Estou no aeroporto de Guarulhos. Agora que as engrenagens
começaram a girar e estou embebido nela, não tenho sentido desconforto na alma,
por mais que vamos enfrentar agora cerca de 11 horas de voo. Mas quem está na
chuva é para se molhar. Por falar nisso, a aterrissagem em Guarulhos foi adiada
pela chuva, tivemos que sobrevoar Belo Horizonte uma ou duas vezes antes de
pousar. E isso foi só o começo. Conseguimos embarcar as três malas, duas
minhas, uma de mamãe. E cá estamos de frente para o portão de embarque.
0h28. Estou usando o meu laptop no avião. Que experiência
nova. Apesar do aperto me dá um prazer diferente, especial. Ainda há muita
bateria, mas muito mais voo há. Tempo restante estimado em mais de oito horas.
Mamãe se mexe muito, putz grilo, parece até que quer me atrapalhar a escrever,
como aconteceu no aeroporto em São Paulo, onde acabei ficando irado e guardando
o meu computador. Se a cadeira da frente não estivesse reclinada, o conforto
seria outro, não muito, mas melhor. Eu poderia abrir a tela completamente, mas
acho que é pedir demais. Só ter a capacidade de usar o meu computador, se mamãe
parar de me atrapalhar, será uma experiência única na minha vida. Experiência
essa que quero repetir na volta. Só o computador mesmo para me fazer gostar de
uma viagem de avião. Mamãe está realmente irrequieta. Acho que não está
conseguindo pôr o filme para assistir na minha cadeira. Trocamos de cadeira a
meu pedido para que eu tivesse mais espaço para digitar. Fico já paranoico de
que, por estar usando o computador para escrever com uma cópia pirata do Word,
eu seja barrado nos EUA. Espero que não.
Estou a exatas 8 horas do meu destino intermediário,
Chicago, a temperatura externa é menos 35 graus, estamos sobrevoando agora o
que eu suponho ser a Região Norte do Brasil, a 920 km/h, numa altitude de 9.574
metros. Este é o local mais excêntrico em que usei um computador em minha vida.
Mas, como passatempo, está bom. Estou no meio da viagem, não tem mais volta,
estou no braço mais cansativo e demorado dessa, pois são mais de 10 horas de
voo, praticamente 11. Estou começando a ficar com sono. Mas subsistirei. Eu
pensei que podia botar “Utopia” de Björk para ouvir, mas lembrei que o Spotify
necessita uma conexão à internet. Acabamos de jantar, um peito de frango ao
molho de tomate com purê e um suposto vegetal que não consegui identificar. Não
estava ruim. Mas também não estava bom. Os comissários de bordo são todos
americanos ou se comunicam em inglês. Mas acredito que sejam da terra de Tio
Sam. Estamos experimentando turbulência agora. Pediram para atacar os cintos de
segurança. Acho que eu sou meio paranoico mesmo. Achando que a movimentação ao
meu lado são os comissários querendo espionar o que estou fazendo no
computador. Ah, se soubessem que só faço narrar asneiras. Hahahaha. Estou cada
vez mais distante do meu quarto-ilha, mas a peça principal dele está aqui entre
os meus dedos na minha frente, meu amado computador velho de guerra. Vai ser o
meu protetor também na casa do meu irmão. Meu consolo, minha fuga. Embora
agora, já atolado na viagem mesmo, posso tentar interagir um pouco mais com a
família. Afinal, todos são legais. Temo que mamãe se estresse com a onipresente
tia da minha cunhada e ambas se estranhem na disputa pela atenção das crianças.
Mas isso já estou fantasiando, pode tudo correr às mil maravilhas para elas e,
se me esquecerem, para mim. Não tenho como saber se o Nintendo Switch já foi
enviado ou não, pois acordei dentro da maratona da viagem. Estava inseguro até
Guarulhos, mas agora que a United Airlines nos deu todos os tickets de
embarque, relaxei. Como há uma certa distância entre os voos, eles podem se
atrasar um pouco ou sair um pouco mais cedo que não tem problema. Não que
esteja de todo relaxado, ainda não sei se as malas vão direto para Boston ou se
teremos que retirá-las em Chicago. A aposta é Boston. Descobriremos lá, então.
Posso botar o iPod para ouvir, mas confesso, que com a escuridão da cabina do
avião e a claridade da tela que varia, pois não está aberta adequadamente, está
me dando sono. Também são 1h08 da manhã e fui dormir ontem perto de duas horas,
acordando às 9h50. Para mim é muito pouco e, embora tenha dormido um pedaço
significativo do voo de Recife para Guarulhos, o sono de avião nunca é bem dormido.
Minha barriga se contorce com a refeição ingerida e penso saudoso no meu
banheiro. Na privacidade de se ter um banheiro só para mim. Nossa, como quero
voltar a ter isso, é umas das regalias mais preciosas que tenho na vida, eu que
já vivi totalmente privado desse conforto, não em um avião, que ainda tem trava
de porta, mas no Manicômio onde pedir para um doido não entrar quando estou
defecando é o mesmo que convidá-lo ou nada dizer, pois ele entrará da mesma
forma, já que as portas não têm trancas e os doidos tem um juízo meio... doido.
Onde queria estar agora? Já de volta em meu quarto-ilha. Com o Switch, o lugar
já reformado e com todos os bonecos que eu quero, expostos. Com o Hulk já no
Brasil e todos os bonecos que quero vender, vendidos e todos os que quero dar
dados e acho que não vou ter coragem de vender a Captain Marvel. Os outros dois
que quero vender, o Skeletor e o Boba Fett, tenho quase certeza de que farei.
Pensando neles essa certeza se reafirma. Movimento inconsciente, procurei o
Vaporfi para dar uma baforada. Em teoria, ele está no compartimento de bagagens
desta aeronave. Não sei nem direito o que estou escrevendo, só estou fazendo
isso pelo inusitado da situação.
1h25. Mamãe começou a se mexer de novo. Parece que vai
tentar dormir agora. Acho que vou escutar um iPod enquanto escrevo. “Thank you”
de Alanis Morissette. Primeira música do iPod que organiza as canções por ordem
alfabética de artistas, seguido, acho eu, por lista alfabética dos discos e
depois das músicas. Pelo visto, coloquei em modo aleatório sem perceber,
começou a tocar “Ceremony” do New Order. Acho muito linda. A sonoridade que
melhor define os anos 80 para mim. Os meus anos 80, pelo menos teriam como
trilha o “Substance” do New Order. Mamãe botou os braços para dentro do meu
espaço da cadeira. Estou escrevendo todo troncho aqui. É desconfortável paca.
Espero que o barulho das teclas não esteja atrapalhando os outros passageiros
que tentam se aninhar e adormecer ou cochilar como podem nas ínfimas poltronas.
Acho que o som das turbinas do avião (ou seria o barulho dele cortando o ar,
não sei) é mais alto que o das minhas teclas, tenho certeza. Antes de colocar o
som, eu não conseguia ouvir o barulhinho das teclas. A aeronave, está quase
toda às escuras, excetuando-se uma tela ou outra e alguma luz de leitura que
algum passageiro não soube ou não se importou em desligar.
1h38. A minha TV parou de funcionar, não posso narrar qual
parte do Ocidente sobrevoamos e demais informações do que chamo “TV Avião”. A
turbulência assola. 1h41. A mais violenta até agora. É uma maravilha da
engenharia mesmo o tal do avião. E este texto está uma porcaria. O avião
chacoalha, é um tanto disturbing. Mas
acho que não vai ser dessa vez que o velho Mário e sua mãe partirão dessa para
melhor. Ou pior. Seria uma ironia do destino. Eita, “It’s In Our Hands”. Linda,
linda. Para ser sincero não estou achando nada divertido escrever nesse aperto,
todo troncho no meio de uma turbulência, mas é melhor que fazer absolutamente
nada por oito horas. Vou até quando a bateria aguentar. Até que está sendo
valente hoje. Também sem internet e sem música, só com o Word, não poderia ser
de outra forma. Já-já chega à metade. Minha bunda dói de tanto tempo sentado na
mesma posição. Dei uma leve levantada para mudar um pouco. Mamãe dorme
profundamente, com a cabeça afundada no próprio casaco. Não sei como aguenta
usar um casaco de inverno brabo num avião. Eu estaria me derretendo. Nossa,
como queria ter internet para acompanhar o meu pedido “gamístico” na Amazon.
Começou uma seleção mais brasileira no iPod. Zizi, cantando Chico, “Valsa
Brasileira”, e agora Maria Rita cantando Marcelo Camelo, “Santa Chuva”. Eu
ainda estou processando o fato de que estou indo para os States. É algo tão
fora da minha mesmice rotineira que me deixa pensativo. Mas menos do que antes.
Não estou com sentimentos bons ou negativos, apenas recebendo e levando a vida
como ela me vem. Agora devo estar passando por uma tempestade ou coisa que
valha. Eita, a TV ligou, já deixamos os céus brasileiros e, em breve deixaremos
a América do Sul. Está mais frio lá fora agora. Estamos sobrevoando o país que
tem Paramaribo por cidade ou capital. Sei lá, sou péssimo em geografia. A
altura é de pouco mais de dez quilômetros, a temperatura -42 graus velocidade é
de 914 km/h. Ainda faltam mais de seis horas e meia para chegarmos ao solo
Norte-Americano e nos prepararmos para o próximo e último voo. De ida. Aí
teremos mais uma curta viagem de carro e chegaremos à casa do meu irmão. Pois
é, para quem gosta de viajar, de andar de avião, deve ser um prato cheio. Para
mim é tolerável graças à ideia do computador. Ele é um companheirão mesmo.
Senão estaria consternado que depois dessa espera que é viajar, não tenha ainda
chegado à metade do caminho deste voo. Ainda bem que ainda tenho um pouquinho
mais de meia bateria, ou seja, o dobro do tempo que eu digitei. Tenho que
perseverar e quem sabe, daqui para a bateria acabar não durmo? Não sei, já
dormi até a hora da janta. Jantar e sono são conceitos bastante elásticos em se
tratando de viagens de avião. Mas gostei da refeição e fiquei inconsciente no
mundo de morfeu por cerca de uma hora. Eu na paranoia de novo, do americano ver
o meu computador com o Windows pirata. Espero que não se atenha a tantos detalhes.
Eita, “Firework” de Kate Perry. Estava com saudade dessa música. Adoro clipe
que empacota de forma poético-artístico-capitalista a canção. É um produto e é tratada
como tal e assim fizeram o clipe. É um produto de qualquer forma e não tem
vergonha de se mostrar assim. Aliás a imensa maioria o é. Até os de Björk mais
novos eu encaro como comerciais de um produto que é sua música. Na música,
entretanto eu sinto que Björk tem liberdade criativa total.
2h22. Mamãe dorme afundada em seu casaco super-super contra
neve, comprado na última viagem – antes dessa – à Munique. Pela camisa que
agora ostento, percebo que estive nos Estados Unidos no ano passado. Esse
número de viagens me desagrada profundamente. Já avisei a mamãe que não quero
viajar em 2018. Descontando a viagem de volta que vai se dar em janeiro do ano
que vem. Mais 24 horas de voo. Meu saco. Que minha mãe convoque agora o meu
padrasto para acompanhá-la. Só sei que não quero viajar por pelo menos um ano.
Cansei. Tá bom. Chega. Viajar todo ano? Não é isso o que eu quero da minha
vida. Que minha mãe entenda e respeite isso. Preciso dar uma respirada, não
pensar que vou daqui há três, quatro meses pegar outra peregrinação dessas. Com
todos os seus pequenos percalços e grandes momentos de tédio. A turbulência
está mais violenta agora, combina com o som que estou ouvindo, Audiosalave,
“Cochise”. O clima é de leve tensão dentro de mim. Nunca peguei um voo com
tanta turbulência, eu acho. Mas essas fantásticas máquinas voadoras são
projetadas para enfrentar esse tipo de intempérie climática. Não arriscariam a
segurança de tantas vidas assim tão displicentemente. O piloto seria o primeiro
a não se arriscar. Nossa, acho que a tia de minha cunhada passa mais tempo nos
EUA que no Brasil. Acho que sua vida em Recife é desprovida de sentido agora
que se aposentou e como é solteirona e sem filhos, se deleita com a casa do meu
irmão. Me sinto mais inseguro para escrever sem o auxílio do Google para tirar
as minhas dúvidas. Saberemos lá quanto tempo vai passar dessa vez. Nada contra,
ela é muito semelhante a mim e o completo oposto também. Semelhante porque tia,
solteira, sem filhos e aposentada; oposta porque ama viajar e estar perto dos
sobrinhos-netos. A bateria chegou na metade, o que significa, se persistir
escrevendo, que não poderei escrever no voo Chicago-Boston. Ainda bem que é um
voo curto, duas horas e pouco. Não sei quanto tempo de espera no aeroporto de
Chicago, entretanto. Mamãe mexeu-se e estou um pouco menos troncho agora. Tanto
melhor. A bateria estar na metade ainda são 2h44. Nos restam nada menos que
cerca de dez horas até chegar à casa do meu irmão. Vou ver se já deixamos a
América do Sul.
5h36. Fui interrompido na minha escrita por uma senhora meio
antipática que queria dormir e achava que a claridade da tela do meu computador
estava a impedindo. Voltei agora, várias sofridas horas depois, para digitar no
Gmail do celular de mamãe, salvar no rascunho e me enviar quando na casa do meu
irmão. Cada gambiarra para passar o tempo. Muito chato escrever no celular,
fico ciscando tecla. Mas é melhor que ficar olhando a progressão da aeronave na
telinha do monitor à minha frente. Por sinal, vamos ver se já adentramos em
território americano. Não, estamos no mar entre Cuba e os EUA. Faltam pouco
menos de três horas para chegarmos ao nosso penúltimo destino. Incrível a
autonomia de voo de um avião, mais de dez horas no ar. Espero que as malas
cheguem corretamente a Boston. Senão vai ser uma bostona. Desculpe, eu tinha
que fazer o talvez célebre e infame trocadilho. Acho o teclado de mamãe mais
burro que o meu. Mas isso agora é uma dádiva para mim. A maior diversão que eu
podia ter. Na volta eu terei, ao que tudo indica, um Nintendo Switch e quem
sabe não o jogue em modo portátil no voo de volta? Num deles, quero dizer. Pois
a volta será igualmente punitiva à ida e a bateria do console não dura tanto.
Espero que a do celular de mamãe aguente, pelo menos até Chicago. Tomara. Está
tão gostosinho ciscar palavras. O que posso dizer agora? Talvez tenha uma
amostra do frio já nesse próximo braço da viagem quando for fumar. Acho que
fumarei uns três cigarros seguidos! Hahaha. Acho que o teclado de mamãe também
é esperto, só que está acostumado com o que ela escreve, então continuemos a escrever
para ver se ele pega um pouco do meu jeito. Hehehe. Jogar o Zelda na telinha do
Switch não me apetece muito. O Mario é mais negócio. Mas lembrei agora que
terei um celular e poderei escrever nele. Bem lembrado. Espero que caiba nos
meus bolsos, pois parece que o bicho é grande.
6h18. Quanto tempo será que me separa do próximo cigarro?
Vou descobrir. Duas horas e vinte ainda. Não andou quase nada e minha bunda dói
de ficar na mesma posição. Ozzy. Estamos no meio do mar praticamente chegando à
terra firme, rica e poderosa dos Estados Unidos. Espero que não dê nada errado
na imigração. É o último obstáculo para, enfim, reencontrar o meu irmão. O
teclado de mamãe fica sempre sugerindo palavras de despedida depois do ponto
final. É uma onda. "Beijos, obrigado e vou". Toda vez. Olha aí, de
novo. Hahaha. 6h31. Estou ficando entediado e dolorido de escrever no celular.
E os minutos se arrastam. Quem me dera tivesse um Kentucky Fried Chicken no
aeroporto de Chicago, caso consigamos passar para dentro do país. Duas horas
para a chegada. Nossa, que demora. Nem estou com saco de escrever, a única
novidade é em que posição minha bunda vai começar a doer. São 6h39 e não
começou ainda a amanhecer? Curioso. Ai, minha bunda. O pior é que meu celular
será Samsung como esse. Espero que quando eu instalar o Swift Key, ele fique
mais parecido com o meu. Por mais que as letras grandes e separadas sejam mais
fáceis de acertar que as do teclado pequeno do meu quiçá antigo celular.
Veremos, se conseguirmos chegar à casa do meu irmão. O teclado já está
aprendendo os meus maneirismos, os meus assuntos. Não é trivial criar algo tão
inteligente assim. Vou tentar tirar um cochilo nessa hora e quarenta que falta.
Não, melhor não. Senão vou ficar dormindo no aeroporto. Para lá de zumbi. Um
zumbi comatoso. Melhor ficar só zumbi. 6h57. Nossa, como demora, só não estou
tão agoniado porque estou com sono. Vou parar e tirar um cochilo. Dane-se, se
vou ser zumbi comatoso ou não. Inté o voo para Boston, se tudo der certo!
11h32. Tudo deu certinho. Até para mamãe comprar um remédio
contra a violenta coriza que a acometeu na descida do avião em Chicago, calhou
de sentar-se ao lado de uma americana, filha de brasileiros, com português
perfeito, com sotaque levemente mineiro, que sabia onde havia a farmácia que
não conseguimos encontrar no nosso caminho para o portão de embarque. Remédio
comprado e cigarros fumados, cá estamos esperando o avião decolar. A simpática
americana de alma brasileira conversou sobre moda, sua atual profissão, embora sua
formação seja psicologia e sociologia. Curioso. E não era feia, tinha traços e
cores indígenas. Bom, são 11h51 e estarmos prestes a decolar. Quando estivermos
no ar, volto a digitar ou acabo caindo no sono, o que não consegui fazer no
torturante voo de Guarulhos a Chicago. Estou saturado de aviões por um bom
tempo. Estou com tanto sono que o celular já quase caiu três vezes da minha
mão.
18h47. Finalmente cheguei à casa do meu irmão. E mais do que
finalmente fui ao banheiro. Desde que Guarulhos, vinha sentindo pontadas no intestino.
Nossa que alívio tremendo ir a um banheiro decente com tempo e privacidade a
contento. A casa é linda e grande, os donos orgulhosos e as crianças felizes.
Já brinquei de um jogo com eles, o que foi uma atitude improvável e ao mesmo
tempo inevitável da minha parte. Não foi ruim, mas garanti que fosse rápido.
Meu irmão definiu em linhas gerais os três filhos, o mais velho necessita ter
constante atenção, alguém prestando atenção nele. O segundo é o mais calado e introvertido
e ele acha que é o que inspira mais cuidados, embora ele mesmo meu irmão se
veja nele, como pessoa introvertida que era. O terceiro, o caçula, ele diz que
é a criança mais feliz que conheceu e não traz muitas preocupações. Fomos comer
no Sky Buffet, o mesmo restaurante “coma o quanto puder” que fomos da outra vez
almoçar. Só mamãe, ele e eu. Foi bom que conversamos sobre tudo um pouco, mas
me marcou mais a parte que falamos de games e do emprego dele. Foi bastante
interessante. Ele tem uma opinião superpertinente sobre os rumos que o trabalho
está tomando, mas não me cabe aqui repartir, afinal são coisas do trabalho e
ele mesmo as manifestou na empresa. Vamos mudar de assunto. Voltando um pouco
para o voo Chicago-Boston, achei bastante curiosas as partes que vi com neve lá
do teto do céu, me pareceram desbotadas, sem cor, em preto e branco, como uma
cópia xerox de má qualidade da realidade. Pois parecia uma visão rala diluída e
cinza da paisagem. Achei bastante interessante o efeito. Não deixava de ser
bonito e ter sua própria poesia. Xerox desbotado/com defeito também tem sua
peculiar beleza, a depender do que copia. No caso, uma paisagem nevada, não
urbana, campestre, com vales e morros vistos a vários quilômetros de altitude. Outra
coisa que despertou minha atenção nesse clima tão não-tropical foi o fato de
certas nuvens, não sei se de neves ou de chuva, refletirem o sol difusamente em
suas superfícies. Algo, para mim, bastante fora do comum. Cheguei aqui e meu
sobrinho mais velho quis me ajudar em tudo. Até escrever esse texto. Disse-lhe
da filmagem amanhã e ele e os demais ficaram animadíssimos. Não sei se foi uma
boa ideia. Mas prometi, vou ter que cumprir. Vou até colocar a câmera para
carregar e limpar o SD card da Go Pro. Minha interação com os guris está sendo
mais intensa do que eu supunha. E isso tem um lado ruim e um lado bom. O lado
bom, ótimo, por sinal, é que eles não me têm por uma pessoa distante e
inacessível como eu supunha. O lado ruim é que não posso exercer o meu ofício a
contento. Só estou escrevendo aqui porque foram tomar banho. Vou ver se arrumo
coragem para falar com o meu irmão sobre a história de dar três bonecos para os
meninos de Natal. Espero que o pai os convença a me deixar em paz enquanto
trabalho. Não estou preparado para tanta sobrinhada de uma vez. E eles são
muito elétricos! Me põem louco. Hahahaha. Não tenho o mínimo jeito com
crianças. E nem sei se quero ter. Me lembram três Meninos Maluquinhos, por
assim dizer. Hahahaha. Bom, agora estou sozinho no escritório, que de fato se
tornou o meu quarto. Pedi a meu irmão uma garrafa de Coca, ele disse que tem
duas pequenas nalgum lugar. Está de ótimo tamanho. Só tomarei essas duas (enquanto
estiver na casa). Se sair, abro uma exceção, ou quantas exceções se derem,
lembrando logo que lhe disse que, por mim, não sairia de casa. O único lugar
que me interessava ir era ao restaurante chinês que fomos hoje. Já me dou por
satisfeito, mas ninguém sabe o que vem por aí. Sei apenas que não há espaço no
carro para muita gente, logo suponho que as saídas devam ser caminhando aqui
por perto. E dessas, talvez possa escapar. Sei que irei comprar o tênis com a
minha mãe algum dia dessa viagem. No mais, não sei nada que seja estritamente
obrigado a fazer. Estou nos Estados Unidos e até agora não está sendo nada do
que pensava. Está sendo bem melhor do que pensava, em verdade. Os tios da minha
cunhada foram muito doces e receptivos comigo, nos breves momentos em que
interagimos. Eles foram fazer compras com a minha cunhada. Estou sendo
assaltado por novidades e velhas recordações que se tornam frescas novamente.
Meu irmão está com muito mais cabelos brancos que da última vez, mas continua
um belo homem. Hoje fugiu um pouco de sua dieta vegana e comeu sorvete com
leite. Pena que não achou o sorvete tão bom quanto esperava. Minha mala veio
sem o zíper, mas, graças, chegou com todos os pertences que continha. Uma pena
será que talvez não consiga levar nenhum dos bonecos que tenho aqui, tendo em
vista que terei que levar todas as roupas de volta numa mala só mais o Nintendo
Switch, se esse vier mesmo, ainda estou sem internet porque não consegui
memorizar a senha gigantesca elaborada por meu irmão, é quase uma pequena
estória que não decorei o enredo. Hahahaha. Coisas de programador. Por falar
nisso, ele achou estranho e por que não dizer, suspeito, o meu Skype avisar que
há outro aplicativo utilizando minha câmera, quando não tenho aplicativo
qualquer que utilize esse recurso sendo executado. Bom se Trump está me vendo
escrever no computador e tirando uma catota do nariz de vez em quando é
problema dele. Ou de quem quer que me observe. Não verá muito mais que isso.
Talvez só as filmagens do meu amigo cineasta. 20h21. Acredito que aqui seja
outro horário, mas manterei o meu de Recife, acho o mais conveniente. Vou
mostrar o que o meu computador mostrar. Se ao conectar coma rede daqui ele
mudar o horário, seguirei o que ele mostrar. Eu certamente não me aperceberei
da mudança, desligado que sou. Ou talvez me aperceba, não faz muita diferença
para o leitor ou para mim mesmo. Fiquei sabendo que hoje ou amanhã, será o dia
mais curto do ano por estas bandas, não admira ter amanhecido tão tarde hoje e
a noite já estar de novo tomando o lugar do dia no céu. É um acontecimento
bastante estranho. Embora hoje tenha feito um dia bastante ensolarado e sem
nuvens – ou neve – no céu. Mesmo assim estava frio o suficiente para sair vapor
da minha boca. O meu sobrinho mais velho entrou aqui e ficou quietinho agora.
Acho que meu irmão deu coordenadas para ele, dizendo que não era para me
atrapalhar. Fiquei com pena do bichinho e puxei papo com ele. Sei que não
deveria fazer isso se quero preservar o meu espaço, mas fico num dilema entre a
razão e a emoção e o coração de manteiga amolece frente a tamanha demonstração
de interesse em relação à minha pessoa.
21h04. Meu irmão é um pai muito criativo, inventou um palco
de rock para os filhos dublarem Guns N’ Roses e outras bandas de rock. Tal
ideia nunca me passaria pela cabeça, confiaria em suas próprias criatividades
para inventarem suas próprias fantasias, mas amaria que meu pai fosse criativo
assim. Talvez meu irmão tenha herdado da minha mãe essa capacidade de
fantasiar, ela é que inventava jogos, brincadeiras e histórias fantásticas com
árvores de brinquedo para nós. Deve ter vindo daí essa vocação que meus irmãos
compartilham, cada um a seu modo. Não posso excluir minha irmã desse rol, pois
cria brinquedos incríveis e bolos que desafiam a gravidade e a paciência de
quem faz. Eu não sei se o meu amor por um filho se manifestaria assim,
criativamente. Seria mágico se fosse, mas não sei nenhum truque. Será que me
ocorreria algo? Talvez quem sabe num lampejo inventasse alguma brincadeira. Ou
talvez não. Eu era criativo, a criatividade era o meu ganha-pão. Acredito no
dito popular, casa de ferreiro, espeto de pau. Talvez esse seja o meu caso.
Devo me lembrar em primeiro lugar, entretanto, que não quero ter filhos. Seria
necessária muita persuasão e também muito amor, respeito e carinho pela
parceira para que eu consentisse em plantar a tal sementinha. Se porventura
ela, que ninguém nem eu sabemos quem seria, quisesse ter um filho comigo.
22h20. Meu sobrinho mais velho parece que foi com a minha
cara, parou uma boa meia-hora aqui comigo agora brincando com o Google Maps.
Mas eu acho que a novidade que sou eu will
quickly wear thin. Estou tentando ver se o Sansar, projeto em que meu irmão
trabalha pega aqui da casa dele onde internet é mais rápida. Acho que não vai
pegar também, mas darei um tempo de 23 minutos. São 22h37. Meu irmão disse que
dura menos para carregar. Veremos.
22h52. Fui fumar um cigarro do lado de fora. Não está
nevando, mas está fazendo um frio agradável. Com o casaco que meu padrasto me
emprestou, diga-se de passagem. Sinto o meu nariz todo gelado. Não me lembro de
ter presenciado frio assim. É gostoso. Uma boa mudança de ares. Se abaixar mais
dois ou três graus, acho que só dá para encarar com algum agasalho para as
pernas, nariz e orelhas. Minhas mãos também ficaram geladas. 22h55. E nada do
Sansar. Estou com vergonha de perguntar a meu irmão sobre os bonecos.
23h13. Não funcionou o Sansar. Mandei um e-mail para o meu
irmão perguntando dos bonecos. Sempre o caminho do meio. Me parece o que mais dá
resultados dentro da minha realidade. Nos poupa o constrangimento do não ao
vivo. E facilita as decisões para ambas as partes. Pelo menos é o que acho.
Espero não cativar o meu sobrinho mais velho a ponto de ele não desgrudar de
mim. Queria ter a minha privacidade para escrever as impressões daqui e isso é
paradoxal, pois uma das grandes experiências é interagir com a criançada. Mas a
verdade é que tenho limites para isso. E talvez tornar o tempo comigo mais
restrito, o torne também mais precioso.
23h26. Amei agora! No escritório do meu irmão há pintura
minha e o túnel infinito que lhe dei de presente. O túnel infinito é um negócio
que só vendo para explicar, mas ele parece muito mais profundo que o objeto que
o comporta, mas muito mais profundo mesmo. Ad
infinitum. É bastante intrigante e achei a cara dele, por isso encomendei.
Estão vendo Netflix na sala. Como não gosto de ver, faço o que gosto. Por falar
em ver, acabei de assistir o vídeo do Game of the Year da IGN, novamente deu
Zeldinha na cabeça e o trailer mostrou vários spoilers, achei isso uma merda,
mas não consegui parar de ver. Uma pena, várias passagens épicas do jogo me
foram reveladas e a quem mais vir que deteste spoilers. Portanto já aviso, o
GOTY da IGN, pelo menos dos leitores, foi The Legend Of Zelda: Breath Of The
Wild. O resto você descobre jogando, que é o que pretendo fazer. Preciso mandar
o e-mail dois, pedindo que façamos os procedimentos como fazíamos para a venda
de bonecos, eu e meu irmão dividindo as funções para a postagem dos produtos no
Ebay. Ele pesando e me dando as dimensões da caixa, eu fazendo a propaganda e
as negociações e, quando vendido, ele imprimir o comprovante de envio, que eu
pago e gero, para ele então entregar nos correios daqui. Tomara que concorde. Estou
tendo sensação de déjà vu. A segunda em menos de 15 dias. Não recordo qual foi
a outra, mas acho que teve relação com o texto também. Vai ver que digitei algo
de conteúdo similar mesmo, nas duas ocasiões, em tempos idos. Sei lá. Escrevo
tanto que a repetição de situações pode muito bem acontecer. Ou eu falo isso
com ele mesmo. Diretamente. Isso eu tenho mais coragem. Amanhã falo. Em meia
hora ele resolve as pesagens e as postagens eu vou fazendo à medida que vendo
cada boneco. Não acredito ainda que vou vender a Captain Marvel e o Skeletor.
Mas acho que basta eu ver os tamanhos das caixas para mudar de ideia. Verei
isso amanhã quando descer ao porão, onde estão todas as caixas, acredito. Não
haveriam de estar em outro lugar e não as vi na geral que dei pelo lugar. Ah,
como queria que meu irmão estivesse aqui. Eu contei da mala? Deixa eu dar uma
relida para ver.
0h52. Eu contei da mala. Pois é, só tenho uma agora. Meu
irmão veio me responder dizendo que acha que os bonecos são para crianças mais
velhas. Que a minha companhia é o suficiente. Ok, mais bonecos para dar ou
vender. Acho que vou botar para vender todos que têm caixas protetoras. Minha
mãe recebeu uma caixa que talvez caiba o Ironman. A outra boneca que vendi alcançou
93 dólares num leilão. Não é um valor de se jogar fora. E essa tem a caixa
ainda, espero. Amanhã tomarei pé de tudo, descerei ao porão e farei a proposta
ao meu irmão. Melhor ganhar 50 dólares que não ganhar nada. Vale a dor de
cabeça de postar acompanhar etc. e etc. Quero que o Switch seja logo enviado.
Todos os itens já estão em estoque, não sei o que os impede de enviar. Vai ver
que a fila de espera pelo Mario esteja grande. E estão atendendo os pedidos
pela ordem em que foram comprados no site. Vi que o meu post sobre
autossugestão já conta com 109 visualizações. Acho simplesmente incrível,
miraculoso e não sei a que se deve. Só sei que isso me lembrou que não repeti as
frases nas últimas 48 horas. Repetirei. Lembrei também que aqui a diferença
nessa época do ano é de duas horas a menos que no Brasil. Nossa, ainda estou com
fome. Destruí os dois empanados que havia na geladeira. Vou ver o que mais acho
para comer. Eu estava achando o frio bom, mas estou com o casaco de neve do meu
padrasto dentro de casa. Tentarei, entretanto só dormir com a colcha, a calça e
a camiseta. E a meia! Sem meia não tem jogo. Tirei o casaco e o frio já
imperou. Eita que o inverno aqui é de lascar. Ainda mais que estou bebendo água
com muito gelo. Botei uma luva, mas não consegui digitar com ela, vou segurando
o frio até onde der, depois me enrolo nas cobertas e durmo. Comi três fatias de
presunto a mais e um biscoito de gengibre, que não foi muito do meu agrado, embora
não seja de todo ruim. Localizei na cozinha o que suponho ser uma máquina de
fazer café. Descobrirei amanhã. Se for, o café me aquecerá. Já estou com pena
de vender o Skeletor e a Captain Marvel. Tenho que ver o que mais tenho para
vender lá. De repente, eu não os venda, ou pire do cabeção e venda mesmo.
Realmente não sei. Vou ver se o porão tem luz, pelo menos. Todos já foram
dormir.
1h53. Meu irmão ou minha irmã, fui olhar os bonecos e aí foi
que a dúvida bateu mesmo. Quando olho para os tesouros que tenho lá embaixo – alguns
que nem me lembro de ter comprado – o meu lado colecionista volta à tona. É
pensar no Switch e no Hulk e vender mais de uma grande. Só para trazer o
Nintendo Switch e mais uma grande sem a outra mala. Se consertarem, posso
trazer mais algumas pequenas também, eu acho. A depender do tamanho da caixa do
Switch. Tem muita coisa massa lá. Babei. Acho que a MoAF, loja de figuras onde
gastei bastante, me mandou uns presentinhos para ver se eu volto a comprar,
pois há duas figuras lá que não me lembro de jeito nenhum de ter comprado. É
interessante como o frio me faz corizar. Lá no porão estava sensivelmente mais
frio que aqui no escritório. Embora aqui também não esteja para brincadeira.
Mas está mais suportável.
2h02. Botei uma camisa de manga comprida mais grossinha por
cima do casaco. Está apertada, mas esquenta mais, quando meu corpo começar a
aquecê-la, digo. Está desconfortável esse moletom. Minha cunhada comprou um
casaco por dez dólares também e me deu, pois ficou folgado no meu irmão. Único
detalhe, não tem mangas. Só se o frio ficar para se torar aqui e eu bote por
dentro do casaco de neve. Agora, levar para Recife, só levo se consertarem a
mala cujo zíper quebrou. Senão fica aí para a próxima. Não sei como engordei
tanto de um dia para o outro. Coloquei o casaco de neve de novo. Por falar em
frio, vou ter que ser frio na seleção dos bonecos. Vou começar a selecioná-los agora, embora só
precise vender um que mamãe pediu, mas vou vender dois dos grandes para ajudar
com o Hulk. E ainda tenho que rememorar as frases de autossugestão. Não sei se
faça isso hoje. Algumas só.
3h06. Elaborei um singelo esboço do que quero vender, do que
quero levar e do que quero dar. Para a minha surpresa e decepção, não sei se a
palavras é esta, houve muito mais que eu quisesse ficar do que as que eu
quisesse vender ou dar. Somadas. Hahahaha. Ao menos coloquei as mais caras na
lista de vendas e selecionei preços para lá de razoáveis para elas, tanto é que
vou fazer no estilo leilão para ser mais rápido e para ver se faturo mais do
que o preço sugerido. Agora vou repetir as frases e me preparar para dormir. Só
que não estou com sono nenhum. Minha vontade é ver os bonecos e separar as
pilhas dos três destinos. Mas faço isso amanhã, se mamãe não quiser comprar
logo os meus tênis. Perguntar a meu irmão se ele conhece alguém que pode pôr um
zíper na mala.
4h35. Já mudei os itens que tinha listado para preços bem
mais acessíveis e coloquei na modalidade leilão com duração de uma semana.
Vamos ver se algum sai. Estou confiante de que venderei algum. Nem que seja o
jogo do Mario que comprei repetido. Botei um preço extremamente baixo nele. Vou
tentar dormir que mamãe já-já acorda.
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