sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

DIA DE PRAIA OU O GRANDE INÚTIL


20h55. Cheguei da praia há cerca de uma hora, fui a Muro Alto com o meu primo-irmão. Escrevi uma série de pequenos e-mails e me enviei, relatando o que apreendia nos momentos em que não estávamos conversando. Vou postá-los abaixo e depois se julgar necessário escrevo mais.

Assunto: Arte
A beleza na Arte. Imagem de caras enfiando gelo e garrafa no ânus. Ariano Suassuna e sua tentativa de elevar a arte popular a grande arte. Preciso me lembrar de tentar ler “A Pedra do Reino” quando estiver na casa do meu primo-irmão. Estou com ele na praia nesse exato momento. 14:44. Meu primo está no mar. Lembrar de falar de GTA V. Segundo meu primo-irmão, Suassuna achava a arte popular muito rústica e queria fazer desta arte algo tão nobre quanto as artes, digamos, clássicas. Ele voltou. Vou conversar com ele.

Assunto: Praia
Saiu da imaginação do meu primo-irmão, pois viu um cara se chegando numa garota, a seguinte abordagem para iniciar a conversa com alguém que se tem certeza de que não quer ver novamente, dizer que trabalha no Vale do Silício que vem duas ou três vezes por ano para o Brasil e que tem salário mensal de 30 mil dólares como representante de uma firma de software empresarial. Será que colaria mesmo? Será que as mulheres ficam realmente mais interessadas em caras de posse? Não sei, nem saberei, não tenho coragem de encarar tal personagem.

Assunto: Paisagem
15:15. Não faz sentido ficar escrevendo quando se tem companhia e paisagem.






Assunto: Olhos verdes
A menina de fala espanhola, não sei se argentina, cruzou rapidamente um confiante e fulminante olhar verde-mel. Ela é a única que fala no grupo em que está. Parece ser a filha, entretanto, também parece a personalidade dominante no núcleo familiar. Meu primo rumina sobre algo que não acho certo publicar aqui. 15:34.

15:40. Me encantei pela espanholinha, mas não sei estimar sua idade, diria que entre 15 e 22 anos, ou seja, na flor do esplendor. Tem cabelos revoltos, castanhos, presos, uma pele dourada-avermelhada, pele de sol, poucas celulites (o que para mim é um superplus) e um rosto de traços fortes e pouco usuais. É bela e atraente, tem uma feminilidade sensual no agir. Está de biquíni verde água. Passou um casal de sarados, mas prefiro a espanholinha.

15:51. Acho que meu primo vai por volta das 16:00. Veremos. Ele tira selfies. Não sei se se incomoda comigo escrevendo. Está ele mesmo entretido com o celular. Isso são dois caras estranhos, na praia mexendo no celular. Ouvindo Menina Bonita, do Fino Coletivo. Combina perfeitamente com o momento, tarde na praia com encantadora garota estrangeira emoldurada pela beira do mar.


Não são a pose ou a expressão mais cativantes, mas há de levar em conta
que não é legal invadir a privacidade alheia e fotografá-la.



Assunto: Tráfego
18:46. Estou no meio tráfego. O engarrafamento é generalizado. Se somarmos o deslocamento de ida e volta, passamos mais tempo no traslado do que na praia. Recife na hora do rush é ozzy.

18:52. Mal andamos, mas não vou ficar falando enquanto o meu primo dirige. Não sei por que vejo mais ambulâncias em emergência no horário de pico. Meu primo entoa Elton John, trilha de O Rei Leão.

19:06. Ouvindo Kraftwerk no trânsito. Foram inovadores. Não sei se mais gente fazia esse tipo de som àquela época, mas o Infected Mushroom acharam seus avós musicais.





(Fim dos e-mails)

21h13. Estou todo ardido no meu quarto-ilha. Quero ver para dormir hoje. Até a camisa me é incômoda. Peguei muito mais sol do que julgava. A água do chuveiro batendo em minhas costas incomodava, estou frito. Literalmente. Hahaha. A conversa sobre arte começou por causa de uma matéria sobre umas performances que o meu primo-irmão postou no grupo de WhatsApp da turma (onde calhei de fazer a estupidez de publicar um post do meu blog... mau Sapão, mau Sapão...). As performances foram as seguintes.


Arte?


Discutimos a abrangência que o termo arte tem hoje e meu primo citou que alguém aí disse que a arte perdeu o seu sentido de beleza, como objeto tão importante quanto a mensagem da obra, que atualmente a arte é focada apenas na mensagem, o que acho generalizar demais, pois lembro de uma exposição que fui há uns dois ou três anos, ou quatro, sei lá, era de arte contemporânea brasileira anyway, e achei algumas peças bonitas lá, então a beleza ainda é perseguida, na minha opinião. Sobre essas performances aí de cima, confesso que não vejo beleza nelas, que resumem-se a mensagens, em fazer o público se questionar. Lembra o trabalho de Marina Abramovic levado a um extremo mais impactante. Foi aí que entramos em Ariano Suassuna e, segundo os detratores do Movimento Armorial, a elitização da cultura popular e desemboquei no pensamento de que videogame é uma forma de arte que envolve vários campos do conhecimento, ilustradores, arquitetos, atores, músicos, dubladores, modeladores em 3D, programadores, designers etc. e etc. Foi aí que me veio outro pensamento, baseado na informação passada por nosso amigo professor, de que o produto de entretenimento mais lucrativo da história mundial foi e é GTA V, um videogame. Não foi o fato de ser um videogame o que me pôs a cismar, mas sim o conteúdo do videogame, onde o jogador assume o controle e o papel de três contraventores de diversas estirpes, desde um psicopata a um estelionatário, passando por um negro marginal. Quão doente é uma sociedade que opta em ter como forma de entretenimento mor um jogo em que tudo o que se faz é contra a lei, contra os valores morais e éticos? Pior que eu até entendo o fetiche em quebrar quase todo tipo de regra sem, ao mesmo tempo, quebrar nenhuma na realidade, apenas no ambiente virtual do jogo. Eu sou um transgressor por natureza (reprimida). E sei que o jogo tem valores de produção incríveis e alçam o que se pode alcançar com videogames a novos patamares. Nunca joguei o game, embora o tenha aqui, lacrado, para algum dia que espero chegar, mas joguei um pouco do antecessor e fiquei impressionado que a TV dentro do quarto do meu personagem passou 20 minutos de transmissão ininterrupta sem repetir nenhum conteúdo. E tudo o que passava era dublado. Só isso me fez crer que o mundo do jogo foi planejado para ser grandioso em todos os detalhes. Não gostei muito dos controles do jogo, mas não me dei tempo necessário para me acostumar com eles e, sinceramente, não me senti bem no papel de um malfeitor, eu que sempre fui acostumado a ser o herói ou heroína da história. Há, sim, heroínas nos videogames e cada vez mais, mas ainda uma parcela muito pouco significativa dentre a miríade de personagens masculinos que dominam esse tipo de entretenimento. É quase certo um jogo multiplayer ter uma personagem feminina, é quase uma regra. Não consigo me lembrar de nenhum, recente pelo menos, que não tenha. Acho que Street Fighter II começou com essa tendência. E só não colocam mulheres se o contexto não permitir. Não há mulheres no Call of Duty sobre a Segunda Guerra Mundial, pois não havia mulheres no front naquela época. Embora ache que os poucos CoD que joguei não continham combatentes femininas. Vai ver que é um jogo cuja demografia seja muito predominantemente masculina, sei lá. Voltando ao GTA V (Grand Theft Auto V), confesso que me sentiria mais feliz se o mundo tivesse escolhido o Mario Odyssey como produto de entretenimento mais lucrativo da história, mas para isso, a Nintendo teria que lançar o jogo para todas as plataformas possíveis, inclusive PC e vender uma versão remasterizada para nova geração de consoles. Os caras da Rockstar souberam como valorizar o investimento monstruoso que fizeram no game, o mais caro da história, 265 milhões de dólares em desenvolvimento e marketing, e esticaram a cauda do game até onde podiam, foi uma estratégia genial e campeã e o jogo é, ainda hoje, um dos mais vendidos para todos os sistemas. A Nintendo, por não querer sair da arena dos consoles e se focar só no software, o que se mostraria na minha opinião, uma jogada de mestre, lucrariam muito mais dessa forma, não largam o osso nem a pau. Só compro o próximo videogame da Nintendo, se tiver Mario e se a capacidade gráfica for equivalente ao do Xbox One X. Ou seja, 4K nativo a 60 frames por segundo, com todos os efeitos no talo. Mas cá estou eu a divagar sobre videogames mais uma vez. Deixar isso de lado.

22h12. Passei por um caminho no meio da mata na volta de Muro Alto pelo Paiva enquanto tocava “As The World Falls Down” de David Bowie, uma das baladas mais belas e que mais gosto na vida. Foi muito bom o momento, muito belo. E capturei a vista abaixo do caminho da praia da elite pernambucana.





22h39. Fui comer um dos dois hambúrgueres feitos no gril de mamãe e fumar um cigarro. Me peguei pensando que o mundo é uma superprodução, eu vivo numa superprodução, tudo ao meu redor vale milhares de reais. Seja na forma de uma porta de madeira, uma porta de incêndio, uma porta de elevador e três lixeiros, que foi o que eu presenciei no hall e que valem somados mais de mil reais, na minha opinião, isso sem mencionar a grana investida para construir o prédio que abriga tal cenário, a grana que cada morador gastou e gasta para adequar e decorar o apartamento da forma mais adequada e legal que acham. Isso tudo daria alguns milhões de reais. E o meu quarto cheio de bonecos? O que vão achar o que de mim? Hahaha. Aqui no meu quarto, com certeza há alguns milhares de reais. Ao pensar no meu quarto redecorado da forma mais inteligente, prática, bela e aconchegante possível, pensei nos bonecos e no que vão pensar dessa imagem de mim, como habitante de tal quarto. Eu lembrei, então, do que meu primo-irmão repetiu imitando o meu pai, numa conversa que tiveram em que papai disse, “o problema de Mário é só um, ele não passou dos oito anos de idade. Não falei dezoito, falei oito mesmo”. Incrível como papai ainda me atinge. Eu nem fico chateado ou acho engraçado, eu levo muito a sério e identifico tal comportamento em mim, pois se papai falou, eu vejo como verdade. Talvez tenha regredido até um pouco menos que isso. Mas, sou uma criança vivendo numa superprodução, a maior produção humana, a própria civilização, que ela mesma produz e consome. Um sem número de coisas, de bolinhas de gude a jamantas, a computadores. Aí, aos poucos eu vou me afastando dessa entidade que é a humanidade e talvez vá perdendo a minha, quem sabe? Como a personagem principal de “Child of God”, cuja solidão o vai pondo cada vez mais doente da cabeça, mais alienado em seu mundo pessoal. Por que só faço escrever? Porque assim eu escapo do mundo e não caio no tédio.  Vou comer o outro hambúrguer, um momento (que só vai durar um ponto final para você). Voltei! Rápido não foi? 23h49. Eu estava pensando no nome do meu blog e pensei que, visto que não profetizo mais nada, vou mudar o título para “A Grande Inutilidade”, acho mais condizente com o produto. Acho que vou realmente fazer isso.

0h21. Depois de muito estica e puxa, fiz, mudei o nome do blog para o que acho que ele realmente é, ou quase, achei “A Grande Inutilidade” muito grande e mudei para “O Grande Inútil”. Ficou melhor a massa visual, eu acho, e o grande inútil pode ser tanto a obra quanto o autor. O que faço é absolutamente inútil e egocêntrico. Sou eu falando de mim. Quem diabos quer saber de mim? Ainda mais quando me digo com tanta prolixidade? Essa é a novela da minha vida. Você lê se quiser. E, se o faz, acha o que quiser. Saiba apenas que é esse grande inútil a maior inclinação da minha alma e é por isso que eu faço, porque algo dentro de mim, algo poderoso, pede. Como disse em um outro post, prefiro ser compulsivo nisso que na cola. Não sei o que meu amigo cineasta vai narrar de mim. Se pensou que o nome seria “Jornal do Profeta”, continua sendo, no endereço e no nome, mas o título que aparece no header agora é outro. Acho até mais chamativo, sonoro e diretamente relacionado com os objetos da produção do vídeo, que são obra e autor. Caramba acho que realmente me descrevi bem agora. “O grande inútil”, tipo de apelido que meu pai me daria se eu fosse um desafeto seu. Eu sou muitas vezes um desafeto meu, por isso me apelidei assim no naipe de papai em toda a sua precisa jocosidade. Revelei a verdade mais vergonhosa sobre mim. Eu sou um grande inútil. Não tem o Grande Lebowski? Pronto. Pelo menos o Grande Lebowski é um personagem interessante, o que não sei se é o caso aqui. Espero que um pouco de dignidade desponte amanhã e eu mude o nome para algo menos pejorativo. Para um cara que é inútil, até que produzo bastante. Eis o dilema, o inútil escreve e, mais, não escreve terrivelmente. Comete muitos erros os quais não se apercebe, mas também não é de todo ruim, não é o texto de um semianalfabeto. Também não é um Machado de Assis, ou Montaigne moderno. É normal, eu acho. Por vezes tedioso, noutras confuso, mudo muito de opinião. Por falar em opinião, que lembra indecisão, pois a minha indecisão se dá entre duas opiniões contrárias, manter ou não manter o Hulk, acho que ele vai rolar, depois de complicações na hora do parto, acho que o bebê vai nascer aqui para o papai, a peça central, ou grande abertura da minha coleção, já que vai ficar logo na entrada do quarto. É como dar o maior impacto primeiro para que o resto desça mais macio a um novato no futuro quarto-ilha. Isso se o Hulk chegar e fizerem a reforma. Pensei em fazer as portas do meu armário revestidas de cortiça para que eu possa pregar coisas nelas. Será que é viável? É um espaço inutilizado do quarto. Vou fumar um cigarro.



1h19. Ai, ai... o grande inútil. Sou eu mesmo, a melhor descrição de mim. Um cara que passa o dia a escrever sobre a vida dele. O que está fazendo de útil para sociedade? Por que a sociedade teria interesse no que ele tem a dizer? É a vida. A minha vida e gosto dela assim. Não gosto do rótulo que apliquei a esse texto e a mim, mas eu acho o mais pertinente. Quem sabe assim não atraia mais leitores curiosos para ver que inutilidade é essa? “Jornal do Profeta” é propaganda enganosa. Não vivo a fazer profecias. Vamos ver como acordo, se com vontade de mudar o nome ou não. Puxa, parece mesmo que papai soprou o nome no meu ouvido, acho a sua cara. O nome aparenta até uma certa pompa que só reforça a ironia venenosa que é. Eu me identifico com o título, muito mais do que o anterior. Eu sou inútil e pretendo continuar sendo. Me apraz ser assim. É uma vida boa de se levar, se se acostuma com o peso rotundo desse rótulo.

1h35. Já registrei o blog ograndeinutil.blogspost e já criei um link redirecionando para cá. Será que há outros grandes inúteis no mundo? Não duvido. Acho até a possibilidade bem grande. É só pegar os mendigos. Ou os ermitões. Eles, no geral, nada ou quase nada oferecem à sociedade e também pouco tiram dela. Eu pelo menos produzo, pena que o valor do que produza seja muito pessoal. Tem seu valor inestimável para mim, mas não consigo ver razão para ter para mais alguém. Sei que seguem me lendo. Poucos, mas seguem. Não sei se irão continuar lendo depois dessa constatação um tanto radical em relação ao conteúdo daqui, mas, reza a lenda, que o seriado Seinfeld era sobre nada. Não vou muito distante disso. Ou vou? Não sei julgar. Hoje, graças à rica interação com o meu primo-irmão tive assuntos mais diferenciados. Foi bom olhar o mar, ouvir o mar, ver desconhecidos fritando no verão pernambucano, muitos turistas, afinal foi em plena quarta-feira de tarde, quem iria para uma praia tão distante? Só quem não tivesse trabalho a fazer, no caso, o meu primo irmão, que bateu suas metas semanais com antecedência e o grande inútil. Não, não vou ficar me chamando disso, aí já é demais, tenho um pouco de autoestima ainda. Ficamos a cismar quantos quilômetros enxergamos até que a terra se curve e tire o horizonte, o mar, do nosso campo de visão. Como a perspectiva é muito inclinada, à medida que nosso olhar se aproxima do horizonte vemos mais e mais quilômetros espremidos em uma faixa cada vez mais fina. Que tenderia a infinito, não fosse a Terra curva.

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14h32. Acho que vou mudar o título do blog, “O Grande Inútil” está me incomodando. Acho que vou chamá-lo do primeiro nome que eu pensei em dar para a minha produção, “Algo Ou Teorias do Fruto da Árvore Envenenada”. Tenho que pensar. Deu pau no pagamento da Sideshow de novo e estou sem saco de ligar para o banco mais uma vez. Tomar coragem para essas duas coisas, mudar o título do blog e resolver a bronca do cartão. Não estou com saco de fazer nada por enquanto. Talvez tomar um café.

14h42. Peguei um café de ontem de manhã, mas ainda está morno, só o gosto não está dos melhores, mas para quem já tomou os cafés que tomei na vida, está de ótimo tamanho.

15h19. Acho que não vai ter solução para os bonecos, acho que vou ter que cancelá-los. Mandei o e-mail para a Sideshow, mas sem grandes esperanças.

16h06. Fiz o novo nome para o header do blog, mas uma força estranha me faz manter o título que agora está por mais um post. Este.

16h31. Estava preparando as imagens para postar. Vou revisar.


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