sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Diários de um Manicômio IX

27 de agosto de 2011


Acabei de jogar dominó. É bom para variar. É noite. Sempre escrevo depois do jantar. Às vezes, depois de tomar os medicamentos. É final de semana e a rotina é um pouco mais tranqüila, menos barulhenta, pois muitos pacientes passam o período fora, com seus familiares/tutores.

Sinto falta de me masturbar e suspeito que haja atividades homossexuais entre alguns pacientes na parte superior da casa (não saberia explicar ou provar por que). Não desejo investigar o assunto por medo de agressão e pela falta de relevância no meu cotidiano.

Da ala feminina presente na casa hoje, nenhuma me desperta libido ou carinho maior que simpatia cordial.
Percebo em alguns pacientes os sintomas de perseguição citados por Freud, chegando algumas vezes a elaborar teorias conspiratórias (quem sou eu para falar de teorias?). A ala das mulheres, distante da enfermaria (que é anexa à ala masculina), faz com que as pacientes femininas me lembrem um bando de cabritas a berrar incessantemente pela distante atenção dos funcionários, geralmente pelos motivos mais esdrúxulos, só pela a atenção em si (o que nem é um motivo tão esdrúxulo, dados o isolamento e carência a que estamos submetidos).

Sobre mim, recebi mais do que pedi e menos do que pedi, pois vieram roupas e guloseimas inesperadas e faltaram os tão esperados caderno e caneta. Terei que continuar esmolando ambos de internos e funcionários. Ainda penso em Adeline e me pego fantasiando se ela seria a “ela” da minha vida. Criança-menina-mulher-poesia-caos-doçura-agressividade-espontaneidade. Tão necessitada de carinho. Tão necessitada de ser aceita como é, tão fada, tão estranha, como uma princesa de Tim Burton, como uma feminina Edward Scissorhands. Mais e melhor que o mundo que a rodeia e, por isso, incompreendida por ele, que a oprime/reprime.

Mas devo falar de mim e só me resta meia página. Eu me sinto, afora pela saudade castanha por Adeline, de todo o resto vazio. Começa a irritar-me a constante amolação por cigarros. Incomoda-me essa característica humana de desejar o que é do outro, mesmo que um biscoito ou um resto de café.

Não me sinto revoltado com a minha mãe. Foi a única alternativa que ofereci. Maquino como conseguirei dinheiro e local para o meu retiro “Norcolaespiritual” quando estiver livre. Penso em livrar-me do meu novo Nike por cinqüenta-setenta reais; conseguir um bom estoque de cola, alguns cigarros e algum líqüido (água, coca [coca é melhor, pois tem glicose e é mais gostosa!]).

Sobre o lugar, tenho duas opções e não as revelarei aqui, pois é depor contra mim e botar meus planos por água abaixo.

A psicóloga daqui do manicômio disse que me dará mais papel hoje. Proporei um jogo a ela.

XXXXX

Ela me deu o papel. Eu propus o jogo – que ela elaborasse perguntas para eu responder; ela concordou. Fez três perguntas relacionadas ao uso da cola, seu significado, conseqüências e coisas do gênero. Infelizmente, devolvi o papel respondido para ela e não o reouve. Logo, não constará deste diário.

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