Academia Pernambucana de Letras; cheguei lá... como visitante! Hahaha |
Página em branco e sem palavras para preenchê-la. Admitir
isso já é preenchê-la e assim, nesse alicerce frágil, meu texto se ergue,
movido apenas pela necessidade de dizer. Dormi a tarde inteira, dormi todo o
sono que me faltou dormir na noite anterior. Não sei como farei para dormir
esta noite, que já se faz presente no firmamento, pois são 19h16. Por mim,
tentaria emendar, mas minha curadora não achou uma boa ideia, alegando que não
dormiria tranquila etc. e etc. Por ela despertei e por ela terei problemas com
o sono durante a noite. Mas o teria se tentasse emendar da mesma forma,
concordo com ela que a probabilidade de acordar no meio da madrugada e não mais
dormir certamente existiria. Mas dormir ou não dormir, os meus problemas de
sono não são um assunto suficientemente interessante para entreter a parca, mas
seleta freguesia. Já estou velho para a maioria dos feitos notáveis, estou
velho para ser alguém que deixa sua marca indelével no mundo. A única coisa que
tenho é um tanto mais de experiência em relação a mim e um tanto menos de
experiência em relação ao mundo. Tenho também a escrita e se algo de notável
vier de mim virá daqui, pois não há mais nada de minimamente notável que faça
da vida. Não acho que me destacarei por causa dos meus escritos tampouco, então
serei um dos milhões que passarão pela vida desapercebido das gentes. Eu que
sempre sonhei ser grande tenho que me contentar com a minha pequenez, por ser
um ser sem brilho ou talento para me destacar no meio dos bilhões de habitantes
do planeta. Isso me decepciona um pouco, me frustra, no fundo sempre achei que
o meu destino era ser star, não poderia estar mais equivocado. Vejo que a
imensa maioria das pessoas que estão no topo são mais jovens que eu, fui
ficando para trás e fiquei velho para a fama. Pensando bem, o que a fama me
traria? O que é a fama? Ser notado por um grande número de pessoas? Não faz nem
o meu perfil, mas parece que faz parte de uma parte mais antiga de mim. Acho
que sempre quis ser o centro das atenções. Talvez porque quando criança, bem
pequena, era o centro das atenções e esse era um lugar agradável, prazeroso
para mim e voltar a esse lugar tenha sido um desejo que acalentei desde então.
19h54. Preciso trabalhar com Ju amanhã na terapia essa coisa
de me colocar no mundo, a garota da noite numa coincidência muito rara, estava
online no mesmo momento que eu no Facebook e não tive coragem de dirigir-lhe a
palavra. Me deu um pequeno surto de ansiedade e saí do Facebook para não a
enfrentar. Me vi sem palavras, sem jeito, sem coragem quando teria que ser sem
vergonha.
20h04. Fui pegar Coca e voltei intimidado com o encontro com
Ju amanhã. Não sei o que dizer a ela. Especialmente se ela me perguntar sobre a
história do outono de mim. Não é que não tenha pensado sobre o assunto, acho
até que pensei bastante. O problema é que não encontrei muito do que quisesse
me desfazer, eu que já tenho tão pouco, não falo em termos materiais. Ela quis
me induzir a pensar em movimentos de mudança e eu estou muito resistente a
mudanças. Tenho tudo o que sempre quis, tenho até mais que isso. Me falta afeto
de amantes, mas não muito. Já me faltou muito mais. Meu lado Eros está
dormente. Se é que existe essa faceta da personalidade humana ou se estou
inventando, falando besteira. Fato é que não há mudança que queira operar na
minha vida o que vai ser um entrave à terapia, visto que se estou bem como levo
a vida sobre o que vou tratar, do que vou me tratar? Vai ser um dia complicado
na terapia. A única coisa que desejo é que não me falte assunto para tratar
nesses textos. Nem na terapia (que temo que é o que vá acontecer amanhã). Em
relação aos textos depende apenas de mim, o que é sempre mais difícil; na
terapia, Ju pode tentar extrair algum conteúdo de mim, é um trabalho em dupla.
21h13. A conversa com a Gatinha pelo WhatsApp me desconectou
do texto e minha mãe me interrompeu para tomar sopa e os remédios. A Gatinha
lembra-se muito pouco da noite do seu aniversário porque tomou todas, de várias
bebidas diferentes, e foi bater no hospital para tomar glicose, soro, Dramin (é
assim que escreve?), essas coisas. Passou o dia ressabiada, na ressaca. A sopa
esquentou meu corpo, vou ligar o ar.
21h24. Passei um tempo agora a cismar com uma série de
coisas, nada que mereça ser citado aqui, basta dizer que até o anão de “Game of
Thrones” me passou pela cabeça.
21h41. Fui pegar Coca e fumar um cigarro e minha mãe falou
do meu ofício de escritor com preocupação, achando que eu cairia na monotonia e
disso numa recaída. Não tenho como assegurá-la do contrário, mas minha última
pretensão é usar cola. Como disse e redisse aqui não foi uma experiência boa, o
custo/benefício simplesmente não valeu. Nem um pouco. Tive apenas um momento
bom e mesmo assim não foi extraordinariamente bom que valha uma internação por
tempo indeterminado no Manicômio. Tenho medo do tédio se abater sobre a minha
rotina? Morro de medo e fujo disso como o diabo da cruz. Mas minha maior
diversão é escrever, é o que mais me preenche a alma, não tenho outra coisa
mais interessante para fazer, não porque me faltem alternativas e sim, porque
estas empalidecem frente a possibilidade de escrever. Que posso eu fazer? Não
estou fazendo nada de errado até onde eu saiba e possa conceber, acontece que a
vida me pôs nessa condição ou antes a busquei e, sim, pensei que seria
diferente, com livros publicados e reconhecimento. Infelizmente nenhum dos dois
se deu, mas deixei de me ocupar dessas frustrações e seguir escrevendo com a
liberdade que talvez essas duas condições me privassem. Não troco a liberdade
de dizer-me por muitas coisas, aliás, vislumbro apenas uma coisa que me seria
digna de troca, um relacionamento amoroso. E essa troca não seria completa,
restringiria o meu hábito de forma a não atrapalhar a relação, mas não cessaria
de escrever. Pelo menos assim quero crer. De toda sorte a possibilidade de tal
relacionamento se dar é remota para dizer o mínimo.
22h07. Já está tarde. Essa possibilidade de começar um novo
parágrafo sempre que um assunto empaca é um recurso fantástico. Deveras útil.
Percebo que me desvencilho do estilo de Montaigne e volto à minha voz natural.
Sentirei saudades, mas certas coisas passam, essa é uma delas. Não sei se
jamais me abandonará por completo e que não tenha ainda e sempre sua parcela de
influência no que escrevo daqui por diante. Pode ser que um resquício permaneça,
mas a sensação é que volto a minha forma mais livre, leve e solta de escrever.
É mais fácil, menos trabalhoso, exige menos dos meus neurônios. Acho que
dormirei em breve. Mamãe veio me repreender o consumo de Coca para que eu durma
mais cedo. Não sei se obedecerei a parte da Coca, mas não quero tardar a
dormir.
22h27. Fui fumar mais um cigarro. Temo que o resto que tenho
na carteira não dure o dia de amanhã. Provavelmente não durará. Oito. Talvez
dê. É só não ser tão displicente no consumo como fui hoje. Se bem que terá o de
antes de dormir. A não ser que vá dormir agora. Não quero dormir agora. Acho
que certas críticas musicais são um tanto ignorantes, no sentido de não
compreender certas coisas. Disseram que o baixo de Adam Clayton do U2 há tempo
não se via tão pulsante e presente como em determinada canção. Mas isso se deve
à mixagem que o pôs em primeiro plano. Preciso aparar meus pelo pubianos, faz
vários anos que não faço isso e sinto que estou em descompasso com os ditames
estéticos dos tempos modernos que a mim me parecem pregar que quanto menos
pelo, melhor. Tentarei fazer isso amanhã que a fantástica faxineira estará aqui
e pode dar uma geral se porventura deixar muitos pelos caírem no chão. Claro
que forrarei o chão com jornais para poupar-lhe o máximo de trabalho possível.
Penso em fazer um milk-shake de chocolate com café amanhã. Uma dose pequena de
café. Acho que fica gostoso. E fazer outro de sorvete de chocolate apenas. É
quero tomar dois copos de milk-shake. É bom demais. Espero que não tenha sido a
causa do meu desarranjo na semana passada. Nem acredito que estou livre do
Manicômio. A ficha não caiu por completo ainda. Estou com sono. Faria e tomaria
o milk-shake agora, mas temo o desarranjo durante o sono e fazer a meladeira
que fiz da última vez. É melhor estar desperto se isso se der. Estou com fome.
Acho que vou comer um pouco do estrogonofe com arroz. Ou charque com arroz e
ketchup mesmo. Veremos. Queria que o meu padrasto fosse dormir, não gosto de
comer com a possibilidade de ele entrar na cozinha a qualquer instante. Acho
que vou lá mesmo assim. Estou com fome e quero dormir.
23h27. Me alimentei bem e agora vou dormir. Não resisti e
abri uma Coca e coloquei um copo.
-x-x-x-x-
9h05. Acordei. As primeiras impressões depois do despertar
nunca são positivas. É o momento do dia que mais me desagrada, que me tem mais
em desacordo com a vida, não sei nem como encontrei disposição para essas
palavras. Acho que porque deixei o computador ligado durante a noite com esse
arquivo aberto, bastou sentar e começar a escrever.
9h16. Fui pedir à fantástica faxineira para fazer café para
mim, isso sempre melhora o meu ânimo. Sou meio dependente de cafeína. Acho que
vou tomar um copo de Coca enquanto isso.
9h23. Nossa, como o tempo voa quando o queremos mais lento.
9h26. Estava a divagar, nenhuma divagação útil a esse texto ou a qualquer
outro. Estou com um a ansiedade ruim em relação à sessão com Ju.
10h25. Tomei já três ou quatro xícaras de café e meu ânimo é
todo outro. Não sei o que esperar da terapia e não a temo tampouco. Irei sem
expectativas ou respostas, investigaremos juntos – Ju e eu – as reentrâncias do
meu ser. Passei um bom tempo na cozinha a observar o trabalho e a conversar com
a fantástica faxineira. Saí dessa internação um pouco mais dado a diálogos o
que é ótimo. Ao menos esse bem o cárcere me trouxe. E é um bem enorme, pois meu
problema reside precisamente aí, em não saber me colocar de forma mais ativa no
mundo. Também conversei com a faz-tudo da casa da minha tia-vizinha e abri o
jogo para ela sobre a minha recaída, ela desabafou sobre os alcoólatras de sua
família e disse não me culpar e entender a minha situação por ter esses
exemplos próximos de si.
10h38. Estou com o pensamento voltado inteiramente para a
sessão com Ju e isso não é bom, prefiro chegar o mais despido de expectativas
que posso. Não posso muito, mas farei o meu melhor para trabalhar o meu
espírito até lá.
10h46. Gostaria de agradecer a Tânia Tonelli por curtir
minhas postagens, isso faz toda a diferença para mim e me desperta a
curiosidade saber o que a leva a gostar das minhas publicações. Mandei uma
mensagem para ela perguntando acerca do assunto. Não sei se me responderá. Mas
não vejo por que não.
10h54. Gostaria que Ju lesse meus escritos, assim teria uma
visão mais precisa acerca da minha pessoa que talvez não consiga traduzir com
as palavras ditas durante a consulta. Mas isso é pedir demais dela. É como
obriga-la a trabalhar fora do horário de expediente e justamente por isso não o
fará.
11h20. Estava relendo o texto que escrevi antes desse e
julgo que parte dele serviria como anexo para o “Diário do Manicômio”. Não
tenho o mínimo ritmo com as mãos e dedos, estava eu a tamborilar na mesa
querendo acompanhar a bateria da música e falhei miseravelmente no intento.
Gostaria de ter um senso de ritmo maior. Bom, não tenho e tenho que aceitar tal
limitação que dentre todas as que tenho deve ser a menor. Será que a fantástica
faxineira já fez mais café? Quero mais cafeína. O tempo avança célere em
direção ao horário da consulta. A vontade de sair do meu quarto-ilha e da minha
escrita é mínima, senão negativa. Mas terei que encarar esse compromisso. A
falta do que dizer no encontro me desagrada.
11h43. Fui pegar café novo e satisfazer necessidades
básicas. Estou exatamente onde queria estar. Minha mãe diz que eu deveria ver
filmes. Não vejo porque não vejo como um divertimento maior que escrever. Tenho
o Super Mario Odyssey para jogar aqui e nem isso me motiva a deixar as
palavras. Quando penso no jogo penso no estresse desnecessário ao qual terei
que me submeter para pegar as luas mais difíceis e isso me desmotiva
completamente. Como já disse um sem número de vezes e repetirei outro tanto ao
longo da vida, vivo sob a égide da lei do menor estresse. Quanto menos estresse
tanto mais a vida se afigura agradável.
11h49. Se nem a minha mãe tem paciência para ler esses
escritos, como posso esperar ter leitores? É um milagre que duas dezenas de
pessoas em média acessem os meus textos. Duvido que cheguem até o final. Por
que alguém se interessaria pelas intimidades de um estranho falho como eu?
Fosse eu uma celebridade ou coisa do gênero, a fama emprestaria relevância (artificial?)
aos meus escritos. Mas em sendo um zé-ninguém e não construindo um texto que
cative com suspense, ação, reviravoltas senão aquelas que a vida me apresenta,
não tenho como cativar os leitores. Acho mágico, visto que inexplicável, que
leiam os meus textos e me regozijo com isso. Penso que se tivesse o “Diário do
Manicômio” publicado, as pessoas que se aventurassem por ele e gostassem talvez
viessem a gostar também da minha produção aqui. O Pequeno Buda acha que o livro
seria um sucesso, não tenho esperanças tão grandes, só queria que ele fosse
publicado por mérito e não porque paguei para produzi-lo. Meu plano para
realizar esse intento é buscar um padrinho ou madrinha que empreste relevância
ao meu texto. Atacarei por dois flancos, o primeiro, que já mencionei aqui, são
os cabeças do Albergue de Drogados e o outro uma moradora aqui do prédio que é
dada a escrever e tem pelo que entendi, circulação e respeito entre os
escritores pernambucanos. Inclusive hoje há o lançamento de um livro dela na
Academia Pernambucana de Letras e minha mãe foi convidada, como acabei de me
informar, e minha mãe me convidou a ir. Posso falar pessoalmente com a pessoa e
perguntar se ela estaria interessada em ler os originais do meu livro e quem
sabe arrumar apoio para a sua publicação. Estou encabulado em ir para o evento
e em pedir-lhe isso. Vou tratar disso na terapia, perguntar se é válido, o que
acho que seja, tenho que fazer uso da minha rede social para tornar a
publicação possível. Estou animado com a ideia, acho que vou encarar esse desafio
social, completamente inóspito para mim, mas não poderia ir em busca de apoio
em lugar melhor que a Academia de Letras daqui. Vou dizer a mamãe que vou.
12h49. Fui falar com mamãe acerca da minha ideia de pedir
que a pessoa em questão leia o meu livro e minha mãe já veio com uma série de
empecilhos. Isso me desanima, mas não esmorecerei. A hora de ir para a terapia
se aproxima. Preciso tomar banho para ir. De 13h00 pontualmente entro no
chuveiro. Não deveria ter repartido a ideia com a minha mãe. Mas ela não poderá
me calar na hora. Estou excitado com a ideia. O não eu já tenho, pode ser que
por cortesia à minha mãe ela leia. É um expediente inconveniente, mas me
valerei dele por ser o mais concreto que tenho. Pode ser que as velas do
destino soprem a meu favor. Como me parecem soprar com essa inesperada
possibilidade de encontro com a escritora hoje, em companhia da minha mãe, o
que empresta ao meu pedido uma validade que não teria sem ela.
13h19. Já estou pronto para ir à terapia. Saio daqui a dez
minutos. A ideia de pedir para a escritora ler o meu livro está muito sólida na
minha cabeça. É um ato ousado, mas nada tenho a perder. Terei muito mais se não
aproveitar essa oportunidade que o destino me apresentou. Pode ser que não dê
em nada, pode ser a realização de um sonho. De ambas as formas, nada perco,
pois nada tenho. Hoje pode ser um dia definitivo na minha vida. Um divisor de
águas. Cavalo selado não passa duas vezes. Preciso me aproveitar dessa
oportunidade. Preciso. Desesperadamente preciso. Não acho que terei outra. Só
falta mamãe temendo o constrangimento do meu pedido me trair e não vir me
buscar para o evento. Espero que não.
15h44. Minha mãe vai se opor a que eu peça a escritora que
leia os originais do meu livro, disse-me a fantástica faxineira. Não acredito
que o destino vá ser assim tão irônico comigo.
16h20. Já estou perdendo a coragem de me colocar para a
escritora, o que será que está acontecendo comigo? Não posso perder a coragem.
Estou confuso. Será que o que quero fazer é uma insanidade? Por que seria? É a
oportunidade de ter alguém que analise o meu livro e, se achar pertinente, me
ajudar a publicá-lo. Alguém de renome. Que será que está dando em mim, de onde
vem essa súbita covardia? Que pudor é esse que me acomete? Estou com um sentimento
ruim dentro de mim.
16h41. Me encontro mais confiante uma vez mais, acho que o
esmorecimento foi porque comi. A saciedade tem um efeito desestimulante para
mim. Parece que saciada a fome de fato as demais fomes se calam da mesma forma
ou assim se dá comigo.
Abri a terapia falando dessa oportunidade que a vida me
apresentava e acabamos a terapia com Ju me desejando sorte na minha empreitada.
Será que o destino conspirará a meu favor? Seria muito bom que sim. Seria a
realização de um sonho. Se é que a escritora acharia meritória a minha obra.
Sei lá, só saberei tentando. Pode ser que ela considere um lixo impublicável.
Hahaha.
Meu amigo cineasta me mandou um e-mail preocupado com a
minha recaída e que isso inviabilizaria o final das filmagens. Mandei um e-mail
para ele dizendo que está tudo certo. Ele disse que dessa vez vem especialmente
para me filmar e que eu terei que fazer algumas encenações. Será curioso. Além
de escritor revelarei agora os meus dotes de ator, que devem ser tão parcos
quanto os da arte que tenho por ofício. Hahaha. Fazia tempo que não colocava
uma risada nos meus textos. Acho que finalmente me desvencilho por completo de
Montaigne. Que pena a forma de dizer dele era bastante interessante e
emprestava um estilo mais elitizado e erudito ao meu texto. Voltei a ser só
lépido e fagueiro. Que seja, não vou me forçar a emular e nem sei mais como. É
tão curioso isso para mim, há apenas alguns dias, escrever como Montaigne era
algo de que não conseguia me desvencilhar. Agora não tenho a mínima ideia de
como imitá-lo mesmo que quisesse. É a coisa mais estranha do mundo para mim,
como uma febre que se contrai, dá e passa. Passou e agora volto à minha voz
habitual. Para o bem ou para o mal. Não sei por que cargas d’água me lembrei de
dois concursos, um de uma marca e outro de um livro infantil, eu acho, que não
ganhei. Acho que o da marca eu nem cheguei a enviar. De toda sorte não acho que
ganhe um concurso literário com a minha obra, por isso recorro a esse
expediente desleal que a vida me apresenta. Minha mãe tentará me impedir. Eu
estou receoso também. Acho que não terei coragem de interpelar a escritora a
meu favor. Que droga. Bom, já são 17h11. Entrego tudo nas mãos do destino. O
que será, será, é inevitável. Se será a meu favor eu não sei. Seria tão bom que
fosse. Já pensou ter um livro publicado? Acho que seria a realização maior da
minha vida. Não consigo ver outra que me desse tanto orgulho e estima. Mas um
livro publicado por mérito, ou pelo menos por quase isso. Com uma pequena mãozinha
do destino. Só não queria e não quero pagar para me publicar, isso não seria e
não é meritório. É narcisismo. Por mais que ser publicado de qualquer forma é
um ato narcisista. Mas quando ocorre por interesse do outro é uma vitória, uma
conquista, algo que empresta valor à obra. Não fui eu quem decidiu que aquela
coisa merece ser lida, mas alguém que entende e vê naquilo algo que pode
agradar ou envolver o leitor. Seria deveras interessante, seria em verdade
fabuloso. Mas está entregue nas mãos do destino. E da minha mãe.
17h26. Até agora nenhum sinal de vida da minha mãe. Não sei
o que pensar. Nem sei se teria coragem de fazer o que me propus acima.
17h33. Mamãe me ligou. Disse que está presa no trânsito e
que em meia-hora chegaria. Pediu para ficar atento à campainha, pois minha irmã
PE vem dormir aqui. Provavelmente mamãe vai querer que eu fique à espera dela.
Este será o mote para que eu não vá para o lançamento do livro. Tal ardil seria
até um alívio para mim mas pediria que mamãe pegasse o e-mail do cara da
editora, que a escritora deve saber qual seja. Sei lá. Agora tudo me parece um
grande devaneio. Minha alma esfriou, o impulso passou, sei lá, sei lá, sei lá.
17h51. Estou com a alma dividida entre a vontade de que isso
se concretize e a de que algo impeça a consecução da coisa toda. O que é isso,
homem? Seu sonho é ser publicado e essa é uma importante janela que se abre.
Uma grande oportunidade. Seria imensamente massa se ela lesse o meu livro. Mais
ainda se visse algum valor e movesse os pauzinhos necessários à sua publicação.
Não posso pedir nada a deus, pois ele já é uma entidade muito ocupada e há
pedidos de outros muito mais importantes que uma irrelevância dessas.
Aparentemente minha mãe chegou.
18h17. Ela vai me levar! Vamos ver no que vai dar. Quando
voltar, conto. Não posso pedir que vocês do futuro torçam por um evento
passado, mas se fosse possível, pediria. Hahaha.
20h08. Estou de volta, era um negócio com tanta pompa e a
fila estava tão grande que me senti intimidado de falar qualquer coisa com a
escritora. Penso em fazer contato pelo Facebook. Mas mamãe pegou uns contatos
da editora pode ser que daí saia alguma coisa. Preciso me dedicar a mais uma
revisão do livro. Penso em tentar nomear cada dia de acordo com o seu conteúdo,
para que cada capítulo/dia tenha um título. Para alcançar isso preciso ler o
que escrevi de cabo a rabo. Quando tiver tudo isso pronto, tento contatar a
editora e a escritora. Vai dar trabalho, mas o trabalho maior foi digitar e
este já está feito. Acho que também tentarei contatar os cabeças do Albergue de
Drogados. Será que vou conseguir ter o meu livro publicado? É meter as caras e
torcer para o destino/acaso/deus ajudar.
Meu amigo cineasta me mandou um itinerário das cenas que
quer filmar e todas, afora a prova de vida no banco, acho possíveis.
20h33. O evento da escritora contou com várias presenças
ilustres, fiquei impressionado com a dimensão da sua obra e da sua relevância
social. Me sentiria profundamente intimidado se estivesse sentado àquela mesa
protagonizando aquilo tudo. Havia até uma orquestra infantil e sem dúvida um
sem número de escritores que desconheço. Nunca chegarei a tal ponto, até porque
serei autor de uma obra só. Aliás, duas, pois o blog é minha obra primeira e
mais importante. Agora que lembrei! Mandei uma mensagem para a leitora que
sempre curte os meus posts, será que ela respondeu? Não estou a fim de
descobrir agora. No momento prefiro dizer-me aqui, ou melhor, contar um pouco
mais do evento da escritora, havia garçons e comidas e bebidas sendo
oferecidas, o evento se deu na Academia Pernambucana de Letras, eu suponho, é
no local da foto que ilustra esse post. Havia iluminação especial sobre a
escritora, as pessoas foram todas bem vestidas e eram em sua maioria da
terceira idade.
20h49. Entrei no meu Facebook e a minha leitora não havia me
respondido, nem sei se o fará. Mandei um e-mail para a editora que publica os
livros da escritora explicando qual a proposta do meu livro. Vamos ver se
respondem. Acho que vou trabalhar no texto agora. Quanto antes ficar pronto,
melhor. Vou me dar como prazo até o final dessa semana, até a sexta para ser
mais específico. Depois boto as demais engrenagens para girar, quais sejam,
ligar para a editora, tentar me tornar amigo da escritora, mandar o livro para
os cabeças do Albergue de Drogados, pode ser que alguma dessas iniciativas gere
algum fruto. Bem vou lá meter a mão na massa.
-x-x-x-x-
17h37. Revisei o “Diário do Manicômio” todo. Levei dois
dias. Acabei de mandar uma mensagem de Facebook para a escritora perguntando
alguma dica de como fazer para ser publicado e se ela estaria interessada em
ler o original do livro. Não sei nem se ela acessa o Facebook. Amanhã, vou
tentar mandar o e-mail para os cabeças do Albergue de Drogados. E entrar em
contato com o telefone que mamãe pegou no dia do lançamento do livro da
escritora. São as três vias que divisei. Pode ser que alguma delas me dê algum
retorno positivo. Torçamos. Amanhã conto dos demais contatos, por ora, quero
desopilar um pouco dessa história do livro. Mas nada trago além disso. Sim, é
muito bom estar em casa. E dessa vez a revisão não me despertou fissura, a
mesma armadilha do vício dificilmente me pega duas vezes, mas estou cansado de
tratar disso. Acho que vou publicar logo este texto. Depois de revisar. Saco,
não aguento mais revisar. Pelo menos vai ser um assunto diferente, ou um pouco
diferente.
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