sexta-feira, 20 de abril de 2018

ACORDEI E TENHO 41 ANOS


11h03. Acordei e tenho 41 anos. Está perto da hora de irmos para o Spettus. Pedi para a fantástica faxineira fazer café. Talvez o meu padrasto vá. Estou sem fome nenhuma, sempre acordo assim e só vou ter fome à noite, mas acho que ao ver as comidas meu apetite desperte ou se mentalizar o que me espera. Há várias mensagens de felicitação no WhatsApp. Isso faz bem para o meu ego. Acordo geralmente com as paixões que me moviam na noite anterior bastante diminuídas ou extintas. O projeto me parece agora uma grande tolice. Bem, não tão grande. Meu irmão me mandou um e-mail de felicitações reforçando a conversa que teremos hoje à noite pelo Skype.

11h57. Respondi às felicitações de alguns grupos de WhatsApp. Mas deixarei para responder mais ao final do dia para que todas as felicitações sejam enviadas e eu possa respondê-las de uma só tacada. Elas, embora meras convenções sociais, me parecem um tanto mais sinceras que o “Parabéns para Você”. O esforço despendido me parece mais genuíno.

12h32. Minha mãe foi se arrumar, eu botei o meu celular para carregar, pois provavelmente eu e meu amigo cineasta voltemos de Uber. Não sei se meu padrasto vai ainda. Quando saí do banho, mamãe estava fechada em seu quarto se arrumando provavelmente. Continuo sem fome nenhuma. Isso não é bom para quem vai a um rodízio de carnes. Já meu amigo cineasta que está acostumado a almoçar deve estar com fome, assim como mamãe. Ele disse que subiria para me filmar um pouco enquanto não saímos. Mas acho que vai coincidir de ele subir e nós estarmos de saída para o restaurante. Tanto melhor.

12h46. Minha mãe saiu do banho e disse que meu padrasto vai também. Talvez role carona para a volta. A ver. Ou meu padrasto queira voltar de Uber conosco, quem sabe.

-x-x-

17h27. Fomos ao Spettus, minha mãe, meu padrasto, meu amigo cineasta e eu. Foi muito agradável, meu padrasto e meu amigo cineasta monopolizaram a conversação, o que achei ótimo, conversamos bastante sobre cinema e percebi um certo interesse do meu padrasto por produções cubanas. Citou três ou quatro, eu que de Cuba só conheço “Buena Vista Social Club”, fiquei caladinho, pois nem deste filme me lembro direito. E acho que é produção de Wim Wenders, que não tem nada de cubano. Comi, mas não comi para me estufar, entretanto acho que valeu, me paguei em termos de alimentação e o custo do rodízio. Uma coisa que percebo como boa é que, com o passar da idade, tenho um apetite cada vez menor. Ganhei do meu padrasto um kit de VR para celular, ou seja, os óculos com um compartimento para que o celular sirva de tela para os gráficos ou imagens. É algo interessante, bastante curioso, mas a novidade se esgotou rapidamente para mim. Utilizei três aplicativos, um com cenas em 360 graus de locais reais pelos quais não podia se passear, mas podia-se olhar em todas as direções, e foi o que achei mais interessante, pena que a internet não ajudou e os filmes ficassem congelando e pulando rapidamente, em movimento acelerado, o decorrer da cena até congelar novamente. Mesmo assim me abestalhou poder olhar para todo o cenário riquissimamente decorado e diria um pouco macabro onde um monte de velhos muito bem vestidos admiravam um desfile de moda. Do chão ao teto havia coisa a serem vistas e sensação de imersão foi grande principalmente por serem filmagens de gente de verdade. Os outros dois, da corda bamba e da montanha-russa foram bem menos interessantes e imersivos acho que por se tratarem de gráficos de game, virtuais, pouco realistas. Testei a montanha-russa, pois foi a simulação de uma que deixou o meu irmão enjoado com o kit de VR que adquiriu. A que peguei foi fraca, acho eu, pois nem me deixou atordoado nem me espantou a imersão no ambiente. E falta o frio na barriga, os empuxos que a ação da força da gravidade opera numa montanha-russa de verdade e que são realmente os grandes fatores de diversão do brinquedo, o trajeto em si não tem muita graça ou peguei uma simulação fraca, não sei. Sei que a intenção do meu padrasto foi a melhor possível, agora percebo que ele veio tentando me criar expectativas em relação ao VR desde que chegou porque havia me trazido os óculos de presente de sua viagem pelos EUA. Muito legal de sua parte, toda essa preocupação em me presentear da melhor forma possível. Acho que meu amigo cineasta pegou-me fazendo uso do equipamento. Ele mesmo o utilizou e foi bem mais longe na corda bamba que eu. Não entendi a interface direito e caía sempre no começo da empreitada, meu amigo pelo menos andou até o meio do corredor, eu nem isso. O que gostei mais foi a sensação da queda, achei a parte mais realista. O mais estranho no das cenas de filme é que embora parecesse um local real eu não via o meu corpo, é como se fosse um ser invisível, imóvel, observando o que se passava no mundo. A vontade de ver meus braços e pernas me acometeu em diversos momentos. Foi estranho. Me senti um fantasma, uma alma penada. Acho que mamãe vai gostar. Eu sinceramente gostaria de visitar locais reais virtualmente, podendo me deslocar por eles. Acho que seria o mais aprazível, sem estresses ou desafios, apenas contemplação de lugares em que nunca estive e provavelmente nunca estarei, tipo as pirâmides do Egito ou coisa que valha.

18h01. Meu amigo cineasta, disse que só usará os meus escritos até hoje, que em teoria será o último dia de filmagem, mas que também talvez não seja, se ele achar que há lacunas que precisa preencher com “simulações”. A Gatinha acabou de me ligar para me dar os parabéns, 18h10. Nem ela, nem eu gostamos muito de falar ao telefone, pelo menos um com o outro. Ela queria aparecer no filme, quem sabe numa próxima ocasião ela não possa me entrevistar. Quem sabe ela não pode ser a narradora do texto? Hahaha. Não, não vou me intrometer mais na criação do meu amigo, não é justo, é chato. Mas em não sendo a minha voz a narrar – e não será, me recuso – acho que uma voz feminina seja o mais adequado para que fique claro que o narrador não sou eu. Sei lá, quem decide é o diretor, mas eu não farei as locuções, o deixo logo de sobreaviso para que arrume uma solução outra para a narração. É pedir demais de mim. Infelizmente isso eu não posso dar. Sou um péssimo, terrível leitor e acho meu sotaque muito peculiar e arrastado para tal expediente. Não serei narrador de mim mesmo. Só na forma da palavra escrita. A palavra falada e entonada com a entonação que convier ao diretor, fica a cargo de outra pessoa. Se captou minha voz nas filmagens aí nada posso fazer, já está gravada e pouco se me dá se for usada, me saiu espontaneamente e me parece justo aproveitar, se houver validade nisso. Não o limitarei, em resumo, só não vou ler os trechos selecionados por ele para preencher a sua obra. E tenho dito.

São 18h32. Ele disse que apareceria às 20h00. Acho-me uma pessoa tão diferente de quem ele conheceu, acho que aos poucos ele mesmo se dá conta disso. E fica decepcionado com quem eu me tornei. A vida nem sempre é como queremos ou a escolhemos. Em breve olharei o Facebook e... acabou que revisei e postei o texto anterior e ao divulgar fiquei respondendo as sempre bem-vindas felicitações de aniversário daqueles que se deram ao trabalho. É um prazer retribuir com uma mensagem todos e cada um deles. Também incentivei o meu amigo jurista a escrever algo que não trabalho porque escreve muito bem e tem um humor afiado e alegre. Acho que produziria bons textos. Melhores que os meus. Meu amigo cineasta ainda não deu sinal de vida, espero que não tenha esquecido... foi só falar que ele se comunicou. Esqueceu a chave de casa, mas já resolveu o problema. Foi tomar um banho para vir para cá. Já falei com o meu irmão que talvez nos atrasemos um pouco. Mas são 21h14 e meu irmão esperava o contato de 21h30 daqui, 20h30 de lá. Ainda bem que a confusão de horários virou a nosso favor.

21h16. Meu padrasto queria me ensinar a ver putaria em VR. Hahaha. Infelizmente não logramos êxito nessa empreitada. Não testei o recurso com a devida paciência que ele requer e tenho medo de enfiar algum vírus no meu celular, esses negócios de sexo sempre me cheiram a armadilhas para cobrar dinheiro ou infectar dispositivos. Mas verei com calma.

21h27. Estou com esperanças de que as filmagens não terminem hoje, por outro lado, queria que terminassem para ver o resultado o mais rápido possível. Em outras palavras, o que vier para mim está bom. Começo a ficar ansioso, achando que não terei o que falar com o meu irmão. Mas sempre há o que dizer. É porque nós dois não somos muito de conversar, eu acho. Eu menos até que ele. Ele está mais conversador atualmente, mas pelas vias eletrônicas ficamos a desejar. Embora às vezes o papo engrene, não vou mentir. Tomara que hoje seja um desses dias. Tenho muito o que conversar sobre VR (realidade virtual) com ele.

21h55. Meu amigo cineasta, está aqui já colocou um minimicrofone em mim, a voz do meu irmão será capturada pelo som do meu quarto com outro equipamento. Ou seja, o som vai ser porradão. Trouxe luzes também para iluminação noturna. Esse é o momento mais superprodução de que já participei no filme.

22h38. Falei com meu irmão e ele fez um curta, os Ninja Boys com os meninos como os heróis e ele como o lobo do mal. Que onda. Ficou excelente. Me abri muito com o filme. Estou até agora com um sorriso no rosto. Vi três vezes seguidas, sinal de que o filme é bom! Hahaha. O único filme que eu vi três vezes seguidas além desse foi o remake da “Madrugada dos Mortos” feito por Zack Snyder na era das locadoras ainda.

22h43. Meu amigo cineasta, me perguntou se eu escrevo para ter fama ou para me satisfazer. Eu fiquei meio sem saber o que dizer. Até que me veio muito claro que escrevo muito mais por mim do que para o público, mas me preocupo em entregar algo de qualidade para o mundo, eu faço o meu melhor para que o português saia o mais correto possível, pelo menos esse respeito eu tenho com o leitor. Mas no mais, vai o que minha alma manda, na direção que o meu espírito aponta. E aí chegamos no livro. O livro eu queria que fosse um razoável sucesso, que fosse além dos meus amigos e familiares que comprariam por compaixão a um amigo e esqueceriam nas estantes de casa. Ou essa seria a melhor coisa que poderiam fazer por mim. Assim não queimaria o meu filme com eles. Mas sei que não é assim, acho que o nome é chamativo o suficiente para que as pessoas pelo menos comecem a ler. E vai ser uma leitura difícil e cansativa, eu acho. Não sei, pois eu acho leve, mas vivi aquilo pela enésima vez. O livro entrou na nossa discussão, o meu amigo tem um ponto de vista que eu respeito muito, de que a obra é do autor e só dele antes de estar pronta e que, uma vez finalizada, se torna do mundo. Eu falei para ele que no livro eu fiz isso e que agora estava com muito medo de oferecê-lo ao mundo porque o mundo poderia não compreender, aliás, estou certo de que não vai compreender as minhas verdades, especificamente uma. Mas que escrevi, como ele disse, só para mim. Estou sendo filmado enquanto escrevo isso na penumbra do meu quarto. Uma penumbra iluminada, artificial. É curioso, gostaria de ter essa luz no meu quarto, é bastante aconchegante.

23h04. Estava respondendo a mais felicitações de aniversário no Facebook. Meu amigo cineasta me filma de costas, tenho que me manter escrevendo para parecer que tenho uma fluência constante no meu ofício que tanto amo. Quero me amostrar para o público em uma palavra. Hahaha. Eu escrevo meio de lado, é um cacoete meu, meu amigo pediu para que eu ficasse mais centralizado, mas acabo me virando um pouco. Estava rememorando o aniversário de uma amiga em comum sobre o qual o meu amigo já havia lido no blog o que meio que me broxou o papo e, ao mesmo tempo me deixou feliz por ele realmente ler os textos. Foi estranho agora, nunca pensei no meu amigo cineasta como um leitor do blog. Acho que ele ficou chocado com o que revelei sobre o livro. Sobre um trecho específico. O tal trecho que vai me queimar com todo o mundo que não enxergará as coisas como as vi ou vejo. Infelizmente. Eu realmente estou condenado. Mas tranquilize-se, Mário, o seu livro não vai ser publicado. A não ser que você mesmo pague por isso. Seu tio não vai fazê-lo por você. Mas se o livro acontecer, a vida vai continuar a ser uma superprodução só que o grupo de atores do qual faço parte, que eu amo, me odiará. Mas não vai ser publicado. Até a minha irmã vai ter receio de mim, tenho certeza. O meu cunhado nunca vai ler, será português demais para ele. Ou assim espero. Minha cunhada por outro lado ira me execrar. Não quero que minha irmã leia. Prefiro que minha mãe leia que à minha irmã. Por que estou revolvendo esse assunto ozzy? Eu me preocupo muito com isso porque não é ficção, mas a minha vida que estará ali exposta, os meus sentimentos, que podem ser incompreendidos e incompreensíveis para a maioria, senão todos que lerem a obra.

0h15. Já passou-se o dia do meu nascimento. Agora é sexta-feira, o que é ótimo, pode ser que tenhamos saída hoje. Para fechar as filmagens, filmamos o ritual de ir dormir e tomar os remédios. Meu amigo cineasta já foi e só deus sabe quando o verei de novo. Certamente não o verei amanhã, pois viaja de 14h00, logo tem que estar no aeroporto antes, quando provavelmente ainda estarei dormindo. Comi as batatas ao forno feitas com carinho e cuidado pela fantástica faxineira ou faxineira fantástica, como ela prefere e como passarei a chamá-la, mas apesar das ervas com que temperou as batatas, notadamente orégano, não sei se houve outras, devo confessar que as prefiro fritas no óleo que assadas no forno e comunicarei a ela dessa preferência, por mais que seja mais calórica e menos saudável, porém muito mais saborosa, o que prefiro. Uma vez perdida não mata ninguém, eu creio. Mas o que não me sai da cabeça são os Ninja Boys episódio 1. E a bonita dedicatória no final do vídeo, não fosse eu dado a anonimatos dos personagens deste blog colocaria o vídeo aqui. É muito engraçado e fofo. É uma pena não poder repartir com você. Mamãe vai pirar quando vir. Foi o melhor presente que poderia ter recebido, eu que não preciso de nada de material, mas certamente estava necessitado de algo que levantasse o meu astral e nada como sobrinhos ninjas contra o papai lobo mau. Com direito a trilha sonora e legendas, simplesmente hilário. A filmagem do projeto do meu amigo cineasta também achei produtiva hoje. O Spettus foi muito bom, só faltou o leitão à pururuca, o kit de VR para celular também me causou impressão e fiquei curioso para ver sexo em realidade virtual, mas infelizmente não me vejo usando muito o equipamento. Posso estar enganado, mas prefiro o Word a qualquer outra forma de entretenimento. De material só quero o Chartreuse verde, o perfume que é a minha assinatura olfativa e, se possível, um iPod Nano. Não quero mais nada. Esqueço novamente do bem material que mais sonho em ter que é o meu livro publicado. Mas não sonhemos tão alto. Fiquemos no que pretendo comprar na Alemanha. Nossa, como não queria ir para essa viagem, mas já avisei nas felicitações da minha irmã que ela não estranhe se eu passasse os dias escrevendo.

0h57. Estou com sono, acho que acabarei este post amanhã. Só não sei o que acrescentar.

1h25. Fui fumar o cigarro do fim da noite e comer um pouco de Farinha Láctea. Agora tenho certeza que alguém come além de mim, pois quando fui atacá-la não havia mais nada. Só se comi com muito sono, praticamente sonambúlico e não me lembro. Mas venho desconfiando que alguém vem comendo há tempos. Vejo perceptíveis baixas no conteúdo da lata de quando em quando. Nada contra, mas tenho curiosidade de saber quem é. Não a ponto de perguntar aos “suspeitos”. Deixa para lá, a vida é tão curta para coisas tão pequenas. Fico até feliz que outro alguém curta a mesma coisa que eu. É realmente, ao meu paladar, delicioso.

1h32. Será que terei saída amanhã? Nesse momento, gostaria de ter. É uma das coisas que valem a pena pensar na vida. Pelo menos para mim. Comentei com o meu amigo cineasta que ele teve um dia cheio, ele redarguiu que era melhor que um dia vazio. Aquilo me doeu, feriu o meu orgulho, pois passo os meus dias com nada a fazer a não ser escrever e estranhamente me sinto muito bem assim. Todas as minhas necessidades são satisfeitas dessa forma. Se paro para pensar, acho uma grande perda de tempo. Mas não vou jogar areia no meu projeto de vida que amo tanto. Não que um dia como hoje não seja interessantíssimo de ser vivido. Falei com meu irmão e família, fiz as filmagens, fui ao Spettus e me senti numa sala cheia de velhos que assistiam a um desfile de moda. Foi um dia muito peculiar, inclusive por ser o meu aniversário. Recebi muitas felicitações. De quase desconhecidos até amigos e amigas e familiares que me são muito preciosos. Construções de vida que não há dinheiro que pague. Eu quero dormir e ao mesmo tempo não quero. Quando der 2h00, eu paro onde estiver, boto o último copo de Coca mesmo e fumo último cigarro mesmo. E vou dormir mesmo.

1h45. Preciso explorar mais o VR. Vejo se faço isso amanhã e escrevo no meu projeto paralelo. Era para ter escrito hoje, dia emblemático e cheio de significado, mas não tive tempo para tanto. Quando voltei aqui com privacidade para escrever, já havia passado da meia-noite.

1h50. Não aguento mais. Vou lá fazer os “finalmentes” da minha noite.




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