Recife, domingo, 10 de setembro de 2017.
17h29. A contagem regressiva chega ao seu final, em dois
dias estarei partindo para a Alemanha. Estou com certa ansiedade ainda, ao
mesmo tempo que me sinto mais leve em relação à viagem do que antes. Espero
muito que me deixem escrever lá. Espero muito que me deixem ficar em casa
quando forem passear com as crianças. Por mim, não sairia de casa, mas acho que
isso vai ser impossível. Prevejo até uma visita à Áustria, só com mamãe e os
sogros da minha irmã. Isso vai ser deveras incômodo para mim, mas não vejo
meios de escapar. Espero que não seja logo no início da viagem, que dê tempo
para eu me aclimatar um pouco com a nova e temporária realidade. Tenho que ter
isso em mente quando a ansiedade bater. É temporário, transitório, tem data
para terminar. Quantas pessoas não gostariam de estar no meu lugar, viajar para
a belíssima Munique em pleno outono, as árvores todas flamejantes de laranja a
vermelho, o centro histórico e de consumo, as praças e parques. Isso faz me
lembrar os primatas mais evoluídos que eu vi no zoológico, não me lembro se nos
EUA ou na Alemanha, e em ter percebido quão estreito é o profundo abismo que
nos separa. Quão humanos são os seus comportamentos, como me vi naqueles seres.
Lembro também dos pinguins que são bichos bem maiores do que imaginava. 17h42.
O dia já se fez noite. Será que me serão atribuídas as mesmas funções da outra
vez, supermercado e despejo dos diversos tipos de lixo? Será que me pedirão
algo mais? Será que cruzarei com os vizinhos e serei obrigado a ir na casa
deles? Há uma probabilidade enorme disto acontecer. E uma indisponibilidade de
igual tamanho da minha parte. Um senhor que frequentemente curte os meus posts,
curtiu o último antes mesmo de tê-lo lido, eu acho. Achei tão estranho e
demonstrativo da confiança que ele tem que o conteúdo seja de mesma qualidade.
Outro senhor curtiu uns quatro posts meus. Achei tudo isso maravilhoso. Aos
poucos, esse trabalho de formiguinha, vai trazendo recompensas para o meu ego
outras que não apenas a saciedade da vontade de me dizer. Vou pegar Coca.
17h57.
18h00. Coloquei “Vulnicura” de Björk para rolar. Estou
viajando no som. Não sei como baixar os mp3 do Spotify para serem
compartilhados com outrem, salvos em outros dispositivos. Já tomei a Coca. Vou
botar mais para aproveitar o gelo.
18h06. Voltei. Agora para ficar mais um pouco. A estátua da
Red Sonja não me encanta tanto quando o Hulk, não sinto a mesma vontade de
ficar olhando para ela que sinto com o Hulk. Há uma formiga no meu quarto,
passeando por cima do meu computador. Isso me preocupa. A única “comida” que
entra aqui no meu quarto é a Coca Zero, não há nada que a atraia para cá, em
teoria. 18h09. Acabei o copo de Coca e como o último gelo. Mas, como ia
dizendo, a Red Sonja não me desperta a mesma atração que o Hulk, mas vou manter
o meu plano de ter essas três últimas estátuas, o busto do Hulk, a Red Sonja e
o Swamp Thing e finalizar a minha coleção. Como disse estou com mais tesão no
Swamp Thing agora, acho que por não ter sido revelado ainda. Aliás, revelado já
foi, eu digo posto à venda, lançado para pre-order. Com fotos abundantes e,
principalmente com o preço. Preciso conversar com mamãe sobre os meus planos
para o meu quarto. Da iluminação personalizada para cada boneco. Do busto do
Hulk. Que precisarei guardar as caixas dos bonecos, para ela falar com minha
tia vizinha se seria possível guardar as caixas no lugar onde os livros de
papai estão guardados, afinal, ela está muito mais próxima da minha tia que eu
com essas desventuras do condomínio. Estou realmente desacostumado a escrever
assim. Preciso voltar a pegar o jeito. Eu com as minhas manias, deu nisso. Mas
vou voltar a pegar o embalo aqui. Se o invasor, se é que esse existiu mesmo, se
não foi um salvamento automático do Blogger, estiver lendo isso e for responder
às questões postas em um arquivo de esboço dentro deste blog, por favor mude o
nome do arquivo adicionando “RESPONDIDAS” no final do título, para que eu saiba
que o arquivo foi alterado sem precisar abri-lo, pois perdi a paciência de
fazê-lo e vê-lo do mesmo jeito que o deixei. Assim fica mais fácil para mim
saber que você, se é que existe mesmo, se comunicou comigo. Mas começo a
suspeitar que foi um salvamento automático do Blogger que se deu de uma forma
que ainda não consigo divisar. Talvez desligando o computador com uma página do
Blogger em branco aberta. Não sei e esse assunto nem me interessa muito mais.
Não vou desligar o meu computador com as condições supramencionadas para testar
agora. Posso fazê-lo no final da noite. 18h39. As horas voam. Amanhã tenho
CAPS, meu último encontro lá por um bom tempo, pois me desligarão do serviço e
a reintegração a ele não é tão rápida assim. Há todo um processo burocrático.
De encaminhamento de pedido da minha psiquiatra até uma data para uma
entrevista de entrada para depois marcar uma data para o reingresso. Caso vá
para os EUA, provavelmente isso só se dê no ano que vem. Estou, para variar,
sem a mínima inspiração para escrever. Isso chega a ser assustador para mim, pois
me sinto escrevendo forçadamente e é precisamente tudo o que não quero fazer,
transformar esse espaço de liberdade em uma obrigação. Não posso deixar isso
acontecer. Acredito que terei mais assunto quando na Alemanha. O “O” e o “M” do
meu teclado estão bastante descascados. Não sei como o “A” ainda resiste. Meu
ombro dói. Me lembro da placa em homenagem ao meu pai que recebi, num evento
que foi transmitido pela internet para que os meus irmãos vissem – e nenhum dos
dois viu, lembrou de ver – e no qual eu falei e meu avô falou, uma fala confusa
e desconexa que já demonstrava que não estava bem da cabeça e não me deu um
clique na hora. Foi meio embaraçosa e constrangedora a sua fala. Mas foi a fala
de um decano da universidade, que foi professor do meu pai, além de ex-sogro,
meu avô, então acho que contou pela soma de qualidades atreladas à sua pessoa.
Foi uma pena meus irmãos não terem visto. Procurei no YouTube pelo nome do meu
pai e há este vídeo do dia em questão que parece aparentemente ter apenas 46
segundos, mas não me dignei a assistir. Assisti. Foi muito emocionante. Não
esperava, minha tia em prantos falando algo que eu não consegui entender
direito, ainda muito fragilizada com a morte de papai. Não sei como sublimei
tão bem a morte dele. Não sei se terei a mesma facilidade de sublimar a de
mamãe e não guardar vazio dela. Ela ocupa um lugar muito presente e vívido, por
mais que na maioria das vezes considere incômodo e intrusivo e coercivo e
repressor e crítico e mesmo assim muito presente e vívido. Ela coordena tantas
partes da minha vida que acho que me sentirei perdido sem ela. Será uma perda
inominável. A não ser que vá a perdendo aos poucos, que ela contraia Alzheimer
ou coisa que valha. Preferia que não, que se mantivesse lúcida até o suspiro
final. Mesmo que o oco em meu peito fosse maior dessa forma. Mas deprimente
seria ser testemunha da derrocada da sua humanidade, como se deu com minha avó
paterna e meu avô materno. E o pior é que não posso fugir de enfrentar todas as
etapas da doença, se for o caso, pois sou curatelado. Mas não quero que isso
aconteça, por mais que sinais disso se apresentem, pelo menos na minha
percepção. A ferida em minha boca parece que está cicatrizando. Tem até a volta
da Alemanha para sarar. Senão, vou procurar um médico. Pode ser câncer de boca.
Vira essa boca pra lá! Mas prevenir é melhor que me ferrar todinho. Mas acho
que está sarando, a textura está diferente de ontem, ontem parecia mais aberto.
19h34. As horas realmente voam. Minha mãe (quem mais,
afinal?) me pediu/mandou eu usar um sapato que ferra os meus pés para ver se
está mais amaciado e se cabe melhor sem a palmilha. Resultado, estou eu agora
de tênis pela casa. Isso não é um teste muito bom para saber se o sapato está
ou não machucando os meus pés. Andar é que é o grande teste. Mas estou fazendo
o que ela me pediu/mandou. Percebi que o senhor que curtiu vários posts meus, é
bem ativo no grupo onde os publiquei, talvez curta todas as publicações, não
sei. Vou pegar Coca. É tão estranho andar calçado dentro de casa. Isso vai
contra as próprias normas da minha mãe. Mas ela está com fixação nesse sapato.
Que posso eu fazer? Parece que a prima da minha cunhada vai acabar casando com
um gringo e ficar de vez nos EUA. Eu sei lá, só falta ser um cara pró-Trump. Eu
o conheci muito superficialmente e ele me pareceu como um possível pró-Trump.
Bom, que ela seja feliz honestamente. O que quer que seja melhor para ela está
bom para mim. Meu irmão, em teoria se mudará de vez para a nova casa amanhã.
Pelo menos foi assim que entendi. Preciso pegar o endereço para poder
redirecionar as minhas contas para os bonecos serem entregues lá. 20h00. O
sapato não me incomoda, minha mãe vai querer que eu viaje com ele e aí vou me
ferrar. Vou tentar bater o pé e dizer que não vou com ele. Embora haja salvação
para ele, talvez. Farei o teste amanhã indo ao CAPS. 20h27. Me perdi na
internet. E fui pegar uma Coca que, por sinal, já tomei. “Songs From The Volta Tour
- Live” rolando. É o disco ao vivo mais estranho que já ouvi, pois não há som
de plateia. Estava pensando sobre o filme do Alien e em levar o pen-drive para
a Alemanha para assistirmos os filmes lá. Minha parcela de cordialidade para
com os de lá. Já que não levo nenhuma lembrancinha para ninguém. É fraco esse
“Volta Live”. Não gosto dos arranjos. Acho que vou botar o “Volta” normal, de
estúdio. Botar o “Volta” de estúdio me deu uma vontade automática a qual não
aquiescerei. É outra coisa esse som em relação ao ao vivo. Tomara que lance o
disco de Björk enquanto estiver lá. Embora tenha o Spotify. Não preciso mais de
CDs, mas algo jurássico em mim ainda sente o prazer ou a falta da mídia física.
Coisas de coroas do milênio passado. De quem já viveu a era dos vinis – que
estão de volta, carésimos –, dos CDs e agora a era digital. É interessante que
a música foi ficando cada vez mais barata. Hoje é baratíssima. Com o Spotify. É
uma revolução. É a revolução que nos levará à Singularidade Tecnológica. Ou
assim quero crer. Assim é a minha crença. O que seria a primeira coisa que iria
fazer imerso na Singularidade, viver uma viagem de cola que eu me lembrasse de
tudo, que todos os meus delírios ficassem computados/gravados para que eu
pudesse assistir posteriormente. Se bem que a Singularidade me daria todas as
respostas que eu busco, eu não sei. Mas o prazer da cola é para mim o ápice dos
prazeres, o único equivalente talvez fosse/seja o amor recíproco de Aurora.
Seria outra coisa que simularia. Uma namorada perfeita para mim. Seria só pedir
à Singularidade que gerasse a namorada ideal para mim, baseado nas minhas
memórias, personalidade e preferências, poderia usar o banco de imagens de
garotas bonitas que salvei no Pinterest para elaborar a aparência, mas
preferiria que ele buscasse dentro da minha alma a namorada perfeita para mim.
Depois, gostaria de criar o meu próprio planetinha com a casa que me apetecesse,
se é que não preferiria dormir numa cama ao relento num bosque de árvores
surreais/impressionistas e pirilampos feitos de névoa de luz âmbar e um
maravilhoso céu estrelado com belíssimas nébulas com uma lua laranja que
aumentaria de tamanho de acordo com a minha vontade, para a qual poderia ir
voando, como quem nadasse no nada, e nela dar superpulos, pois sua gravidade
seria muito pequena. Sei lá, as possibilidades são infinitas. E inimagináveis.
Acho que levaria um tempo de aclimatação e prática até alcançar abstrações mais
avançadas, mas teria virtualmente a eternidade, milhões de anos para aprender o
máximo que eu pudesse, se isso já não me viesse instantaneamente com a fusão
com a Singularidade. Acho que teria uma coleção de bonecos e inventaria os meus
próprios, mas gostaria de ter uma réplica do busto do Hulk comigo. De repente,
ele, o busto, poderia conversar comigo. Precisaria de companhia. Não sei se as
mentes fundidas à Singularidade poderiam se conectar, mas acho que sim, até
para cada um poder conhecer as criações do outro e para ter companhia. Eu
poderia configurar a minha aparência e mudá-la quando me apetecesse. Como
queria que esse momento chegasse. E logo. Mas tenho que esperar a tecnologia
evoluir, não há o que fazer até a história dar esse pulo definitivo. Essa que
será a revolução de todas as revoluções, a maior obra da humanidade, a
culminância de todo o conhecimento adquirido ao longo dos milênios. Das
pinturas rupestres até a Singularidade. Foi um belo caminho, um trabalho
coletivo e tanto. Nosso destino seguido de acordo com os ditames da
Suprainteligência Universal. Que criou um universo que tende à inteligência e à
tecnologia. À complexidade que se expande à mesma medida que as dimensões do
universo, mantendo assim constante e proporcional ao tamanho deste e
inevitavelmente levando ao surgimento das Singularidades Tecnológicas. A única
limitação são as leis da termodinâmica que tornarão toda a energia do universo
inutilizável, pois toda a energia tende a decair de um estado mais utilizável
para um menos utilizável. Mas a inteligência é também sábia e a complexidade à
medida que se torna mais complexa, utiliza a energia de forma cada vez mais
eficiente. Mas tá bom, já falei devaneios demais para um post só. 21h45. Meu
deus, estou com vontade. Estou quase decidido. Isso não é bom. Mudei de ideia.
Assim está melhor. Superego, haja. Se já estivesse tudo pronto, tudo bem, mas não
está. Nem se tudo já estivesse pronto, nem assim seria uma decisão acertada. O
tempo é senhor de todas as coisas. O tempo irá dizer. Por falar em tempo, acho
que já estou começando a ficar com aquelas marcas na pele típicas da idade.
Espero que não, que seja viagem minha. Mas o número de sinais na minha pele
aumentou bastante. Pelo menos nos meus braços. Reparei isso agora. Mas preciso
receber sol. Eu percebo isso. Tem vezes que eu sinto prazer com a luz solar me
atingindo e se tenho esse tipo de prazer é porque alguma utilidade deve ter
receber os raios solares, por mais que me aproximem de um câncer de pele. E
envelheçam a epiderme também, mas não é sempre que me exponho ao sol,
geralmente só me exponho quando estou fumando no CAPS. Estou viajando na música
de “Drawing Restraint 9” de Björk. “Storm” o nome da música. Queria muito ver
esse filme. Deve ser muito louco a julgar pela trilha. Tem ele todinho pra
assistir no YouTube. Viajei na trilha sonora. É muito doida e amelódica. Parece
liberdade criativa total. E isso eu acho interessante. Me agrada o diferente.
Em especial musicalmente. Mas acho que quando esse acabar eu vou dar um pulo em
SugarCubes. Meus videogames... tudo pegando poeira. Não tenho mais aquele
ímpeto ou paciência com as frustrantes mortes. Pelo menos nos jogos do Mario
que estou jogando. Quem sabe o Persona 4, quando eu voltar, não me desperte
algum interesse. Mas acho que não. Veremos. Venho me prometendo jogá-lo há
muito e não faço. Acho até que os meus controles de PS3 já arrearam a bateria.
22h31. Acho que vou um pouco para o Desabafos do Vate. Minha alma precisa
daquele espaço mais que deste nesse momento. Antes, porém, vou elaborar uma
lista aqui do que me resta fazer para a viagem.
- Encher os tubos de líquido do Vaporfi (3)
- Pegar os pen-drives e HDs externos
- Botar mais camisetas na mala (3)
- Carregar o iPod e levar o carregador
- Levar “O Mundo de Sofia”
- Levar o meu computador
- Levar atomizers
- Levar cartão de crédito (?)
- Colocar minha Havaianas na mala
- Levar o meu Vaporfi e o carregador
- Levar adaptadores de tomada do meu computador e do
carregador do Vaporfi.
-x-x-x-x-
Última vez que venho ao CAPS antes da viagem. Estou
sonolento e não quero participar do primeiro grupo, só do AD. Espero ser bem-sucedido
no meu intento. Vários pensamentos passam pela minha cabeça e não apreendo
nenhum. Relativos à viagem, bonecos, viagem, o que geralmente ocupa a minha
mente. Pensei numa possível conversa com a estagiária no interlúdio do primeiro
grupo e me veio falar da Singularidade. Mas não sei se o faça. Não sei nem se
ela virá ter comigo. Minha barba está cheia de caspa mesmo estando curta,
aparei ontem, máquina dois. Por isso não passei xampu anticaspa nela no banho
de ontem. Meu Deus, a essa hora, na quarta, estarei na Alemanha. Lembrar de
pedir a entrevista ao carinha que me prometeu fazê-la essa semana. A música de
Mallu que passa no meu iPod me lembra a fase que me dedicava quase que
exclusivamente ao blog de bonecos. Fui interrompido por dois psicólogos que
vieram me “estimular” a participar do grupo. Eita, “Underneath the Stars”, do
Cure. Acho que vou fumar um cigarro dentro em breve. Não sei por que não quis
participar do grupo de Colagens Criativas, acho que foi porque vim decidido a
só ir para o grupo AD, visto que não desgosto de fazer postais. Mas não me
apraz a discussão depois. A apresentação dos trabalhos, em especial a minha
apresentação. Não tenho muito conteúdo para trazer, estou com a cabeça meio oca
hoje. Vou até tomar um café com cigarro para despertar. São 9h54.
10h06. Cruzei com uma garota que não era bonita, mas algo
nela me atraiu. Interessante, eu que sou tão seletivo. Acho que porque tinha os
cachos bem cuidados e um corpo estilo falsa magra, que eu acho delícia. Uma
garota não intimidante, isso me agradou. Nossa comunicação se deu apenas por
olhares e foi rápida, o tempo de abrirem a porta de entrada do CAPS. Mas não
vou me fixar nessa pessoa que certamente não vai cruzar o meu caminho
novamente, que dirá o meu coração. Deve ter vindo para uma consulta pelo rumo
que tomou dentro do CAPS. Ou é uma estagiária, mas acho que ela assinou a ata
de presença. Sei lá. Uma amiga do grupo AD me deu dez euros para eu comprar
dois perfumes iguais para ela. Uma garota chora deitada na rede. Eu vou fumar
um cigarro. Assim não vai dar para a viagem. Mas vou fumar mesmo assim. 10h50.
10h59. O grupo vai acabar. A amiga do grupo disse que o
universo conspira a favor do que desejamos de verdade. Quem dera fosse assim.
Talvez tivesse dessa forma uma chance com Aurora. Ela disse que eu tenho que me
abrir. Se ela soubesse o quanto me abro, me escancaro para isso. Mas vamos
mudar de assunto. O meu último grupo talvez nesse ano. A menina que achei
interessante está aqui do meu lado. Estava. Parece que o grupo de Sofia já a
acolheu. Sofia teve uma crise de algo. É de partir o coração. A psicóloga que
eu quero que me trate está auxiliando ela. Ela já parece mais tranquila. Ainda
bem. O novato do grupo AD está sentado à minha mesa. Ele aparentemente criou um
vínculo mais forte comigo. Talvez por termos passado por várias internações nos
mesmos lugares. Estranho nunca termos nos cruzado em nenhuma. Descobri que Nina
chegou a noivar com ele numa das internações. Bem a cara dela. Hahahaha. Essa
Nina... o Marinheiro desconfia que ela esteja internada mais uma vez. Espero
que não. Mas crise de borderline com incompreensão/incapacidade de lidar da
família e tendo a Doutora como psiquiatra... é possível que ela esteja
realmente internada mais uma vez.
12h49. O grupo teve depoimentos pesados hoje. Hoje foi um
dia denso. Só o final foi mais light com uma conversa a sós com a psicóloga de
referência, na qual ela percebeu um padrão, que eu mesmo nunca havia notado, de
recaída após essas viagens. Eu acho que recaía por causa da fissura anterior de
conseguir drogas mais pesadas lá, que saciava com uma recaída de cola. Só pode
ser isso. Felizmente dessa vez, pelo menos até agora, não tenho planos ou
desejos nesse sentido, logo, não tenho nada a temer. Ou assim quero crer. Assim
me enxergo. Me enxergo saindo pouco às ruas, ficando mais em casa. Ou vendo
filmes ou escrevendo. Quero sair à Marienplatz poucas vezes. Não quero ver museus,
não quero ir para parque com criança, quero seguir ao máximo a rotina que sigo
aqui. Que me deixem fazer isso. Que a minha mãe me deixe fazer isso, que minha
irmã compreenda a minha vontade. E respeitem-na. Meu cunhado não tem muito a
ver com a história, com a minha história, logo acho que ele não deve opinar.
Vão querer me convencer a todo custo a ir para os lugares, mas não quero ir.
Não quero encontrar meus vizinhos de jeito maneira. Acho que passeios com
crianças e visitas aos vizinhos se tornarão inevitáveis. Deus queira que não.
Enfrentar o voo vai ser um saco. Enfrentar a Oktoberfest vai ser um saco. Tudo
vai ser um saco. Queria ficar aqui. Mas o meu destino já está traçado quer
queira, quer não, amanhã embarcarei para a Alemanha. E talvez meu padrasto e
sua filha vão se juntar a nós. Que ozzy. Eles que saiam e me deixem em paz. Se
tiver que sair, prefiro sair só. Ou com mamãe. Deixá-la fazendo suas coisas e
ir fazer as minhas. A ferida em minha boca está praticamente curada. Então, já
posso descartar o câncer, eu creio. Parece que uma amiga que há muito não vejo
ou falo vai me ligar. Não queria falar com ela. Não quero nada hoje. Estou do
contra. Minha mãe quer que eu vá na padaria comprar coxinha e bolo de rolo para
os alunos. Ao ver a minha má vontade, disse que ia tentar o delivery da padaria
o que muito me surpreendeu. Talvez queira comprar mais coisas, além disso
apenas. Seria muita cara de pau da minha parte pedir para ela comprar um sonho
para mim.
14h19. Pedi e ela consentiu. Ela está fazendo, como imaginei
uma pequena feira na padaria. Pareceu mais feliz com a opção do delivery do que
com a minha ida, pois não sei nem se conseguiria carregar tudo. Tanto melhor.
Não sei porque a minha cadeira às vezes trava e não reclina para trás. É um mistério
para mim. Parece que mais alunos chegaram aqui em casa, quando cheguei do CAPS
havia duas moças aqui. Agora eu não sei quem são, mas descobrirei em breve
quando for pegar mais Coca e gelo. Verei os rostos, mas obviamente não saberei
de quem se tratam. Acho que vou aproveitar para tirar um cochilo. É minha
última noite em Recife, queria aproveitá-la a contento. Com tudo o que tenho
direito. Espero que o casal vá dormir cedo hoje. Quero a noite, a última noite,
só para mim. Espero que os meninos fiquem na escola a maior parte do dia, isso
inclui a tarde. Quanto menos horas-criança, melhor. Sei que pareço um cara
insensível, mas em verdade talvez seja sensível demais. Especialmente sensível
a mudanças na minha rotina envolvendo crianças pequenas em outro país e na casa
dos outros. Não é a casa da minha irmã apenas, é dela e do meu cunhado e há
normas lá que diferem das daqui. Veremos o que vai acontecer. Só não queria
interação com as crianças e os vizinhos. Um livro que eu acho que leria seria o
que deu origem ao filme “Child Of God”. É um filme que veria de novo. Espero
que um dia eu o faça. Quem sabe nessa viagem. Cujo traslado promete ser mais
curto que o anterior, pois vamos direto de Recife para a Alemanha, sem passar
por São Paulo. Isso já é uma comodidade adicional. Não começa nem termina tão
cansativa a nossa viagem. Por mais que ainda seja. Não queria fazer passeios em
família lá. Realmente não queria. Não queria ir à Áustria. Só queria mesmo dar
os meus rolés pela Marienplatz e arrebaldes, poucos, à procura dos itens que
busco. Nada de zoológico, castelo, parque, museu, Oktoberfest, nada. Vamos ver
de quanto disso conseguirei escapar. Espero que da maioria. Quem me dera de
tudo. Gostarei de ver o Nintendo Switch. Gostarei de ir na Saturn. Gostaria
muito de achar a caixa de madeira trabalhada. Da Oktoberfest eu provavelmente
não vou poder escapar. Mas quem viu uma, viu todas. Eu acho. Acho também que
estou com as expectativas muito baixas. Ou altas em relação à possibilidade de
ter minha independência e isolamento da família. Meu deus, como não queria ir.
Espero que me surpreenda positivamente. Mas acho tão difícil. Bom, seja o que
vier, me matar não vai. Vai ser só extremamente desconfortável e chato. Quem me
dera os guris me deixassem em paz. Quem me dera todos me deixassem em paz. Era
o que poderia dizer a todos: me deixem aqui em paz. Eu levo o lixo e eu faço
compras no Edeka, o resto do tempo, eu decido como usar. Duvido que consiga
estabelecer isso. Eita, uma coisa que me ocorre agora: o carro não terá espaço para
minha irmã, meu cunhado, minha mãe, as duas cadeiras de criança e eu! Logo, não
precisarei fazer passeios de carro em família! Simplesmente porque não caberei
no carro. Uêba! Que familiar ingrato sou eu. Tenho até vergonha de mim, mas
esse sou o eu de agora. Eu preciso me respeitar e me fazer respeitado nas
minhas escolhas. Podem ser escolhas estranhas, fora dos padrões de um turista,
mas não gosto de ser turista. Gosto de ficar em casa escrevendo ou o que me der
na telha. Cada vez me pareço mais com o meu velho pai, só que acho que
ultrapasso e vou além da sua alienação. Mas a resistência em sair da minha zona
de conforto é similar à dele. A dele envolvia mais gente, se bem que nem sei,
contado com as minhas saídas, para as quais encontro cada vez menos motivação,
eu tenho uma vida social mais ativa do que ele tinha nos anos finais. Nem sei
mais o que estou escrevendo, só queixas sobre a viagem, disso eu sei, mas perdi
o fio da meada. Acho que foi até bom, a viagem estava me carregando
negativamente. Acho que vou dar uma pausa aqui e tirar um cochilo. Mas meu sono
passou. O que fazer? O de sempre, escrever mais. Não, vou tirar um cochilo.
16h01. Passei pela sala e mamãe pediu que eu servisse copos
e água aos alunos. Tenho pensado em uma pessoa do meu passado. Uma garota. Com
uma frequência que não tem nada a ver. E com uma certa saudade que tem menos a
ver ainda. Foi ótimo, mas foi um verão que passou há muitos anos. Não tem
realmente mais nada a ver. A pessoa inclusive nem mora aqui. Quase mordo a ferida
de novo comendo gelo. Acho que agora vou dar uma pausa mesmo e tirar um
cochilo.
18h25. Acordei agora há pouco. Comi o restante das coxinhas
e dos pastéis açucarados, guardando a fatia de bolo mínima para mais tarde.
Ainda estou com sono. Dormiria novamente de bom grado. Mas ficarei acordado
para não gerar celeumas com a minha mãe na véspera da viagem. Acordarei cedo
também 10h00. Pelo menos essa é a minha proposta. Acho que vou dormir só mais
uma horinha.
20h42. Eu deitei, mas não consegui dormir. De qualquer forma
permaneci deitado até o despertador tocar. Foi bom. A vontade era ter
continuado na cama. Quem sabe eu ainda não volte para lá daqui a pouco? Não
sei, a vontade há, mas mamãe está pilhada, não quero estressá-la mais. Aos
poucos vou despertando e chegando aqui. Minha última noite em Recife antes da
viagem. Que ozzy colocar assim. Quando eu retornar, voltará a ser uma noite
como outra qualquer. Esse prospecto também não me agrada, pois parece algo
interminável e maçante. Um dia de cada vez. Agora é momento de aproveitar os
restos desse dia que se esvai no tempo. Amanhã será momento dos últimos ajustes
e do início da viagem. Cumprir a listinha que enumerei acima. Agora queria me
deitar. E descansar até às 22h. Ficar deitado. Estou entediado de escrever e
sei bem por quê. Meu primo urbano, que viaja também, entre hoje e amanhã, quer
me ver para fumarmos um cigarro.
21h45. Foi rápido. Mas conversamos sobre as viagens e nos
felicitamos mutuamente. Mamãe pediu que eu tirasse uma cópia da prescrição da
Doutora para levar uma comigo e outra na mala. Já o fiz. Vou trocar essa
bermuda que botei só para não sair mal amanhado para ver meu primo. Colocar o
confortável pijama.
21h55. Coloquei e coloquei mais Coca. Ouvindo Björk. Preciso
botar meu iPod para recarregar, mas só farei amanhã. Só cumprirei minha lista
amanhã. Mamãe acaba de me pedir para criar um lembrete para ela. A cadeira
magicamente destravou. Incompreensível para mim. E ótimo também. Gosto quando
ela reclina.
22h22. Fui lá embaixo numa última busca à carteira de
motorista de mamãe. “I’ve Seen It All” passando, parece muito com a minha visão
de mundo de hoje. Comodismo/acomodação absolutos e resistência a mudanças. Não
quero nada fora do meu quadrado. Estou muito bem nele. No entanto, parto para
uma mudança radical, vou sair não só do meu quadrado, meu quarto-ilha, mas da
minha cidade, do meu país, meu continente, cruzar o oceano direto para o
primeiro e velho mundo, para a casa da minha irmã com duas crianças. É, para
quem tem resistência a mudanças é um baita desafio. E ainda mais para alguém
cuja rotina é tão antissocial. Crianças são seres que demandam interação,
interação esta que acho que já deixei claro aqui que não estou disposto a dar. Pode
me chamar de egoísta, mas não sou pai nem pedi para ser tio. Infelizmente, a
contrário da minha geração, eles têm apenas dois tios por parte de mãe, um
chato, eu, e um legal, o meu irmão. E para a sua decepção maior, eu sou o que
mais viaja para lá, pois sou um aposentado que vive atrelado à mãe. Ou cuja mãe
atrela a si. É uma via de mão dupla, eu acho. Ela pede e eu respondo de acordo.
Ou não, em alguns casos. Escassos casos. Não sinto o mesmo prazer de outrora ao
escrever. Isso muito me incomoda. Mas espero destravar nessa viagem. Acho que
uma das próximas revoluções em games vai ser em termos de AI, para jogos com
The Sims ou date simulators. Ou open
world games que já usam AI relativamente avançadas a julgar por FarCry3, que
foi um dos únicos que mergulhei realmente. 23h05. Pelo visto essa noite vai
demorar para dormirem. Mas parece que o corredor já está escuro. Vou pegar Coca
e averiguar. Parece que já vão se deitar. Acho que vou também. Mas antes
revisar e postar isso.
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