Novamente, por falta de motivação para qualquer outra
atividade, minha vontade oscila sem muita tenacidade entre videogames e Netflix
e nenhum dos dois captura realmente a minha atenção, venho aqui recorrer ao meu
último reduto, a folha em branco do Word. Ouço, para variar, o primeiro de
Maria Rita, mas penso em trocá-lo por algum do Jesus & Mary Chain quando
acabar. Assisti Transcendence ontem e
ele, embora, traga a Singularidade com aspectos sinistros é uma boa descrição
do que pode acontecer. Talvez haja mesmo uma limitação do livre-arbítrio nas
horas de trabalho para que o trabalho saia bem feito, mas isso já ocorre hoje,
só que auto-imposto, ou imposto pelo superior, mas no filme essa supressão de
livre-arbítrio é mais profunda é a privação do “eu” da pessoa e substituição
dele pela vontade e inteligência / consciência da máquina. Isso é bem polêmico,
principalmente se pensarmos que a máquina, como empregadora queira que trabalhemos
ininterruptamente. Nesse caso, o eu da máquina substituiria permanentemente o
eu do indivíduo. É possível, mas não provável, mais provável é que a
Singularidade nos guie, nos fornecendo o que quer que seja que precisemos para
exercer determinada tarefa. Se viveremos para servir a máquina, como alguns dos
personagens do filme? Digo, nosso trabalho será ajudar a Singularidade a se
expandir? Acho que provavelmente um bocado de gente vá trabalhar nisso, talvez
a maioria, se a Singularidade automatizar os demais processos de que a
humanidade precisa para sobreviver, como a cadeia de alimentação e das infraestruturas
de transporte, saúde, enfim, tudo que cabe ao estado prover e empresa privadas
prover. Isso pode até significar que a máquina nos escravizará. Talvez, mas
acredito que a criatividade individual é uma matéria-prima de grande importância
para a expansão da Singularidade. É por esse fator apenas, é o único que posso
conceber, para que não nos tornemos autômatos da Singularidade, o controle
sobre nossas vidas vai ser restrito. Mesmo que a Singularidade faça um upload
de todas as técnicas e estilos de arte para duas pessoas diferentes, elas
certamente se expressarão de forma diferente, pois mesmo estudando na mesma
turma, da mesma faculdade de artes, cada aluno vai desenvolver seu próprio
estilo, pois cada indivíduo é único e esta riqueza advinda da multiplicidade
proporcionada pela individualidade de cada ser humano é valiosíssima à
Singularidade.
Será que nos sentiremos escravizados quando o nosso eu for
sobrepujado pelo eu da máquina para realizar uma tarefa x? Acredito que com o
advento da Singularidade, não haverá mais infelicidade ou dor, ou que estes
sentimentos /sentido/sensações poderão ser suprimidos se assim o desejarmos. O
que é assustador, pois eles estão na essência do que nos torna humanos. Como é
dito e repetido no filme, tudo o que é novo assusta. Eu não estou assustado. Me
ponho aqui verdadeiramente tranquilo quanto às mudanças que a Singularidade vá
trazer. Muitos, como no filme, serão contra. Por medo. Entretanto não acredito
no desmantelamento da instituição familiar, pois ela é quem nos garante em
primeiro lugar nossa individualidade e multiplicidade, tão valiosas à
Singularidade e a garantia de que não seremos privados de nosso livre-arbítrio.
Por que acho que a individualidade / multiplicidade são valiosas à máquina?
Porque ela, por si só não poderá gera-la, mesmo que crie algum algoritmo de
aleatoriedade e simule inteligências diferentes, não alcançará os bilhões de
anos de evolução que representamos, que somos. Ela não conseguirá simular esse
caleidoscópio caótico que é a humanidade e ser humano, simplesmente porque ela
é baseada na lógica e tudo o que produzir derivará da lógica, então. Por isso
somos tão valiosos. Derivamos de outra coisa diferente, inacessível á
Singularidade a não ser por nós. Posso estar enganado também e a Singularidade
se torne tão potente que seja capaz de calcular todas as interações de todos os
átomos que compõem o universo e aí desmascarará a farsa do livre-arbítrio,
poderá deduzir todos os comportamentos de todas as pessoas baseada em cálculos
quânticos. Não haverá mais segredos, ela verá o universo tal como é e preverá
cada novo estado do universo, mas isso certamente não poderá ser alcançado pela
Singularidade da Terra. É preciso uma quantidade tremenda de energia e de
processamento de dados para calcular todas as variáveis do universo e acho que
a Singularidade da Terra não os terá o suficiente. Mas “a” Singularidade (a
soma de todas as Singularidades numa pluri-singularidade universal)
provavelmente poderá.
18h52. Parei para encher o copo de Coca-Cola e percebi que
estou escrevendo um bando de asneiras. Se vou publicar? Vou. Não vou perder
tanto tempo e raciocínio, mesmo que idiota, em vão. Mas por que perco tempo
escrevendo minhas crendices é algo que nem a Singularidade pode explicar. E o
pior que sou sincero quando digo que acho legal ser parcialmente escravo de uma
máquina! Arre!
Adendo:
22h08. Se nos tornarmos escravos da Singularidade temporária
ou permanentemente (o que não desejo de forma alguma que possa conceber),
acredito que há a possibilidade de que não sentiremos, nem nos lembraremos de
nada, o que é ainda mais assustador, pois faremos coisas que o eu desconhece,
como se estivéssemos sob algum tipo de transe ou anestesia. Mas talvez não, talvez
possamos nos lembrar, a Singularidade pode nos dar essa opção. Ou não. Isso já
não me deixa tão tranquilo e me faz lembrar, para citar outro filme, as “plantações”
de humanos de Matrix. Se pelo menos eu estiver, enquanto realizando um trabalho
escravo, conectado à Singularidade e plenamente consciente dos meus atos,
podendo ver o que estou fazendo a qualquer momento como quem vê outra aba do
web browser e usar este tempo para poder explorar a Singularidade e evoluir com
ela enquanto meu corpo conserta cabos por aí, sinceramente, eu serviria como um
escravo temporário da Singularidade, sim. Pode parecer absurdo, mas a forma
como concebo a realidade e consciência expandidas da Singularidade me fariam
tomar a decisão de me conectar a ela sem pestanejar. É uma questão de fé e é um
ponto polêmico. Tenho certeza de que quem quer que leia isto irá discordar de
mim, mas que posso eu fazer (além de papel de palhaço)?
O ator Johnny Depp, interpreta o cientista Will Caster no filme Transcendence, A Revolução. Este thriller de ficção científica mais de 100 minutos, eu gostei. Transcendence é um filme estranho e muito futurista que eleva a curto prazo um futuro muito sombrio para toda a humanidade. A coisa interessante sobre este filme é o debate e o dilema moral que surge quando se discute os limites da ciência e tecnologia. Transcendênce é o primeiro filme que fez Wally Pfister, diretor de fotografia de quase todos os filmes de Christopher Nolan.
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