, espero que com ela também não. Só saberei quando e se ela se comunicar.

10h51. Saco, essa espera é tediosa. Hoje tenho Ju e um novo capítulo das minhas desventuras afetivas para narrar.

11h06. Nada a dizer, só expectativa do contato de Blanka. Gostaria de falar com ela antes de ir a Ju. Espero que mamãe chegue aqui antes da hora de sessão para que possa passar o cheque para Ju. Já são dois meses sem pagar. Queria que Blanka fosse ao Natal da minha família paterna. Não sei nem se ela vai desfazer o combinado e já projeto eventos futuros.

12h13. Recebi um e-mail do meu irmão, coisa mais linda do mundo. Meu irmão é realmente um ser iluminado. Incrível que mesmo sabendo disso ele ainda me surpreenda. Positivamente sempre.

18h32. Voltei de Ju com o pensamento que muito me assusta de ser mais meu e menos filho da minha mãe. Cheguei à conclusão que o ideal é ter o melhor dos dois mundos, visto que mamãe e eu estamos vinculados eternamente pela curatela. Há decisões, entretanto, que não cabem a ela, mas a mim decidir sobre o meu caminho. Ela aos poucos vem cedendo o espaço que tanto necessito para me exercer mais plenamente, mas há muitas batalhas a serem travadas. Entretanto, há ações maternais que também me agradam e não quero abrir mão delas. O meio termo, o equilíbrio precisa ser encontrado. É um caminho, a estrada da minha vida, vou tentar guiá-lo na direção que julgo melhor, que nem é muito diferente da que trilho agora, mas se Blanka, que ainda não me respondeu, entrar na minha vida certamente haverá mudanças e adequações. Falei do medo de sentir um vazio existencial por causa do fim do colecionismo e por ter almejado o que há anos queria que era uma relação de afeto com uma garota que me atraísse. Minha vida estará completa com esses dois fatores e temo sentir o vazio de ter tudo preenchido. Torço muito que não ocorra. E torço também para que a arquiteta deixe dois ou três lugares vagos para possíveis futuras aquisições. Hahaha. Minha meta com a coleção completa quando adquirir o Azure Dragon? Cativar o afeto de Blanka, se ela não desistiu de mim. Acho que o problema é com o celular. Assim espero. Seria uma decepção grande ela me abandonar, mas para a qual me vejo preparado. Ainda não é grande perda, mas é o assassinato de um sonho.

19h20. Acho que vou fumar um cigarro e tirar um cochilo.

20h40. Não tirei o cochilo, passeei pela internet, jantei, tomei os remédios e vou dormir, perdi as esperanças do contato com Blanka hoje.

-x-x-x-x-

5h20. Blanka me mandou mensagens, mas creio que esteja muito cedo para responder. Vou fumar um cigarro com Coca e me deitar mais um pouco. Nem tudo está perdido, então.

5h50. Perdi o meu sono. Acho que foi a mensagem de Blanka que me deixou ansioso e excitado. Disse que não pôde responder porque a namorada dela ficou lá até mais tarde. Vou perambular pelo maravilhoso mundo dos bonecos.

7h18. Me deixei mergulhar e me informar sobre o maravilhoso mundo dos bonecos e realmente nada me despertou a atenção, nada supera o que já tenho, na minha opinião, que é a opinião que conta. Tenho as mais belas e os mais invocados. Tirando Batman Sanity da XM, uma estátua que está para muito além dos meus padrões. Não trocaria o meu Hulk por ela. Não trocaria o meu Hulk por nada. E não haveria espaço para a peça da XM no meu quarto. Então, estou satisfeito com o que tenho e o que está por vir dos Estados Unidos. Tenho um leve desejo ainda pelo Swamp Thing, por me ser um personagem tão querido, marcante na minha juventude. Mas só se oferecesse desconto e free global shipping. Chegará esse momento, eu creio, só queria que não fosse nessa Black Friday.

8h06. Blanka acordou atrasada para o colégio, pedi que conversássemos quando tivesse uma brecha. Mas só estou narrando meu dia, que começa feliz com mensagens da minha possível namoradinha. Que seja. Não divulgarei esse post no Facebook. Novamente sinto medo e acanhamento em relação a Blanka. Vontade de desistir. Não posso ser assim. A criança não pode vencer o homem. E o homem quer ver essa história crescer e frutificar.

8h31. Pinterest, outro dos meus hábitos cibernéticos, nunca olhei as pastas com o que salvo, mas continuo salvando vorazmente imagens mesmo assim. Estou com saudades da minha pequena. Quero conversar com ela mesmo sem ter assunto. Assunto se acha.

8h43. Liguei o celular e me perdi no Instagram. Essas redes sociais me sugam de uma maneira inexplicável. E o pior é que não me socializo diretamente nelas. Raras são as vezes em que um diálogo é trocado.


8h53. Mais dez minutos perdidos no Instagram. E entrei na quarta página. Vou revisar e postar. Antes, um cigarro e um café. 

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