terça-feira, 15 de novembro de 2011

Meu Querido Diário I

Para quem não conhece: jiló (o sabor do meu humor).

Hoje não foi um dia bom. Minha alma não estava nem está boa, ando carregando uma amargura e um rancor das coisas do mundo dignos do meu pai. Passei o dia na casa dos meus avós e isso ajudou. É triste – e por vezes enervante – ver pessoas amadas em tal estado de decrepitude. Não que sejam velhos infelizes, são felizes tanto quanto a idade e as mazelas permitem. Porém, por mais felizes que sejam, o convívio com meus avós paternos e maternos, além de feia piedade, só reforça a minha vontade de morrer na metade do caminho, de não viver uma existência ainda mais limitada e ridícula que esta em que agora me encontro, onde tenho plena capacidade das minhas faculdades e elas de nada servem para salvar-me da minha mediocridade. Minha mãe sugeriu que eu estivesse deprimido. Por este início, começo a concordar com ela.

A partir de sábado, novamente me encontrarei sem lar e terei de retornar ao albergue de drogados, pois a alternativa restante seria passar uma semana em companhia dos meus avós. Não poderei ficar na casa da minha amada tia (a primeira alternativa de exílio cogitada), devido à pintura de final de ano e ao estoque de tinta e tíner, tentadores para o viciado em cola (e solventes em geral) que sou. Isso também ajudou no meu mau humor.

Mas não são os acontecimentos por si só, é alguma ranhura na alma, uma hipersensibilidade ao desagrado, uma intolerância com qualquer não. Talvez tenha passado tempo demais em internamentos e desaprendido a viver nessa gangorra tresloucada que é o mundo todo. Talvez esteja querendo inconscientemente minar a fortaleza que construí para passar os dois meses que restam de abstinência. Talvez esteja deprimido. Talvez tudo isso ou nada disso. Não importa. Preciso me animar. Preciso descobrir como. A única coisa que me acende é o novo Zelda. E escrever. Pintar, que seria o meu sustento escolhido, abandonei, abusei (em verdade me acovardei diante da possibilidade de funcionar [e nada deve funcionar para mim, pois é assim que funciono]). Estou ancorado em mim mesmo, por correntes pesadas e curtas que quase me afogam nesse mar de nada em que eu mesmo atraquei. Eu sou o responsável por isso, por mim, pelas correntes e pelo mar, por não pintar e não viver, por ter medo da velhice e amor à droga, por amar amores em vão. Eu sou o responsável por esta obra humana quase desumana (ou humaníssima em toda a sua gloriosa pequenez). Eu sou responsável, principalmente, por não assumir nenhuma responsabilidade. Tenho fobia de responsabilidades. E isso talvez seja uma grande responsabilidade, pois poucas pessoas, além dos loucos, assumem a responsabilidade de não serem responsáveis por nada. Acredito que as responsabilidades foram as piores torturas existenciais às quais fui submetido. Me ensinei que não sei cuidar de mim. Me dizem que eu não sei cuidar de mim. E é mais fácil acreditar. É muito mais fácil reclamar de barriga cheia que correr atrás de comida. É muito mais fácil sofrer acorrentado à boa vida que correr do sofrimento e ir atrás de uma vida boa, melhor, mais minha, mais eu. Foda-se. Vou fumar e tomar um café.

XXXXX

Incrível como escrever palavras ácidas de desabafo e autocomiseração alivia a alma. Fumar um cigarro e tomar um café, depois fumar outro cigarro com um copão de coca (zero :P) também. Ainda mais quando o pensamento vai parar em idéias de como seria o perfeito Zelda para Wii U (pretendo desenvolver os conceitos em um novo – e mais alegre –  post).

Quero ver como o texto acima vai me soar daqui a um mês, se conseguirei ver o óbvio e o ridículo que agora me escapam.

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VIAGENS ASTRAIS

“Gâst”, como o velho costumava chamar, imitando o Rei Rossi.

Um nóia meio espírita tem me acometido ultimamente. Tenho me pego conversando com meu pai (morto), como se fosse ele o causador desse meu estado rancoroso (como o dele me parecia ser no final da vida). Me pego dizendo a ele que não sou daquele jeito, que exigir de mim essa indignação com as coisas miúdas me faz mal, que, se ele quiser me ajudar, apenas continue me incentivando do além a ter o cuidado que ando tendo na revisão destes textos (ele era extremamente brilhante e perfeccionista na construção e lapidação do que escrevia). Sempre acabo as “conversas” desejando que ele seja feliz e encontre paz (essas coisas meio de oração).

Acho curiosa a inevitabilidade desses misticismos se alevantarem até em mim, que nunca fui dado – nem entregue – a religiões. Deve ser coisa do fantasma da memória de alguém tão absolutamente importante e definitivo na minha vida. Racionalmente, me considero completamente cético em relação a esses deuses que já existem. No meu âmago talvez ainda precise conversar com meu pai para aplainar sua agora eterna ausência.

É estranho tecer esses comentários e me desperta sentimentos indefinidos. Sentimentos que não conhecia antes de sua morte. Sentimento brandos, pelo menos. Carinhosos, eu acho. Saudosos e culposos também. Uma dor leve e fina, um quase não-doer, um quase amar ou uma dor de amor tão etérea que quase não se materializa em sentimento. Curioso. De qualquer forma, se Deus houver, que ele te abençoe e te guarde, meu pai. Não se preocupe comigo, pois a mim só eu posso dar solução. E manda lembranças para vovô e para o imperador!

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EU, EU, EU


Devido à minha incomensurável preguiça, ao meu infinito egoísmo e à minha chata curiosidade percebi hoje que o único objeto de estudo ao qual eu posso me dedicar, por estar sempre à mão e por ser o único a que tenho total e irrestrito acesso, sou eu. Eu, eu, eu. Minha ocupação nestes últimos meses – quem sabe anos – fui eu mesmo. Se a máxima conhece-te a ti mesmo tem alguma relevância, tenho-a cumprido à risca. E descoberto que outra máxima é ainda mais verdadeira, só sei que nada sei (sobre mim).

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Por que todo mundo quer subir? Por que não fazer aqui embaixo mesmo?

Para atar todos os nós deste post, devo dizer que, embora atualmente apenas me estude, acredito que já descobri as maiores verdades do universo (por que estamos aqui, como viemos parar aqui, para onde vamos, o que é Deus e, principalmente, como criar o paraíso na Terra com a ajuda da Google e da Nintendo). A grande missão (auto-imposta) da minha vida é escrevê-las (e quem sabe publicar em algum lugar além deste blog [tá certo...]). Depois disso, poderei me libertar dessa existência mesquinha e pequena, dessa cápsula de carne que apodrece rumo – espero – ao nada (se houver Deus, vou pedir para ele dar Ctrl + Alt + Del em mim! Não vou agüentar morrer e continuar sendo eu. É muita sacanagem!). Se tudo der certo, partirei muito antes da decrepitude física se tornar velhice doente e senil, que é a velhice inevitável para mim que trato tão mal o “veículo da minha alma”.


Um comentário:

  1. Também não sigo uma religião específica, mas me pego rezando todos os dias por você, Helena, Maria e tia Ana e agradecendo a vida abençoada que tenho. E me ppego pensando em papai e no quanto ainda sinto que ele está conosco, mesmo nunca mais o tendo visto.

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