11h03. Acordei e tenho 41 anos. Está perto da hora de irmos
para o Spettus. Pedi para a fantástica faxineira fazer café. Talvez o meu
padrasto vá. Estou sem fome nenhuma, sempre acordo assim e só vou ter fome à
noite, mas acho que ao ver as comidas meu apetite desperte ou se mentalizar o
que me espera. Há várias mensagens de felicitação no WhatsApp. Isso faz bem
para o meu ego. Acordo geralmente com as paixões que me moviam na noite
anterior bastante diminuídas ou extintas. O projeto me parece agora uma grande
tolice. Bem, não tão grande. Meu irmão me mandou um e-mail de felicitações reforçando
a conversa que teremos hoje à noite pelo Skype.
11h57. Respondi às felicitações de alguns grupos de
WhatsApp. Mas deixarei para responder mais ao final do dia para que todas as
felicitações sejam enviadas e eu possa respondê-las de uma só tacada. Elas,
embora meras convenções sociais, me parecem um tanto mais sinceras que o “Parabéns
para Você”. O esforço despendido me parece mais genuíno.
12h32. Minha mãe foi se arrumar, eu botei o meu celular para
carregar, pois provavelmente eu e meu amigo cineasta voltemos de Uber. Não sei
se meu padrasto vai ainda. Quando saí do banho, mamãe estava fechada em seu
quarto se arrumando provavelmente. Continuo sem fome nenhuma. Isso não é bom para
quem vai a um rodízio de carnes. Já meu amigo cineasta que está acostumado a
almoçar deve estar com fome, assim como mamãe. Ele disse que subiria para me
filmar um pouco enquanto não saímos. Mas acho que vai coincidir de ele subir e
nós estarmos de saída para o restaurante. Tanto melhor.
12h46. Minha mãe saiu do banho e disse que meu padrasto vai também.
Talvez role carona para a volta. A ver. Ou meu padrasto queira voltar de Uber
conosco, quem sabe.
-x-x-
17h27. Fomos ao Spettus, minha mãe, meu padrasto, meu amigo
cineasta e eu. Foi muito agradável, meu padrasto e meu amigo cineasta monopolizaram
a conversação, o que achei ótimo, conversamos bastante sobre cinema e percebi
um certo interesse do meu padrasto por produções cubanas. Citou três ou quatro,
eu que de Cuba só conheço “Buena Vista Social Club”, fiquei caladinho, pois nem
deste filme me lembro direito. E acho que é produção de Wim Wenders, que não
tem nada de cubano. Comi, mas não comi para me estufar, entretanto acho que
valeu, me paguei em termos de alimentação e o custo do rodízio. Uma coisa que
percebo como boa é que, com o passar da idade, tenho um apetite cada vez menor.
Ganhei do meu padrasto um kit de VR para celular, ou seja, os óculos com um
compartimento para que o celular sirva de tela para os gráficos ou imagens. É
algo interessante, bastante curioso, mas a novidade se esgotou rapidamente para
mim. Utilizei três aplicativos, um com cenas em 360 graus de locais reais pelos
quais não podia se passear, mas podia-se olhar em todas as direções, e foi o
que achei mais interessante, pena que a internet não ajudou e os filmes ficassem
congelando e pulando rapidamente, em movimento acelerado, o decorrer da cena
até congelar novamente. Mesmo assim me abestalhou poder olhar para todo o
cenário riquissimamente decorado e diria um pouco macabro onde um monte de velhos
muito bem vestidos admiravam um desfile de moda. Do chão ao teto havia coisa a
serem vistas e sensação de imersão foi grande principalmente por serem
filmagens de gente de verdade. Os outros dois, da corda bamba e da
montanha-russa foram bem menos interessantes e imersivos acho que por se
tratarem de gráficos de game, virtuais, pouco realistas. Testei a
montanha-russa, pois foi a simulação de uma que deixou o meu irmão enjoado com
o kit de VR que adquiriu. A que peguei foi fraca, acho eu, pois nem me deixou
atordoado nem me espantou a imersão no ambiente. E falta o frio na barriga, os
empuxos que a ação da força da gravidade opera numa montanha-russa de verdade e
que são realmente os grandes fatores de diversão do brinquedo, o trajeto em si
não tem muita graça ou peguei uma simulação fraca, não sei. Sei que a intenção
do meu padrasto foi a melhor possível, agora percebo que ele veio tentando me
criar expectativas em relação ao VR desde que chegou porque havia me trazido os
óculos de presente de sua viagem pelos EUA. Muito legal de sua parte, toda essa
preocupação em me presentear da melhor forma possível. Acho que meu amigo cineasta
pegou-me fazendo uso do equipamento. Ele mesmo o utilizou e foi bem mais longe
na corda bamba que eu. Não entendi a interface direito e caía sempre no começo
da empreitada, meu amigo pelo menos andou até o meio do corredor, eu nem isso.
O que gostei mais foi a sensação da queda, achei a parte mais realista. O mais
estranho no das cenas de filme é que embora parecesse um local real eu não via
o meu corpo, é como se fosse um ser invisível, imóvel, observando o que se
passava no mundo. A vontade de ver meus braços e pernas me acometeu em diversos
momentos. Foi estranho. Me senti um fantasma, uma alma penada. Acho que mamãe
vai gostar. Eu sinceramente gostaria de visitar locais reais virtualmente,
podendo me deslocar por eles. Acho que seria o mais aprazível, sem estresses ou
desafios, apenas contemplação de lugares em que nunca estive e provavelmente nunca
estarei, tipo as pirâmides do Egito ou coisa que valha.
18h01. Meu amigo cineasta, disse que só usará os meus
escritos até hoje, que em teoria será o último dia de filmagem, mas que também
talvez não seja, se ele achar que há lacunas que precisa preencher com “simulações”.
A Gatinha acabou de me ligar para me dar os parabéns, 18h10. Nem ela, nem eu
gostamos muito de falar ao telefone, pelo menos um com o outro. Ela queria
aparecer no filme, quem sabe numa próxima ocasião ela não possa me entrevistar.
Quem sabe ela não pode ser a narradora do texto? Hahaha. Não, não vou me
intrometer mais na criação do meu amigo, não é justo, é chato. Mas em não sendo
a minha voz a narrar – e não será, me recuso – acho que uma voz feminina seja o
mais adequado para que fique claro que o narrador não sou eu. Sei lá, quem
decide é o diretor, mas eu não farei as locuções, o deixo logo de sobreaviso
para que arrume uma solução outra para a narração. É pedir demais de mim. Infelizmente
isso eu não posso dar. Sou um péssimo, terrível leitor e acho meu sotaque muito
peculiar e arrastado para tal expediente. Não serei narrador de mim mesmo. Só
na forma da palavra escrita. A palavra falada e entonada com a entonação que convier
ao diretor, fica a cargo de outra pessoa. Se captou minha voz nas filmagens aí
nada posso fazer, já está gravada e pouco se me dá se for usada, me saiu
espontaneamente e me parece justo aproveitar, se houver validade nisso. Não o
limitarei, em resumo, só não vou ler os trechos selecionados por ele para
preencher a sua obra. E tenho dito.
São 18h32. Ele disse que apareceria às 20h00. Acho-me uma
pessoa tão diferente de quem ele conheceu, acho que aos poucos ele mesmo se dá
conta disso. E fica decepcionado com quem eu me tornei. A vida nem sempre é
como queremos ou a escolhemos. Em breve olharei o Facebook e... acabou que
revisei e postei o texto anterior e ao divulgar fiquei respondendo as sempre
bem-vindas felicitações de aniversário daqueles que se deram ao trabalho. É um
prazer retribuir com uma mensagem todos e cada um deles. Também incentivei o
meu amigo jurista a escrever algo que não trabalho porque escreve muito bem e
tem um humor afiado e alegre. Acho que produziria bons textos. Melhores que os
meus. Meu amigo cineasta ainda não deu sinal de vida, espero que não tenha
esquecido... foi só falar que ele se comunicou. Esqueceu a chave de casa, mas
já resolveu o problema. Foi tomar um banho para vir para cá. Já falei com o meu
irmão que talvez nos atrasemos um pouco. Mas são 21h14 e meu irmão esperava o
contato de 21h30 daqui, 20h30 de lá. Ainda bem que a confusão de horários virou
a nosso favor.
21h16. Meu padrasto queria me ensinar a ver putaria em VR.
Hahaha. Infelizmente não logramos êxito nessa empreitada. Não testei o recurso
com a devida paciência que ele requer e tenho medo de enfiar algum vírus no meu
celular, esses negócios de sexo sempre me cheiram a armadilhas para cobrar
dinheiro ou infectar dispositivos. Mas verei com calma.
21h27. Estou com esperanças de que as filmagens não terminem
hoje, por outro lado, queria que terminassem para ver o resultado o mais rápido
possível. Em outras palavras, o que vier para mim está bom. Começo a ficar
ansioso, achando que não terei o que falar com o meu irmão. Mas sempre há o que
dizer. É porque nós dois não somos muito de conversar, eu acho. Eu menos até
que ele. Ele está mais conversador atualmente, mas pelas vias eletrônicas
ficamos a desejar. Embora às vezes o papo engrene, não vou mentir. Tomara que
hoje seja um desses dias. Tenho muito o que conversar sobre VR (realidade
virtual) com ele.
21h55. Meu amigo cineasta, está aqui já colocou um
minimicrofone em mim, a voz do meu irmão será capturada pelo som do meu quarto
com outro equipamento. Ou seja, o som vai ser porradão. Trouxe luzes também
para iluminação noturna. Esse é o momento mais superprodução de que já
participei no filme.
22h38. Falei com meu irmão e ele fez um curta, os Ninja Boys
com os meninos como os heróis e ele como o lobo do mal. Que onda. Ficou excelente.
Me abri muito com o filme. Estou até agora com um sorriso no rosto. Vi três
vezes seguidas, sinal de que o filme é bom! Hahaha. O único filme que eu vi
três vezes seguidas além desse foi o remake da “Madrugada dos Mortos” feito por
Zack Snyder na era das locadoras ainda.
22h43. Meu amigo cineasta, me perguntou se eu escrevo para
ter fama ou para me satisfazer. Eu fiquei meio sem saber o que dizer. Até que
me veio muito claro que escrevo muito mais por mim do que para o público, mas
me preocupo em entregar algo de qualidade para o mundo, eu faço o meu melhor
para que o português saia o mais correto possível, pelo menos esse respeito eu
tenho com o leitor. Mas no mais, vai o que minha alma manda, na direção que o
meu espírito aponta. E aí chegamos no livro. O livro eu queria que fosse um
razoável sucesso, que fosse além dos meus amigos e familiares que comprariam
por compaixão a um amigo e esqueceriam nas estantes de casa. Ou essa seria a
melhor coisa que poderiam fazer por mim. Assim não queimaria o meu filme com
eles. Mas sei que não é assim, acho que o nome é chamativo o suficiente para
que as pessoas pelo menos comecem a ler. E vai ser uma leitura difícil e cansativa,
eu acho. Não sei, pois eu acho leve, mas vivi aquilo pela enésima vez. O livro
entrou na nossa discussão, o meu amigo tem um ponto de vista que eu respeito
muito, de que a obra é do autor e só dele antes de estar pronta e que, uma vez
finalizada, se torna do mundo. Eu falei para ele que no livro eu fiz isso e que
agora estava com muito medo de oferecê-lo ao mundo porque o mundo poderia não
compreender, aliás, estou certo de que não vai compreender as minhas verdades,
especificamente uma. Mas que escrevi, como ele disse, só para mim. Estou sendo
filmado enquanto escrevo isso na penumbra do meu quarto. Uma penumbra
iluminada, artificial. É curioso, gostaria de ter essa luz no meu quarto, é
bastante aconchegante.
23h04. Estava respondendo a mais felicitações de aniversário
no Facebook. Meu amigo cineasta me filma de costas, tenho que me manter
escrevendo para parecer que tenho uma fluência constante no meu ofício que
tanto amo. Quero me amostrar para o público em uma palavra. Hahaha. Eu escrevo
meio de lado, é um cacoete meu, meu amigo pediu para que eu ficasse mais
centralizado, mas acabo me virando um pouco. Estava rememorando o aniversário
de uma amiga em comum sobre o qual o meu amigo já havia lido no blog o que meio
que me broxou o papo e, ao mesmo tempo me deixou feliz por ele realmente ler os
textos. Foi estranho agora, nunca pensei no meu amigo cineasta como um leitor
do blog. Acho que ele ficou chocado com o que revelei sobre o livro. Sobre um
trecho específico. O tal trecho que vai me queimar com todo o mundo que não
enxergará as coisas como as vi ou vejo. Infelizmente. Eu realmente estou
condenado. Mas tranquilize-se, Mário, o seu livro não vai ser publicado. A não
ser que você mesmo pague por isso. Seu tio não vai fazê-lo por você. Mas se o
livro acontecer, a vida vai continuar a ser uma superprodução só que o grupo de
atores do qual faço parte, que eu amo, me odiará. Mas não vai ser publicado.
Até a minha irmã vai ter receio de mim, tenho certeza. O meu cunhado nunca vai
ler, será português demais para ele. Ou assim espero. Minha cunhada por outro
lado ira me execrar. Não quero que minha irmã leia. Prefiro que minha mãe leia
que à minha irmã. Por que estou revolvendo esse assunto ozzy? Eu me preocupo
muito com isso porque não é ficção, mas a minha vida que estará ali exposta, os
meus sentimentos, que podem ser incompreendidos e incompreensíveis para a
maioria, senão todos que lerem a obra.
0h15. Já passou-se o dia do meu nascimento. Agora é sexta-feira,
o que é ótimo, pode ser que tenhamos saída hoje. Para fechar as filmagens,
filmamos o ritual de ir dormir e tomar os remédios. Meu amigo cineasta já foi e
só deus sabe quando o verei de novo. Certamente não o verei amanhã, pois viaja
de 14h00, logo tem que estar no aeroporto antes, quando provavelmente ainda estarei
dormindo. Comi as batatas ao forno feitas com carinho e cuidado pela fantástica
faxineira ou faxineira fantástica, como ela prefere e como passarei a chamá-la,
mas apesar das ervas com que temperou as batatas, notadamente orégano, não sei
se houve outras, devo confessar que as prefiro fritas no óleo que assadas no
forno e comunicarei a ela dessa preferência, por mais que seja mais calórica e
menos saudável, porém muito mais saborosa, o que prefiro. Uma vez perdida não
mata ninguém, eu creio. Mas o que não me sai da cabeça são os Ninja Boys
episódio 1. E a bonita dedicatória no final do vídeo, não fosse eu dado a
anonimatos dos personagens deste blog colocaria o vídeo aqui. É muito engraçado
e fofo. É uma pena não poder repartir com você. Mamãe vai pirar quando vir. Foi
o melhor presente que poderia ter recebido, eu que não preciso de nada de
material, mas certamente estava necessitado de algo que levantasse o meu astral
e nada como sobrinhos ninjas contra o papai lobo mau. Com direito a trilha sonora
e legendas, simplesmente hilário. A filmagem do projeto do meu amigo cineasta também
achei produtiva hoje. O Spettus foi muito bom, só faltou o leitão à pururuca, o
kit de VR para celular também me causou impressão e fiquei curioso para ver
sexo em realidade virtual, mas infelizmente não me vejo usando muito o
equipamento. Posso estar enganado, mas prefiro o Word a qualquer outra forma de
entretenimento. De material só quero o Chartreuse verde, o perfume que é a
minha assinatura olfativa e, se possível, um iPod Nano. Não quero mais nada.
Esqueço novamente do bem material que mais sonho em ter que é o meu livro
publicado. Mas não sonhemos tão alto. Fiquemos no que pretendo comprar na
Alemanha. Nossa, como não queria ir para essa viagem, mas já avisei nas
felicitações da minha irmã que ela não estranhe se eu passasse os dias
escrevendo.
0h57. Estou com sono, acho que acabarei este post amanhã. Só
não sei o que acrescentar.
1h25. Fui fumar o cigarro do fim da noite e comer um pouco
de Farinha Láctea. Agora tenho certeza que alguém come além de mim, pois quando
fui atacá-la não havia mais nada. Só se comi com muito sono, praticamente
sonambúlico e não me lembro. Mas venho desconfiando que alguém vem comendo há
tempos. Vejo perceptíveis baixas no conteúdo da lata de quando em quando. Nada
contra, mas tenho curiosidade de saber quem é. Não a ponto de perguntar aos “suspeitos”.
Deixa para lá, a vida é tão curta para coisas tão pequenas. Fico até feliz que
outro alguém curta a mesma coisa que eu. É realmente, ao meu paladar,
delicioso.
1h32. Será que terei saída amanhã? Nesse momento, gostaria
de ter. É uma das coisas que valem a pena pensar na vida. Pelo menos para mim.
Comentei com o meu amigo cineasta que ele teve um dia cheio, ele redarguiu que
era melhor que um dia vazio. Aquilo me doeu, feriu o meu orgulho, pois passo os
meus dias com nada a fazer a não ser escrever e estranhamente me sinto muito
bem assim. Todas as minhas necessidades são satisfeitas dessa forma. Se paro
para pensar, acho uma grande perda de tempo. Mas não vou jogar areia no meu
projeto de vida que amo tanto. Não que um dia como hoje não seja
interessantíssimo de ser vivido. Falei com meu irmão e família, fiz as
filmagens, fui ao Spettus e me senti numa sala cheia de velhos que assistiam a
um desfile de moda. Foi um dia muito peculiar, inclusive por ser o meu
aniversário. Recebi muitas felicitações. De quase desconhecidos até amigos e
amigas e familiares que me são muito preciosos. Construções de vida que não há
dinheiro que pague. Eu quero dormir e ao mesmo tempo não quero. Quando der
2h00, eu paro onde estiver, boto o último copo de Coca mesmo e fumo último
cigarro mesmo. E vou dormir mesmo.
1h45. Preciso explorar mais o VR. Vejo se faço isso amanhã e
escrevo no meu projeto paralelo. Era para ter escrito hoje, dia emblemático e
cheio de significado, mas não tive tempo para tanto. Quando voltei aqui com
privacidade para escrever, já havia passado da meia-noite.
1h50. Não aguento mais. Vou lá fazer os “finalmentes” da
minha noite.
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